Acórdão nº 24527/20.9T8LSB.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 18 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelLUÍS CORREIA DE MENDONÇA
Data da Resolução18 de Novembro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa O A, com sede em Amadora, Portugal, instaurou ação declarativa, com processo comum, contra B [ INTER, com sede em Lisboa, representante em Portugal da Companhia de Seguros Espanhola X ] , pedindo: a)-a condenação da ré a pagar-lhe, a título de danos patrimoniais, o montante global de € 35 519,19 (trinta e cinco mil, quinhentos e dezanove euros e dezanove cêntimos); b)-a condenação da ré a pagar-lhe o montante que venha a ter que suportar com: a reparação dos guarda-lamas das rodas dianteiras do veículo de matrícula 48-T...-30, a reparação do apoio da grelha dianteira do motor, a reparação e afinação da porta do lado do condutor e a substituição do sensor do óleo do motor; c)-a condenação da ré a pagar-lhe juros de mora à taxa legal, calculados sobre os montantes reclamados, desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento.

Alegou, em síntese, que: - é uma sociedade comercial que tem como objeto “transportes internacionais de mercadorias”, exercendo actualmente o transporte de veículos automóveis por vários países da Europa; - é proprietária do veículo com a matrícula 48-T..-30 da marca Renault e do semi reboque AV 56361; - no dia 12 de março de 2019, pelas 10,00 horas, ocorreu um acidente de viação entre o veículo 3934 CCB e o conjunto de veículos da autora; - o conjunto de veículos da autora era conduzido por Sergiu M; - o veículo pesado de mercadorias 3934 CCB era conduzido por Jesus M; - o acidente ocorreu em Espanha, Gasteiz, Vitoria; - em consequência do rebentamento de um pneu, o condutor do veículo 3934 CCB não conseguiu controlar o veículo, vindo a invadir a via de trânsito por onde seguia o veículo da autora e a embater violentamente contra a lateral direita deste; - o acidente de viação deu-se por culpa única e exclusiva do condutor do veículo com a matrícula 3934 CCB; - por contrato de seguro, titulado pela apólice n.º 4......9, a proprietária do veículo 3934 CCB, transferiu para a Companhia de Seguros, representada pela ré, a sua responsabilidade civil por danos causados a terceiros emergentes da circulação do veículo; - em consequência do embate, a autora sofreu danos patrimoniais, que pretende ver ressarcidos com a presente ação.

A ré contestou, invocando a exceção peremptória de prescrição, e, subsidiariamente, por impugnação, peticionando a sua absolvição do pedido.

Alegou, em resumo, o seguinte: - estamos perante obrigações extracontratuais decorrentes de um acidente de viação que ocorreu em Espanha; - a tais obrigações aplica-se a lei espanhola, quer pelo disposto no artigo 4º, n.º 1 do Regulamento (CE) 864/2007 (Roma II), quer pelo disposto no artigo 45º do Código Civil; - o acidente ocorreu em 12 de março de 2019; - a ré e a sua representada aceitaram a responsabilidade, o que foi comunicado à autora por e-mail de 27 de março de 2019; - a seguradora espanhola, representada da ré, pagou a reparação do cabeça-trator TQ e do reboque AV em junho de 2019; - em 27 de março de 2019, a autora reclamou à ré indemnização pela paralisação do seu veículo; - em 2 de julho de 2019, a ré informou a autora que a sua representada não estava disponível para efetuar qualquer indemnização por paralisação; - após essa data a autora não voltou a contactar a ré ou a sua representada, diretamente ou através de mandatário; - em 17 de novembro de 2020, a autora propôs ação judicial; - a ré foi citada em 25 de novembro de 2020; - decorreu mais de um ano desde a comunicação da ré de 2 de julho de 2019 e a data em que a ação foi proposta e a ré foi citada; - nos termos dos artigos 1968º, n.º 2, 1969º e 1963º do Código Civil espanhol, encontra-se prescrito o direito de indemnização da autora relativamente aos danos reclamados na presente ação, pois, para além da propositura da presente ação, não foi praticado pela autora, nem pela ré (e sua representada) qualquer ato interruptivo da prescrição após 2 de julho de 2019.

A autora respondeu à exceção invocada pela ré.

Alegou, em síntese, o seguinte: - o direito invocado pela autora não está prescrito, porquanto a lei aplicável é a portuguesa, - por um lado, verifica-se a exceção contida no artigo 45º, n.º 3 do Código Civil; - a proprietária do veículo com a matrícula 3934 CCB transferiu para a Companhia de Seguros, representada pela ré, a sua responsabilidade civil por danos causados a terceiros emergentes da circulação do veículo; - a ré tem sede na Avª..... ....., n.º ..., ...º andar, em L______; - sendo lesante uma sociedade comercial com sucursal em Portugal, para a qual foi transferida a responsabilidade civil, e lesado um cidadão português, existe razões que apontem para a prevalência, como conexão a atender, da nacionalidade comum, em detrimento da conexão primariamente relevante, o local onde a atividade lesiva teve lugar; - por outro lado, a ordem jurídica comunitária adota como regra geral aplicável em sede de responsabilidade fundada em ato ilícito ou no risco a lei do lugar onde o dano é sofrido, que na maioria dos casos corresponde à lei do país da residência da pessoa lesada; - a presente ação foi intentada em 17 de novembro de 2020 e a citação da ré ocorreu em 25 de novembro de 2020; - nos termos do artigo 498º, n.º 3 do Código Civil, a autora tinha o prazo de cinco anos para intentar a presente ação.

Procedeu-se à realização da audiência prévia.

Foi proferido saneador-sentença que julgou procedente a exceção peremptória de prescrição do direito da autora e, consequentemente, absolveu a ré do pedido.

Inconformada, interpôs a autora A competente recurso, cuja minuta concluiu da seguinte forma: «I.–Conforme resultou do Acórdão do Tribunal de Justiça (Sexta Secção) de 31 de janeiro de 2019, proferido no âmbito do processo C-149/18, cuja cópia se anexa: “Decorre da decisão de reenvio que o artigo 11.º, n.º 1, alínea b), do Decreto-Lei n.º 291/2007 dispõe que, relativamente aos acidentes ocorridos no território dos Estados que tenham aderido ao Acordo sobre o Espaço Económico Europeu, a obrigação de indemnizar estabelecida na lei aplicável ao acidente é substituída pela lei portuguesa sempre que esta estabeleça uma cobertura superior. Em aplicação do artigo 498.º, 1, do Código Civil, o prazo de prescrição da ação de indemnização pelos danos resultantes de um sinistro é de três anos, enquanto o prazo previsto no direito espanhol, que o órgão jurisdicional de reenvio considera aplicável no caso em apreço, por força do artigo 4. o do Regulamento Roma II, é de um ano.

II.–E conforme resulta em conclusão desse Acórdão pode o órgão jurisdicional chamado a conhecer do processo “… com base numa análise circunstanciada dos termos, da sistemática geral, dos objetivos e do contexto da adoção dessa disposição, que ela assume uma importância tal na ordem jurídica nacional que justifica que se afaste da lei aplicável, designada nos termos do artigo 4.º daquele regulamento.

III.–A Directiva 2009/103/CE de 16 de setembro de 2009, relativa ao seguro de responsabilidade civil que resulta da circulação de veículos automóveis e à fiscalização de cumprimento da obrigação de segurar esta responsabilidade, estipula no considerando (34) que: A pessoa lesada por um acidente de viação que caia no...

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