Acórdão nº 9715/19.9T8LRS.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Janeiro de 2022

Magistrado ResponsávelJOÃO CURA MARIANO
Data da Resolução12 de Janeiro de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Autora: Ultracaseiro, Comércio e Indústria, Limitada Ré: LTHC, Unipessoal, Limitada * 1. Relatório A Autora intentou contra a Ré ação declarativa, sob a forma de processo comum em que pediu a condenação da demandada a reconhecer o seu direito de propriedade sobre o prédio urbano sito na Praceta ..., na ..., e a proceder à restituição do mesmo, bem como a pagar-lhe a quantia de € 9.655,31 relativa à fruição que a demandada fez do prédio entre Março e Setembro de 2019, mais € 1.379,33 mensais por cada mês que, após Outubro de 2019, se mantenha na posse desse imóvel, quantias todas elas acrescidas de juros desde a citação.

Contestou a Ré, alegando o seguinte: - Quando a anterior ocupante do imóvel, a sociedade A..., Limitada, ia encerrar o ginásio que aí se encontrava instalado, a Ré viu uma oportunidade para dar continuidade à atividade aí desenvolvida, pelo que manifestou à Autora o seu interesse nesse espaço; - Entre Dezembro de 2016 e Janeiro de 2017 a Autora e a Ré iniciaram negociações com vista a celebrar um contrato de arrendamento tendo por objeto o imóvel reivindicado; - Embora as negociações não tenham conduzido à formalização de um contrato de arrendamento, a Autora autorizou a Ré a ocupar o imóvel, mediante o pagamento de uma renda, cujo montante inicialmente acordado foi de € 1.350,00; - Este valor foi posteriormente aumentado por decisão unilateral da Autora, tendo sido pago até março de 2019, altura em que a se Ré recusou a pagar a renda enquanto a Autora não realizasse as obras necessárias ao exercício da atividade da Ré; - A Ré não está obrigada a pagar a renda, em virtude do imóvel em causa não estar apto a ser usado para a actividade de ginásio, uma vez que, além de não ter licença de utilização, não tem as condições físicas, de higiene e de segurança necessárias para o efeito e a Autora recusa-se a realizar ou custear as obras que permitam ultrapassar tal situação e a obter a necessária licença de utilização; - Após ter sido autorizada pela Autora a ocupar o imóvel em causa a Ré realizou nele diversas obras de conservação, reparação e beneficiação que o valorizaram e cujo custo ascendeu a € 37 527,41.

- Porque a Autora se recusou a fazer outras obras necessárias, em razão de infiltrações, humidade e encharcamento do chão, parte das obras por si realizadas estragaram-se, bem como materiais e equipamentos que tinha no local; - As deficientes condições do espaço levaram à interdição temporária para a prática desportiva de algumas zonas do ginásio e à perda de 349 clientes entre 2017 e 2019, o que representou para si uma perda de receitas no valor de € 115.196,00.

Concluiu pela improcedência da ação e deduziu reconvenção, pedindo a condenação da Autora a pagar-lhe € 37.527,42, a título de benfeitorias feitas pela Ré no imóvel reivindicado, e € 115.196,00, a título de lucros cessantes e perda de clientela, a tudo acrescendo juros de mora desde a “citação”.

A Autora replicou, pronunciando-se pela improcedência da exceção de não cumprimento e da reconvenção.

Foi proferido saneador sentença onde, por se entender conter os autos todos os elementos para conhecer do mérito da ação e da reconvenção, assim se procedeu, decidindo-se: - condenar a Ré a reconhecer o direito de propriedade da Autora sobre o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº....30 da freguesia da ..., sito na Praceta ...; - absolver a Ré do demais peticionado; - absolver a Autora do pedido reconvencional.

A Autora recorreu desta decisão para o Tribunal da Relação que, por acórdão proferido em 17.06.2021, julgou procedente o recurso e, em consequência, condenou a Ré a entregar à Autora o imóvel em causa e a pagar-lhe os montantes vencidos desde Março de 2019 e vincendos até à efetiva entrega do imóvel.

Desta decisão a Ré interpôs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo concluído as suas alegações do seguinte modo: A decisão recorrida enferma da nulidade prevista na alínea c) do nº 1 do artigo 615º e 666.º do CPC, porquanto os fundamentos do acórdão estão em contradição com a decisão.

  1. O direito de propriedade da Autora/ Recorrida nunca constituiu uma questão controversa pois a Ré/ Recorrente nunca negou essa titularidade nem se arrogou um direito incompatível com aquele.

  2. Não basta o reconhecimento do direito de propriedade para que a obrigação de restituir a coisa seja imposta.

  3. Tendo-se demonstrado que a Ré/ Recorrente, enquanto detentora ou possuidora da coisa reivindicada, é titular de um direito licitamente constituído e compatível com o direito do proprietário, não há fundamento para a restituição.

  4. Nada no acervo factual apurado e definitivamente fixado permite...

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