Acórdão nº 0266/20.0BEPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 02 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelANABELA RUSSO
Data da Resolução02 de Fevereiro de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACÓRDÃO 1. RELATÓRIO 1.1. A……………, inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto - que julgou totalmente improcedente a reclamação judicial por si deduzida do despacho do Chefe do Serviço de Finanças do Porto 5, que indeferiu o pedido cancelamento da hipoteca voluntária constituída para garantia da dívida, bem como o cancelamento sobre a penhora de imóveis e a extinção do processo de execução fiscal n.º 3190200801014196 - interpôs recurso para este Supremo Tribunal Administrativo.

1.2.

Tendo alegado, conclui a Recorrente a sua motivação nos seguintes termos: «

  1. Vem o presente recurso interposto da Sentença proferida no processo n.º 266/20.0BEPRT do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou improcedente os pedidos formulados pela Alegante, que aí pugnava pelo cancelamento da hipoteca voluntária bem assim da penhora imobiliária, constituídas para garantia da dívida tributária exigida no processo executivo 3190 2008 0101 4196, e em consequência, a extinção do processo executivo.

  2. Não obstante as questões suscitadas nos presentes autos, entendeu a ALEGANTE submeter a recurso apenas uma questão, que por consequência define a estrutura das presentes alegações: • saber se é lícito, ao Órgão de Execução Fiscal, e por seu turno ao Tribunal a quo, à luz do princípio da presunção da inocência, com consagração no artigo 6º § 2 da Convenção do Direitos Humanos, indeferir os pedidos formulados pela ALEGANTE.

  3. Cronologicamente no tempo, apura-se a factualidade que infra se enunciará.

  4. O acto tributário que deu origem ao processo executivo n.º 3190 2008 0101 4196, no qual foi proferida a decisão objecto de reclamação, foi praticado pela Direcção de Finanças do Porto 5, na sequência do acto de liquidação adicional de IRS | 2003, promovida ao abrigo do acto inspectivo no âmbito da Ordem de Serviço interna OI200700974, constando a respectiva motivação do relatório de inspecção tributária que se encontra junto aos autos de procedimento gracioso correspondente.

  5. Posteriormente, o Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Secção Local Criminal, J3, sob o n.º 65/08.7IDPRT, apreciados os factos que estiveram na génese da liquidação do imposto em execução fiscal, veio a considerar que não se provou que a ALEGANTE (…) tivesse recebido com a venda da B…………, Lda, qualquer quantia ou benefício.

  6. Mais observou o Tribunal Criminal que em face da prova produzida em Audiência de Julgamento, não se provou ou demonstrou que a ALEGANTE tenha outorgado o contrato de cessão de quotas (…) omitindo o seu real valor à Administração Tributária, com o fito de assim, lograrem a não entrega do correspondente imposto tributário e dessa feita aumentarem, em igual valor, a própria vantagem patrimonial.

  7. Entendendo a final, o Tribunal Criminal, que não foi provado que a ALEGANTE tenha obtido (…) um ganho sujeito a IRS constituído pela diferença entre o valor da realização e o valor da aquisição (…) assim como não ficou demonstrado que (…) os rendimentos obtidos (…) provenientes da transmissão da participação social detida e adquirida após o ano de 1998, constituem mais – valias sujeitas a tributação.

  8. Conclusão que ancorou no facto de, da concatenação dos vários elementos de prova, não ter resultado (ao contrário do que veio a considerar a AT em sede de tributação e liquidação adicional de IRS | 2003) que a empresa tivesse sido vendida pelo preço de € 1.246.994,74.

  9. Tendo assim, concluído o Tribunal Criminal pela inexistência de qualquer ocultação de valores relevante para efeitos de IRS | 2003.

  10. Em face de quanto veio de se alegar, entendeu o Tribunal Criminal que (…) nada permite concluir que os arguidos tivessem ocultado os valores da venda, que tivesses recebido qualquer dividendo ou ocultado qualquer benefício.

  11. Os argumentos que vêm de se alinhar levaram o Tribunal a proferir decisão absolutória, a qual já transitou em julgado em 21.04.2019.

  12. Assim entendimento da ALEGANTE, que pelo seu, necessário efeito comunicante, também não lhe poderá ser exigido o pagamento da dívida em execução, sob pena de com a manutenção da execução e consequentemente da hipoteca e da penhora de bens sobre o seu património, o OEF e por sua vez o Tribunal a quo incorreram em grave violação dos direitos da ALEGANTE, os quais, se encontram devidamente salvaguardados na Convenção dos Direitos do Homem.

  13. Em face de quanto vem de se expor mal andou o Tribunal a quo por considerar que (…) o art. 84º do C.P.P. apenas atribui relevância extraprocessual ao caso julgado de decisões penais que apreciem pedidos cíveis e os arts. 674º-A e 674º-B do C.P.C apenas atribuem a decisões penais em processos de natureza cível e não de natureza tributária. Com efeito, só no âmbito das acções civis em que se discutem relações jurídicas conexas com a prática da infracção em apreciação no processo penal, pode a decisão penal absolutória constituir presunção ilidível, relativamente aos factos que integram os pressupostos da punição e os elementos do tipo legal de crime e nessa medida pode ser aplicado o princípio da presunção da inocência. Pg. 8 da Sentença a quo N) Concluindo a este propósito que [n]esta senda, a absolvição em processo-crime não acarreta ilegalidade ou inexistência das quantias exequendas. No âmbito do direito tributário, ao nível da legalidade do acto tributário, não se questiona nem se apura a existência de factos que permitam concluir pela prática de um qualquer crime com a consequente condenação e/ou absolvição. Isto porque, no âmbito das matérias aqui em questão os factos pertinentes onde respeitas à existência ou inexistência de factos que consubstanciem tributação no âmbito das leis fiscais. Pg. 9 da Sentença a quo O) Conclusões que estribou na fundamentação que aqui se transcreve (…) resulta da factualidade assente, pontos 1) e 2), o Serviço de Finanças do Porto 5 instaurou em nome de C………….. e da aqui Reclamante o processo de execução fiscal n.º 3190200801014196, por dívidas de IRS do ano de 2003, tendo sido deduzida impugnação judicial contra a liquidação de IRS controvertida naquele processo de execução fiscal, tendo-se aí discutido a legalidade da sobredita liquidação de IRS. – Pg. 9 da Sentença a quo P) Diversamente o Ministério Público com intervenção nestes autos, pronunciou-se em sentido diametralmente oposto, pugnando pela procedência da acção, por considerar que [a]o restringir o âmbito da norma do art. 624º do CPC ao processo de natureza civil, há-de significar que os princípios e valores do processo penal, máxime, o da presunção da inocência devem revelar em processos ulteriores ao processo penal absolutório.

  14. Considerando que se afigura (…) podermos/devermos afirmar com inteira propriedade que a desresponsabilização da autoria material imputada em processo penal, em resultado de sentença penal absolutória definitiva, não deixa de entrar directamente como premissa no silogismo judiciário em que se consubstancia o elemento lógico da sentença penal, fixando no caso concreto a situação tributária do contribuinte (arguido). Ocorrendo por isso projecção necessária dos efeitos penais absolutórios no processo de impugnação judicial (e também no processo de oposição á execução fiscal). A sentença absolutória penal definitiva tem, em nosso ver, esse efeito reparador.

  15. Advertindo que [i]mporta não perder de vista o objectivo funcional do procedimento tributária, enformado pela preocupação da descoberta da verdade material, consubstanciada no princípio do da Justiça (art. 55º da LGT), não sendo de admitir condutas da Administração Tributária que procurem, a todo o custo, a tributação dos rendimentos dos contribuintes.

  16. Contrariamente, o Tribunal a quo subsumindo estes mesmos factos ao direito, retira-se da fundamentação da Sentença em escrutínio quanto...

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