Acórdão nº 449/20.2T8VRL-C.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelPINTO DE ALMEIDA
Data da Resolução03 de Novembro de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam em conferência no Supremo Tribunal de Justiça: SOCIEDADE TURÍSTICA E HOTELEIRA VALE DO DOURO, SA e outros vieram interpor recurso de revista do Acórdão da Relação de Guimarães de 22.04.2021, que julgou improcedente a apelação, mantendo a decisão proferida na 1ª Instância.

No Supremo foi proferido despacho liminar, com esta fundamentação: "Estamos no âmbito de um procedimento cautelar de arresto, tendo o recurso por fundamento a contradição de acórdãos, nos termos dos arts. 370º, nº 2 e 629º, nº 2, al. d), do CPC.

Com efeito, sustentam os recorrentes que se verifica contradição entre o Acórdão recorrido e os Acórdãos a seguir indicados, quanto às questões assim identificadas (adiante concretizadas): - Acórdão da Relação de Évora de 05.05.2015 (P. 1087/05): (1) Inutilidade superveniente da lide; (2) Ilegitimidade activa; (3) Caducidade da acção; - Acórdão da Relação de Lisboa de 30.11.2016 (P. 32648/15): (4) Prescrição; (7) Posse/usucapião; (8) Simulação; - Acórdão da Relação do Porto de 14.06.2017 (P. 11257/15): (5) Falta de interpelação dos devedores; - Acórdão da Relação de Coimbra de 04.04.2017 (P. 1049/11): (6) Não renúncia à excussão prévia; - Acórdão da Relação do porto de 07.12.2018 (P. 430/14): (9) Prova ilegal.

Teve-se em atenção a redução do número de acórdãos, operada pelos recorrentes, a convite do Tribunal, no requerimento de 12.07.2021.

Com excepção do último, os recorrentes juntaram certidões desses acórdãos fundamento e do respectivo trânsito em julgado.

A recorrida sustenta que não se verifica a contradição invocada (afirmando genericamente que inexiste identidade das situações de factos analisadas nos acórdãos indicados).

Cumpre aferir da admissibilidade do recurso.

Requisito dessa admissibilidade – para além do mesmo quadro normativo e de não existir sobre a questão decisão uniformizadora do Supremo – que os dois acórdãos tenham decidido de forma divergente a mesma questão fundamental de direito.

Como tem sido reiteradamente decidido por este Tribunal a oposição de acórdãos quanto à mesma questão fundamental de direito verifica-se quando a mesma disposição legal se mostre, num e noutro, interpretada e/ou aplicada em termos opostos, havendo identidade de situação de facto subjacente a essa aplicação. A oposição ocorrerá, pois, quando um caso concreto (constituído por um similar núcleo factual) é decidido, com base na mesma disposição legal, num acórdão num sentido e no outro em sentido contrário.

Vejamos então.

  1. No que respeita ao primeiro grupo de questões – Inutilidade superveniente da lide, ilegitimidade activa; caducidade da acção – vem invocada a contradição com o Acórdão da Relação de Évora de 05.05.2015.

    Afigura-se-nos, porém, que não existe essa oposição de julgados: claramente no que respeita às duas últimas questões, mas também quanto à primeira, relativa à inutilidade superveniente.

    Existe, com efeito, uma diferença essencial entre as situações analisadas nos acórdãos em confronto, que tem a ver com a data da prática dos actos que se pretenderam impugnar em cada uma das acções.

    No caso do Acórdão fundamento, os autores haviam pedido a declaração de nulidade dos negócios que foram celebrados entre os réus, dentro dos dois anos anteriores ao início do processo de insolvência da 1ª ré, em momento em que não se havia esgotado ainda o prazo de dois anos previsto no art.º 123º, nº 1, do CIRE.

    Afirmou-se que, nesse caso, a lei prevê um regime específico para a obtenção do efeito pretendido: a resolução em benefício da massa insolvente ou a impugnação pauliana e é o administrador da insolvência (AI) quem detém, exclusivamente, legitimidade activa para declarar tal resolução.

    No Acórdão recorrido também se reconheceu que o CIRE prevê um regime específico de conservação da garantia patrimonial da massa insolvente, que é a resolução dos negócios em benefício da massa insolvente e que o exercício desta pertence exclusivamente ao AI.

    Ponderou-se, porém, que a resolução só pode operar em relação a actos praticados dentro dos dois anos anteriores à data do início do processo de insolvência e não pode ser efectuada depois de decorridos dois anos sobre a data da declaração de insolvência (art.º 123º, nº 1, do CIRE).

    Daí que, no caso, o AI não pudesse já recorrer a tal meio de conservação da garantia patrimonial.

    Concluiu-se, por isso, que, não tendo o AI procedido à resolução em benefício da massa, não ficava vedada a possibilidade de os credores recorrerem à acção de impugnação do acto, através da invocação da sua nulidade e ao prévio procedimento de arresto sobre bens de terceiro para acautelar a garantia patrimonial.

    Do que fica referido decorre também que não existe qualquer contradição entre os aludidos acórdãos no que respeita à ilegitimidade activa.

    Devendo cingir-nos, neste momento, a essa questão...

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