Acórdão nº 00229/21.8BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 22 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelRicardo de Oliveira e Sousa
Data da Resolução22 de Outubro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:* * I – RELATÓRIO O MUNICÍPIO (...) e G., LDA., devidamente identificados nos autos, vêm interpor RECURSO JURISDICIONAL do (i) despacho do T.A.F. de Viseu de 08.06.2021, na parte que manda desentranhar a resposta do Réu ao incidente de adoção de medidas provisórias e contestação também apresentada pelo Réu relativamente ao processo principal, e, bem assim, porém, restrito ao Município (...), (ii) da decisão judicial promanada na mesma data que julgou procedente o presente incidente de adoção de medidas provisórias e, consequentemente, determinou que o R. e a Contrainteressada G., Lda. se abstenham de executar o contrato de empreitada concursado até ao trânsito em julgado da decisão final do presente processo.

Alegando, o Recorrente MUNICÍPIO (...) formulou as seguintes conclusões: “(…) 1. A entrega da resposta ao incidente de adoção de medidas provisórias e da contestação, ambos com os respetivos anexos, foi feita atempadamente pela Recorrente por correio eletrónico, foi aceite pela secretaria, que notificou os referidos articulados à Autora, aqui Requerida; 2. A autora tomou posição sobre os factos alegados pela recorrente e não acusou qualquer dificuldade ou diminuição das condições de exercício do contraditório; 3. O envio das referidas peças processuais por correio eletrónico não causou qualquer delonga ou atraso no trâmite processual, nem prejudicou ou derrogou qualquer princípio do processo, tais como do contraditório, da transparência, da igualdade das partes ou da boa administração da justiça, nomeadamente quanto à simplicidade ou celeridade processual; 4. A remessa por correio eletrónico das peças processuais era legalmente admitida até 14.01.2020, data da revogação do artigo 10.° da Lei n° 118/2019, de 17 de setembro.

5. A omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declarar expressamente ou quando a irregularidade possa influir no exame ou na decisão da causa, como resulta do artigo. 195° do Código do Processo Civil, aplicável por força do artigo 1.° do CPTA; 6. Nem o artigo 24.° do CPTA, nem qualquer outra norma comina com a nulidade ou com o desentranhamento a falta de entrega de peças processuais através da plataforma SITAF, nem o envio dessas peças por correio eletrónico era suscetível de influir no exame ou decisão da causa.

7. O não envio das peças processuais referidas através da plataforma SITAF constitui uma mera irregularidade processual, que o Senhor Juiz deveria ter convidado a recorrente a suprir, à semelhança do que ocorre com as situações previstas no n° 2 do artigo 87.° do CPTA; 8. A invocação do justo impedimento não é pressuposto do convite para suprir a irregularidade; 9. A prevalência dada à execução formal e a sanção grave e penosa imposta à Recorrente de lhe recusar o exercício do contraditório é manifestamente desproporcionada e inadequada à irregularidade cometida, tendo em vista os princípios de um processo equitativo, para garantia de uma justa composição do litígio, com base na descoberta da verdade material.

10. O despacho recorrido faz uma interpretação inconstitucional das normas vertidas nos artigos 24.°, n° 2 e 87.°, n° 2 e 3 do CPTA, quando interpretadas no sentido de que a apresentação de peças processuais, por outra via que não a plataforma SITAF, constitui ato nulo insanável por convite da parte ao aperfeiçoamento, nos termos do disposto no artigo 87.°, n° 2 e 3 e artigo 7.° - A, ambos do CPTA, por violação do n° 1 e n° 4 do artigo 20° da Constituição da República Portuguesa; 11. O ónus de alegação e prova dos requisitos para o decretamento das medidas provisórias previstas no artigo 103.°-B do CPTA cabe ao requerente dessas medidas; 12. São dois os requisitos estabelecidos no artigo 103.°-B do CPTA, a saber, o perigo de lesão grave e de difícil reparação resultante da constituição de um facto consumado ou de ser impossível retomar o procedimento pré-contratual para determinar o devido adjudicatário, por um lado, e que os danos causados pelas medidas provisórias não sejam superiores aos danos por elas pretendidos evitar.

13. A Recorrida não alegou e, consequentemente, não provou factos suficientes para integrar os requisitos identificados na medida em que alegou o risco de perda dos lucros que auferiria com a execução da empreitada, mas não os quantificou, o que impediu de avaliar a gravidade dos danos e fazer a ponderação dos interesses contrapostos.

14. Nas medidas cautelares, a prova do dano a prevenir não se basta com juízos de mera probabilidade, antes exigindo a demonstração efetiva do dano e o fundado receio que ele se venha a verificar; 15. A alegação genérica pela Recorrida da perda de lucros, sem os quantificar ou demonstrar, não satisfaz a prova de um fundado receio de uma lesão efetiva e séria; 16. Por outro lado, sendo os danos alegadamente receados pela Recorrida, de natureza económica ou financeira, eles são ressarcíveis in natura pela Recorrente, de quem a Recorrida não invocou incapacidade económico-financeira para pagar a eventual correspondente indemnização; 17. A Recorrida não alegou, e consequentemente não provou, como lhe competia, o valor dos danos que pretende precaver com a medida provisória pedida, pelo que era impossível avaliar se esse valor era inferior ou superior aos danos causados à Recorrente com o decretamento da medida cautelar; 18. A Recorrida não alegou, e consequentemente não provou, como lhe competia, os danos que a manutenção da medida provisória causará à Recorrente, impedindo, também desta forma, uma ponderação dos interesses contrapostos; 19. Existem factos públicos e notórios, constantes de documentos e Regulamentos e publicações oficiais, demonstradores que a Recorrente corre um risco sério e fundado de sofrer danos efetivos com a manutenção da medida provisória necessariamente superiores aos que a Recorrida possa sofrer com a não adjudicação da empreitada em causa; 20. À Recorrente foi atribuída uma comparticipação de € 1.178.768,87 (um milhão, setecentos e setenta e oito mil, setecentos e sessenta e oito euros e oitenta e sete cêntimos, ao abrigo do programa FEDER, para financiamento do projeto em que se insere a empreitada, a executar até 31.10.2022, como consta da publicação no site www.Portugal2020.pt; 21. É regulamentar e público e notório que a não conclusão das obras comparticipadas e a não realização da respetiva despesa dentro do prazo contratado, implica a perda irremediável da comparticipação do programa FEDER; 22. O juiz a quo podia, e devia, conhecer estes factos notórios, como também conhece que a ação principal nunca terá decisão transitada em julgado antes de 31.10.2022, pelo que devia ter concluído que a medida provisória fará a Recorrente perder mais de um milhão de euros e o concelho de (...) perder uma infraestrutura de elevada relevância socioeconómica local.

23. As candidaturas a participações ao abrigo do programa FEDER são irrepetíveis, pelo que não é possível recuperar a comparticipação de um projeto não executado ou não executado dentro do prazo do programa de financiamento.

24. O interesse público é de conhecimento oficioso, quando resulta de factos públicos e notórios ou das regras da experiência comum; 25. O Juiz a quo recusou-se a conhecer oficiosamente do interesse público, mas recorreu a presunções processuais para determinar que a Recorrente suportaria um custo “bastante superior”, sem dizer o quê, se a medida não fosse decretada; 26. Embora a falta de resposta ao requerimento de adoção de medidas provisórias, em razão do desentranhamento tenha sido considerada equiparada pelo Tribunal a quo à revelia inoperante, os factos alegados naquele requerimento pela Requerente à aqui Recorrida, foram considerados como não controvertidos e dispensados de prova; 27. É nula, por isso, a prova por confissão, decidida pelo Tribunal a quo, dos factos integradores dos requisitos da medida provisória, que à Recorrida cabia alegar e provar.

28. A situação de revelia verificada nos autos, requeria do juiz um cuidado redobrado na apreciação da prova e um aproveitamento das provas e factos públicos e notórios que servissem à esfera do interesse público.

29. A decisão recorrida violou os artigos 7.°, 7°-A, 24.°, n° 2 e n° 6, 87.°, n° 2 e 3, 103°- B, n° 1 e 2 do CPTA, 140.°, 411.° e 412.° CPC e 20.°, n° 1 e 4 da CRP (…)”.

*Quanto ao seu recurso, concluiu a Recorrente G., Lda.

, nos seguintes termos: “(…)

  1. A douta decisão recorrida que deu a conhecer o desentranhamento dos autos da resposta apresentada pelo Réu no incidente de adoção de medidas provisórias e, bem assim, da contestação apresentada também pelo Réu nos autos principais é uma decisão surpresa para a contra-interessada uma vez...

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