Acórdão nº 01442/21.3BELRA de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 02 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelGUSTAVO LOPES COURINHA
Data da Resolução02 de Fevereiro de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I – RELATÓRIO I.1 Alegações A REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA, vem recorrer da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que julgou procedente a reclamação de atos do órgão de execução fiscal interposta por A…………, UNIPESSOAL, LDA, contra o indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia no âmbito do processo de execução fiscal n.º 13332019010394312 e outros, instaurados para cobrança coerciva de dívidas provenientes de coimas fixadas em processos de contraordenação por falta de pagamento de taxas de portagens.

Apresenta as suas alegações de recurso com o seguinte conteúdo a fls. 151 a 163 do SITAF: 1 - O presente recurso vem interposto contra a douta sentença que julgou procedente por provada, a reclamação de actos do órgão de execução fiscal interposta por A…………, UNIPESSOAL, LDA., contra a decisão do Chefe da Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de Leiria, pela qual foi indeferido o pedido de dispensa de prestação de garantia formulado no âmbito dos autos.

2 – A douta sentença sustenta tal procedência no entendimento que a Administração Tributária deveria, ao abrigo do seu dever de colaboração e ao abrigo do princípio do inquisitório, solicitar documentação adicional ao contribuinte ou, em alternativa, encetar as diligências necessárias para o efeito, com vista ao cumprimento do défice instrutório de que o requerimento da recorrida padecia.

3 - Com a devida vénia, a Fazenda Pública não se pode conformar com tal decisão, considerando que existiu erro de julgamento em matéria de direito, na interpretação e aplicação do artigo 52º n.º 4 e artigo 74º n.º 1 e 2 da LGT e artigo 170º n.º 1 e 3 do CPPT, na medida em que não aplicou corretamente as regras sobre a distribuição do ónus de alegação e prova constante das referidas normas, pelo que deve a douta sentença ser revogada, e substituída por douto acórdão que negue provimento à reclamação.

4 - Considera a Autoridade Tributária que não está obrigada pelo princípio da colaboração e do inquisitório, ainda que o Contribuinte se disponibilize expressamente para prestar mais informações se solicitadas, a suprir oficiosamente as diligências impostas pela lei ao Contribuinte.

5 - Resulta pois do n.º 3 do artigo 170º do CPPT que o requerimento de dispensa da prestação de garantia deve ser fundamentado de facto e de direito, e instruído com a prova documental necessária 6 - Ora, é manifesto que o requerimento de dispensa de prestação de garantia apresentado pela Reclamante não estava devidamente fundamentado de facto, na medida em que omitiu bens, muito menos estava instruído com a prova documental necessária.

7 - O Tribunal recorrido partiu ainda do pressuposto que a Administração Tributária conhecia a situação patrimonial da Reclamante, por força do PER ou de outros processos, pressuposto que também não tem qualquer sustentação fática nos autos.

8 - É sobre a reclamante que recai o ónus da demonstração da verificação dos pressupostos de dispensa ou isenção de garantia, ficando a AT autorizada, caso logre demonstrar a existência de bens penhoráveis em nome da requerente, suscetíveis de serem oferecidos como garantia, a indeferir o pedido, sem necessidade de mais diligências.

9 – Igual entendimento é perfilhado no acórdão do STA, proferido no proc. 0289/20.9BEALM, datado de 04/11/2020, disponível para consulta em www.dgsi.pt.

10 - É pois manifesto que a Reclamante não cumpriu com os seus ónus de alegação e prova dos requisitos de que depende a requerida dispensa da prestação de garantia, como não resulta inequivocamente dos autos que o OEF tivesse concreto conhecimento da situação patrimonial da Reclamante.

11 - Com a devida vénia, contrariamente ao vertido na douta sentença recorrida, considera a Fazenda Pública que não se tratou de uma “mera existência de bens não oferecidos como garantia.”, tratando-se, outro sim, de uma verdadeira ocultação deliberada de parte considerável de bens imobiliários e viaturas automóveis totalmente desoneradas.

12 - Ora, o OEF só pode analisar o pedido de dispensa da prestação da garantia, depois de conhecer a real situação patrimonial da Reclamante, o que implica ter elementos concretos sobre a globalidade do património da Reclamante suscetível de penhora.

13 - Andou pois mal a douta sentença recorrida ao considerar que, para aferir ou não da insuficiência de bens para efeitos de prestação de garantia ou da sua dispensa, competia ao OEF o ónus de quantificar o património da Reclamante, desonerando, na prática, a Reclamante dos seus deveres legais.

14 - Mais errou a douta sentença, ao desvalorizar e desconsiderar a omissão da apresentação de bens por parte da Reclamante e da omissão de qualquer prova, designadamente, documental sobre a situação patrimonial da Reclamante.

15 - Por conseguinte, a douta sentença, ao decidir como decidiu, padece de erro de julgamento, fazendo errónea aplicação do direito, violando as disposições contidas nos artigos 52º n.º 4 e 74º n.º1 e 2 da LGT e 170º n.º 1 e 3 do CPPT, razão pela qual deve ser revogada.

16 - A Fazenda Pública requer, muito respeitosamente a V. Exas., ponderada a verificação dos seus pressupostos, a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça prevista no n.º 7 do art.º 6º do RCP.

I.2 – Contra-alegações Não foram proferidas contra alegações no âmbito da instância.

I.3 – Parecer do Ministério Público O Ministério Público emitiu parecer com o seguinte conteúdo: “A Fazenda Pública vem interpor o presente recurso jurisdicional da douta sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, datada de 23 de Novembro de 2021, que julgou procedente a reclamação deduzida por A………… Unipessoal, Lda, ao abrigo do disposto no artigo 276º, do CPPT do despacho do Chefe de Divisão de Justiça Tributária da Direcção de Finanças de Leiria que, no âmbito do processos de execução fiscal nº 1333201901901039423 e outros devidamente identificados.

Contra si instaurados para cobrança coerciva de dívidas de coimas fixadas em processos de contraordenação fiscal, no montante de €3.212.535,18, lhe indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia (cf. fls. 117 a 139 do SITAF.

Como melhor se alcança da análise da motivação sub judice, a Recorrente, invocando, erro de julgamento da matéria de direito, pretende com o presente recurso jurisdicional a revogação por este tribunal ad quem da, aliás, douta sentença proferida pelo tribunal a quo por entender haver errada interpretação e aplicação dos artigos 52º, nº 4 e 74º, nºs 1 e 2, da LGT e 170º, nºs 1 e 3, do CPPT.

Ora resulta expressamente da lei e é univocamente reconhecido pela jurisprudência que o âmbito do presente recurso se encontra delimitado pelas conclusões extraídas da motivação, por parte do recorrente, não podendo o tribunal ad quem conhecer de matéria nelas não inserida, ressalvados os casos do seu conhecimento oficioso, de harmonia com as disposições conjugadas dos artigos 282º, nº 5 a 7 do CPPT e 635º, nº 4, do CPC, na redacção que lhe foi dada pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, aqui aplicável ex. vi do artigo 281º do CPPT.

Cumpre-nos, pois, emitir parecer.

DO MÉRITO DO RECURSOEstá em causa nestes autos a douta sentença que deu provimento à reclamação apresentada pela Reclamante, ora Recorrida, contra o acto do Chefe de Divisão de Justiça Tributária da Direcção de Finanças de Leiria, que indeferiu o seu pedido de dispensa de prestação de garantia.

O pedido de dispensa de garantia deve ser apresentado ao órgão da execução fiscal, nos termos do n.º 1 do artigo 170.º do CPPT, que regulamenta o pedido de dispensa de prestação de garantia previsto no n.º 4 do artigo 52.º da LGT, Pois é a esse órgão que está legalmente atribuída a competência exclusiva para decidir sobre esse pedido.

Isto, sem prejuízo de o tribunal tributário competente poder ser chamado, mediante solicitação de qualquer interessado, a sindicar a legalidade da actuação da Administração no âmbito desse pedido (cf. artigos 151.º, n.º 1, e 286.º, ambos do CPPT).

In casu, a Reclamante, ora Recorrida pediu a dispensa da prestação de garantia com fundamento na manifesta falta de meios económicos por não possuir bens suficientes para garantir a dívida exequenda e o acrescido, Alegando, em síntese, a inexistência de bens que possa oferecer em garantia.

Não apresentou quaisquer elementos de prova que fundamentassem a alegada insuficiência de bens.

A AT indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia com o fundamento de que a Executada, contrariamente ao que alegou, possuía bens que podiam servir o desígnio da prestação de garantia, Designadamente, cinco (5) artigos rústicos e um (1) urbano, trinta (30) veículos automóveis em regime de propriedade e onze (11) em locação financeira.

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, em sede de reclamação judicial, entendeu que essa decisão é ilegal, por violação dos princípios do inquisitório e da boa cooperação entre administração e contribuinte, Já que se lhe impunha que, previamente à decisão, efectuasse diligências em ordem ao esclarecimento sobre o real valor desses bens, designadamente mediante solicitação de esclarecimentos à Reclamante, ora Recorrida.

Ora, afigura-se-nos, salvo o devido respeito por melhor opinião, que o Tribunal a quo incorreu numa menos correcta interpretação da decisão por que a AT indeferiu o pedido: Uma vez que tal decisão assentou não na falta de prova sobre o valor dos bens que integram o activo da Reclamante, ora Recorrida, Mas sim da falta de prova por parte da mesma de uma situação de insuficiência de bens, reveladora de manifesta falta de meios económicos que lhe permitam garantir a dívida exequenda e o acrescido, nos termos do n.º 4 do artigo 52.º da LGT.

Na verdade, a AT considerou que não ocorre a situação de manifesta falta de meios económicos porque a Executada pode oferecer como garantia os bens acima indicados.

Consequentemente, impor à AT que...

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