Acórdão nº 96/19.1YHLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Janeiro de 2022

Magistrado ResponsávelFERREIRA LOPES
Data da Resolução20 de Janeiro de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça ENATUR – EMPRESA NACIONAL DE TURISMO S.A., instaurou acção declarativa de condenação contra ILIDH – INSTITUTO LUSO- ILÍRIO PARA O DESENVOLVIMENTO HUMANO, pedindo: a) a declaração de nulidade do registo da marca nacional nº 535589 titulado pela Ré; b) subsidiariamente, a declaração da anulabilidade do registo da marca nacional nº 535589 titulado pela Ré; c) a condenação da Ré a abster-se de usar a expressão “Pousada(s)” designadamente como denominação social, marca, logótipo, nome de domínio, sinalética, merchandising, nos media social para assinalar produtos idênticos ou afins aqueles designados pelos direitos prioritários da Autora; d) a condenação da Ré no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória em valor a determinar pelo Tribunal por cada dia de violação do peticionado na al c), a contar da data do trânsito em julgado da sentença até efectivo e integral cumprimento.

Alegou para tanto e em síntese, ser titular das marcas nacionais nº 284804 “Pousadas de Portugal”, nº 497126 “Pousadas de Portugal” e nº 402806 “Adegas das Pousadas de Portugal”, dos logótipos nº 235 e nº 26294, das marcas da União Europeia nº 10742559 “Pousadas de Portugal” e nº 10738871 “Pousadas de Portugal”, bem como do nome de domínio www.pousadas.pt.

Por sua vez, a Ré é titular da marca nacional nº 535589 “Pousada de Mafra – Palácio dos Marqueses”, concedida em 23.1.2015, para assinalar produtos e serviços das classes 16ª, 25ª, 28ª e 43ª.

Contudo, ex vi do art 11 do DL 39/2008 de 7.3, o termo legal “Pousada” identifica determinados estabelecimentos hoteleiros explorados pela Autora ou por terceiros que com esta hajam contratado tal exploração, o que não é o caso ora Ré. Donde, o uso dessa expressão pela Ré é contrária à lei e viola regras de ordem pública, induzindo o publico em erro acerca da natureza ou qualidade do serviço, fundamentos determinantes da nulidade do respectivo registo da marca nos termos do art 33 nº 1 al c), 238 nº 1 e 4 a 6 e 265 todos do CPI.

Caso assim não se entenda, deverá o registo da marca em análise ser anulada por virtude do direito de expressão “Pousada” não lhe pertencer nos termos do art 34 nº 1 do CPI, além de imitar as marcas prioritárias tituladas pela Autora, marcas essas de prestígio, devendo-se nesta sede atender ao seu elevado carácter distintivo considerado relevante na aferição da confundibilidade entre os sinais, beneficiando do estatuto plasmado nos art 241 e 242 do CPC.

Mais acresce ser a coexistência entre elas causadora de prejuízos à Autora, além de configurar a actuação da Ré uma situação de concorrência desleal.

Citada, a Ré ofereceu contestação, pugnando pela improcedência da acção e a sua absolvição o pedido.

Alegou no essencial, que a Autora não detém o monopólio sobre a expressão “Pousada”, não sendo legítima a interpretação por si apresentada do art 11º do DL 39/2008, devendo antes se entender como uma definição de estabelecimentos hoteleiros, que nada tem a ver com as marcas, não merecendo qualquer respaldo no CPI a protecção deste monopólio, como seria expectável caso existisse.

Refuta, igualmente, por não demonstrada a invocada notoriedade e prestígio das marcas tituladas pela Autora, bem assim como a não verificação dos pressupostos de imitação de marca ou de concorrência desleal, argumento a propósito desta última conviver a Autora com muitas outras marcas contendo a expressão “Pousada”.

Feito o julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente, decisão confirmada por acórdão da de Lisboa.

/// Ainda inconformada, a Autora interpôs recurso de revista excepcional, que foi admitido por acórdão da formação (no nº 3 do art. 672º), que considerou estar preenchido o pressuposto da alínea a) do nº 2 do art. 672º, com a seguinte fundamentação: Importa saber se a exegese do art. 231º nº 3, alínea d) do actual Código de Propriedade Industrial, na redação do DL nº 110/2018 de 10.12. (…) contempla uma abordagem interpretativa dos artºs. 11º, 41º e 42º do DL nº 39/2008 de 7 de março do Regime Jurídico de Instalação, Exploração e Funcionamento dos empreendimentos turísticos, envolve uma temática que justifica a excecionalidade da revista e o acesso ao terceiro grau de jurisdição, por forma a reforçar a segurança e a certeza na aplicação do direito.

Conquanto se reconheça que o Regime Jurídico da Instalação, Exploração e Funcionamento dos empreendimentos turísticos cura da regulação da actividade dos empreendimentos turísticos e do acesso à mesma, ao passo que do regime da Propriedade Industrial apura da possibilidade de existência de imitação, usurpação, potencialidade de indução em erro ou concorrência desleal, sempre com vista a garantir o bom funcionamento do mercado e, consequentemente de toda a economia, impõe-se sublinhar que a questão de saber se admissibilidade de instalação do empreendimento turístico em apreço tem, ou não, cruzamento relevante com o regime da propriedade industrial, encerra complexidade bastante e de atualidade indiscutível, a par de impor à respectiva subsunção jurídica, um detalhado exercício de exegese.

A solução encontrada, retirada da exegese dos mencionados diplomas, condizente a saber se são confluentes as questões incidentes sobre a suscetibilidade de licenciamento de alojamentos com as de propriedade intelectual, é suscetível de influir no modo como as instâncias apreciarão casos semelhantes, extravasando o simples interesse particular.

Afigura-se-nos, pois, estar objetivamente justificada a necessidade de excecional intervenção deste Tribunal, com vista a obter uma solução orientadora sobre a matéria trazida a juízo.

/// A Recorrente conclui do seguinte modo as suas alegações: 1ª. A presente acção foi intentada pela A./Apelante, e aqui Recorrente, ENATUR – Empresa nacional de Turismo S.A., contra a associação ILIDH – Instituto Luso-Ilírio para o Desenvolvimento Humano, peticionando-se: (…) 2ª. O Tribunal da Propriedade Intelectual julgou a acção intentada pela Apelante totalmente improcedente, tendo a Apelante, inconformada com a sentença proferida pelo tribunal a quo, interposto recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa. Com data de 05 de Janeiro de 2021, foi proferido Acórdão pelos Venerandos Juízes Desembargadores que compõem a Secção da Propriedade Intelectual, Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa, que confirmou a sentença impugnada, julgando também improcedente a apelação.

  1. O Acórdão aqui sindicado, determinou a improcedência do recurso de Apelação da A./Apelante, dele se extraindo o seguinte sumário: «I. O Decreto-lei n.º 39/2008 de 7 de Março que «Aprova o regime jurídico da instalação, exploração e funcionamento dos empreendimentos turísticos» não visou criar regimes de exclusividade onomástica ou relativos ao uso de símbolos atribuindo titularidade privativa sobre determinados vocábulos para efeitos de constituição de marcas mas apenas regular uma actividade; II. A questão da admissibilidade de instalação de empreendimento turístico não tem cruzamento relevante com as da propriedade industrial já que, enquanto aí se cura da regulação da actividade dos empreendimentos turísticos e acesso à mesma, aqui o que importa é averiguar da possibilidade de existência de imitação, usurpação ou concorrência desleal, sempre com vista a garantir o bom funcionamento do mercado e, consequentemente, de toda a economia; III. «Pousada» corresponde a vocábulo do léxico lusitano de uso comum que não se demonstrou que tenha adquirido eficácia distintiva específica e exclusiva com o curso dos anos face ao exercício da actividade da Recorrente.» 4ª.

    Estamos perante uma única situação fáctica: o...

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