Acórdão nº 14456/19.4 T8LSB.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Janeiro de 2022

Magistrado ResponsávelTERESA SANDIÃES
Data da Resolução20 de Janeiro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes da 8ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa V.M.

intentou ação especial de prestação de contas contra F.M., pedindo a citação da R., nos termos previstos no artigo 946.º n.º 1 do CPC, para, no prazo de trinta dias, querendo, contestar as contas apresentadas pela A.; a condenação da R. no saldo que se vier a apurar das contas apresentadas pela A. e que esta apresenta no montante de € 16.693,00 (dezasseis mil seiscentos e noventa e três euros), bem como no pagamento de juros civis, desde a data da citação até ao integral e efetivo pagamento.

Alegou, em síntese, que por partilha judicial da herança de A.M., pai da A. e da R., transitada em julgado em 06/10/1989, a Recorrente e Recorrida tornaram-se as únicas comproprietárias, sem determinação de parte ou de direito, entre outros, do prédio urbano sito na Rua X, números 20, 20 – A, 20 – B e 20 – C, freguesia de …, concelho de Lisboa, descrito na Sétima Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o nº 0000 e inscrito na matriz predial urbana da freguesia em apreço, sob o artigo 000º, composto pelas frações autónomas designadas pelas letras “A”, “B”, “C”, “D”, “E”, “F”, “G”, “H”, “I”, “J”, “L”, “M”, “N”, “O”, “P”, “Q”, “R”, e “S”. Por sentença transitada em julgado em 30/11/2009, foi o suprarreferido prédio objeto de divisão judicial, tendo sido adjudicadas à A. as frações autónomas designadas pelas letras “B”; “D”; “E”; “F”; “J”; “N”; “O”; “R”; “S”; e adjudicadas à R. as restantes frações, com uma permilagem total de 51,7214% para a A. e de 48,2786% para a R.. Desde finais de 2016, tendo a R. vendido uma das frações daquele prédio a terceiro, e em finais de 2017 uma outra, passaram a existir, assim, quatro condóminos naquele prédio. Entre janeiro de 2011 e abril de 2018, as despesas a titulo de gestão e manutenção do prédio supra referenciado, ascendeu ao montante de € 36.049,39, que a A. suportou, efetuando transferências bancárias regulares para uma conta bancária separada da sua, denominada “Condomínio do Prédio sito na Rua X”. As despesas de gestão e manutenção do prédio, no total de € 36.049,39, terão de ser suportadas nas respetivas quotas partes pela A. (51,7214%) e pela R. (48,2786%), tendo, no entanto em consideração, que no ano de 2017 a Ré só detinha 42,8814% (uma vez que vendeu a fração “Q”), e no ano de 2018 a Ré só detinha 36,6235% (uma vez que vendeu a fração “P”). Assim sendo, cabe à R., por conta das despesas e manutenção com o imóvel, o montante de €16.693,00. De acordo com o art.º 1405º nº 1 do Código Civil, os comproprietários exercem, em conjunto, todos os direitos que pertencem ao proprietário singular e separadamente, participam nas vantagens e encargos da coisa, em proporção das suas quotas.

A R. apresentou contestação.

Alegou, em síntese, que nunca, após novembro de 2009, a Ré foi notificada pela A., para a constituição do condomínio do prédio, para a realização de qualquer assembleia de condomínio, conforme previsto no nº 1 do artº 1430 do Cód. Civil e nº 1 do artº 1432 do Cód. Civil. Nunca foi comunicado à Ré qualquer deliberação tomada em assembleia conforme previsto no nº 6 do artº 1432 do Cód. Civil. Nunca foi comunicado à Ré que esta devia à A., ou ao condomínio do prédio da Rua X, o valor do condomínio mensal ou anual de x, y ou z. A Ré nada deve à A. Não é verdade que o condomínio do prédio tenha sido constituído em maio de 2018, já que do doc. 21 ao doc. 199, todos como alegados comprovativos das contas apresentadas pela A., na presente ação, são documentos relativos a despesas do condomínio do prédio sito na Rua X, sendo que o Doc. 21 junto pala A., tem a data de 24/06/2011. Ao contrário do alegado pela A., o condomínio não foi constituído em maio de 2018, mas sim em data anterior a junho de 2011, com a identificação fiscal WWWW, razão pela qual, a partir daquela data, de 2011, ao administrador do condomínio competia convocar a assembleia de condóminos, elaborar o orçamento de despesas e receitas para cada ano, cobrar as receitas e pagar as despesas comuns. Entre 2011 e maio de 2018 e, não obstante à A., pertencer a maior permilagem de frações, ter constituído o condomínio e ser provisoriamente administradora do condomínio nos termos do nº 1 do artº 1435 – A do Cód. Civil, o que é certo é que nunca convocou a Ré para qualquer assembleia anual do condomínio, nunca lhe comunicou qualquer orçamento anual, nem lhe exigiu a sua quota parte nas despesas. A A., não tinha que prestar contas das despesas do prédio à Ré. O que a A., devia ter feito, e não fez, enquanto administradora do prédio, nos termos do nº1 do artº 1435-A do C. Civil, era convocar a assembleia de condóminos, elaborar o orçamento anual, e exigir da Ré a quota-parte nas despesas aprovadas. Terminada a propriedade em comum e sem determinação de parte ou direitos, foi concretizada a propriedade de determinadas frações autónomas, sujeitas ao regime da propriedade horizontal.

Têm cada uma enquanto condómino a propriedade exclusiva das frações que lhe pertencem, e a compropriedade das partes comuns do edifício. A partir do momento em que cessa a relação jurídica da compropriedade do prédio, e se estabelece o regime da propriedade horizontal do mesmo, é este regime que passa a regular as relações entre ambas, cabendo a administração das partes comuns à assembleia de condóminos, e a um administrador (nº 1 do artº 1430 do Cód. Civil).

Não pode a A., vir alegar que suportava sozinha, pelo menos desde 2011 a gestão e a manutenção do referido prédio urbano, quando todas as faturas que juntou aos autos são emitidas em nome do Condomínio do Prédio sito na Rua X. E igualmente os documentos bancários juntos e que pretensamente deveriam demonstrar os pagamentos efetuados pela A., são documentos bancários relativos a uma conta bancária do condomínio da Rua X. Subsumindo a relação concreta existente, entre A. e Ré, no que ao prédio urbano referido diz respeito, ao disposto no artº 941 do Cod. Proc. Civil, facilmente se conclui que nem a A. pode propor a ação que propôs, porque não tem o direito de exigir as contas, nem a Ré tinha o dever de prestá-las.

Conclui pela improcedência da ação.

Em 01/06/2020 foi proferido o seguinte despacho: “Analisados os autos verifica-se que a Ré não põe em causa que as despesas referidas nas diversas contas correntes reportadas aos diversos anos de administração do prédio tenham sido efectuadas parecendo centrar-se a sua defesa na alegação da falta de legitimidade substantiva da Autora para prestar contas e reclamar o pagamento da quota parte das despesas à Ré, alegando ainda esta que não foi convocada para qualquer assembleia de condóminos e, assim sendo, não aprovou orçamentos, nem contas.

Considerando que não foram peticionados quaisquer juros pela mora no pagamento, é indiferente para o destino da acção que tenha ou não sido convocada qualquer assembleia de condóminos ou que tenham ou não sido aprovadas contas, o que aliás, é o escopo da presente acção.

Por outro lado, a Autora alega que foi ela quem sozinha suportou as despesas das partes comuns do prédio numa época em que eram apenas a Autora e a Ré, que são irmãs, as proprietárias das fracções do prédio e as comproprietárias das respectivas partes comuns – art.s 11º e 12º da petição inicial.

Por fim, resulta do documento ora junto pela Autora que a prestação de contas a que se reporta a acção referida na petição inicial, não engloba as despesas a que se refere a presente acção, não permitindo à Ré que alegue nada dever à Autora por já ter pago integralmente a quantia em que ali foi condenada.

Assim, o destino da presente acção está dependente de saber se pode ser afirmado que foi a Autora quem realizou sozinha o pagamento das despesas de gestão das partes comuns do prédio identificado, não sendo claro se a Ré nega este facto ou se apenas defende que a Autora deveria ter interposto a acção na qualidade de Administradora do Condomínio e não em seu nome individual.

Pelo exposto, notifique a Ré para aperfeiçoar a sua contestação, devendo esclarecer a dúvida supra exposta. No caso de se tratar da última hipótese referida, notifique as partes para declararem se concordam que a acção está pronta para decisão sem necessidade de produção de outras provas.” Em cumprimento do ordenado a R. alegou que: “(…) dos documentos juntos como alegada prova dos factos por si articulados, o que resulta é que não foi a A. quem pagou os referidos montantes de despesas no prédio, mas sim o condomínio, com o N.P.C. WWWW.

6- A A. tem o NIF …., não tem o NIF WWWW.

7- Conforme a própria A. demonstra, com os docs. que juntou, existe condomínio do prédio desde 2011.

8- Só que à Ré nunca foi comunicado pelo condomínio qual o montante anual da comparticipação que esta teria que fazer.

9- Nunca lhe foram enviados quaisquer orçamentos.

10- Nem quaisquer contas anuais.

11- Daí que a Ré não sabe se foi a A. se quem foi, quem pagou as contas do condomínio, 12- Apenas sabe, e pela presente acção, que o condomínio do prédio sito na Rua X, em Lisboa, pagou nos anos 2011 a 2017, as verbas constantes dos docs. juntos, e tão somente isso.

13- Daí que a acção não possa proceder, tanto no ponto de vista material como formal, 14- Já que a relação jurídica posta em causa pela A. deixou de existir, a partir do momento em que A. e Ré procederam à divisão de coisa comum, conforme aquela refere no artº 4º da sua p.i.

15- A partir de então as fracções do prédio que até aí eram coisa comum passaram a ser autónomas e pertença umas de uma, outras de outra.

16- Daí que, a partir de então, a relação jurídica relativa às fracções em causa passou a ser a de compropriedade, e as compropriedades passaram a ter obrigações para com o condomínio do prédio.

17- A Ré deixou de ter qualquer obrigação para com a irmã, relativamente às fracções em causa, 18- Passando sim a ter obrigações para com o condomínio.

19- Isto para reafirmar que, nem material, nem processualmente a acção possa proceder.

20-...

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