Acórdão nº 797/20.1T8LLE.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Janeiro de 2022

Magistrado ResponsávelELISABETE VALENTE
Data da Resolução13 de Janeiro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os juízes da secção cível do Tribunal da Relação de Évora: 1 – Relatório.

(…), (…) e (…), (AA), intentaram a presente ação declarativa, sob a forma comum, contra "(…), Unipessoal, Lda.", na qualidade de administração do condomínio do lote C3, representada pelo único sócio (…), Condomínio do Bloco C3, (…), (…), (...), (…) e (…), pedindo que, pela sua procedência: "1 - exonerar-se a sociedade "(…), Unipessoal, Lda." das funções de administração do condomínio do Bloco C3, sito na Rua (…), em Quarteira, por manifesta negligência e irregularidades no desempenho das mesmas; 2 - declarar-se nulas as atas 9 e 11 por falta de legitimidade dos deliberantes presentes e, consequentemente, 3 - declarar-se nula a atas 11 e 12 por: a) - convocatória ilegal b) - deliberarem sobre pontos da ata n.º 9, cuja nulidade se arguiu e se pretende, caso assim se não entenda, c) - por deliberar por facto impugnado não contrário à lei.

4 - declarar-se nula a ata n.º 12 por deliberar por facto impugnado não contrário à lei.

5 - reconhecer-se aos autores o: a) - direito de propriedade dos autores sobre as suas frações b) - direito de compropriedade sobre o logradouro prédio c) - direito de livre acesso e uso do mesmo.

6 - o réu (…) se abstenha de impedir o acesso dos autores ao logradouro, para o que: a) - seja ordenado que este, no prazo máximo de 8 dias, faculte, tal como o fez ao proprietário da fração e aos residentes nas frações G) e I), o comando do portão que colocou às autoras para que procedam a cópia dos mesmos, sob suas expensas exclusivas.

7 - por obstrução do direito de uso de zona comum aos demais condóminos, ora réus, e, especialmente, violação do direito que assiste às autoras seja condenado em indemnização a fixar em cômputo de sentença." Os RR (…), (…), (…) e (…) contestaram e deduziram pedido reconvencional, no qual peticionam que: a) serem [os AA] condenados a reconhecerem que os 1.°s RR (…) e mulher (…) / reconvintes são titulares do uso exclusivo e fruição do logradouro que é composto pela rampa de acesso à fração autónoma designada pela letra “A" (garagem e arrumos), propriedade dos RR/reconvintes, reconhecendo-se que o logradouro é de uso exclusivo desta fração; b) serem condenados a absterem-se de praticar quaisquer atos que prejudiquem, impeçam ou embaracem os direitos dos 1.°s RR (…) e mulher (…) / reconvintes do uso exclusivo e de fruição sobre o logradouro que é composto pela rampa de acesso à fração autónoma designada pela letra “A" (garagem e arrumos)." Os AA apresentaram réplica, concluindo pela improcedência da reconvenção.

Os AA foram notificados da verificação de cumulação ilegal dos pedidos formulados, vindo apresentar desistência dos pedidos formulados nos pontos 1 a 4, a qual foi homologada, prosseguindo os autos para apreciação do demais peticionado.

Realizou-se audiência prévia.

Foi proferida sentença que julgou: A) a ação parcialmente procedente, por provada, e em consequência: - reconheceu os AA como proprietários das frações autónomas designadas pelas letras B, C, O, F e H; - reconheceu o direito de compropriedade sobre o logradouro prédio identificado em 1. e livre acesso e uso do mesmo pelos AA; - condenou o R (…) a remover os obstáculos colocados ao acesso ao logradouro e/ou entrega de chave ou comando do portão que ali colocou; - absolveu os RR do demais peticionado; B) a reconvenção improcedente, por não provada, e, em consequência, absolveu os AA dos pedidos reconvencionais.

Inconformados com a sentença, os RR (…) e (…) vieram interpor recurso da mesma, apresentando as seguintes as conclusões do recurso (transcrição): ”1º- Vem o presente Recurso interposto da douta Sentença de fls., que julgou a ação procedente e improcedente a reconvenção.

  1. - Entendem os Recorrentes, com a devida vénia por douto entendimento, que se verificam, no processo de formação da convicção da M.M. Juiz a quo, para além de erros na aplicação do Direito, mas igualmente erros de Julgamento, incluindo violações de regras e princípios de direito probatório, em particular nos documentos juntos autos.

  2. - Cabendo, por isso, a este Venerando Tribunal da Relação, fazer uma sindicância do apuramento dos factos apurados em 1ª instância e da fundamentação feita da decisão por via destes e, fundamentalmente, analisar o processo de formação da convicção do julgador e concluir, como se espera, pela falta de razoabilidade de se ter dado por provado o que se deu por provado, e a final determinar-se a anulação da douta Sentença Recorrida.

  3. - Tendo a fração designada pela letra “A” entrada própria através de uma rampa de acesso e que todas as outras as restantes, têm entrada comum pelo arruamento a poente, é claramente percetível que as demais frações do referido prédio não têm acesso pela rampa de acesso à fração “A”, mas pela entrada comum pelo arruamento a poente.

  4. - O acesso à fração “A” – espaço compreendido entre o acesso à via pública e à fração para uso de parqueamento de viaturas –, não se confunde com o logradouro, não faz parte da estrutura do edifício, e não está compreendido no artigo 1421.º, n.º 1, alínea b), do Código Civil.

  5. - Ou seja, o acesso à garagem para uso privado da fração “A”, em edifício submetido ao regime de propriedade horizontal, não é de considerar parte imperativamente comum, mas apenas presuntivamente parte comum.

  6. - Esta presunção pode ser ilidida demonstrando algum condómino que determinadas partes presumivelmente comuns do edifício foram por ele adquiridas pela prática de actos possessórios.

  7. - Há mais de 30 anos que os Recorrentes e os ante possuidores (…) e (…), de forma ininterrupta, fruem e usam com exclusão de quaisquer outros da rampa de acesso à fração “A”, a sul do prédio, atuando como sendo exclusivos fruidores à vista de toda a gente, sem oposição de ninguém e ignorando lesar direitos alheios, e nunca nenhum condómino tendo reagido a ela, podendo fazê-lo, não deverá ser autorizado a agir desse modo após aquele período de tempo, quando se mantiveram inalteradas as circunstâncias em que a respetiva passividade/inércia se manifestou, por essa atuação consubstanciar abuso de direito, na modalidade de supressio.

  8. - Os Recorrentes, entraram na posse de tais habitações há mais de 30 anos, a qual vieram sempre mantendo, mesmo computando tal prazo desde o início do funcionamento do prédio em condomínio (13/07/1977), pelo que adquiriram tal o acesso à garagem de acesso privado por prescrição aquisitiva (usucapião).

  9. - Entendendo-se nada obstar a que as partes comuns do edifício constituído em propriedade horizontal possam ser objeto de usucapião por um dos condóminos, desde que não se trate de parte essencial às frações autónomas do mesmo, pelo que deverá declara-se que os Recorrentes adquiriram, por usucapião, o direito de propriedade sobre o espaço (acesso à garagem de uso exclusivo – rampa de acesso à via pública), sendo seus donos e legítimos possuidores.

  10. - A presunção consagrada no artigo 1421.º, n.º 2, do CC é ilidível, podendo demonstrar-se que a coisa foi atribuída no título constitutivo da propriedade horizontal ou que foi adquirida por usucapião por algum dos condóminos.

  11. - O acesso à fração “A” de acesso privado, tem uma destinação objetiva e afetação material em exclusivo para esta fração.

  12. - A presunção de comunhão consagrada no artigo 1421.º, n.º 2, do CC foi ilidida com a demonstração de que, através de posse pacífica, pública, não titulada, mas de boa-fé, os Recorrentes o adquiriram por usucapião ao fim de 30 anos, nos termos do artigo 1296.º do Código Civil.

  13. - Não se provou, nem foi alegado, por outro lado, que a rampa de acesso à fração “A” pertence em exclusivo a qualquer dos condóminos, nem que quaisquer outros tivessem a posse e detenção, para além dos Recorrentes, deste modo, ficou demonstrada a possibilidade de funcionamento da presunção de parte comum...

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