Acórdão nº 00328/15.5BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 22 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução22 de Outubro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO P., residente na Rua (…), instaurou ação administrativa especial contra o Presidente da Câmara Municipal (...), pedindo: “Julgar procedente a presente acção por provada e em consequência declarar nulo o despacho do Senhor Presidente da Câmara Municipal por aqueles vícios de falta de fundamentação e violação do nº 2 artº 106ºdo RJUE, condenando o Presidente da Câmara Municipal (...) a prosseguir o procedimento com o conjunto de actos necessários à verificação da possibilidade ou não de legalização das obras ainda que corrigidas, com a devida fundamentação”.

Por sentença proferida pelo TAF de Mirandela foi julgada improcedente a acção e absolvido o Réu do pedido.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, o Autor formulou as seguintes conclusões: A Apesar lhe serem concedidas duas oportunidades para o recorrente requerer a legalização da construção, uma em 9.05.2014 e outra em 19.01.2015, e o recorrente nada fazer nessas duas ocasiões.

B Em 14.04.2015, o ora recorrente foi notificado para se pronunciar em sede de audiência prévia sobre a proposta de demolição.

C Nada legalmente obrigava a que o ora recorrente fosse novamente ouvido em sede de audiência prévia.

D E tendo sido novamente concedido ao recorrente o direito de audiência não pode coartar-se esse direito, pois que foi o próprio Réu/recorrido que concedeu ao recorrente esse direito.

E Não se compreende a falta de fundamentação da decisão do Reu/recorrido, remetendo para uma informação e projecto de decisão anterior e o mais grave, considerando que o exercício do direito de audição de interessados exercido pelo ora recorrente “não passam de mero expediente para atrasar o processo de demolição há muito determinado”.

F Tal decisão é nula por absoluta falta de fundamentação, contrariamente ao defendido na sentença a quo.

G A fundamentação constante da notificação datada de 19.05.2015 limita-se a dizer que a referida construção “não só não constitui um anexo ... como acima de tudo viola pelo seu enorme impacto visual de agressão paisagística todas as normas estéticas e urbanísticas particularmente as que se prendem com as constantes dos Núcleos de Desenvolvimento Turístico onde a pretensão se enquadra”.

H Refere o n° 1 do art° 125º do CPA, que a fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão.

I E o n° 2 do mesmo artigo 125º diz que equivale a falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto.

J Ora a decisão em litígio viola precisamente as exigências do art° 125º do CPA, contrariamente ao defendido na douta sentença a quo.

K Não basta dizer que “acima de tudo viola pelo seu enorme impacto visual de agressão paisagística todas as normas estéticas e urbanísticas particularmente as que se prendem com as constantes dos Núcleos de Desenvolvimento Turístico onde a pretensão se enquadra.” L Tinha que concretizar em que se traduz a violação pelo “enorme impacto visual de agressão paisagística todas as normas estéticas e urbanísticas particularmente as que se prendem com as constantes dos Núcleos de Desenvolvimento Turístico onde a pretensão se enquadra.” M Não se sabe quais são as normas estéticas e urbanísticas constantes dos Núcleos de Desenvolvimento Turístico onde a pretensão do recorrente se enquadra.

N Não pode pura e simplesmente fazer-se apelo como foi feito a um enorme impacto visual de agressão paisagística que viola todas as normas estéticas e urbanísticas, sem esclarecer no concreto caso em que se traduz o mesmo.

O Como se pode dizer que uma construção em bruto, praticamente na sua fase inicial, ocupando 40 m2, quando no local até pode ir aos 50 m2, não tendo mais que 2 a 2,5 metros de altura, em que a cobertura ainda nem foi efectuada, em que as paredes podem ser revestidas de material típico do local (granito), tem ou terá um impacto visual e de agressão paisagística e todas as normas estéticas e urbanísticas particularmente as que se prendem com as constantes dos Núcleos de Desenvolvimento Turístico onde a pretensão se enquadra.

P Estamos perante uma obscuridade ou insuficiência que não esclarecem concretamente a motivação do acto, que consubstancia nos termos do art° 125º do CPA uma falta de fundamentação, contrariamente ao defendido na douta sentença a quo.

Q Mas, caso se entenda que existe e ainda que é valida uma remissão para a fundamentação do despacho datado de 19.05.2015, sempre se dirá que aquela fundamentação é ilegal e violadora da lei, nomeadamente o disposto no n° 2 do art° 106º do RJUE.

R Refere o n° 2 do art° 106º do RJUE que a demolição pode ser evitada se a obra for susceptível de ser licenciada ou autorizada ou se for possível assegurar a sua conformidade com as disposições legais e regulamentares que lhe são aplicáveis mediante a realização de trabalhos de correcção ou de alteração.

S Ou seja, a demolição só pode ser ordenada se de todo for impossível assegurar a sua conformidade com as disposições legais e regulamentares que lhe são aplicáveis.

T Estando a construção numa fase muito inicial claramente que a mesma pode ser licenciada ou autorizada assegurando a sua conformidade com as disposições legais e regulamentares que lhe são aplicáveis mediante a realização de trabalhos de correcção ou de alteração, ou impondo o cumprimento de determinados requisitos para que a referida construção não tenha impacto visual e de agressão urbanística, nomeadamente limitações à altura, ao material e forma da cobertura e aos materiais de revestimento exterior do anexo em causa, e desta forma cumprir o estipulado no n° 2 do art° 106 do RJUE.

U A demolição apenas pode ser ordenada em caso de absoluta impossibilidade de cumprimento das normas legais e regulamentares.

V Ora, no caso dos autos em não há qualquer fundamentação e justificação para a impossibilidade de cumprimento das normas legais.

Y Violando-se assim o disposto no nº 2 do artº 106º do RJUE, contrariamente ao defendido na sentença.

Dando provimento ao presente recurso revogando e substituindo a decisão do Tribunal a quo por outra no sentido de declarar nulo o despacho do Senhor Presidente da Câmara Municipal por aqueles vícios de falta de fundamentação e violação do nº 2 artº 106º do RJUE, condenando o Presidente da Câmara Municipal (...) a prosseguir o procedimento com o conjunto de actos necessários à verificação da possibilidade ou não de legalização das obras ainda que corrigidas, com a devida fundamentação, Farão JUSTIÇA! O Réu juntou contra-alegações, concluindo: 1. Inexiste, assim, qualquer violação do artigo 106.º, n.º 2 do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, visto que a ordem de demolição foi antecedida de apreciação técnica sobre a possibilidade de a construção satisfazer ou poder vir a satisfazer os requisitos legais e regulamentares.

  1. Tal apreciação técnica conclui pela inviabilidade de legalização da construção, sendo que o Autor não logra demonstrar o desacerto ostensivo ou grosseiro do critério técnico utilizado.

  2. A construção em causa não foi erigida no prédio onde o edifício principal está implantado, pelo que a necessidade de garantir a adequada inserção paisagística e o respeito pelo espaço arquitetónico envolvente aumenta consideravelmente.

  3. Tais fundamentos são claros, objectivos e apreensíveis por qualquer homem colocado nas concretas circunstâncias do Autor.

  4. A fundamentação utilizada não é abstrata nem genérica, sendo certo que o Autor podia ter utilizado todos meios legais no sentido de afastar a mesma, mas parece limitar-se a exigir a “fundamentação da fundamentação”.

  5. Inexiste fundamento para anular o ato impugnado, pelo que tal deve manter-se na ordem jurídica.

    Termos em que, não se divisando nenhum desacerto na decisão recorrida, resta considerar, na nossa opinião, o recurso improcedente, assim se fazendo justiça.

    O Senhor Procurador Geral Adjunto, notificado nos termos e para os efeitos do artigo 146º/1 do CPTA, emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.

    Cumpre apreciar e decidir.

    FUNDAMENTOS DE FACTO Na decisão foi fixada a seguinte factualidade: 1) Pela apresentação n.º 3927, de 25 de setembro de 2009, na conservatória do registo predial de (...), encontra-se registado em nome de P. e S. o prédio rústico sito em (…), inscrito na matriz sob o n.º 416 (fls. 60 e 61 do processo administrativo e fls. 49 e 96 do suporte físico do processo).

    2) Pela apresentação n.º 3927, de 25 de setembro de 2009, na conservatória do registo predial de (...), encontra-se registado em nome de P. e S. o prédio urbano sito em (…), inscrito na matriz sob o n.º 6 e descrito sob o n.º 156 (fls. 46 e 97 do suporte físico do processo).

    3) Os prédios identificados em 1) e 2) são contíguos, embora separados por um caminho público (por confissão).

    4) O prédio urbano identificado em 2) não possui qualquer logradouro, sendo integralmente ocupado pela edificação (por confissão).

    5) Em maio de 2014, P., iniciou uma construção, com a área de 40 m2, no “Lugar (…)”, freguesia de (...), (...), no prédio identificado em 1) (por confissão).

    6) P. não obteve licenciamento nem procedeu à comunicação prévia da construção aludida em 5) (por confissão).

    7) Em 7 de maio de 2014, o fiscal de obras da Câmara Municipal de (...) elaborou uma participação, à qual foi atribuído o registo n.º 7/14, dirigido ao Presidente daquela edilidade, dando-lhe conta que P. tinha iniciado a construção referenciada em 5), sem o respetivo alvará de licenciamento (cfr. fls. 78 e 78 verso do processo administrativo).

    8) Em 7 de maio de 2014, o Presidente da Câmara Municipal decidiu embargar a obra e determinou a suspensão das obras irregulares e fixou, ainda, um prazo de 30 dias para ser requerida a legalização (cfr. fls. 78 verso do processo administrativo).

    9) Em 7 de maio de 2014, a Unidade de Serviços...

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