Acórdão nº 019/21.8BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Janeiro de 2022

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução26 de Janeiro de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso para uniformização de jurisprudência da decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa - CAAD no processo n.º 808/2019-T Recorrente: “A…………, Lda.” Recorrida: Autoridade Tributária e Aduaneira 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade acima identificada veio, ao abrigo do disposto no art. 25.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo da decisão arbitral proferida no processo 808/2019-T (Disponível em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?listOrder=Sorter_data&listDir=DESC&id=5173.) pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), por oposição com a decisão proferida no processo 929/2019-T do mesmo CAAD (Disponível em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?listOrder=Sorter_processo&listDir=DESC&listPage=3&id=4903.), transitada em julgado, tendo apresentado alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor: «1.º Entende a Recorrente estar a decisão recorrida em oposição com a decisão arbitral proferida pelo tribunal arbitral constituído no processo n.º 929/2019-T; 2.º A decisão recorrida e a decisão fundamento estão em oposição quanto à seguinte questão fundamental de direito: pode um relatório de inspecção tributária efectivar correcções que extravasem a extensão da ordem de serviço na génese do procedimento inspectivo sem que haja lugar a notificação de despacho fundamentado de alteração da extensão do procedimento mas, ao invés, à notificação de meras ordens de serviço adicionais (cfr. artigo 15.º do RCPITA)? 3.º O presente recurso por oposição deve ser julgado admissível uma vez que se encontram preenchidos todos os pressupostos para o efeito; 4.º A decisão arbitral invocada como fundamento do recurso por oposição tem de corresponder a uma decisão transitada em julgado, sendo que, segundo pôde a Recorrente apurar, a decisão arbitral fundamento transitou em julgado (cfr. Doc. n.º 1); 5.º Na situação em presença, a decisão recorrida foi proferida por tribunal arbitral constituído sob a égide do Centro de Arbitragem Administrativa, no âmbito do processo n.º 808/2019-T [ (Permitimo-nos corrigir o manifesto lapso de escrita: a Recorrente escreveu 514/2015-T onde queria dizer 808/2019-T.)], e a decisão arbitral fundamento foi proferida no âmbito do processo n.º 929/2019-T; 6.º Ademais, o cenário jurídico-normativo subjacente à decisão arbitral recorrida e à decisão arbitral fundamento é substancialmente idêntico, sendo que em ambos o sujeito passivo foi alvo de uma inspecção tributária iniciada a coberto de ordem de serviço que circunscrevia a sua extensão a um exercício e culminou com a notificação de um relatório inspectivo que abrangia matérias extravagantes à extensão dessa ordem de serviço, sem que tivesse sido notificado de despacho fundamento de alteração da extensão da inspecção, nos termos do artigo 15.º do RCPITA; 7.º Por seu turno, na situação em presença, quer a decisão arbitral recorrida quer a decisão arbitral fundamento discutem o regime ínsito no artigo 15.º do RCPITA, divergindo relativamente à sua aplicação no caso concreto; 8.º Na situação em presença, a decisão recorrida conclui que não padece de violação do artigo 15.º do RCPITA – determinante da anulação dos actos tributários respectivos – a acção inspectiva que culmina na prolação de um relatório final de inspecção tributária cujas correcções extravasam a extensão da ordem de serviço inicial, ainda que não tenha havido a notificação de qualquer despacho fundamentado de alteração da extensão da inspecção mas, tão-somente, novas ordens de serviço com extensões distintas, não fundamentadas, proferidas no decurso da inspecção; 9.º Contrariamente, a decisão arbitral fundamento afasta aquela interpretação nessas situações ditando que o artigo 15.º do RCPITA impõe que a prolação de relatório final de inspecção que extravase a extensão da Ordem de Serviço inicial depende da notificação ao inspeccionado de despacho fundamentado de alargamento da extensão da acção inspectiva, não podendo ser substituída (ou adulterada) pela notificação de ordens de serviço com extensões distintas, não fundamentadas, proferidas no decurso da inspecção; 10.º Do exposto resulta serem as decisões jurisdicionais em presença opostas, na medida em que interpretam de modo distinto a obrigatoriedade prevista no artigo 15.º do RCPITA, concluindo, por via disso, de modo igualmente distinto no que respeita à violação da extensão do âmbito da inspecção no que concerne às correcções não contempladas na Ordem de Serviço na génese da acção inspectiva; 11.º Com vista à admissão do presente recurso, exige-se que inexista um marcado e relevante acervo jurisprudencial consonante com o sentido decisório perfilhado na decisão recorrida, sendo que, na situação em presença, desconhece a Recorrente existir jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo consonante com o sentido decisório perfilhado pelo Douto Tribunal a quo no âmbito da decisão arbitral recorrida; 12.º Ao invés, a jurisprudência constante e reiterada do Supremo Tribunal Administrativo adopta posição análoga à ínsita no âmbito do decisão arbitral fundamento e, por conseguinte, diametralmente oposta à sufragada no aresto em crise (cfr. por exemplo os [acórdã]os da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, proferidos em 15 de Junho de 2016, no processo n.º 01101/15, em 19 de Setembro de 2018, no processo n.º 01460/17, e em 4 de Dezembro de 2019, no processo n.º 02243/16.6BEBRG); 13.º Por tudo quanto ficou exposto, conclui-se pelo pleno preenchimento de todos os pressupostos conducentes à admissão do presente recurso jurisdicional, requerendo-se a esse Douto Tribunal ad quem que julgue verificada a referida oposição entre as decisões jurisdicionais em apreço, com os inerentes efeitos legais; 14.º Discorda a Recorrente do sentido decisório propalado pelo Douto Tribunal a quo – sumariado supra – assente em manifesto erro de julgamento, merecedor de censura por parte desse Douto Tribunal ad quem, atento o disposto no artigo 15.º do RCPITA; 15.º A Autoridade Tributária optou por circunscrever ab initio a extensão da inspecção tributária em causa ao exercício de 2014, por força da Ordem de Serviço n.º OI201700198, de 28 de Junho de 2017, limitando-se a extensão da inspecção àquele exercício (artigo 14.º, n.ºs 1 e 3, do RCPITA); 16.º Não obstante, os serviços de inspecção efectuaram também correcções, em sede de IRC, extravagantes a tal exercício, abrangendo os exercícios de 2013 e 2015 (cfr. p. 15 da decisão arbitral recorrida); 17.º De acordo com o artigo 15.º, n.º 1, do RCPITA, os serviços inspectivos podem alterar a extensão da acção inspectiva durante o seu curso conquanto tal alteração (i) conste de despacho fundamentado da entidade que houver ordenado a inspecção e (ii) que tal despacho seja notificado ao inspeccionado previamente à conclusão da acção inspectiva; 18.º Na situação em presença, em momento algum, foi a Recorrente notificada de despacho fundamentado de alteração da extensão do procedimento inspectivo (artigo 15.º do RCPITA); 19.º No decurso da acção inspectiva, a Recorrente apenas foi notificada de duas novas cartas-aviso e ordens de serviço, referentes aos exercícios de 2013 e 2015, as quais determinam o início de novas acções inspectivas, mas não o alargamento de uma acção inspectiva em curso, nos termos e para os efeitos do artigo 15.º do RCPITA; 20.º A lei não permite que ordens de serviço substituam o despacho previsto no artigo 15.º do RCPITA, uma vez que almejam objectivos distintos e impõem diferentes requisitos (nomeadamente, a obrigatoriedade de fundamentação expressa do alargamento); 21.º Esta fundamentação é exigida por razões de transparência da actuação da Autoridade Tributária na selecção das inspecções a realizar, tendo o contribuinte direito a conhecer os motivos na origem do procedimento e pelos quais foi alargado a outras matérias (artigos 15.º, 27.º e 62.º, n.º 3, alínea e), do RCPITA); 22.º Porquanto o sujeito passivo não foi notificado de despacho fundamentado de alteração da extensão do procedimento de inspecção, os serviços inspectivos careciam de poderes para a sua prossecução quanto aos exercícios de 2013 e 2015, padecendo tais correcções do vício de violação de lei (neste sentido, cfr. acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 15 de Junho de 2016, proferido no processo n.º 01101/15; de 19 de Setembro de 2018, proferido no processo n.º 01460/17; de 4 de Dezembro de 2019, proferido no processo n.º 02243/16.6BEBRG, e decisão arbitral, proferida a 5 de Junho de 2019, no âmbito do processo n.º 611/2018-T); 23.º Pelo que, ao realizarem correcções à matéria colectável extravagantes face à extensão da acção inspectiva inicialmente instaurada, os serviços de inspecção extrapolaram o seu mandato, inquinando de ilegalidade os actos tributários relativos aos exercícios de 2013 e 2015, por violação do artigo 15. º do RCPITA, impondo-se a respectiva anulação nos termos do artigo 163.º do CPA, aplicável ex vi artigo 4.º, alínea e), do RCPITA; 24.º Tal não resulta prejudicado pela posição que mereceu vencimento na decisão arbitral recorrida, no sentido de, tendo sido notificadas três cartas-aviso e três ordens de serviço, terem tido lugar três acções inspectivas autónomas e independentes entre si, de onde não resultaria a obrigatoriedade de proceder ao alargamento da acção inspectiva inicial; 25.º Atenta desde logo a unicidade da fundamentação vertida no relatório de inspecção, resulta manifesto que somente ocorreu uma única acção inspectiva, a qual ilegalmente incidiu sobre o IRC dos exercícios de 2013, 2014 e 2015; 26.º Para além de as correcções aderirem a uma única fundamentação agregadora, a conclusão de que se está perante uma única acção inspectiva resulta também da circunstância de a inspecção aos diversos exercícios (i) ter corrido os seus termos em simultâneo; (ii) ter sido...

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