Acórdão nº 00536/20.7BEAVR-B de Tribunal Central Administrativo Norte, 14 de Janeiro de 2022
Magistrado Responsável | Paulo Ferreira de Magalh |
Data da Resolução | 14 de Janeiro de 2022 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I - RELATÓRIO MOVIMENTO JUNTOS PELO (...) – ASSOCIAÇÃO CÍVICA [devidamente identificada nos autos], Co-Requerente no Processo cautelar que intentou contra o Município (...) [também devidamente identificado nos autos], inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 01 de setembro de 2021, pela qual foi julgado improcedente o pedido de adopção de providências cautelares formulado a final do Requerimento inicial [atinente a que a providência cautelar seja admitida, julgada procedente, por provada, e em consequência, ser: “1. Ordenada ao Requerido Município (...) e aos seus órgãos Executivo, Câmara Municipal (...), e deliberativo, Assembleia Municipal, bem como ao Presidente desses órgãos, que até à decisão final a proferir no processo principal de que esta providência é apenso, se abstenham de incluir na Ordem de Trabalho das próximas reuniões desses órgãos executivo e deliberativo, discutir e deliberar ou ratificar a adjudicação e aprovação do contrato da obra de requalificação do Largo (...) e da Praça (...), em (…), e da Concessão do Serviço Público de Estacionamento em Parques de Estacionamento Subterrâneos, com todas as legais consequências, nomeadamente, a de não poder constituir matéria de discussão e de deliberação na reuniões do Executivo camarário que vierem a ser convocadas após a notificação dessa Providência ao Requerido. 2. Ser Decretado provisoriamente e no despacho liminar a providência ora requerida. 3. No caso de se vir a verificar a adjudicação, ser determinada a suspensão imediata, até à decisão final que venha a ser proferida no processo principal, do acto de adjudicação e a outorga qualquer contrato de execução das referidas obras e os efeitos de contratos que já tenham sido outorgados à data da notificação da decisão proferida neste auto de providência cautelar. 4. Ser determinada a suspensão imediata da tramitação concursal, abstendo-se o Município de praticar quaisquer actos que possam agravar ou causar prejuízo ao município e demais entidades intervenientes.
”], com fundamento, em suma, na não verificação do periculum in mora.
* No âmbito das Alegações por si apresentadas, a Recorrente elencou a final as conclusões que ora se reproduzem: “[…] IV. CONCLUSÕES A.
A Resolução Fundamentada é um acto administrativo motivada pela urgência na execução do acto suspenso decorrente de graves prejuízos que a demora nessa execução decorrente da suspensão da sua eficácia pode vir a causar ao interesse público, que só produz efeitos processuais quando apresentado em processo judicial pendente, sendo, portanto, em última análise é um privilégio concedido à Administração.
B.
A lei permite à Administração apresentar nos autos o acto – Resolução Fundamentada – na pendência da acção cautelar e não durante a pendência da acção cautelar para dela dar conhecimento ao Juiz, o que significa que a Administração, sempre terá de aguardar pela propositura de uma acção cautelar para produzir tal acto com o concreto objetivo de o apresentar nesse processo, logo, num processo pendente.
C.
O legislador ao escrever (no artigo 103-A e no artigo 131.º, ambos do CPTA) durante todo o processo e ao escrever no artigo 128.º na pendência do processo seguramente não quis dizer a mesma coisa e, por isso mesmo, usou num caso a preposição durante para exprimir uma duração no tempo ou se se quiser, período de tempo de duração, na ocorrência de um processo judicial e no outro usou a preposição na (que resulta da contração da preposição em e artigo a, em+a =na) para nos dizer que é em processo pendente que a Resolução fundamentada deve ser apresentada, pois ela só “nasce” para ser apresentada em processo judicial pendente, posto que só com essa apresentação é que se torna operatório.
D.
A norma do n.º 1 do artigo 128.º do CPTA que, após a revisão deste diploma, deixou de fixar concretamente um prazo para a apresentação dessa Resolução, remeteu para o prazo geral de 10 dias e quis exactamente consagrar que ela tem de ser apresentada em (+ o = no) processo cautelar pendente, no prazo geral supletivo para a prática de actos pelas partes.
E.
Como pode ver-se do artigo 117.º do CPTA, que não foi alterado com a revisão, o prazo para deduzir oposição é de dez dias, sendo que antes da revisão o prazo para a presentar a Resolução Fundamentada era de 15 dias. Ora, tudo indica que com a referida remissão para o prazo geral se quis compatibilizar o prazo da apresentação da oposição com o da apresentação dessa Resolução, o que faz todo o sentido.
F.
Não fazia, nem faz, sentido que apresentada a oposição em dez dias e sabendo nessa altura a entidade requerida alega os graves prejuízos que em sua opinião decorrem da suspensão da eficácia e da execução do acto não apresentasse a dita resolução juntamente com a sua oposição.
G.
Como reforço do que acabámos de defender, basta ver que o legislador usou nos artigos 103ª e 131.º n. 2 a preposição durante, quando quis consagrar uma temporalidade correspondente ao tempo da pendência da acção ou do processo cautelar e usou no artigo 128.º n.º 1 a preposição na somente quando se referiu à apresentação da Resolução Fundamentada.
H.
Mário Aroso de Almeida e Carlos Cadilha, no que se referia ao prazo de 15 dias para a presentação nos autos da dita Resolução, defendiam que esse prazo “se afigura inteiramente justificado, numa perspectiva moralizadora, na medida em que não se justifica permitir que a Administração possa protelar o exercício de uma prerrogativa que apenas faz sentido na medida em que seja indispensável para dar resposta a situações de urgência” I.
De acordo com o alegado e tendo em atenção a disposição do artigo 29.º do CPTA do CPTA que consagra o prazo de 10 dias como prazo geral supletivo, tendo ainda em conta que tratando--se de acto que só pode ser praticado pelo Requerido, não podendo os contra-interessados ter qualquer participação na sua produção e apresentação nos autos, e ainda que o prazo começa a contar a partir da data do recebimento da citação do Requerido, a Resolução Fundamentada foi apresentada fora do prazo, pelo que deve ser indeferida.
J.
Nestes autos, toda a prova apreciada pelo Tribunal para proferir a sua decisão é documental. Os documentos juntos provam indiciariamente o preenchimento cumulativo dos dois requisitos processuais necessários para o decretamento de uma providência cautelar: periculum in mora e fumus bonus iuris.
K.
Na fundamentação da sentença ora recorrida, o Tribunal a quo apesar de munido de todos os instrumentos teórico-doutrinais, a que se refere na sua sentença, aplica-os ao caso concreto ao arrepio não só da doutrina por si invocada e como dos objectivos que essa mesma doutrina ensina que o periculum in mora visa acautelar.
L.
Os dois elementos que constituem o periculum in mora, a demora e a lesão ou dano dela decorrente, encontram-se indiciariamente preenchidos nestes autos.
M.
Demora, decorrente do tempo necessário para se julgar o processo principal, teve já como efeito permitir não só a adjudicação da obra e a outorga do contrato, que se pretendia evitar com a presente Providência, o que justifica plenamente o justo receio de a conduta do Requerido vir a causar prejuízo sério e de difícil reparação.
N.
Lesão ou ao dano dela decorrente de bens públicos – património arbóreo, arqueológico da área geográfica envolvida, bem como o edificado envolvente – que é grave e dificilmente reparável. Na verdade, uma vez destruído tal património a sua reparação será de difícil ou impossível. Não se trata de lesão virtual ou hipotética, por a realização da obra de requalificação implicar necessariamente a destruição desse património, o que não é uma mera conjectura, mas decorre da natureza da própria obra de requalificação e do que está consagrado no caderno de encargos e na calendarização da obra.
O.
O perigo de dano ou lesão é actual, iminente e concreto, havendo sério e justificado receio de concretização do dano se não for decretada medida cautelar peticionada.
P.
A experiência da vida de um homo prudens permite presumir que a administração pública e autárquica quando adjudica uma obra e outorga o competente contrato para a sua execução, para dar início à obra não espera pela decisão judicial em processo em que se discute a legalidade da sua actuação. Regra geral, inicia-a o mais rapidamente possível com vista a colocar o Tribunal e as partes perante facto consumado, Q.
Nestes autos está provada pelos documentos juntos e pela conduta do Requerido o justo receio de essa conduta poder causar lesão grave e de difícil reparação, nomeadamente com a celebração do contrato de adjudicação da obra e o pedido de visto ao Tribunal de Contas, mesmo quando o Requerido não ignorava que contra si tinha sido requerida medida cautelar e quando tinha já sido citado para a acção principal e notificado da automática suspensão dos efeitos actos de adjudicação já praticados e da execução de contrato já celebrados com vista à execução da obra de requalificação.
R.
Também a conduta do Requerido acima referida – nomeadamente com a concreta adjudicação da obra e a celebração do contrato – à data da sentença recorrida revelava inequivocamente que o perigo invocado em Janeiro de 2021 não é uma mera conjectura, mas decorria e seria consequência necessária da própria natureza e dinâmica dessa conduta, que fundamentava um sério juízo indiciário da necessidade urgente da adopção de medida judicial preventiva, o Município tinha já feito tal facto, embora já ocorrido.
S.
O caderno de encargos e a calendarização dos trabalhos constante do documento 4, p.ª 39 juntos com a petição, consubstanciam e apresentam factos concretos que provam indiciariamente que nos primeiros dois a três meses de execução desses trabalhos, o perigo da ocorrência de perigo grave e de difícil reparação.
T.
De acordo com...
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