Acórdão nº 2550/20.3T8SRE-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Dezembro de 2021

Magistrado ResponsávelCRISTINA NEVES
Data da Resolução15 de Dezembro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

SUMÁRIO ELABORADO E DA RESPONSABILIDADE DO RELATOR I- A livrança que contenha os requisitos essenciais referidos nos artºs 75 e 76 da LULL, constitui título cambiário autónomo e abstracto, integrado no elenco dos títulos executivos por via do disposto no artº 703 nº1 c) do C.P.C., incorporando no título o direito nele representado, com plena autonomia da relação fundamental subjacente.

II- Prestado aval ao subscritor da livrança, a obrigação do avalista é uma obrigação de garantia do pagamento da obrigação cambiária avalizada, no seu vencimento, e não da obrigação relação subjacente (artº 32 da LULL), mantendo-se esta obrigação de garantia, mesmo no caso de a obrigação garantida ser nula por qualquer razão que não um vício de forma (artºs 75 e 76 da LULL).

III- Dado o carácter autónomo e abstracto do título de crédito e a função de garantia do aval, só podem os avalistas opor-se à execução desta obrigação, se estiverem nas relações imediatas com o portador da livrança (artº 17 da LULL e 731 do C.P.C.), cabendo-lhes, nesse caso, o ónus de alegar e provar os factos referentes ao preenchimento abusivo do pacto de preenchimento e os meios de defesa oponíveis à relação causal, porque constituindo excepções de direito material (artº 342 nº2 do C.C.).

IV-Não constando da petição de embargos, os factos relativos ao pacto de preenchimento e à relação causal, nem que o avalista se encontre nas relações imediatas com o portador da livrança, não é esta omissão suprível, quer por via de contestação aos embargos, quer por despacho de aperfeiçoamento, impondo-se a rejeição liminar dos embargos, com fundamento na manifesta improcedência das excepções invocadas (artº 732 nº2 c) do C.P.C.).

Proc. Nº 2550/20.3T8SRE-A.C1- Apelação Tribunal Recorrido: Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra - Juízo de Execução de Soure-J1 Recorrentes: V... e M...

Recorrida: Banco B..., S.A.

Juiz Desembargador Relator: Cristina Neves Juízes Desembargadores Adjuntos: Jaime Ferreira Teresa Albuquerque Acordam os Juízes na 3ª Secção do Tribunal da Relação de COIMBRA: RELATÓRIO Intentada execução por Banco B..., S.A. contra S..., Lda e H..., J...., M..., M..., V... e M...

, para pagamento da quantia de €50.754,63, apresentando como título executivo livrança subscrita pela sociedade e avalizada pelos demais executados, vieram estes dois últimos, deduzir embargos, invocando: -a invalidade do título, por dele não constar o local de pagamento/domiciliação; -o preenchimento abusivo da livrança, entregue em branco, alegando terem subscrito “pacto de preenchimento, também em branco, cujo original não lhe foi facultado pela Exequente, pelo que se requer a sua junção aos autos pela Exequente de modo a poder pronunciar-se sobre o conteúdo da mesma” (artº 10º dos embargos); - o referido pacto de preenchimento foi elaborado com base em “impresso/minuta padronizado previamente elaborado, no qual se encontra inserto determinado clausulado, limitando-se os Executados ora Embargantes a aceitar e assinar o mesmo, sem possibilidade de, no essencial e através de negociação, modelar ou alterar o respectivo teor” (artº 11 dos embargos); -a inexigibilidade da quantia exequenda por não terem sido previamente interpelados para pagamento, em data anterior à execução e por não compreenderem “a razão para o valor aposto naquela livrança ser de €49.980,71” (artºs 19 a 24 dos embargos); -a não renúncia ao benefício do prazo previsto no artº 782 do C.C.; -a não resolução do contrato pela exequente, prévia à instauração da ação, não existindo assim título executivo válido (artºs 31 a 40 dos embargos).

Após, foi proferido despacho no tribunal a quo, em 07/05/21, de convite ao aperfeiçoamento da petição de embargos, nos seguintes termos: “Nos termos do art.º 724.º/1/e) CPC, a lei só exige a exposição dos factos que fundamentam o pedido no requerimento executivo quando os mesmos não constem do título executivo.Deste modo, se a Exequente apresenta como título executivo, à luz do art.º 703.º/1/c)/“Primeira Parte” CPC, um válido e regular título de crédito (Livrança) a causa de pedir consiste e é apenas e exclusivamente a aquisição na esfera jurídica da Exequente do direito a exigir a prestação pecuniária cambiária dos Executados/Embargantes que resulta, apenas e só, da Subscrição/Aval da Livrança por estes (art.º 75.º da LULL).

Esta é a causa de pedir da presente ação executiva e que consta integralmente e de forma completa do título executivo/título de crédito apresentado, o qual certifica e presume a existência do referido negócio jurídico-cambiário.

Com efeito, é hoje pacífico na doutrina e na jurisprudência que é sobre o Executado/Embargante Avalista que recai o ónus de alegação e de prova de que se trata de uma Livrança que foi avalizada em branco, que o Avalista teve intervenção no pacto de preenchimento da Livrança, e a concreta forma e medida em que foi violado o pacto de preenchimento [factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito emergente do título de crédito – art.º 342.º, n.º 2, do Código Civil], sob pena de permanecer incólume a obrigação cambiária que resulta da literalidade do título de crédito [ art.os 378.º e 458.º do Código Civil].

Pelo exposto, convida-se: Os Executados/Embargantes a, no prazo de 10 dias, apresentarem nova e integral petição inicial (que substituirá integralmente a primeira que deixará de ter qualquer valor processual) em que: – Aleguem qual o negócio jurídico que foi celebrado entre a Subscritora/Emitente e a Tomadora da Livrança e que constitui a relação fundamental causal extracambiária da Subscrição/Emissão da Livrança em branco; – Aleguem se a celebração desse negócio extracambiária e a Subscrição/Emissão da Livrança em branco foi acompanhada da celebração pelas partes de pacto de preenchimento da Livrança (subscrito também pelos Executados/Embargantes como Avalista) que constitui a convenção executiva da relação fundamental; – Qual o teor desse pacto de preenchimento; – O relato descritivo e factual (e não meramente impugnativo, abstracto, conclusivo ou dubitativo) sobre o estado de cumprimento ou de incumprimento da relação fundamental e a sua conjugação com o teor do pacto de preenchimento, permitindo concluir que o título cambiário não devia ter sido preenchido (por não se verificarem os pressupostos do pacto que permitem o preenchimento) ou que foi preenchido de forma incorrecta (alegando factualmente qual é o estado do incumprimento da relação fundamental e quais são os correctos termos e os concretos valores do preenchimento do título de acordo com o respectivo pacto).

Na ausência desta alegação não dão os Executados/Embargantes a conhecer ao Tribunal a sua versão sobre os factos que consubstanciam um conclusivamente alegado preenchimento abusivo da Livrança – cuja prova pudesse impedir ou reconfigurar a sua responsabilidade cambiária de acordo com o correspondente conteúdo literal inscrito na Livrança – e fica por cumprir o ónus de alegação que apenas sobre si recai.

A hipotética necessidade dos Executados/Embargantes de suprir a sua própria e eventual negligência em manter cópia de documentos relacionados com a sua vinculação cambiária ou em se manterem ao corrente do estado de cumprimento das obrigações que garantiram deve ser colmatada junto daquela por quem prestaram o Aval (existindo, inclusive, processos de insolvência da sociedade e dos Executados/Embargantes), pois, à luz do título executivo apresentado, os Executados/Embargantes não celebraram qualquer contrato com a Exequente, sendo que esta é Portadora de uma Livrança em que os Executados/Embargantes são apenas Avalistas da Subscritora/Emitente.

À Exequente, em sede de contestação (caso os Embargos de Executado venham a ser liminarmente admitidos), competirá tomar posição definida sobre os factos que forem alegados pelos Executados/Embargantes na petição inicial (art.os 574.º/1 e 732.º/3 CPC).” Em resposta a este despacho vieram os embargantes, apresentar nova petição, na qual acrescentaram novos artigos: -o 4º, com a seguinte redacção “Desde logo, esclarece-se que o negócio jurídico que teve por base a entrega da livrança em branco pela subscritora à Exequente foi um contrato de mútuo em que a subscritora entregou a livrança em branco como garantia, como é prática comum aquando da celebração de mútuos bancários.”; -o 12º com a seguinte redacção “Este pacto nunca foi lido e explicado aos Embargantes, e por essa razão desconhecem os mesmos o teor desse mesmo documento”; -em relação à inexigibilidade da dívida os artºs 26 e 27 com a seguinte redacção “Uma vez que, no limite, aquela livrança apenas poderia ser preenchida com o valor de €35.726,36”, pelo que “Não tendo sido, conclui-se que foi preenchida abusivamente”.

Após, foi proferido despacho que indfeferiu liminarmente os embargos pelos seguintes fundamentos: “I) Sobre os fundamentos de Oposição à Execução: Nos termos do art.º 724.º/1/e) CPC, a lei só exige a exposição dos factos que fundamentam o...

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