Acórdão nº 00100/14.0BEVIS-A de Tribunal Central Administrativo Norte, 05 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução05 de Novembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório H.

, no âmbito da Ação Executiva para Prestação de Facto, intentada contra a Caixa Geral de Aposentações, formulou o seguinte pedido: “Termos em que se requer a condenação da executada no pagamento do montante de 134 632,63€, a título do somatório de pensões vencidas entre 25-11-2013 e 29-11-2019, acrescidas de juros de mora à taxa legal de 4% sobre as pensões em dívida, desde a data do respetivo vencimento até efetivo e integral pagamento.

Mais se requer a fixação de um prazo para que o Executado cumpra a condenação, bem como a imposição de uma sanção pecuniária compulsória, nos termos do artigo 169.º do CPTA, por cada dia de incumprimento para além do prazo judicialmente fixado.

” Tendo o TAF de Viseu, em 9 de março de 2021 vindo a proferir Sentença condenando a “Executada CGA a pagar ao A., H., as pensões de aposentação que se venceram entre 25.11.2013 e 29.11.2019, acrescidas de juros moratórios, calculados sobre aquelas pensões em dívida, desde 25.11.2013 até integral e efetivo pagamento”, veio a CGA a Recorrer para esta instância, tendo concluído: “

  1. A CGA considera que a Sentença recorrida violou as regras subjacentes à reconstituição da situação atual hipotética, previstas no art.º 173.º do CPTA, padece de falta de fundamentação e é geradora uma situação de enriquecimento sem causa para o Recorrido.

  2. Não existe justificação para o Recorrido ter direito a receber valores correspondentes a pensão antecipada, retroativos ao período de 2013-11-25 a 2019-11-29 (e em acumulação com as remunerações que então auferiu), passando, a partir dessa data, a receber a pensão não antecipada que entretanto requerera à CGA na pendência da ação exequenda.

    I – OS FACTOS FUNDAMENTAIS PARA EFEITOS DA PRESENTE EXECUÇÃO C) Encontra-se provado que em 2014-02-19 o Exequente peticionou ao TAF de Viseu a anulação do despacho da Direção da CGA de 2013-11-25, que indeferiu o seu pedido de aposentação antecipada, e a condenação da CGA a atribuir-lhe essa pensão antecipada, prevista no art.º 37.º-A do Estatuto da Aposentação (EA) (cfr. 1 dos Factos Assentes) D) Encontra-se, também, provado que em 2019-12-11 foi proferida Sentença naquele processo, julgando procedente o pedido e condenando a CGA “a praticar ato administrativo que conceda ao Autor a pensão antecipada, considerando todo o tempo de serviço para cada um dos regimes de contribuição” (cfr. 2 dos Factos Assentes) E) Encontrando-se, ainda, provado que, no contexto da execução da Sentença, a CGA calculou o valor da aposentação antecipada, fixando-a em € 1.857,23 (cfr. 11 dos Factos Assentes), comunicou esse valor ao Recorrido (cfr. 13 a 15 dos Factos Assentes) e que este, perante tal informação, veio declarar por escrito que optava por manter a pensão não antecipada, que entretanto (cfr. 5 e 6 dos Factos Assentes) requerera na pendência da ação, por esta ter um valor superior, de € 2.581,19 (cfr. 16 dos Factos Assentes).

    II – A RELEVÂNCIA DA VONTADE DO INTERESSADO E O CONTEÚDO DA DECISÃO EXEQUENDA F) No caso dos autos, resulta do pedido (cfr. 1 dos Factos Assentes) e da decisão exequenda (cfr. 2 dos Factos Assentes) que o ato impugnado foi o despacho da Direção da CGA de 2013-11-25, que indeferiu o pedido de aposentação antecipada formulado pelo interessado ao abrigo do art.º 37-A.º do EA, sendo que a reconstituição da situação atual hipotética passaria por conceder-lhe a peticionada pensão antecipada, desde 2013-11-25.

  3. Em execução da decisão exequenda, a CGA poderia simplesmente ter fixado a pensão antecipada, nos termos do art.º 37.º-A do EA, com efeitos reportados a 2013-11-25, no entanto, como se encontra provado nos autos (11 a 13 dos Factos Assentes) a CGA deu a conhecer ao Recorrido que o valor de pensão antecipada resultante da execução do julgado resultava inferior ao valor da pensão não antecipada que aquele havia entretanto requerido na pendência dos autos (e que lhe fora deferida), sendo que o mesmo veio declarar que pretendia antes manter esta última, por ter um valor superior (cfr. 16 dos Factos Assentes).

  4. Isto é, constatando que a pensão fixada de harmonia com a Sentença exequenda era de valor inferior à pensão não antecipada que entretanto requerera à CGA (inferior em mais de 700 euros mensais), o interessado optou por manter esta última. Pelo que não se poderá argumentar que a CGA não quis fixar ao Recorrido a pensão antecipada, nos termos do art.º 37.º-A do EA (única pensão que foi discutida na decisão exequenda).

  5. Se a reconstituição da situação atual hipotética – anulação do ato impugnado seguida de concessão da pensão antecipada nos termos do art.º 37.º-A do EA, com efeitos reportados a 2013-11-25 – não ocorreu no caso concreto, tal se deve, apenas, à decisão do Recorrido, que optou pelo recebimento de outra pensão (pensão não antecipada) de natureza diferente daquela que peticionou ao TAF de Viseu (pensão antecipada).

  6. Ao julgar admissível o facto de um particular poder receber uma pensão antecipada entre 2013-11-25 e 2019-11-29 e uma pensão não antecipada após aquela data, a Sentença recorrida extravasou os limites da decisão exequenda, pois esta apenas apreciou se o Recorrido tinha ou não direito à aposentação antecipada.

  7. Como resulta do Acórdão proferido em 2013-04-04 pelo STA, proc.º n.º 0752/12 (disponível na base de dados do IGFEJ em www.dgsi.pt): “Em sede de execução de uma decisão proferida numa ação administrativa especial de condenação à prática de ato devido cumpre, apenas e tão só, dar cumprimento ao que foi decidido na sentença proferida nesse processo (a decisão exequenda), isto é, dar concretização às injunções nela determinadas.” L) Pelo que, nesta perspetiva, a decisão exequenda tem de dar-se por integralmente cumprida.

    III – A FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DA «COMPENSAÇÃO» ARBITRADA PELO TRIBUNAL A QUO E O CONSEQUENTE ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA DO RECORRIDO M) Durante o período compreendido entre 2013-11-25 e 2019-11-29 (relativamente ao qual o Tribunal a quo considera ser de pagar pensão antecipada) o interessado esteve também a ser pago de vencimentos. Questão que o Tribunal a quo terá considerado inócua, pois considera admissível o Recorrido poder ter, durante 6 anos, uma dupla qualidade: a de trabalhador da função pública e a de aposentado da função pública.

  8. A reconstituição da situação atual hipotética, prevista no n.º 1 do art.º 173.º do CPTA não pode permitir que um funcionário público possa ter direito a receber, durante o mesmo período, simultaneamente remuneração e pensão pelo mesmo cargo.

  9. Importa recordar que a aposentação do Recorrido é ainda o exemplo daquilo em que assenta a natureza estatutária tradicionalmente atribuída à aposentação dos funcionários públicos. Segundo tal conceção, o quantum da pensão de aposentação do funcionário público é equiparado à remuneração desse funcionário, agora na situação de inativo.

  10. Essa natureza estatutária da aposentação dos funcionários públicos encontra-se bem estudada na doutrina de Marcello Caetano (Manual..., cit., vol. II, 10.ª ed. (6.ª reimpressão), p. 795) de Luiz Lopes Navarro (Funcionários Públicos, 2.ª ed., Editora Gráfica Portuguesa, Limitada, Lisboa, 1941, pp. 245-246), ou de João Alfaia (Conceitos fundamentais..., cit., pp. 1058-1059), supra transcrita em Alegações, sendo ainda de referir que tal regime estatutário subsiste, ainda hoje, no EA (cfr. n.º 1 do art.º 74.º), quando ali se prescreve que “O aposentado tem direito à pensão de aposentação e conserva os títulos e categoria do cargo que exercia, bem como os direitos e deveres que não dependem da situação de atividade.” Q) Por isso, não se nos afigura concebível admitir-se, em sede de reconstituição da situação atual hipotética, a acumulação de um duplo benefício, pelo mesmo funcionário público, pelo mesmo cargo e pelo mesmo lapso de tempo, quando legalmente apenas tem direito ou a receber remuneração ou a receber pensão.

  11. Não é admissível que a reconstituição da situação atual hipotética acabe por traduzir-se na acumulação de pensões e de remunerações durante um período de 6 anos (entre 2013-11-25 e 2019-11-29). Tal equivale a conceder o direito a uma «indemnização», sem que tenha ocorrido um dano patrimonial.

  12. Note-se que a decisão exequenda não condenou a CGA no ressarcimento de quaisquer danos (nem morais nem patrimoniais) ao Recorrido. Pelo que pergunta-se: com que fundamento pretende o Tribunal a quo atribuir essa «indemnização» ao Recorrido? Por danos morais? (os mesmos jamais foram suscitados nos autos). Por danos patrimoniais? Qual a perda patrimonial que, em concreto, teve o Recorrido? T) O entendimento do Tribunal a quo não só viola o dever de fundamentação das Sentenças e o disposto no art.º 173.º do CPTA, como viola ainda as regras mais basilares em matéria de responsabilidade extracontratual, onde se proclama que não há lugar a indemnização quando não há dano: art.º 483.º do Código Civil.

  13. Quanto a este particular, considera a CGA que a melhor jurisprudência é a que consta no Acórdão do TCA Sul, proferido em 2009-04-23 no processo de recurso n.º 04821/09, disponível na base de dados do ITIJ em www.dgsi.pt, propugnando pela necessidade de observância da teoria da diferença no âmbito da reconstituição da situação atual hipotética: “…a ser admissível a tese sufragada pelo recorrente, tal conduziria a uma situação absurda, e que consistiria no facto daquele, no período compreendido entre 1-1-2004 e 31-3-2008 receber do seu serviço do ativo, até ao desligamento, os correspondentes vencimentos e, após o desligamento e até à assunção dos encargos por parte da CGA, uma pensão transitória, nos termos previstos no nº 3 do artigo 99º do EA e, simultaneamente, a ser deferido o pedido formulado na presente execução, receber ainda uma pensão de aposentação paga pela CGA, durante esse mesmo período de tempo.

    No fundo, a consequência do deferimento da pretensão executiva conduziria...

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