Acórdão nº 063/21.5BEPNF de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 27 de Janeiro de 2022

Magistrado ResponsávelSUZANA TAVARES DA SILVA
Data da Resolução27 de Janeiro de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo I - Relatório 1. A…………, B…………, C………… e D…………, todos com os sinais dos autos, propuseram no Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel (de ora em diante TAF de Penafiel) uma providência cautelar contra o Município de Amarante, indicando como contra-interessados E………… e F…………, todos igualmente com os sinais dos autos, na qual formularam o seguinte pedido: «[…] Termos em que deve a presente providência cautelar ser julgada, por provada e, em consequência, a) ser decretada a suspensão de eficácia do acto que admitiu e deferiu a alteração ao loteamento (doc. 8), a comunicação prévia (n.º 59178/18/ CMP), bem como do acto que autorizou o início das obras nos imóveis (lotes 10 e 10A) de R2 e acima identificados b) ser decretado o embargo total da obra de construção sita nos imóveis acima identificados (lotes 10/10A) e propriedade de R2 c) ser determinado que o Requerido Município, em face do disposto no n.º 1 do artigo 128.º do CPTA, proceda à suspensão de imediato da execução da obra de construção em curso nos identificados imóveis de R2 (lotes 10 e 10 A) d) ser ordenado ao Requerido Município para assegurar que a referida obra fica, imediata e efectivamente, suspensa e que, por conseguinte, não sofra qualquer alteração até ser proferida a decisão definitiva no processo principal; […]».

  1. Por sentença do TAF de Penafiel, de 17 de Junho de 2021, foi a acção cautelar julgada procedente e, em consequência, suspenso o acto de deferimento de alteração da operação de loteamento, praticado em 31/07/2020 pela Sra. Vereadora do Município de Amarante e determinado o embargo da obra.

  2. Inconformado com a decisão, o Município de Amarante recorreu da mesma para o TCA Norte, que, por acórdão de 10 de Setembro de 2021, concedeu provimento ao recurso, revogou a sentença do TAF de Penafiel e julgou improcedente a providência cautelar.

  3. No seguimento daquele acórdão, os autores interpuseram recurso para este STA. Por acórdão de 18 de Novembro de 2021, foi admitida a revista com base, essencialmente, nos seguintes fundamentos: «[…] 11. Entrando na análise do preenchimento dos pressupostos da revista sub specie impõe-se referir, desde logo, que não se vislumbra que as concretas questões objeto de dissídio nos autos e indicadas como de relevância fundamental reclamem labor de interpretação, ou que se mostrem de elevada complexidade jurídica em razão da dificuldade das operações exegéticas a realizar, de enquadramento normativo especialmente intrincado, complexo ou confuso, ou cuja análise suscite dúvidas sérias, nem tão pouco jurídicos, cientes também de que o litígio não parece contender ou envolver a totalidade do loteamento, dado que centrado em apenas 2 dos 22 lotes, não possuindo, assim, a repercussão social invocada.

  4. Já quanto à necessidade de admissão da revista para uma melhor aplicação de direito temos que, presente a motivação expendida pelos recorrentes e o quadro normativo posto em crise, e sem prejuízo da muito diversa valia ou bondade da motivação aduzida nesta sede, o juízo impugnado do TCA/N apresenta-se, desde logo, quanto ao não preenchimento do requisito do periculum in mora no segmento, nomeadamente que se prende com o facto consumado, como não isento de dúvidas e carecido de reanálise por este Supremo, tanto mais que diametralmente divergente daquele que havia sido produzido pelo TAF/PNF, impondo-se proceder à sua reapreciação.

  5. Daí que se justifique a quebra da regra da excecionalidade supra enunciada e a admissão da revista […]».

  6. Os Recorrentes apresentaram alegações que remataram com as seguintes conclusões: «[…] 18. O contrainteressado avançou com a construção de mais um novo edifício, sem qualquer licenciamento e sem autorização, o qual, está adiantado, mas ainda não está terminado.

  7. A manter-se o Acórdão recorrido, o contrainteressado vai avançar rapidamente e conclui a obra, num mês ou dois.

  8. Quando a sentença na acção principal vier a ser proferida, daqui a 2 ou 3 anos, não há dúvida que teremos a obra terminada muito antes de ser proferida a decisão judicial e sem ser sequer passível de legalização.

  9. O entendimento do Juiz da primeira instância na sentença de fls., é o que perfilhamos e em que nos louvamos e é, aquele que faz uma correta interpretação e aplicação do direito e no caso do disposto no artigo 120.º, n.º 1 do CPTA, que, diz “… as providências cautelares são adotadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de fato consumado…”.

  10. O douto Acórdão recorrido, apresenta, a este título uma fundamentação quase inexistente e até contraditória nos seus fundamentos.

  11. E, diz erradamente que “nada do que consta apurado indicia que o simples desenrolar e conclusão da obra faça deparar uma situação de facto consumado”.

  12. O que consta apurado indicia que o desenrolar e conclusão da obra ocorrerá antes de haver sentença na acção principal e dará origem a uma situação de facto consumado. Pois que, na expressão da jurisprudência o estado das coisas que a acção quer influenciar ganhará entretanto, a irreversível estabilidade inerente ao que já está terminado ou acabado.

  13. Em termos factuais isso traduz-se, como foi bem interpretado e decidido na sentença de primeira instância, que até ser proferida a decisão final na acção principal, o contrainteressado terminará a obra toda e passará a habitar a mesma, ganhando assim a irreversível estabilidade inerente ao que já está terminado ou acabado, e não mais a irá demolir e não mais a deixará de habitar, fazendo com que a sentença da acção principal sirva para encaixilhar.

  14. E, assim perpetuar-se-á mais uma edificação ilegal e que nem é passível de legalização, é o que resulta dos factos, e das regras da experiência comum, ou seja, uma vez concluída e habitada, aquela situação torna-se irreversível ou praticamente irreversível.

  15. O contra-interessado tem no seu ADN o desrespeito por todos e o desrespeito da lei, das entidades públicas e das decisões judiciais (neste mesmo sentido vide na sentença de fl. págs. 25, 27 e 28), como prova disso mesmo, já construiu uma casa à face da estrada que é ilegal, que a Câmara já lhe disse que é ilegal e que tem que demolir e o que é certo é que já passaram anos e a mesma lá continua intocada. Entretanto, também avançou com a construção de mais esta nova casa, igualmente sem licença e ilegal.

  16. E, na pendência da providência cautelar, mesmo sabendo que tinha que parar a obra, o certo é que prosseguia e prosseguiu como consta dos autos e na sentença onde se diz "B………… referiu, igualmente, que tem visto funcionários a trabalhar na obra".

  17. No caso, há todo um contexto que reforça ainda mais os indícios de que uma vez a obra concluída, teremos uma situação de facto consumado e que na prática não será reversível.

  18. Na primeira instância, o Juiz "a quo" foi ao local e por força da imediação, apreendeu, melhor do que ninguém, a realidade física e mais conseguiu apreender os depoimentos, a situação de iminente conflituosidade e as relações e reações das testemunhas e das partes, formou assim, uma percepção correcta da realidade e assim decretou a providência cautelar julgando verificados o fumus boni iuris, o periculum in mora e fazendo a respectiva ponderação de interesses.

  19. No caso dos autos, relativo a uma construção ilegal por parte do contrainteressado e de alteração ilegal ao loteamento, curiosamente, o contrainteressado aquele que é mais afectado pela sentença e que estava a edificar sem licença e em violação do loteamento, conformou-se com a douta sentença e não recorreu da mesma.

  20. O Acórdão recorrido, apesar do fumus boni iuris, e de estar provado nos autos que a obra é ilegal, não é legalizável e que ainda não está...

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