Acórdão nº 02926/11.7BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelAna Patroc
Data da Resolução30 de Setembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:* I. Relatório M., contribuinte n.º (…), com domicílio na Rua (…), interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 20/02/2021, que julgou improcedente a acção administrativa especial, e, em consequência, absolveu o Ministério das Finanças do pedido formulado na presente acção, na qual impugnou o acto de indeferimento do recurso hierárquico interposto do despacho de indeferimento do pedido de enquadramento no regime de contabilidade organizada para efeitos de IRS no ano de 2009 e solicitou a condenação da entidade demandada a proceder ao enquadramento da autora, nesse exercício de 2009, no regime da contabilidade organizada.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso com as conclusões que se reproduzem de seguida: “

  1. A decisão recorrida incorreu em erro de julgamento da matéria de facto, porquanto, para além dos factos que nela foram dados como provados, deveriam igualmente ter sido dados como provados, por interessarem à boa decisão da causa, os seguintes factos alegados pela ora Recorrente nos artigos 47º e 48º da PI da Acção: 1. No exercício de 2009, o rendimento colectável da Autora, tendo sido aplicado o regime simplificado para apurar o rendimento da Cat. B de IRS, cifrou-se em €1.468.207,74 (cfr. art. 47º da PI, 2ª parte); 2. No mesmo exercício de 2009, o rendimento colectável da Autora, caso o rendimento da Cat. B de IRS tivesse sido apurado com base na sua contabilidade, cifrar-se-ia em €762.779,30 (cfr. art. 47º da PI, 1ª parte); 3. Nesse exercício de 2009, tendo o rendimento da Cat. B de IRS da Autora sido apurado através do regime simplificado, o imposto a pagar cifrou-se em €506.540,92 (cfr. art. 48º da PI, 2ª parte); 4. Ainda no mesmo exercício de 2009, se o rendimento da Cat. B de IRS da Autora tivesse sido apurado com base na sua contabilidade, o imposto a pagar cifrar-se-ia em €210.260,98 (cfr. art. 48º da PI, 1ª parte).

  2. Os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida sobre os pontos da matéria de facto impugnados, são constituídos pelos documentos, intitulados “Resultado da Simulação”, que, enquanto documentos nºs 14 e nº 15, foram juntos com a PI da Acção, e que constituem impressões feitas a partir do simulador da AT com os dados da Autora relativos ao ano de 2009, bem como os documentos também juntos com a PI sob os nºs 4 (Declaração Anual IES apresentada pela Autora em 22/09/2010), 5 (Declaração Mod. 3 de IRS da Autora referente a 2009, apresentada em 27/05/2010) e 6 (Nota demonstrativa da liquidação de IRS 2009), e ainda a Declaração Mod. 3 de substituição apresentada pela Autora em 21/09/2010, a fls. 44 do processo administrativo (cfr. facto dado como provado no ponto 20 da Sentença), concretamente: 1. Quanto aos pontos 1. e 3. da conclusão a) supra (valores resultantes da aplicação do regime simplificado ao apuramento do rendimento da categoria B): Declaração Mod. 3 de IRS da Autora apresentada em 27/05/2010 (documento nº 5 junto com a PI), respectiva nota demonstrativa da liquidação (documento nº 6 junto com a PI), bem como a simulação feita no próprio portal da Administração Fiscal constante no documento nº 15 junto com a P.I.; 2. Quanto aos pontos 2. e 4. da conclusão a) supra (valores resultantes do apuramento do rendimento da categoria B com base na contabilidade): Declaração Mod. 3 de substituição entregue em 21/09/2010, a fls. 44 do processo administrativo (cfr. facto dado como provado no ponto 20 da Sentença), respectiva Declaração Anual IES apresentada pela Autora em 22/09/2010 (documento nº 4 junto com a PI), e a simulação feita, com base nos elementos constantes nestas declarações, no próprio portal da Administração Fiscal, constante no documento nº 14 junto com a PI.

  3. Uma vez que os factos alegados nos arts. 47º e 48º da PI resultam directamente do teor dos documentos nºs 4, 5, 6, 14 e 15 juntos com esse articulado, bem como de fls. 44 do processo administrativo, e se mostram relevantes para a boa decisão da causa segundo pelo menos uma das decisões plausíveis de direito, não tendo esses documentos sido impugnados pela Fazenda Pública e fazendo a Declaração Mod. 3 de substituição parte do próprio processo administrativo (cfr. fls. 44), também esses factos deveriam ter sido considerados como provados.

  4. Ao assim não ter acontecido, a decisão proferida sobre a matéria de facto enferma de erro que deverá determinar a sua alteração, devendo os factos supra discriminados ser dados como provados.

  5. A Sentença recorrida enferma também de erro de julgamento da matéria de direito, desde logo por ser manifestamente errada a interpretação que nela é feita do regime legal previsto no art. 28º do CIRS (na redacção vigente à data dos factos em análise), e por, com base nesse erro, ter considerado que o acto impugnado não violou os princípios da tributação do rendimento real, da igualdade fiscal e da capacidade contributiva.

  6. No que aos autos importa, no período de tributação de 2009 ficavam abrangidos pelo regime simplificado os sujeitos passivos que, no exercício da sua actividade, não tivessem ultrapassado no período de tributação imediatamente anterior um volume de vendas de €149.739,37 ou um valor ilíquido dos restantes rendimentos da categoria B de €99.759,58 (cfr. art. 28º-2 do CIRS, na redacção introduzida pela Lei nº 211/2005, de 7 de Dezembro).

  7. Apesar disso, o legislador, dando concretização ao preceituado no art. 81º-2 da LGT, estabeleceu a possibilidade de os sujeitos passivos abrangidos pelo regime simplificado poderem optar pela determinação dos respectivos rendimentos com base na contabilidade (cfr. art. 28º-3 do CIRS, na redacção introduzida pela Lei nº 211/2005, de 7 de Dezembro), desde que essa opção fosse formulada na declaração de início de actividade ou até ao fim do mês de Março do ano em que pretendessem alterar a forma de determinação do rendimento, mediante a apresentação de declaração de alterações (cfr. art. 28º-4 do CIRS, na redacção introduzida pela Lei nº 53-A/2006, de 29/12).

  8. O período de permanência em qualquer dos regimes era de três anos, prorrogável por iguais períodos, excepto se o sujeito passivo comunicasse, até ao fim do mês de Março do ano em que pretendesse alterar a forma de determinação do rendimento, a sua decisão de mudar de regime (cfr. art. 28º-5 do CIRS, na redacção introduzida pela Lei nº 53-A/2006, de 29/12).

  9. A única situação que fazia cessar o referido período de permanência de três anos no regime simplificado e determinava a passagem obrigatória do contribuinte para o regime da contabilidade encontrava-se prevista no art. 28º-6, passagem essa que, apenas nesse caso, podia ocorrer em qualquer momento daquele período de três anos, se verificada essa situação e demais pressupostos legais.

  10. Assim, no sentido de que, se um sujeito passivo, inicialmente enquadrado no regime simplificado, não comunicasse, até ao final do mês de Março do ano seguinte ao termo do triénio correspondente ao período de permanência, a sua vontade de passar para o regime da contabilidade organizada, teria necessariamente de manter-se no regime simplificado por mais três anos, pronunciou-se a AT através das suas orientações genéricas, de que, a título exemplificativo, se cita a Circular nº 5/2007, de 13/03, da Direcção de Serviços do IRS.

  11. Ora, no caso sub judice, verifica-se que a Recorrente, em 21/05/2007, apresentou a “Declaração de Inscrição no Registo/Início de Actividade”, tendo ficado abrangida pelo regime simplificado de tributação (cfr. ponto 2) dos factos dados como provados na Sentença recorrida).

  12. Assim sendo, e uma vez que, de forma contrária àquilo que, por manifesto erro, foi considerado na Sentença recorrida, em Março de 2009 ainda se encontrava a decorrer o período de permanência obrigatória no regime simplificado de tributação a que se referia o art. 28º-5 do CIRS (tendo em consideração que a Recorrente iniciou a sua actividade em 21/05/2007, o referido período de permanência abrangeria os exercícios de 2007, 2008 e 2009), a Recorrente, no referido ano de 2009, teve de se manter nesse mesmo regime.

  13. É evidente, pois, que, contrariamente ao que consta na Sentença recorrida, a Recorrente, com referência ao ano de 2009, não podia ter optado “pela alteração do regime simplificado /…/ até final do mês do [sic] Março de 2009” (cfr. pág. 8 da Sentença recorrida).

  14. Na verdade, a Recorrente, em 2009, pretendeu efectivamente optar pelo regime da contabilidade organizada, opção essa que, todavia, não pôde ser concretizada por ainda se encontrar a decorrer o período de permanência obrigatória no regime simplificado de tributação (período esse que, nos termos legais, abrangia os exercícios de 2007, 2008 e 2009).

  15. Carecem assim de toda e qualquer razão de ser as conclusões que constam na Sentença recorrida no sentido de que a Recorrente “não agiu por forma a puder [sic] ser tributada à luz de tal regime, sendo a única responsável por tal resultado”, bem como no sentido de que a mesma “não cumpriu” “as regras para a alteração do seu enquadramento” no regime simplificado de tributação.

  16. O entendimento do Tribunal a quo padece, pois, de um evidente erro nos respectivos pressupostos, uma vez que, de forma contrária ao que foi feito constar na Sentença recorrida, a Recorrente, com referência ao exercício de 2009, não pôde optar pelo regime da contabilidade organizada.

  17. Em virtude de, com referência ao exercício de 2009, não ter podido optar pelo regime da contabilidade organizada, a Recorrente, com referência aos €923.774,00 que lhe foram pagos pela sociedade “A., Lda.”, não pôde deduzir – como aconteceria caso lhe tivesse sido possível optar pelo regime da contabilidade organizada – as despesas, no valor de €726.910,25, que comprovadamente teve de suportar para auferir aquele rendimento, tendo o Tribunal a quo...

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