Acórdão nº 4720/17.2T8LSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 16 de Dezembro de 2021

Magistrado ResponsávelNELSON BORGES CARNEIRO
Data da Resolução16 de Dezembro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os juízes da 2ª secção (cível) do Tribunal da Relação de Lisboa: 1. RELATÓRIO AA e, BB, habilitados no lugar de CC e de DD, intentaram ação declarativa de condenação contra BANCO BIC PORTUGUÊS, S.A.

, pedindo a condenação deste no pagamento na quantia de € 50 000,00, correspondente ao capital investido, acrescida de juros contados desde 9 de maio de 2016 e ainda de € 7500,00, a título de danos não patrimoniais.

Foi proferida sentença que condenou o réu a pagar aos autores habilitados, a quantia de € 50 000,00 (cinquenta mil euros), acrescidos de juros legais à taxa de 4% ao ano, contados desde a data de citação do réu para esta ação, e até integral e efetivo pagamento.

Inconformado, veio o réu apelar da sentença, tendo extraído das alegações[1],[2] que apresentou as seguintes CONCLUSÕES[3]: 1. A douta sentença do Tribunal de Lisboa violou e fez errada aplicação e interpretação do disposto nos arts. 7º, 290º nº 1 alínea a), 304º-A e 312º a 314º-D e 323º a 323º-D e 327º do CdVM e 4º, 12º, 17º e 19º do D.L. 69/2004 de 25/02 e da Diretiva 2004/39/CE e 364º, 483º e ss., 563º, 628º e 798º e ss. do C.C.

2. A putativa desconformidade entre o comportamento exigido ao Réu e o seu comportamento verificado tem que ver com o facto do Tribunal considerar que, a circunstância do funcionário do Banco Réu ter assegurado ao Autor (conforme ele próprio estava convencido) que a aplicação financeira era um produto sem risco, não transmitindo a característica da subordinação ou a diferença para o depósito a prazo, configura a prestação de uma informação falsa.

3. Porém, tal realidade não configura qualquer violação do dever de informação por prestação de informação falsa.

4. O único risco que percebemos existir na emissão obrigacionista em causa é exatamente o relativo ao cumprimento da obrigação de reembolso.

5. Este risco corresponde ao incumprimento da prestação principal da entidade emitente! Ou seja, corresponde ao chamado risco geral de incumprimento! 6. A possibilidade deste incumprimento não corresponde a qualquer especial risco inerente ao modo de funcionamento endógeno do instrumento financeiro... antes corresponde ao normal e universal risco comum a todos, repete-se... a todos, os contratos! 7. Do incumprimento da obrigação de reembolso da entidade emitente, em 2016, não podemos, sem mais, retirar que esse o risco dessa eventualidade fosse relevante – sequer concebível, à exceção de ser uma mera hipótese académica no momento da subscrição! 8. A S......., era titular de 100% do capital social do Banco-R., exercendo, por isso o domínio total sobre este.

9. O risco associado ao reembolso das Obrigações correspondia, então ao risco de solvabilidade da S........

10. E sendo esta totalmente dominante do Banco-R., então este risco de solvência, corresponderia, grosso modo, ao risco de solvabilidade do próprio Banco! 11. A segurança da subscrição de Obrigações emitidas pela S....... seria correspondente à segurança de um Depósito a Prazo no BPN.

12. O risco BPN ou risco S......., da perspetiva da insolvência era também equivalente! 13. A única diferença consistia no facto do Banco ter sido resgatado através da sua nacionalização, numa decisão puramente política e alicerçada num regime aprovado propositadamente para atender a essa situação e não em qualquer quadro legal previamente estabelecido.

14. O que retira qualquer relevância à transmissão da característica no momento da decisão de investimento.

15. A menção do dito risco praticamente inexistente, como de resto do capital garantido, não pode senão ser entendida no contexto da atribuição de uma segurança acima da média ao produto, de confiança no normal cumprimento de todas as obrigações da emitente, sustentada em factos e juízo objetivamente razoáveis e previsíveis.

16. A menção à expressão capital garantido não tem por si só a virtualidade de atribuir qualquer desaparecimento de todo o risco de qualquer Upo de aplicação… 17. A expressão capital garantido mais não é do que a descrição de uma característica técnica do produto – corresponde à garanti de que o valor de reembolso, no vencimento, é feito pelo valor nominal do título e correspondente ao respetivo valor de subscrição! Ou seja, o valor do capital investido é garantido! 18. A este propósito o Plano de Formação Financeira em site do Conselho de Supervisores Portugueses – www.todoscontam.pt! descreve as características de produtos financeiros, entre os quais as Obrigações, e explica a garantia de capital, exatamente nos termos que vimos de expor.

19. Ainda que se entenda que esta expressão mereceria uma densificação ou explicação aos clientes, a fim de evitar qualquer confusão, o certo é que, transmitindo uma característica técnica, não se poderá afirmar que o banco, ou os seus colaboradores agiram com culpa, e muito menos grave! 20. O Banco limitou-se a informar esta característica do produto, não sendo suas obrigações assegurar-se de que o cliente compreendeu a afirmação.

21. A interpretação das menções “sem risco” ou de “capital garantido” não é suscetível de ser feita apenas com recurso à impressão do destinatário, nos termos do previsto no artº 236º do CCiv. uma vez que esta disposição se aplica, apenas e só, às declarações negociais.

22. A comercialização por intermediário financeiro de produto com a indicação de que o mesmo tem “capital garantido” não implica a corresponsabilização do referido intermediário pelo prejuízo decorrente da falta de reembolso por parte da entidade emitente.

23. Acresce que a expressão garantido pelo Banco era também ela consentânea com a realidade na altura da subscrição! 24. Efetivamente o banco era parte integrante do património da emitente das obrigações e como tal garante do cumprimento das suas obrigações.

25. Também por isso não faz qualquer sentido afirmar, ou querer retirar dessa afirmação, uma garantia de cumprimento no sentido de uma fiança pelo facto da mesma ser em absoluto redundante. O banco como elemento do património da eminente já era, com todo o seu património, garantia geral do cumprimento das obrigações daquela.

26. O dever de informação ao cliente, não se trata de um direito absoluto do cliente à prestação de informações exatas, mas apenas de um dever de esforço sério de recolha de informações o mais fiáveis possível pelo banco.

27. O grau de exatidão em relação às informações será variável, consoante o Upo de informação em causa.

28. No caso dos presentes autos, ficou demonstrado, e foi assumido, que era do interesse e vontade do subscritor investir em produtos de com boa rentabilidade e de elevada segurança.

29. Assim, não pode o Banco Recorrente senão concluir que foram salvaguardados os legítimos interesses do cliente.

30. Resultou demonstrado que os funcionários, mais concretamente o funcionário que o colocou, sempre acreditaram - até praticamente ao momento do incumprimento - que se tratava de produto seguro e se preocupavam com os interesses dos clientes.

31. A simples omissão de referência à característica da subordinação das Obrigações não constitui de forma alguma uma violação do dever de informação.

32. O teor do dever de informação não consiste, nem pode consistir, num mero elenco, apenas para efeitos formais da dita informação, das características do produto, antes devendo adequar-se às concretas circunstâncias relativas ao cliente ou ao momento histórico.

33. Esta particular característica da subordinação refere-se exclusivamente, e por definição, a um cenário de concurso de credores. Este cenário, contudo, e realisticamente falando, era em 2006 por todos encarados como puramente teórico e académico...

34. A situação do sistema financeiro em geral, em Portugal, e do Banco-R. em particular nunca levariam a que ninguém valorizasse uma tal possibilidade mesmo que comunicada. Esta simples e, quanto a nós, óbvia circunstância implica que a falta daquela concreta menção, desde logo não implicou uma verdadeira falta de informação, porquanto nunca seria valorizada por qualquer cliente como tal...

35. Diga-se ainda que nos parece que é evidente que a relação causal entre esta falta de informação e o dano que sobreveio sempre inexistiria de facto, em face da já explicada irrelevância assumida da dita informação sobre subordinação.

36. Dispunha sobre a matéria do conteúdo dos deveres do intermediário financeiro o artigo 304º do CVM no sentido de que os intermediários financeiros estão obrigados a orientar a sua catividade no sentido da proteção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado, devendo conformar a sua catividade aos ditames da boa-fé, agindo de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência.

37. E, quanto ao risco, há aqui que chamar à colação o art. 312º nº 1 alínea a) do CdVM, que obriga então o intermediário financeiro a informar o investidor sobre os “riscos especiais envolvidos nas operações a realizar”.

38. Tal redação refere-se necessariamente ao negócio de intermediação financeira enquanto negócio de cobertura que, depois, proporcionará negócios de execução.

39. Tal menção não pode nunca equivaler ao dever de informação sobre o instrumento financeiro em si! 40. A informação quanto ao risco dos instrumentos financeiros propriamente dito apenas veio a ser exigida prestar aos intermediários financeiros com o D.L. 357-A/2007 de 31/10, que aditou o art. 312º-E nº 1, passando a obrigar o intermediário financeiro a informar o cliente sobre os riscos do Upo de instrumento financeiro em causa.

41. O legislador não deixou nada ao acaso e logo no número seguinte, afirmou claramente o que se devia entender por risco do Upo do instrumento financeiro em causa nas quatro alíneas do nº 2 do art. 312º-E.

42. São ESTES e APENAS ESTES os riscos do Upo do instrumento financeiro sobre os quais o Intermediário Financeiro tem que prestar informação, mesmo na atual redação do CdVM.

43. A alusão que a lei faz quanto ao risco de perda da totalidade do investimento está...

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