Acórdão nº 3133/08.1TBVCT.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Janeiro de 2022

Magistrado ResponsávelFERREIRA LOPES
Data da Resolução20 de Janeiro de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam em conferência no Supremo Tribunal de Justiça Notificados do acórdão proferido nos autos, com data de 30.06.2021, vieram o recorrente Autor AA, e a recorrente Ré Generali Seguros SA, requerer a reforma do acórdão, arguindo a nulidade do mesmo.

O Requerentes AA conclui como segue a sua reclamação: 1. O presente pedido de reforma é admissível, por força da conjugação do teor das disposições dos arts. 616.º, n.º 2, al. a), 666.º, n.º 1 e 679.º do Cód. Proc. Civil 2. O Douto Acórdão proferido em sede de revista padece da nulidade prevista na al. d) do n.º 1 do art. 615.º do Cód. Proc. Civil, por se ter pronunciado sobre matéria relativamente à qual, havendo dupla conforme entre as decisões de 1.ª e 2. Instância, lhe estava vedado tomar posição.

  1. Padece, ademais, da nulidade prevista na al. c) do n.º 1doart. 615.º do Cód. Proc. Civil, por conter contradição entre a fundamentação e a decisão, concretamente, entre a fundamentação, na parte em que considerou existir dupla conforme relativamente à indemnização pela perda de ganho futuro (320 000,00 €), e a decisão, na parte em que, apesar dessa dupla conformidade, revogou a decisão condenatória proferida em 2.ª Instância.

  2. Padece, também, da nulidade prevista na al. c) do n.º 1 do art. 615.º do Cód. Proc. Civil, porconterambiguidadequetornaafundamentaçãoeadecisãoininteligíveis, na parte em que se pronunciou sobre o conceito de dano biológico e a impossibilidade de cumular este segmento indemnizatório com a pensão por invalide.

  3. Padece, salvo melhor opinião, de erro na aplicação do direito, na parte em que pese embora a existência de dupla conforme ao nível das decisões que condenaram a Ré Seguradora no pagamento das indemnizações arbitradasem1.ª e 2.ª Instância, procedeu à alteração desses segmentos decisórios.

  4. Padece ainda, salvo melhor opinião, de erro na aplicação do direito, na parte em que não reconheceu ao Autor o direito ao recebimento de juros de mora, entre a data da citação da Ré para os presentes autos e a data do pagamento da indemnização, violando, nesta parte, o disposto no art. 804.º, n.º 1 e 805.º, n.º 1, al. b) e 806.º, n.º 1 do Cód. Civil.

  5. Salvoodevidorespeito,padecetambémdeerronaaplicaçãododireitoaosfactos, na parte em que socorre do art.611.º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil para considerar a cotação do franco suíço à data da sentença, na medida em que os autos dispunham de prova documental (extractos bancários) que permitia saber quanto recebeu o Autor da Interveniente SUVA, após conversão do franco suíço em euros, quando cada pagamento foi efectuado, violando, desse modo, as disposições dos arts. 558.º, n.º 1 do Cód. Civil e 611.º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil.

  6. Padece de erro grosseiro de raciocínio, aonível da qualificaçãojurídicados factos, na parte em que não reflectiu, no segmento decisório, o quantum indemnizatório devido ao Autor pela Ré (afastando-se do modus decidendi das Instâncias, que fixaram essa indemnização e determinaram a dedução à mesma do valor pago ao Autor pela Interveniente SUVA), abstendo-se, desse modo, de fixar o limite máximo da obrigação de reembolso à Interveniente, a cargo da Ré seguradora, e violando, desse modo, o disposto no art. 593.º, n.º 1 do Cód. Civil.

  7. Padece de erro grosseiro de raciocínio, ao nível da qualificação jurídica dos factos, na parte em que, considerando incluída no que qualificou como indemnização pela pera de ganho futuro, no valor de 320 000,00 €, a indemnização pelo dano biológico, não levou em conta a presunção n.º 2 do art. 6.º do Decreto-Lei n.º 187/2007, obviando à possibilidade de cumulação da indemnização por dano biológico com a pensão de sobrevivência paga pela Interveniente SUVA.

  8. Ao decidir como decidiu, revogando as decisões de condenação da Ré Seguradora no pagamento de indemnização por perdas salariais (€103.500,00), por perda de capacidade de ganho futuro (€320.000,00), e de juros de mora sobre essas quantias, este Tribunal tomou conhecimento de matéria cuja apreciação lhe estava vedada pelo art. 671.º, n.º 3 do Cód. Proc. Civil, o que inquina o Douto Acórdão com a nulidade prevista no art. 615.º, n.º 1, al. d) do Cód. Proc. Civil 11. Daí que se requeira a V. Exas. que julguem procedente o presente pedido de reforma, revogando o Douto Acórdão proferido nos autos e substituindo-o por decisão que não tome posição sobre a pretensão da Recorrente Seguradora de ver alterado o acórdão recorrido, na parte em que a condenou a pagar ao Autor indemnização por perdas salariais (103 500,00 €), indemnização a título de perda de ganhos futuros (320 000,00 €) e juros moratórios sobre essas quantia, assim como na parte em que definiu o modo de abater à indemnização por perdas salariais os valores pagos pela Interveniente SUVA, confirmando, nessa parte, o decidido em 2.ª Instância.

  9. Este Tribunal entendeu existir uma situação de dupla conforme relativamente à indemnização fixada a título de perda de capacidade de ganho futuro e, por inerência, às decisões condenatórias proferidas pelas Instâncias, a esse título, impeditiva do conhecimento dessa parte do recurso, por força do disposto no art. 671.º, n.º 3 do Cód. Proc. Civil.

  10. Apesar de ter partido desse pressuposto, este Tribunal alterou essa parcela do segmento decisório, já que, contrariamente ao decidido em 1.ª e 2.ª Instância (condenação da Ré Seguradora a pagar ao Autor, “a título de perda de ganhos futuros, a quantia de € 320.000,00 (trezentos e vinte mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, contados desde a citação até integral pagamento”), decidiu revogar “o acórdão na parte em que a condenou a indemnizar o Autor a título de danos não patrimoniais, por perdas salariais e a título de ganhos futuros”.

  11. Salvo melhor opinião, nessa parte verifica-se uma contradição entre a fundamentação e a decisão do Douto Acórdão proferido por este Tribunal, já que, apesar de, ao nível da fundamentação, se ter entendido que não se poderia apreciar o recurso, na parte em que visava a revogação da condenação no pagamento de indemnização por perda de capacidade de ganho futuro, por existir dupla conforme, no segmento decisório contrariou-se esse pressuposto e alterou-se o decidido nessa parte – o que leva a uma dissonância entre a premissa e a conclusão.

  12. Ao actuar desse modo, salvo qualquer lapso (pelo qual, a existir, o Recorrente se penitencia), este Tribunal cometeu a nulidade prevista no art. 615.º, n.º 1, al. c) do Cód. Proc. Civil, o que impõe a procedência do presente pedido de reforma, a revogação do Douto Acórdão proferido em sede de revista e sua substituição por Douta Decisão que corrija essa nulidade, confirmando o decidido em 2.ª Instância, na parte em que condenou a Ré Seguradora a pagar ao Autor indemnização a título de perda de ganhos futuros (320 000,00 €) e juros moratórios sobre essas quantia.

  13. Olhando à fundamentação do Douto Acórdão proferido em sede de revista, é legítimo concluir que se entendeu aí que a quantia de 320 000,00 € abrangia a parcela indemnizatória destinada a compensar o dano biológico, pois é isso que textualmente resulta do excerto acima transcrito. O que também daí resulta, embora tacitamente, é que, embora o valor de 320 000,00 € incluísse a indemnização pelo dano biológico, não era possível discernir, nesse montante, qual a parcela destinada a ressarcir esse concreto dano.

  14. Apesar de ter partido do pressuposto de que, por um lado, os 320 000,00 compreendem uma parcela destinada a indemnizar o dano biológico e, por outro, que não foi discriminado qual o montante concreto dessa parcela (por inexistir obrigação, a cargo das Instâncias, de o fazer, como se afirmou), em parte mais adiantada da fundamentação da sua decisão (também na pág. 35) este Tribunal entendeu não ser de presumir que uma parte dessa indemnização (1/3) se destinava a compensar o dano biológico.

  15. Essa contradição, por si só, torna ambígua a decisão final, na medida em que, se parte do pressuposto que os 320 000,00 € compreendiam uma parcela destinada a indemnizar o dano biológico, sem especificar qual o respectivo montante, este Tribunal não poderia afirmar que não haveria que lançar mão da presunção prevista no art. 6.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de Maio, nem que proceder ao abatimento das pensões pagas pela Interveniente SUVA sobre a totalidade da indemnização de 320 000,00 €.

  16. Por força dessa ambiguidade, o Douto Acórdão proferido em sede de revista padece da nulidade prevista no art. 615.º, n.º 1, al. c) do Cód. Proc. Civil, o que impõe a procedência do presente pedido de reforma e consequente revogação dessa decisão e sua substituição por Douto Acórdão que supra essa nulidade, considerando que os 320 000,00 € compreendem uma parcela destinada a indemnizar o dano biológico, aplicando a presunção prevista no art. 6.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de Maio, e, por inerência, confirmando na íntegra o Douto Acórdão recorrido, na parte em que decidiu “Condenar a Ré a pagar ao Autor, a título de perda de ganhos futuros, a quantia de € 320.000,00 (trezentos e vinte mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, contados desde a citação até integral pagamento, deduzindo-se da parcela de dois terços desse valor, ou seja, 213 333,33 €, o valor pago pela interveniente ao autor a título de pensões até ao encerramento da discussão da causa (sendo que o valor já liquidado ascende a CHF 343.842,27), e ainda a quantia de € 15.500,00 (já adiantada pela ré em consequência da providência cautelar apensa), sendo-lhe, assim, apenas pago a este título, o valor da diferença, se a houver, entre o primeiro e o segundo valor, na data do cumprimento, à taxa de câmbio que se verificar, e condenando-se a Ré a pagar ao Autor, ainda, sem qualquer desconto, o remanescente, ou seja, € 106 666,67 (correspondentes a uma terça parte da indemnização pela perda de ganhos futuros – 320 000,00 € -, não sujeita a desconto)” - o que se requer.

  17. Por força da (dupla) conformidade entre a sentença e o...

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