Acórdão nº 10984/19.0T8SNT-A.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 16 de Dezembro de 2021

Magistrado ResponsávelINÊS MOURA
Data da Resolução16 de Dezembro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na 2ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa I. Relatório Vem a S…, Ld.ª, intentar a presente ação declarativa com a forma de processo comum contra a Dr. G…, sociedade Alemã, pedindo a condenação da R. a pagar-lhe a quantia de € 74.216,71 acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação.

Alega, em síntese, para fundamentar o seu pedido, que celebrou um contrato com a R., que as partes nunca reduziram a escrito, mediante o qual procede à promoção, comercialização e distribuição dos produtos fabricados pela mesma no território português, o que acontece desde 1971, atuando durante 28 anos como agente da R., tendo esta enviado uma carta à A. em 30/11/2008 pondo fim à sua colaboração. Refere que angariou os maiores clientes da R., considerando ter direito a uma indemnização de clientela que dela reclama.

Devidamente citada a R. veio contestar e deduzir pedido reconvencional contra a A. Invoca a exceção da incompetência absoluta dos tribunais portugueses por força de um pacto atributivo de jurisdição celebrado entre as partes que atribui competência para dirimir eventuais litígios entre as mesmas ao tribunal de Augsburg, na Alemanha. Impugna os factos alegados pela A. e dela reclama o pagamento de € 11.705,21 relativo à venda de produtos não pagos, acrescido de juros de mora à taxa de 5%, vencidos e vincendos, ascendendo os juros já vencidos ao valor de € 1.059,65.

Na sua contestação a R. fundamenta a exceção da incompetência dos tribunais portuguesas que suscita, nos art.º 5.º a 18.º nos termos que se reproduzem: “5. Na presente ação as partes acordaram que os tribunais com competência exclusiva para dirimirem qualquer disputa entre as partes seriam os tribunais de Augsburg, Alemanha.

  1. Com efeito, conforme consta de forma expressa das variadíssimas faturas recebidas pela Autora ao longo dos anos e referentes à relação entre as partes, o fornecimento dos bens em causa encontrava-se sujeito às Condições Gerais de Venda (Exportação), conforme consta da cláusula que refere: “Delivery of the goods is subject to our General Conditions of Sale (Export), and the prices invoiced are those of our current net export price list.” (cfr. Faturas, confirmações de ordem e notas de entrega que ora se juntam como Doc. 1 e cujo teor aqui se dá como integralmente reproduzido).

  2. Nessas mesmas Condições Gerais de Venda encontra-se referido na Cláusula 13 que: “13.1 O contrato será regido pelas leis da República Federal da Alemanha e deve ser interpretado em conformidade.

    13.2 O local designado para execução, bem como o local de jurisdição exclusiva será Augsburg, Alemanha. Temos, no entanto, o direito de apresentar uma acão judicial no local da sede do cliente. (…)”. (cfr. Doc. 2 que ora se junta e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido) 8. A Autora acedeu regularmente às referidas Condições Gerais de Venda através do website da Ré com vista à sua consulta e verificação (Disponíveis em https://b2b.grandel.de/SB=2438).

  3. A respeito desta matéria note-se também no registo informático de algumas das muitas ocasiões em que a Autora acedeu efetivamente ao portal da Ré (cfr. Doc. 3 que ora se junta e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

  4. Em qualquer caso, o acesso regular às Condições Gerais de Venda, era tanto um uso, como também um pressuposto, da relação comercial entre as duas partes.

  5. Por outro lado, o uso deste tipo de cláusulas nos documentos em causa é amplamente conhecido e regularmente observado pelas partes em contratos do mesmo tipo.

  6. Assim, a Autora sempre conheceu e aceitou as referidas Condições Gerais de Venda, sendo que obviamente pautou a sua conduta enquanto compradora e entidade comercial ao longo da sua relação com a Ré de acordo com tais condições 13. Ou seja, seria simplesmente ilógico vir agora afirmar que porventura não conhece as referidas Condições Gerais de Venda… Dito isto, note-se que: 14. O Art. 25.º do Regulamento 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho de 12 de Dezembro de 2012 (relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria Civil e comercial) determina que: “1. Se as partes, independentemente do seu domicílio, tiverem convencionado que um tribunal ou os tribunais de um Estado-Membro têm competência para decidir quaisquer litígios que tenham surgido ou que possam surgir de uma determinada relação jurídica, esse tribunal ou esses tribunais terão competência, a menos que o pacto seja, nos termos da lei desse Estado-Membro, substantivamente nulo. Essa competência é exclusiva, salvo acordo das partes em contrário. O pacto atributivo de jurisdição deve ser celebrado: a) Por escrito ou verbalmente com confirmação escrita; b) De acordo com os usos que as partes tenham estabelecido entre si; ou c) No comércio internacional, de acordo com os usos que as partes conheçam ou devam conhecer e que, em tal comércio, sejam amplamente conhecidos e regularmente observados pelas partes em contratos do mesmo tipo, no ramo comercial concreto em questão.

  7. Qualquer comunicação por via eletrónica que permita um registo duradouro do pacto equivale à «forma escrita”. [nosso destaque] 15. No mesmo sentido, também o Art. 94.º do CPC determina que: “1 – As partes podem convencionar qual a jurisdição competente para dirimir um litígio determinado, ou os litígios eventualmente decorrentes de certa relação jurídica, contanto que a relação controvertida tenha conexão com mais de uma ordem jurídica.

    2 – A designação convencional pode envolver a atribuição de competência exclusiva ou meramente alternativa com a dos tribunais portugueses, quando esta exista, presumindo-se que seja exclusiva em caso de dúvida.

    3 – A eleição do foro só é válida quando se verifiquem cumulativamente os seguintes requisitos:

    1. Dizer respeito a um litígio sobre direitos disponíveis; b) Ser aceite pela lei do tribunal designado; c) Ser justificada por um interesse sério de ambas as partes ou de uma delas, desde que não envolva inconveniente grave para a outra; d) Não recair sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais portugueses; e) Resultar de acordo escrito ou confirmado por escrito, devendo nele fazer-se menção expressa da jurisdição competente.

    4 – Para efeitos do disposto no número anterior, considera-se reduzido a escrito o acordo constante de documento assinado pelas partes, ou o emergente de troca de cartas, telex, telegramas ou outros meios de comunicação de que fique prova escrita, quer tais instrumentos contenham diretamente o acordo quer deles conste cláusula de remissão para algum documento em que ele esteja contido. [nosso destaque] 16. Face ao exposto, a referida Cláusula 13.ª das Condições Gerais de Venda constitui assim um Pacto Atributivo de Jurisdição que foi validamente celebrado entre as partes.

  8. Os efeitos desse Pacto Atributivo de Jurisdição atribuem competência exclusiva ao Tribunal de Augsburg, sito na Alemanha, retirando-a dos Tribunais Portugueses, os quais não têm competência para dirimir o presente litígio.

  9. Estamos assim na presença de uma exceção dilatória de incompetência absoluta dos Tribunais Portugueses com a consequência da absolvição da Ré da presente instância (Arts. 94.º, 96.º, alínea a) e 99.º, n.º 1 e 3 do CPC), a qual aqui se invoca para todos os legais efeitos.” A A. veio responder à exceção da incompetência do tribunal concluindo pela sua improcedência. Refere que a relação contratual das partes não se limitava à venda pela R. dos seus produtos e que nunca teve conhecimento nem aceitou as condições gerais de venda agora invocadas pela R., sendo que quando se iniciou a relação comercial entre as partes nem sequer havia um site desta na internet, concluindo que não existiu qualquer pacto de jurisdição celebrado entre as partes.

    Foi realizada audiência prévia onde foi proferido despacho saneador, tendo o tribunal apreciado e decidido a exceção dilatória da incompetência internacional dos tribunais portugueses no sentido da sua improcedência, aí se referindo: “Nos presentes autos a R. estriba a atribuição do pacto de jurisdição nos dizeres constantes das facturas remetidas à A. das quais consta, em língua inglesa, que “Delivery of the goods is subject to our General Conditions of Sale (Export), and the prices invoiced are those of our current net export price list.”, a significar que se aplicam ao fornecimento de produtos pela R. as condições gerais de venda por esta definidas, alegando que as mesmas constam do sítio da internet da R., sendo que em tais condições, na cláusula 13 consta, também em língua inglesa, que o local de jurisdição exclusiva será Augsburg, Alemanha.

    O contrato celebrado entre as partes não consta de forma escrita, nem foi reduzido a escrito, pelo que se tem por adquirido que o contrato foi celebrado verbalmente.

    Nem das facturas emitidas pela R. à A. nem das referidas condições gerais consta a assinatura da A..

    Não resulta demonstrado que a A. tenha expresso, de forma escrita ou até mesmo verbalmente, a sua aceitação à referida cláusula aposta nas condições de venda estipuladas pela R..

    A referida menção nas facturas não satisfaz o requisito previsto na alínea a) do nº 1 do artigo 25º do Regulamento, desde logo porque não contem a assinatura da A..

    Falta a demonstração da existência de bilateralidade nessa estipulação, decorrente da demonstração da existência de um efectivo acordo de vontades na eleição do foro, a qual está a cargo da parte que invoca em seu benefício o pacto privativo de jurisdição.

    A R. não alega a existência de um prévio acordo verbal sobre tal matéria, passível de constituir a...

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