Acórdão nº 2535/10.8 BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 28 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelPATRÍCIA MANUEL PIRES
Data da Resolução28 de Outubro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I-RELATÓRIO A DIGNA REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA (doravante Recorrente ou DRFP), veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A., tendo por objeto o ato de liquidação adicional de Imposto Municipal de Transações (IMT) e de Imposto de Selo (IS), referente ao prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Caneças sob o artigo 42.., nos valores de €3796,69 e €431,80, respetivamente.

A Recorrente apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem: “ I – Visa o presente recurso reagir contra a douta decisão proferida na impugnação judicial deduzida por A., a qual foi julgada procedente e, em consequência, foi a Fazenda Pública condenada no pedido de anulação das liquidações de IMT e Selo com os n.ºs 2877518 e 2010 11000581572, nos valores de €3.796,69 e €431,80, com a respetiva restituição dos montantes indevidamente pagos, por considerar que as aludidas liquidações “padecem de falta de fundamentação formal”; II - A Fazenda Pública louva-se no Parecer do DMMP, com o qual concorda na íntegra e para o qual remete a sua fundamentação, considerando-o por reproduzido para os efeitos legais.

III - Como se demonstrou, e consta dos elementos juntos aos autos, o Recorrido/Impugnante tinha conhecimento dos fundamentos, quer de facto, quer de direito, subjacentes às liquidações, nomeadamante, através da cópia do relatório de entregue em conjunto da certidão emitida nos termos do art. 37º do CPPT.

IV - Não pode a Fazenda Pública aceitar que o Tribunal a quo tenha feito “tábua rasa” dos fundamentos constantes dos autos para concluir, que a AT se limitou a invocar correções efetuadas em sede de ação inspetiva realizada a outro sujeito passivo, sem que o Recorrido/Impugnante tenha tido conhecimento do seu teor, sem que tal alguma vez tenha sido transmitido ao Recorrido/Impugnante, ou que a AT se tenha limitado a “lançar” afirmações meramente genéricas sem conteúdo fático; V – Veja-se que o Recorrido/Impugnante foi sempre chamado a participar na decisão, tendo-lhe sempre sido facultados os elementos de facto subjacentes às liquidações postas em crise, conforme resulta nomeadamente de fls. 102, 203, 107 e 108 dos autos; VI - Ainda no decurso do procedimento inspetivo realizado à sociedade E., S.A., foi o Recorrido/Impugnante notificado para apresentar documentos e elementos que pudessem permitir aquilatar do real valor de aquisição da fração autónoma adquirida àquela entidade.

VII - O Recorrido/Impugnante foi notificado para o exercício de audição prévia, nos termos do art. 60º da LGT, acerca da intenção de se proceder à liquidação adicional de IMT e IS, tendo-lhe sido facultado o projeto de decisão sobre o qual, após pedir prorrogação para exercer o contraditório, nada disse.

VIII - O Recorrido/Impugnante requereu, ainda, nos termos do art. 37º do CPPT, a passagem de certidão, com a fundamentação dos atos, a qual foi emitida; IX - Conjuntamente com a certidão emitida nos termos do art. 37º do CPPT, junta aos autos, foi enviada cópia do relatório na sequência da ação inspetiva realizada à sociedade E., S.A., conforme decorre do ponto 1. da mesma:“Junta-se cópia do relatório na sequência da acção inspectiva ao sujeito passivo E., S.A.,, NIPC 50009…., aos exercícios de 2005 e 2006. Neste relatório encontra-se a demonstração da determinação do novo valor de aquisição; (...) (negrito nosso) X - O Recorrido/Impugnante teve, pois e sempre, perfeito conhecimento de toda a fundamentação do ato, nomeadamente, as razões de facto e de direito que presidiram à decisão, as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo que estive na origem das liquidações controvertidas.

XI - O Recorrido/Impugnante não podia, pois, desconhecer que as correções efetuadas pela AT resultaram quer de autodenúncias de outros adquirentes, quer na existência de segundos mútuos efetuados, a partir dos quais foram presumidos novos valores de aquisição, com base no valor de aquisição por m2, aplicado à permilagem de cada uma das frações e respetiva área.

XII – O Recorrido/Impugnante deduziu, contra as liquidações em causa, reclamação graciosa n.º 4227201004005066 para IMT e n.º 4227201004005074 para IS, as quais foram arquivadas em virtude da apresentação da impugnação judicial de cuja decisão ora se recorre.

XIII - O Tribunal a quo, na sua decisão, não podia deixar de considerar e valorar todas estas questões.

XIV - A fundamentação dos atos administrativos em geral, constitui um imperativo constitucional, expressamente, previsto no nº 3, do art.º 268º da CRP e, no âmbito do direito tributário, tal exigência de fundamentação dimana, diretamente, da norma do art.º 77º da LGT.

XV – A fundamentação das correções operadas pela AT e que determinaram as liquidações adicionais controvertidas, exprime, em termos claros, suficientes, congruentes e inteligíveis, o critério legal e a motivação das mesmas, ficando, assim, cumprida a dupla função de controlo endógeno e exógeno da legalidade de tais atos tributários, não ocorrendo em consequência, a insuficiência ou a falta de fundamentação.

XVI - A fundamentação dos atos tributários em causa observou as características legais e dele se extrai, indubitavelmente, qual o percurso cognoscitivo e valorativo seguido, já que, quer por parte dos SIT, quer por parte das notificações efetuadas pelo Serviço de Finanças de Odivelas, foram identificados os motivos e critérios determinantes da decisão, ficando, inclusive, o destinatário do ato esclarecido de forma a interpor os meio de defesa ao seu alcance.

XVII - Face ao exposto, e salvo o devido respeito, entende a Fazenda Pública que a douta sentença recorrida ao julgar procedente a impugnação judicial, enferma de erro de apreciação da prova e de erro de interpretação de lei, violando o art. 77º da LGT.

Nestes termos, em face da motivação e das conclusões atrás enunciadas, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença ora recorrida, com as legais consequências, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA. “ *** O Recorrido, devidamente notificado, contra-alegou, remetendo para o já expendido no processo, e no sentido da manutenção da decisão recorrida.

*** O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

*** Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

*** II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto: “Compulsados os autos e analisada a prova produzida, dão-se como provados, com interesse para a decisão, os factos infra indicados:

  1. Em 04.11.2005, junto do Cartório Notarial de Lisboa de J. S., o Impugnante declarou adquirir à sociedade “E., S.A.,.”, a fração autónoma descrita pela letra “F” do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Caneças, concelho de Odivelas, sob o artigo provisório nº 42.., pelo preço de 125.000,00€ (cfr. fls. 110 a 116 dos autos).

  2. Para a aquisição referida na alínea antecedente, o Impugnante celebrou contrato de mútuo pelo mesmo valor de 125.000,00€, igual ao da aquisição, junto do B., S.A. (cfr. fls. 110 a 116 dos autos).

  3. Através do ofício nº 079770 de 18.09.2009 foi o Impugnante notificado do seguinte: “Assunto: Acção de controle de transacções de imóveis efectuadas nos anos de 2005 e 2006 NOTIFICAÇÃO Vimos informar V. Exa que, se encontra em curso na Inspecção Tributária desta Direcção de Finanças de Lisboa, uma acção de controle da veracidade dos valores nas transações de imóveis efectuadas pelo sujeito passivo E., S.A.,, NIF 600 098 …, sendo de salientar que a ausência de veracidade em declarações prestadas que vise a não liquidação, entrega ou pagamento da prestação tributária, corresponde a infracção que pode ser tipificada como crime de fraude fiscal, nos termos do artigo 103.° do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT).

    Ao abrigo do dever de colaboração previsto no n.° 4 do artigo 59.º da Lei Geral Tributária (LGT), fica V. Exa. por este meio notificado para remeter a estes Serviços sitos na morada indicada em rodapé (…), os seguintes elementos: 1. Fotocópia do contrato promessa de compra e venda e da escritura, respeitante à aquisição do imóvel inscrito na matriz sob o artigo 42 da freguesia de Caneças em que adquiriu a fracção F, à empresa acima mencionada; 2. Cópia dos meios de pagamento utilizados na respectiva aquisição, nomeadamente cheques emitidos, prova documental no caso de ter sido efectuada por transferência bancária, ou justificativo de qualquer outro meio de pagamento utilizado; 3. Confirmar o valor que declarou aquando da aquisição para efeitos de IMI ou, no caso de haver divergência entre o valor da escritura e o preço efectivo, indicar qual. Neste caso, apresentar o comprovativo da regularização do IMT adicional; 4. Caso tenha hipotecas bancárias sobre o imóvel em valor superior ao da escritura, justificar a...

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