Acórdão nº 00420/15.6BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 05 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelLu
Data da Resolução05 de Novembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: Município (...) (Casal (…)) interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF de Coimbra, que julgou procedente acção administrativa especial intentada contra si e outros pelo Ministério Público, pedindo a declaração de nulidade das (i) Deliberações da Entidade Regional da Reserva Agrícola Nacional do Centro (ERRANC) nº 528/2013, de 18 de Setembro de 2013, e nº 604/2013, de 01 de Novembro de 2013, reiterada pela deliberação nº 223/2014, de 06 de Maio de 2014, e ainda dos (ii) Despachos de 23 de Outubro de 2014 e de 29 de Janeiro de 2015, do Senhor Vereador da Câmara Municipal (...), R., com competência subdelegada.

O recorrente tira as seguintes conclusões de recurso: 1ª O aresto em recurso enferma de erro na fixação da matéria de facto, uma vez que, pretendendo dar por assentes factos que estavam documentalmente provados no processo administrativo, não poderia o Tribunal a quo dar por provados apenas os factos favoráveis à pretensão do A., tendo igualmente de dar por provado o que ele próprio reconhece estar provado por documento - a insuficiência económica do contra-interessado -, até por esse facto ser absolutamente essencial para curar da violação da alínea b) do n° 1 do art° 22º do RJRAN.

Acresce, ainda, que 2ª O aresto em recurso enferma da nulidade prevista na alínea c) do n° 1 do art° 615º do CPC, uma vez que considerou que os actos impugnados violavam o art° 22° do RJRAM sem que tivesse especificado e dado por provado qualquer facto de que depende a violação daquele preceito, designadamente que havia uma alternativa viável fora das terras da RAM ou que o requerente não estava em situação de insuficiência económica ou que tinha uma outra habitação.

Em qualquer dos casos, 3ª Resulta claramente do aresto em recurso que o Tribunal a quo considerou como nulos os actos impugnados por as entidades demandadas não referirem o preenchimento dos pressupostos de que o art° 22º do RJRAN faz depender a utilização de solos integrados na RAN, ou seja, por não referirem não haver alternativa viável fora das áreas do RAN, estar o requerente numa situação de comprovada insuficiência económica e não ter uma outra habitação.

Contudo 4ª O aresto em recurso sempre teria incorrido em erro de julgamento e em violação do princípio do inquisitório - consagrado no art° 7° do CC - ao considerar que pelo facto de os actos impugnados não referirem os pressupostos constantes do art° 22° do RJRAN eles não se verificavam, uma vez que só a comprovação de que tais pressupostos efectivamente não ocorriam é que permitia considerar violado a lei, o que é o mesmo que dizer que só com a efectiva prova de que havia outra alternativa fora da RAN ou que o requerente tinha capacidade económica e outra habitação é que o Tribunal a quo poderia considerar nulos os actos impugnados por violação do art° 22º do RJRAN.

5° Ao declarar nulos os actos impugnados por considerar que fora violado o art° 22º do RJRAN, o aresto em recurso incorreu em flagrante erro de julgamento e numa clara violação das regras que presidem à distribuição do ónus da prova (v. art° 342° do CCivil), uma vez que por força do princípio da presunção da validade dos actos administrativos é o Autor que tem de demonstrar e comprovar os factos integrantes do seu direito, daí resultando que só se o Ministério Público tivesse provado que existia outra alternativa fora da área da RAN, que o contra-interessado não estava numa situação de insuficiência económica ou que tinha uma outra habitação, é que o Tribunal a quo poderia considerar violado tal normativo e declarar nulos os actos impugnados.

6ª Consequentemente, é inquestionável não haver a mínimo prova em como o parecer favorável emitido pela Entidade Regional da Reserva Agrícola Nacional do-Centro em 1/1112013 e os actos proferidos pelo Vereador do Município a legalizar a obra eram desconformes com o permitido pelo art° 22º do RJRAN, pelo que, não havendo qualquer prova em como existia outra alternativa fora da área da RAN, que o contra-interessado não estava numa situação de insuficiência económica ou que tinha uma outra habitação, não poderia o Tribunal a quo ter declarado a nulidade de todos aqueles actos.

Contra-alegou o recorrido autor, concluindo: 1. Na presente ação administrativa especial é formulado o pedido da nulidade: a) - das Deliberações da Entidade Regional da Reserva Agrícola Nacional do Centro (ERRANC) nº 528/2013, de 18 de Setembro de 2013, e nº 604/2013, de 01 de Novembro de 2013, reiterada pela deliberação nº 223/2014, de 06 de Maio de 2014, e b) - dos Despachos de 23 de Outubro de 2014 e de 29 de Janeiro de 2015, do Senhor Vereador da Câmara Municipal (...) R., com competência subdelegada.

  1. As nulidades referidas em a) verificam-se, a primeira, por consubstanciar a revogação de um ato nulo, por impossibilidade jurídica do seu objeto (cfr. arts. 133º, nº 2, al. c) e 139º, do CPA) e a segunda, pela emissão de parecer favorável à pretensão de utilização não agrícola de Área integrada na Reserva Agrícola Nacional (RAN), em violação do disposto nos arts. 38º e 22º, nº 1, al. c), do Regime Jurídico da Reserva Agrícola Nacional.

  2. - As nulidades referidas em b) verificam-se por consubstanciarem atos consequentes de atos nulos (cfr. art. 133º, nº 2, al. i), do CPA, em vigor à data dos factos.

  3. Dispõe o Regime Jurídico da RAN (RJRAN), no seu art. 20º, nº 1, que as áreas da RAN devem ser afetas à atividade e são áreas non aedificandi, numa ótica de uso sustentado e de gestão eficaz do espaço rural.

  4. Estabelecendo o art. 21º, alínea a), que são interditas todas as ações que diminuam ou destruam as potencialidades para o exercício da atividade agrícola das terras e solos da RAN, tais como (…) obras de (…) construção ou ampliação, com exceção das utilizações previstas no artigo seguinte.

  5. Ora, art. 22º, nº 1, do RJRAN estatui-se que as utilizações não agrícolas de áreas integradas na RAN só podem verificar-se quando não exista alternativa viável fora das terras ou solos da RAN, no que respeita às componentes técnica, económica, ambiental e cultural, devendo localizar-se nas terras e solos classificados como de menor aptidão, e quando estejam em causa:(…) b) Construção ou ampliação para residência própria e permanente dos proprietários e respetivos agregados familiares, com os limites de área e tipologia estabelecidos no regime de habitação a custos controlados em função da dimensão do agregado familiar, quando se encontrem em situação de comprovada insuficiência económica e não sejam proprietários de outro edifício ou fração para fins habitacionais, desde que daí não resultem inconvenientes para os interesses tutelados pelo presente decreto-lei. (…) 7. Assim, e reportando-nos ao caso dos autos, a ERRANC, ao apreciar toda a documentação do processo administrativo instrutor – processo nº 288/ER-RAN.C/2013 - no sentido de proferir a deliberação de emissão de parecer favorável à utilização não agrícola de área integrada na RAN, teria necessariamente de apreciar da verificação, caso, de todos no os supra indicados requisitos legais.

  6. E sendo indubitável que a ERRANC não apreciou, como devia, tais requisitos legais a Mmª Juiz na sentença recorrida refere que embora conste no processo administrativo, documentação apresentada pelo ora contrainteressado, como seja da insuficiência económica do agregado familiar, não foram verificadas esta ou quaisquer outras condições legais.

  7. Tal referência não consubstancia qualquer erro na apreciação da matéria de facto pela Mmª Juiz já que é indubitável que pese embora constasse do processo administrativo instrutor a insuficiência económica do agregado familiar do contrainteressado, a ERRANC não apreciou tal requisito tal como não apreciou os demais que, diga-se, são de verificação cumulativa.

  8. Como supra se referiu, nos termos do Regime Jurídico da RAN as áreas da RAN são afetas à atividade agrícola e são áreas non aedificandi.

  9. Sendo que as utilizações não agrícolas de áreas integradas na RAN só podem verificar-se: - quando não exista alternativa viável fora das terras ou solos da RAN, no que respeita às componentes técnica, económica, ambiental e cultural, devendo localizar-se nas terras e solos classificados como de menor aptidão; e - quando esteja em causa: - a construção ou ampliação para residência própria e permanente dos proprietários e respetivos agregados familiares; - com os limites de área e tipologia estabelecidos no regime de habitação a custos controlados em função da dimensão do agregado familiar; - quando se encontrem em situação de comprovada insuficiência económica; - não sejam proprietários de outro edifício ou fração para fins habitacionais; - desde que daí não resultem inconvenientes para os interesses tutelados pelo presente decreto-lei.

  10. Assim, a ERRANC, ao proferir, e reiterar a deliberação de emissão de parecer favorável à utilização não agrícola de área integrada na RAN sem apreciar da verificação, no caso de todos aqueles pressupostos, incorreu em violação do preceituado nesse art. 22º, nº 1, al. c), do RJRAN 13. Ou seja, sendo inquestionável de que as obras se localizam em espaço RAN, isto é, em área non aedificandi e não tendo o...

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