Acórdão nº 1096/04.1BTSNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 07 de Dezembro de 2021

Magistrado ResponsávelVITAL LOPES
Data da Resolução07 de Dezembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2.ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL 1 – RELATÓRIO A Exma. Representante da Fazenda Pública, recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por “U. – U., CRL.”., e anulou a liquidação adicional de IRC, relativa ao ano de 1999 e respectivos juros compensatórios.

A Recorrente conclui as doutas alegações assim: «

  1. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou procedente a impugnação deduzida por U. – U. CRL, melhor identificada nos autos, contra a liquidação adicional de IRC de 1999, no montante total de € 84.929,85, anulando, consequentemente, a referida liquidação adicional e respetiva liquidação de juros compensatórios e condenando a Fazenda Pública no pagamento juros indemnizatórios, sobre a quantia de € 72.404,82, contados desde a data do respetivo pagamento até à data da emissão da nota de crédito, às taxas legais aplicáveis.

  2. Em causa nos autos está a liquidação adicional de IRC de 1999, no montante total de € 84.929,85, emitida na sequência de uma ação inspetiva externa levada a cabo na sequência do processo de inquérito n.º 1/2000.9 TELSB do DCIAP/Lisboa.

  3. Na referida ação inspetiva externa e, em sede de IRC, foram apresentadas correções à matéria colectável no total de € 193.595,78, respeitantes a rappeis, os quais são considerados pela Administração Fiscal como contabilizados em duplicado (€ 167.004,99) ou indevidamente justificados (sem suporte documental) por constarem de nota de lançamento interna (€ 26.590,79).

  4. A ora Recorrida em sede de petição inicial alegou falta de fundamentação das correções efetuadas pelos Serviços de Inspeção Tributária e que os elementos apresentados em sede de audição prévia (documentos contabilísticos e ficheiro informático), no âmbito do procedimento de inspeção, justificavam a alegada duplicação dos registos contabilísticos de rapeis, tendo o Tribunal a quo entendido que efetivamente “para além de falta de fundamentação formal, as correções em apreço padecem, igualmente, de falta de fundamentação substancial na medida em que não vêm demonstrados os pressupostos de facto que sustentam a alteração dos elementos e valores declarados pelo sujeito passivo e que determinaram a liquidação adicional de IRC”.

  5. Discordamos da posição da sentença ora em crise, estando as correções levadas a cabo pelos Serviços de Inspeção Tributária e constantes do Relatório de Inspeção Tributária devidamente fundamentadas, de facto e de direito, nos termos do disposto no nº 3 do artigo 268º da CRP, nos artigos 152.º e 153º do CPA e no artigo 77º da LGT, conforme iremos demonstrar.

  6. O princípio constitucional da fundamentação formal dos atos administrativos (art. 268º nº 3 CRP) foi densificado nos arts. 152º e 153º Código do Procedimento Administrativo e, concretamente no que respeita ao ato administrativo tributário, no art. 77º nºs 1 e 2 LGT.

  7. Por imposição do nº 3 do artigo 268º da CRP, dos artigos 152.º e 153º do CPA e artigo 77º da LGT, os atos tributários estão sujeitos ao dever de fundamentação.

  8. Assim, não olvidamos que o ato tributário de liquidação resultante da ação inspetiva é um ato impositivo de deveres e encargos para o particular e como tal está sujeito a fundamentação.

  9. “A fundamentação consiste em deduzir expressamente a resolução tomada das premissas em que assenta, ou em exprimir os motivos porque se resolve certa maneira, e não de outra maneira” (MARCELLO CAETANO in Princípios Fundamentais do Direito Administrativo, 1977, página 123).

  10. No que concerne aos requisitos da fundamentação, denote-se que, para ser legal, “a fundamentação tem preencher diversos requisitos, devendo ser: expressa, no sentido de não ser admissível uma fundamentação que apenas se infira de outros aspectos do acto ou procedimento administrativo; sucinta, o que proíbe fundamentações desmesuradamente extensas, quer por atentarem contra os princípios da desburocratização e da eficiência, quer por poderem perturbar a apreensão, pelos particulares, dos motivos que presidiram à emissão do acto; clara, o que proíbe as fundamentações obscuras; congruente, o que proíbe fundamentações contraditórias, quer em sim mesmas, quer em relação à decisão contida no acto; suficiente, no sentido de os motivos aduzidos deverem chegar para que o particular compreenda as razões da prática do acto; acessível, no sentido de que designadamente nos casos de fundamentação por homologação, o acesso dos particulares à fundamentação não poder ser impedido ou dificultado em virtude da separação física entre o documento que contém a decisão e aquele que contém a fundamentação” (Cfr. MARCELO REBELO DE SOUSA e ANDRÉ SALGADO MATOS in Direito Administrativo Geral, Tomo III, 2007, página 149).

  11. “É sabido que, perante a enorme variedade de tipos de poderes e de tipos de actos, não há um critério uniforme que permita reconhecer uma fundamentação suficiente. Repetidamente se diz que a suficiência de fundamentação é um conceito relativo, variável conforme a matéria, o tipo de acto e sobretudo as particularidades concretas de cada decisão. Todavia, para que possa cumprir as principais que a lei lhe comete, não pode deixar de ter capacidade para esclarecer concretamente as razões determinantes do acto, o que só acontece se for clara, congruente e suficiente (nº 2 do art. 125º do CPA)” (vide Ac. do STA de 15/02/2012, proferido no âmbito do processo 872/11, acessível através da internet através do site www.dgsi.pt).

  12. “E, como é consensual na jurisprudência, as exigências de fundamentação não são rígidas, variando de acordo com o tipo de acto e as circunstâncias concretas em que este foi proferido: o acto estará suficientemente fundamentado quando o administrado, colocado na posição de destinatário normal – o bonus pater familiae de que fala o art. 487º nº 2 do C.Civil – possa ficar a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua génese, de modo a permitir-lhe optar, de forma esclarecida, entre a aceitação do acto ou o accionamento dos meios legais de impugnação, e de molde a que, nesta última circunstância, o tribunal possa também exercer o efectivo controle da legalidade do acto, aferindo do seu acerto jurídico em face da sua fundamentação contextual” – vide Ac. do STA de 12/03/2014, proferido no âmbito do processo n.º 01674/13, disponível em www.dgsi.pt.

  13. No que concerne à fundamentação de facto, no Relatório de Inspeção Tributária está de forma suficientemente fundamentada o processo lógico e jurídico que conduziu à decisão e esclarece a ora Recorrido da motivação da decisão tomada pela Inspeção Tributária.

  14. Dito isto, e observando o Relatório de Inspeção, constata-se que a correção em causa se encontra devidamente fundamentada, tendo sido justificada a correção em sede de IRC dos custos relativos aos "rapeis" atribuídos pela "U." aos seus associados, no montante total de 38.812.468$00 (€ 193.595,78), face ao facto de os rapeis de 1999 a distribuir pela "U.", serem contabilizados como custo neste mesmo ano, embora a distribuição dos mesmos apenas ocorra no ano seguinte, havendo uma diferença de 60.507.376$00 (€ 301.809,52) entre o custo declarado no balancete analítico, de 5.490.507.376$00 (€ 27.386.535,33) e o valor apurado no quadro apresentado referente à totalidade dos rapeis distribuídos aos seus associados no montante total de 5.430.000.000$00 (€ 27.084.725,81).

  15. Conforme foi apurado pela Inspeção Tributária e consta do Relatório de Inspeção Tributária, essa diferença “justifica-se” por três motivos: - acertos efetuados no ano 2000, de rapeis referentes ao ano de 1999, para os quais existem emissão de notas de crédito aos associados; - nota de lançamento, no montante de 5.330.974$00 (€ 26.590,78), datada de 31/12/99, sem outro suporte documental, a qual se refere a possíveis regularizações efetuadas, verba esta que não foi (justificadamente) aceite como custo, por não estar devidamente justificada; - notas de débito emitidas durante o ano de 1999, pelas associadas "P. D. – D., S.A", "F. N. – H., S.A" e "G. – G.., S.A", no montante total de 33.481.494$00 (€ 167.004,99), referente a rapeis que lhes foram atribuídos pela "U.", tendo a Inspeção Tributária entendido e enunciado no Relatório de Inspeção Tributária que uma vez que o valor total de rapeis distribuídos pela "U.", engloba estas associadas, não existe motivo válido para a emissão das notas de débito, tendo, por conseguinte, considerado a referida verba registada em duplicado.

  16. Nesse sentido, corrigiu em sede de IRC os custos relativos aos "rapeis" atribuídos pela "U." aos seus associados, no montante total de 38.812.468$00 (€ 193.595,78), exatamente a soma da nota de lançamento, no montante de 5.330.974$00 (€ 26.590,78), datada de 31/12/99, supra referida e das notas de débito emitidas durante o ano de 1999, pelas associadas "P. D. – D., S.A", "F. N. – H., S.A" e "G. – G.., S.A", no montante total de 33.481.494$00 (€ 167.004,99), supra melhor explicitadas.

  17. Ou seja, de forma expressa, clara, sucinta, congruente, suficiente e acessível, a AT deu a conhecer à ora Recorrida que iria proferir o ato de liquidação, nos exatos termos em que o fez, atendendo a que constatou irregularidades conducentes a correções, que fundamentou devidamente.

  18. Com efeito e conforme supra mencionamos, o STA vem entendendo que as exigências de fundamentação não são rígidas, variando de acordo com o tipo de ato e as circunstâncias concretas em que o ato foi proferido, pelo que, constituindo o dever de fundamentação garantia dos administrados, o dever de fundamentação é alcançado quando se possa afirmar que o administrado, colocado na posição de destinatário normal, possa ficar a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua génese.

  19. Em nosso entendimento e salvo melhor opinião, o teor das notificações supra mencionadas, permitiram à ora Recorrida, colocada na posição de destinatário normal (bónus...

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