Acórdão nº 108/20.6T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 27 de Janeiro de 2022

Data27 Janeiro 2022

Acordam no Tribunal da Relação de Évora I – As Partes e o Litígio Recorrente / Ré: (…) Seguros, SA Recorrida / Autora: (…) Trata-se de uma ação declarativa de condenação proposta contra (…) Portugal, S.A. e (…) Seguros, S.A., com vista à condenação da R seguradora no pagamento de indemnização no montante de € 68.285,38 a título de danos patrimoniais e de € 20.000,00 a título de danos não patrimoniais, no total de € 88.285,38, acrescido de juros de mora, à taxa legal de 4%, contados desde a citação até efetivo e integral pagamento.

Para tanto, a Autora invocou ter sido atingida por bola de golfe proveniente do campo de golfe explorado pela Ré (…) Portugal, que dele é proprietária, entidade que transferiu a responsabilidade civil por danos decorrentes dessa atividade para a (…) Seguros. Esse evento provocou danos quer de natureza patrimonial quer de natureza não patrimonial que, na ótica da Autora, suportam o pedido deduzido contra a Ré seguradora, que declarou assumir a responsabilidade pelo sinistro.

A Autora juntou documento subscrito pela (…) Seguros, SA, com data de 12/10/2017 do qual consta, nomeadamente, o seguinte: «Após a devida instrução do presente processo de sinistro identificado em assunto, cumpre-nos informar que assumimos a responsabilidade pelo mesmo (…)».

[1] Em sede de contestação, a R seguradora afirmou ter assumido a responsabilidade pelo sinistro aqui em discussão, avançando que, «assim sendo, está em discussão neste processo o quantum indemnizatório a que a Autora tem direito»[2]. Impugnou a factualidade alegada pela A. Sustenta que a ação deve ser julgada parcialmente procedente, devendo a indemnização ser fixada em valor justo e razoável, inferior ao peticionado.

Mais deduziu incidente de intervenção de terceiros, pretendendo fazer intervir na ação (…), proprietário da moradia onde se encontrava a A. Invocou ter assumido a responsabilidade pelo sinistro que está em discussão nos autos (cfr. artigo 54º da contestação) mas que o responsável final pelas consequências resultantes do acidente é o proprietário da casa (cfr. art. 66º da contestação): são às dezenas as bolas que são recolhidas naquela propriedade, as árvores aí existentes são as únicas barreiras para evitar que as bolas de golfe atinjam a casa, as bolas passam por cima dos pinheiros entrando dentro da propriedade, pelo que se impunha que o proprietário tivesse edificado uma rede de proteção para assegurar condições de segurança na sua propriedade (cfr. artigos 57º a 64º da contestação).

O incidente de intervenção, a que se opôs a Autora, não foi admitido.

A Ré (…) Portugal apresentou-se a contestar, pugnando pela respetiva absolvição do pedido, impugnando a factualidade alegada na petição inicial.

A Autora apresentou-se a requerer a ampliação do pedido, pretendendo que o mesmo passe a incluir o seguinte: - quanto à repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer, a considerar no âmbito dos danos não patrimoniais, reclama quantia não inferior a € 20.000,00 (vinte mil euros); - no que se refere a ajuda medicamentosa, a quantia de € 6.000,00 (seis mil euros); - por tratamentos médicos regulares de fisioterapia, a quantia de € 12.600,00 (doze mil e seiscentos euros); - por consultas médicas anuais de ORL, a quantia de € 1.750,00 (mil e setecentos e cinquenta euros); - por tratamentos de fisioterapia postural, o montante de € 12.000,00 (doze mil euros).

A ampliação do pedido, embora impugnada, foi admitida.

A Ré (…) Seguros, SA apresentou articulado superveniente, pugnando pela total improcedência da ação. Invoca, para tanto, o seguinte: - se bem que tenha assumido a responsabilidade pelo sinistro, só no decorrer da audiência final teve conhecimento de factos que desconhecia quando assumiu tal responsabilidade, e dos quais decorre que nenhuma responsabilidade lhe pode ser assacada; - por ordem do proprietário do lote onde se encontra implantada a moradia onde a Autora foi atingida teve lugar o corte de árvores de grande porte, com cerca de 15/20 metros de altura, que se encontravam quer no lote quer fora dele; - o que teve lugar pela razão fútil de receber em casa mais luz solar; - em face disso, os responsáveis da 1.ª Ré alertaram o proprietário daquele lote para os riscos do corte das árvores, que constituíam barreira natural de proteção das bolas de golfe; - os responsáveis da 1.ª Ré exigiram ao proprietário daquele lote a adoção de medidas de minimização dos riscos, tais como a plantação de novas árvores e colocação de vedação com cerca de 1,80 metros de altura; - factos que a 2.ª Ré desconhecia; - as árvores plantadas levarão anos a atingir a altura de 15/20 metros; - o proprietário do lote conhecia os riscos inerentes a ter a sua moradia na proximidade do campo de golfe, cabia-lhe adotar cuidados para cumprir as regras de segurança enquanto proprietário de moradia que fica junto a um campo de golfe; - as árvores não podiam ter sido cortadas, muito menos sem autorização da 1.ª Ré; - o proprietário do lote é o único responsável pelo acidente, cuja responsabilidade não pode ser imputada à 1.ª Ré.

A Autora sustentou que o articulado superveniente deve ser indeferido, impugnando, à cautela, a factualidade nele alegada.

O articulado superveniente foi admitido.

II – O Objeto do Recurso Decorridos os trâmites processuais legalmente previstos, foi proferida sentença julgando a ação parcialmente procedente, conforme segue: «a) condeno a ré (…) Seguros a pagar à autora (…) a quantia de € 1.565,94, a título de dano patrimonial, na vertente das despesas médicas, medicamentosas e transportes, acrescida de juros de mora, à taxa de juros civis, a contar da data da citação até integral pagamento; b) condeno a ré (…) Seguros a pagar à autora a quantia que vier a ser liquidada, em sede de incidente de liquidação em execução de sentença, a título de dano patrimonial futuro, na vertente de despesas médicas, medicamentosas e com tratamentos que a autora venha a necessitar, com o limite do pedido de € 32.350,00; c) condeno a ré (…) Seguros a pagar à autora a quantia de € 23.000,00, a título de dano patrimonial, na vertente de dano biológico, acrescida de juros de mora, à taxa de juros civis, a contar do dia seguinte ao da prolação da sentença até integral pagamento; d) condeno a ré (…) Seguros a pagar à autora a quantia de € 20.000,00, a título de danos não patrimoniais, acrescidas de juros de mora, à taxa de juros civis, a contar do dia seguinte ao da prolação da sentença até integral pagamento; e) absolvo as rés do demais peticionado.» Inconformada, a R Seguradora apresentou-se a recorrer, pugnando pela revogação da decisão recorrida, a substituir por outra que a absolva do pedido. Concluiu a alegação de recurso nos seguintes termos: «Impugnação da decisão de facto Aditamento aos factos provados da matéria do artigo 11º do articulado superveniente 1. A R. propõe o aditamento aos factos provados (sob n.º 9.1) de um novo ponto com o seguinte teor: “9.1. As novas árvores plantadas por (…) eram mais pequenas (1,5 – 2 metros) do que as que ele cortara e vão levar vários anos até atingir a altura destas, sendo que não era possível plantar árvores com a altura das que lá estavam.” 2. Essa matéria foi alegada no art. 11º do articulado superveniente e não é despicienda para a valoração da conduta da segurada da Ré., à luz da solução jurídica pugnada pela Ré.

  1. A matéria cujo aditamento aos factos provados se reclama encontra suporte nos testemunhos prestados por … (ficheiro 20210518 141047_4091477_2870816.wma, passagem da gravação: 00:07:18 – 00:07:50) e … (ficheiro 20210518 143442_4091477_2870816.wma, passagem da gravação: 00:13:19 – 00:14:05).

  2. A propõe que o n.º 45 dos factos provados assuma a seguinte redação, assim se restringindo a sua amplitude: “45. A Autora passou a executar as tarefas diárias de forma pausada e sem pressa”.

  3. Com efeito, não se vislumbra na prova testemunhal produzida qualquer referência à impossibilidade da A. de utilizar auscultadores (nem mesmo a A. o referiu nas suas declarações de parte – ficheiro 20210518 151020_4091477_2870816.wma – ou nas queixas que transmitiu ao INML, no âmbito da requerida perícia médico-legal – página 4 do relatório pericial de fls. 152 a 156).

  4. A dificuldade no uso de telemóvel também não foi mencionada pela A. nas suas declarações de parte, nem nas referidas queixas ao INML (apenas o marido da A., …, aludiu, de forma visivelmente atrapalhada, à existência de dificuldades no uso do telemóvel no ouvido esquerdo, reconhecendo, depois, que a Autora é destra – ficheiro 20210518 110332_4091477_2870816.wma, passagens da gravação: 00:08:53 – 00:09:12 e 00:25:35 – 00:27:10), o que torna inverosímil aquela dificuldade.

  5. Acresce que a expressão “utiliza o telemóvel com dificuldade” não tem cabimento numa decisão de facto, dado não ser factual, mas sim conclusiva.

  6. Ainda que se optasse por incluir algo no n.º 45 dos factos provados quanto ao telemóvel, sempre se teria de restringir a dificuldade na sua utilização ao ouvido esquerdo, já que o marido da A. apenas referiu a existência de dificuldades desse lado.

     FP 46 9. Manda o rigor restringir a amplitude do n.º 46 dos factos provados, que deverá adotar a seguinte redação: “46. A Autora evita conduzir à noite e em trajetos longos.” 10. Dizer que alguém “tem dificuldade” na realização de uma qualquer atividade é conclusivo, sendo que o que se espera encontrar numa decisão de facto são os factos concretos e objetivos reveladores dessa dificuldade.

  7. Acresce que não se vislumbra nas declarações de parte da A. ou no testemunho do seu marido, (…), a menção à existência de dificuldades na condução quando está a chover.

     FP 47 12. Os testemunhos do marido e da tia da A. (este último de ouvir dizer), bem como as declarações de parte prestadas pela A., são manifestamente insuficientes para se julgar provado que a A. “Tem dificuldade … em viajar de avião”, sendo que fica a ideia que essas dificuldades se prendem, essencialmente...

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