Acórdão nº 674/21.9T8BCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Novembro de 2021
Magistrado Responsável | MARIA LEONOR CHAVES DOS SANTOS BARROSO |
Data da Resolução | 04 de Novembro de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
I.
RELATÓRIO J. F.
, residente em …, Avenue …, em França, veio requerer a declaração de executoriedade de uma sentença proferida em 11/09/2003 pelo Conseil de Prud’hommes de Longjumeau (Tribunal do Trabalho de Longjumeau), no processo n.º RG nº 03/00127, na qual se condenou Y & Filhos, Lda.
, pessoa coletiva n.º ........., com sede em Torre …, freguesia de ..., concelho de Barcelos, a pagar-lhe as quantias de 5.107,00€ a título de salários e 510,72€ a título de subsídios de férias.
Foi proferida a seguinte decisão (ora alvo de recurso): “O tribunal é o competente – art.º 39.º e anexo II do Regulamento (CE) n.º 44/2001 do Conselho, de 22 de dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (publicado no Jornal Oficial das Comunidades Europeias n.º L 12, de 16/01/2001) – aplicável por força do disposto no art.º 66.º, n.º 2 do Regulamento (UE) n.º 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2012, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (publicado no Jornal Oficial da União Europeia n.º L 351, de 20/12/2012).
Não se verifica qualquer das situações previstas nos arts. 34.º e 35.º do Regulamento n.º 44/2001.
Mostram-se cumpridos os trâmites previstos nos arts. 53.º e ss. do citado Regulamento.
Assim, nos termos do disposto no art.º 41.º do Regulamento n.º 44/2001, declaro executória a sentença proferida em 11/09/2003 pelo Conseil de Prud’hommes de Longjumeau (Tribunal do Trabalho de Longjumeau), no processo n.º RG nº 03/00127, na qual se condenou Y & Filhos, Lda., pessoa coletiva n.º ........., com sede em ..., freguesia de ..., concelho de Barcelos, a pagar a J. F., residente em …, Avenue …, em França, as quantias de 5.107,00€ a título de salários e 510,72€ a título de subsídios de férias.
Sem custas – art.º 52.º do Regulamento n.º 44/2001.
Notifique o requerente e a requerida, esta última com cópia da decisão – art.º 42.º do Regulamento n.º 44/2001 FOI INTERPOSTO RECURSO PELA REQUERIDA Proferido despacho de aperfeiçoamento das prolixas conclusões e, apresentadas novas conclusões, a requerida suscita as seguintes questões- EXTRACTOS DAS CONCLUSÕES: “……A decisão recorrida enferma de erro na aplicação e na interpretação do direito por manifesta violação do direito de defesa, do contraditório e da igualdade de partes, do direito de acesso ao direito e à justiça (ínsitos no art. 20º, da C.R.P) e, bem assim, por manifesta contrariedade com a ordem pública, o que configura fundamento de revogação da sentença de declaração de executoriedade ora proferida, em virtude do vertido no art. 45.º, n.º 1 e o art. 34.º, n.º 1 e 2, ambos do Regulamento (CE) 44/2001 de 22/12/2000….
A sentença proferida contra a Recorrente no Tribunal de Trabalho de Longjumeau, França, não pode ser declarada executória, porquanto o ato que iniciou a instância não foi comunicado à Recorrente, em tempo útil e de modo a permitir-lhe a defesa, o que configura fundamento de revogação da sentença de declaração de executoriedade ora proferida, em virtude do que dispõe o art. 45.º, n.º 1 e o art. 34.º, n.º 2, ambos do Regulamento (CE) 44/2001, de 22/12/2000.
A Recorrente não foi, nem demandada, nem condenada no âmbito do processo RG n.º 03/00127, antes uma sociedade de direito francês.
O processo RG n.º 03/00127 foi proposto contra uma sociedade de direito estrangeiro, matriculada no Registo do Comércio e das Sociedades, possuindo estabelecimento principal em França, na …. Logo, A Recorrente é parte ilegítima na presente demanda.
O reconhecimento e a declaração de executoriedade da sentença proferida em 11/09/2003 pelo Conseil de Prud’hommes de Longjumeau, no âmbito do processo n.º RG n.º 03/00127, foi feita sem que tenha sido notificado ou comunicado o ato que iniciou a instância à Recorrente e Apelante, bem como não foi, nem notificado, nem comunicado à Recorrente e Apelante a decisão proferida. Na verdade, A Requerente e Apelante só teve conhecimento da sentença contra si proferida se não com a notificação da decisão que ora impugna ….De acordo com o Regulamento (CE) n.º 44/2001 pode fundamentar o recurso a falta de qualquer dos requisitos de reconhecimento da decisão, cfr. artigos 34.º e 35.º, do Regulamento (CE) n.º 44/2001.
….Conforme consta da certidão judicial traduzida junta aos Autos, a Recorrente não foi, nem citada do ato que determinou o início da instância, nem tão pouco da decisão proferida no âmbito do processo n.º RG n.º 03/00127, datada de 11/09/2003.
A este propósito refira-se que de acordo com Regulamento (CE) n.º 805/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de Abril de 2004, que criou o título executivo europeu para créditos não contestados, não é admitida a citação ou notificação do documento que dá início à instância ou ato equivalente feita por algum dos meios estabelecidos no n.º 1 do art.º 14.º, “se o endereço do devedor não for conhecido com segurança” – cfr. o n.º 2.
Cumpre ainda, a propósito, ter presente o que dispõe o art.º 19.º do mesmo Regulamento quanto às normas mínimas de revisão em casos excecionais: uma decisão só pode ser certificada como Título Executivo Europeu se o devedor tiver direito, segundo a legislação do Estado-Membro de origem, a requerer uma revisão da decisão quando “o documento que dá início à instância ou acto equivalente ... tiver sido notificado por um dos meios previstos no art.º 14.º” e “a citação ou notificação não tiver sido efectuada em tempo útil para lhe permitir preparar a defesa, sem que haja qualquer culpa da sua parte” (pontos i) e ii) da alínea a)).
…No que respeita à ordem jurídica interna portuguesa, são os princípios do contraditório e da igualdade das partes, consagrados, respetivamente, nos arts. 3.º e 4.º, do CPC. que saíram inobservados e consequentemente violados.
A Recorrente não teve conhecimento pessoal do conteúdo da ação contra si proposta e da sentença condenatória contra si proferida a tempo dela recorrer no Tribunal do Estado-Membro de origem. Logo, No presente caso verificam-se as situações referidas nos n.º 1 e 2, do art.º 34.º do Regulamento (CE) n.º 44/2001….
…Nos termos do n.º 5, do art.º 10º, do CPC, toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da ação executiva.
Reporta-se a condição necessária da ação executiva, ao facto de não existir execução sem que exista o atinente título.
Na ação executiva a questão da legitimidade resolve-se no confronto entre as partes e o título executivo: têm legitimidade como exequente e executado, respetivamente, quem no título figura como credor e como devedor.
A aqui Recorrente e Apelante não consta do título executivo como devedora, logo a aqui Recorrente e Apelante é parte ilegítima na ação.
A decisão relativamente à qual se declarou o exequatur foi proferida contra uma sociedade de direito francês, como muito bem consta do processo n.º RG n.º 03/00127, o qual correu termos no Conseil de Prud’hommes de Longjumeau, e não contra a aqui Recorrente.
O processo RG n.º 03/00127 foi proposto contra uma sociedade de direito estrangeiro, matriculada no Registo do Comércio e das Sociedades, possuindo estabelecimento principal em França, na .... Logo, A aqui Recorrente não foi, nem demandada, nem condenada na ação em que a sentença foi proferida.
A Recorrente é parte ilegítima na presente ação.
… …revogando a Decisão recorrida quanto à Recorrente e recusando-se a declaração de exequibilidade da decisão proferida em 11/09/2003 pelo Conseil de Prud’hommes de Longjumeau, no âmbito do processo n.º RG n.º 03/00127, farão Vossas Excelências a habitual e costumada JUSTIÇA…” Com as alegações de recurso a requerida juntou um documento alegadamente destinado a comprovar que não foi citada na acção que correu em França, mas sim outra sociedade, e que é parte ilegítima na acção que nos ocupa (vd art. 17 das alegações). Refere, em abono, no artigo 16 das alegações que: ”O processo RG n.º 03/00127 foi proposto contra uma sociedade de direito estrangeiro, matriculada no Registo do Comércio e das Sociedades, possuindo estabelecimento principal em França, na ..., cfr. doc. 1, que ora se junta e se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos….” CONTRA-ALEGAÇÕES DA REQUERENTE/RECORRIDA-EXTRACTOS: 1) … Alega a Recorrente que a sociedade Y & Filhos, Lda. não é a mesma pessoa jurídica que foi parte (Ré) no processo RG n.º R 03/00127 que correu os seus termos no “Conseil de Prud’hommes de Longjumeau”, sendo esta última “uma sociedade de direito estrangeiro matriculada no Registo do Comércio e das Sociedades, possuindo estabelecimento principal em França, na ...”.
2) Contudo tal alegação, quanto à diversidade de pessoas jurídicas não é verdadeira, como facilmente se constata através de consulta da certidão comercial francesa (Documento 1 que junta e cujo teor considera integralmente reproduzido).
3) Na verdade, a pessoa coletiva/Ré que foi citada naquele Tribunal do Trabalho francês é a mesma contra quem foi proposta a presente ação neste Juízo de Trabalho, 4) A qual, para poder exercer uma atividade permanente naquele país estrangeiro, como efetivamente pretendeu...
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