Acórdão nº 1489/21.0BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 07 de Dezembro de 2021

Magistrado ResponsávelPATRÍCIA MANUEL PIRES
Data da Resolução07 de Dezembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I-RELATÓRIO O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA, (doravante DRFP) veio interpor recurso jurisdicional dirigido a este Tribunal tendo por objeto sentença proferida pela Mmª. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, através da qual julgou procedente a reclamação deduzida por R. N. P. P., SA, (Recorrida) do despacho proferido em 12 de maio de 2021, pelo Diretor de Finanças Adjunto, da Direção de Finanças de Lisboa, que indeferiu o pedido de substituição de garantia apresentado pela Reclamante, no âmbito dos processos de execução fiscal números 3263202001220462 e apenso, 3263202001223658, 3263202001263110 e apenso, 3263202101000845 e 3263202101015788 e apensos, 3263202101030132 e 3263202101036114, que correm termos no Serviço de Finanças de Lisboa 5, para cobrança coerciva de dívida no valor global de 441.754,70€.

A Recorrente, apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem: “I. Ficou decidido nos autos ter o órgão de execução fiscal, ao recusar a substituição de garantia consistente na penhora de depósitos bancários por um penhor de participações sociais com os fundamentos que constam do despacho reclamado, incorrido em vício de violação de lei, por erro nos seus pressupostos, consagrados nos artigos 52.º, n.º 7 e 55.º da LGT, em conjugação com o artigo 199.º do CPPT, devendo, por isso, o referido ato reclamado ser anulado.

Douta decisão com a qual, com a devida vénia, não se concorda.

  1. Em causa está a recusa pela AT da pretensão de substituição de garantia anteriormente prestada pela executada/Reclamante – penhora de saldos de conta bancária – por uma outra – penhor de ações.

  2. E desde logo cabe convocar o disposto no n.º 2 do artigo 199.º do CPPT, nos termos do qual, o penhor só consubstancia garantia idónea «a requerimento do executado e mediante concordância da administração tributária».

    Ora, neste caso, a AT não manifestou concordância com o dito penhor, pelo que este não é suscetível de consubstanciar uma garantia idónea.

    Porém, caso assim não se entenda e sem conceder, IV. Nos termos do disposto no n.º 7 do art.º 52.º da LGT, a substituição da garantia obedece a três requisitos: a excecionalidade; a prova de interesse legítimo do executado e não resultar prejuízo para o credor tributário.

  3. Quanto ao requisito da excecionalidade, refere José Maria Pires (Coord.) e Outros, na pág. 515 da obra citada, que o requerente terá de provar que “tal interesse legítimo não poderia ter sido invocado na altura da prestação da garantia, por nesse momento não se poder prever, com razoabilidade, a verificação das circunstâncias actual ou potencialmente lesivas das quais resulta o interesse legítimo na substituição. A referência à imprevisibilidade em termos razoáveis deve ter por critério de aferição a do homem mediano e normalmente diligente na condução dos seus negócios”.

    E esta prova não se pode considerar como tendo sido feita pela aqui Reclamante.

  4. Afigura-se que a situação de excecionalidade relatada não é de considerar in casu, atendendo a que, aquando da prestação de garantia mediante indicação de bens à penhora, por certo toda a envolvente relatada – v.g. necessidade de pagamento de salários e a credores – já seria conhecida da Reclamante ou por esta perfeitamente previsível.

  5. E à data, tal situação não impediu a Reclamante de indicar bens à penhora para valer como garantia.

  6. Sobre o requisito da excecionalidade na substituição da garantia, importa ainda referir que esta é reportada pela douta Sentença ao momento da constituição da garantia – e vem identificada pela necessidade de rápida obtenção de certidão de situação tributária regularizada – sendo que a excecionalidade que aqui releva, é a que se verifica após este momento e que motiva a substituição da garantia.

  7. A prova do interesse legítimo caberia à requerente da substituição da garantia, a qual se entende não ter sido feita. Com efeito, foram invocadas dificuldades de pagamento de vencimentos e a credores, porém, tal não só não configura situação de exceção, - previsível aquando da indicação dos saldos de conta bancária à penhora - como não constitui prova do interesse legítimo na substituição.

  8. Quanto à prova do interesse legítimo, a Reclamante limitou-se a invocá-lo, apresentando o Anexo 1 ao seu requerimento, no qual se encontram inscritas um conjunto de despesas sob as epígrafes «Pagamentos até 31-03-21» e «Fornecedores correntes críticos», sem ter realizado qualquer prova que corroborasse os valores ali inscritos, assim como invocou «um conjunto de dívidas já vencidas e cujo pagamento se encontra a ser negociado, que ascendem ao valor de € 948.000».

  9. Neste conspecto, entendeu o douto Tribunal que «assentou mal a decisão reclamada no errado pressuposto de que tais meios de prova necessitavam de outros que os corroborassem, sem explicar porque é que aqueles não seriam aptos, por si só, a realizar a correspondente prova e que outros documentos entendia serem relevantes (…)».

  10. Com o devido respeito, não concordamos com esta argumentação, uma vez que do ato reclamado resulta expressamente que a executada não logrou provar este requisito, pois que apresentou o Anexo 1, no qual se encontram inscritas um conjunto de despesas sob as epígrafes «Pagamentos até 31-03-21» e «Fornecedores correntes críticos», sem que viesse carrear para o processo quaisquer elementos probatórios que sustentassem aqueles valores inscritos. Porque não basta alegar, apresentando um mero documento escrito no qual inscreveram valores sob o título de «Pagamentos até 31-03-21» e «Fornecedores correntes críticos», sem que venha demonstrar a veracidade daqueles montantes através dos competentes meios probatórios, no caso, os elementos da contabilidade da empresa.

  11. Considerou ainda o douto Tribunal que «(…) tendo em consideração a data da apresentação do requerimento para a substituição de garantia, perante a alegação dos correspondentes factos e a junção do relatório de contas e IES referentes ao ano de 2019, assentou mal a decisão reclamada no errado pressuposto que a Reclamante devia ter procedido à junção dos elementos referentes ao ano de 2020, quando a existência e aprovação dos mesmos ainda não era exigível àquela data (…)».

  12. Porém, se bem que, na data da apresentação do requerimento, a N. não estivesse obrigada a ter já realizado a prestação de contas (três meses após o encerramento do exercício – n.º 5 do art. 65.º do CSC), não é menos certo que «Não são permitidos atrasos na execução da contabilidade superiores a 90 dias, contados do último dia do mês a que as operações respeitam.» (n.º 3 do art. 123.º do CIRC), pelo que a contabilidade referente ao mês de novembro – data em que já se verificava uma retoma da economia – já poderia/deveria ter sido apresentada, permitindo, assim, obter uma avaliação mais próxima da realidade.

  13. Quanto ao requisito da ausência prejuízo para o credor tributário, foi referido na douta Sentença que não pode a AT fundamentar tal recusa num ofício circulado que estabelece restrições quanto ao tipo de garantias que podem ser oferecidas em substituição, porquanto o legislador não o fez no art.º 52.º n.º 7 da LGT, logo esta poderá abranger qualquer uma das garantias previstas no art.º 199.º do CPPT.

  14. Sobre esta asserção importa referir que está em causa a substituição de uma garantia anterior e que estamos perante regime legal distinto daquele que é aplicável à prestação da garantia ab initio.

    E neste caso, não poderia ser aceite a substituição da garantia já prestada pelo penhor de ações da N. que revela claramente um grau de liquidez inferior, por daí advir uma diminuição da probabilidade de cobrança do crédito tributário.

  15. Com efeito, na eventualidade de ser executada a garantia que se pretende apresentar em substituição da anterior, teria a Autoridade Tributária que proceder à venda do bem, (arts. 248.º e 250.º do CPPT), ficando assim a AT sujeita às contingências decorrentes deste procedimento (v.g. venda deserta ou com propostas de aquisição de valor inferior ao da avaliação), daqui decorrendo um sério risco de a garantia se tornar insuficiente ou até nula.

  16. Pelo que, bem andou a AT ao decidir que o penhor de ações não deverá ser aceite em substituição da penhora de saldos bancários já prestada por não estarem reunidos os pressupostos legais previstos no n.º 7 do artigo 52.º da LGT, designadamente por aquela penhora de saldos de conta bancária melhor assegurar o pagamento da dívida exequenda e acrescido.

  17. E no processo de execução fiscal, há que ponderar o interesse público da cobrança dos tributos e da maior ou menor probabilidade de sucesso em proceder a essa cobrança, face às várias modalidades de garantia legalmente previstas e admissíveis. A “execução fiscal é um processo cujo interesse tutelar é o da cobrança do crédito” e os “créditos tributários têm natureza pública e a sua incobrabilidade tem efeitos danosos que ultrapassam largamente os interesses do Estado, dado que se projetam sobre todos os contribuintes”, estando proibida a concessão de moratórias ilegais – cfr. pág. 507 da obra citada em V.

  18. Por outro lado, decidiu o Tribunal pela anulação do despacho de indeferimento do pedido de substituição da garantia. No entanto, e salvo melhor opinião, tal anulação do despacho não levará necessariamente à obrigatoriedade de aceitação da garantia oferecida em substituição, mas antes acarretará nova pronúncia pela AT quanto ao que veio solicitado; XXI. Requerimento que, como explanado supra, não se entende fundamentar a excecionalidade nem o interesse legítimo, devendo sempre ser indeferido por não cumprimento dos requisitos previstos no n.º 7 do art.º 52.º da LGT; XXII. Pelo que, a anulação do ato reclamado apenas levará – necessária e legalmente – a novo ato de recusa de substituição da garantia (ainda que com diferente fundamentação), mantendo-se a garantia entretanto prestada. E nestes termos, porque assim terá de ser, deverá o Despacho Reclamado manter-se, ao...

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