Acórdão nº 792/21 de Tribunal Constitucional (Port, 08 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Mariana Canotilho
Data da Resolução08 de Outubro de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 792/2021

Processo n.º 1002/2021

Plenário

Relatora: Conselheira Mariana Canotilho

Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional,

I – RELATÓRIO

1. Nos presentes autos, em que é recorrente Joaquim Martinho da Silva, Mandatário do Partido Socialista para o Município de Santarém, foi interposto recurso contencioso, ao abrigo do artigo 156º, n.º 1, da Lei Eleitoral para os Órgãos das Autarquias Locais (aprovada pela Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de agosto, na atual versão dada pela Lei Orgânica n.º 1/2021, de 4 de junho, de ora em diante, LEOAL), da decisão da Assembleia de Apuramento Geral dos resultados eleitorais do Concelho de Santarém, relativamente à mesa de apuramento número 2, da assembleia de voto da freguesia de Pernes, naquele aludido Concelho, afixada em Edital no dia 30 de setembro de 2021. O requerimento tem o seguinte teor:

“De facto

O resultado eleitoral para o órgão Assembleia de Freguesia de Pernes, obtido pela Assembleia de Apuramento Local da freguesia de Pernes, do concelho de Santarém, resultou num empate a 345 votos entre as candidaturas do Partido Socialista (PS) e do Partido Popular Democrático/Partido Social Democrata (PPD/PSD).

A Assembleia de Apuramento Local da freguesia supra identificada foi constituída por duas mesas.

Não foi apresentado nenhum protesto nem reclamação, no âmbito da Assembleia de Apuramento Local.

A Assembleia de Apuramento Geral decidiu, por votação, com discussão, por maioria, a validação de um voto a favor da candidatura do PPD/PSD, à Assembleia de Freguesia de Pernes.

Por seu lado, a Assembleia de Apuramento Geral decidiu, com discussão, por maioria, a não validação de um voto nulo a favor da candidatura do PS à Assembleia de Freguesia de Pernes.

Quer isto dizer que, esta irregularidade e mesmo ilegalidade ocorrida no apuramento da Assembleia de Apuramento Geral, tem influência no resultado da Assembleia de Freguesia.

Em claro prejuízo da candidatura do PS.

Uma vez que, o resultado obtido pela Assembleia de Apuramento Local foi um empate entre as candidaturas do PS e do PPD/PSD.

Enquanto que, o resultado obtido pela Assembleia de Apuramento Geral, foi a vitória da candidatura do PPD/PSD.

10º

A classificação de voto nulo encontra-se definida no art. 133º da “Lei dos Titulares dos Órgãos das Autarquias Locais”.

11º

Prescreve este normativo legal:

“1 - Considera-se «voto nulo» o correspondente ao boletim:

a) No qual tenha sido assinalado mais de um quadrado;

b) No qual haja dúvidas quanto ao quadrado assinalado;

c) No qual tenha sido assinalado o quadrado correspondente a uma candidatura que tenha sido rejeitada ou desistido das eleições;

d) No qual tenha sido feito qualquer corte, desenho ou rasura;

e) No qual tenha sido escrita qualquer palavra.

2 - Não é considerado voto nulo o do boletim de voto no qual a cruz, embora não sendo perfeitamente desenhada ou excedendo os limites do quadrado, assinale inequivocamente a vontade do eleitor.

3 - Considera-se ainda como nulo o voto antecipado quando o sobrescrito com o boletim de voto não chegue ao seu destino nas condições previstas nos artigos 118.º e 119.º ou seja recebido em sobrescrito que não esteja adequadamente fechado.”

12º

O voto não validado, à candidatura do PS, pela Assembleia de Apuramento Geral foi expresso da seguinte forma:

- Desenhado dentro do quadrado correspondente à candidatura do PS à Assembleia de Freguesia de Pernes;

- O desenho inseto no identificado quadrado, são segmentos de reta com interceção entre si;

- O “desenho” não ultrapassa os limites do quadrado supra identificado;

- Não identifica o eleitor, mantendo-se o sigilo do voto;

- O eleitor assinalou com uma cruz, ainda que imperfeita, no boletim de voto, no quadrado correspondente à candidatura em que pretendia votar;

- O voto foi dobrado em 4;

- O boletim de voto em causa não tem nenhum corte, nenhum desenho, nenhuma rasura.

13º

Tem sim, o “desenho” do voto, um dos segmentos de reta mais largo e carregado.

14º

Mas isso nada mais significa que pretendeu vincar a sua vontade de votar na candidatura do PS.

15º

Não se trata de nenhuma rubrica, nenhum rabisco.

16º

No ato isolado de uma cabine de voto, o eleitor pode ter-se distraído e carregar mais num os segmentos de reta, pode ter ocorrido a perceção de alguma falta de tinta da caneta e reforçar o segmento de reta, mas dúvidas não existem que intenção do eleitor ao expressar a sua vontade no boletim de voto é inequivocamente de votar na candidatura do PS à Assembleia de Freguesia de Pernes.

17º

Se o eleitor tivesse intenção que o seu voto fosse nulo não teria desenhado segmentos de reta com interceção entre estas nos limites do quadrado.

18º

Seria contrário ao espírito do legislador considerar válido um voto cuja cruz excede os limites do quadrado respetivo e não ser válido a cruz que se encontra “desenhada” em excesso nos limites do quadrado da respetiva candidatura.

19º

A Assembleia de Apuramento geral não validou ainda, um voto nulo, a favor da candidatura do PS à freguesia de Pernes, cuja a cruz foi desenhada fora do quadrado, mas nos limites da linha correspondente à candidatura do PS à Assembleia de Freguesia de Pernes.

20º

Este eleitor em causa manifestou a sua declaração de vontade,

21º

E esta é o voto inequívoco na candidatura do PS à Assembleia de Freguesia de Pernes.

22º

Tendo a deliberação da Assembleia de Apuramento Geral cometido uma irregularidade ao não validar o voto identificado em 19º.

23º

Visto ser inequívoco e sem qualquer dúvida, a intenção do eleitor exercer o seu direito ao voto na candidatura do PS à Assembleia de Freguesia de Pernes.

24º

Por seu lado, a Assembleia de Apuramento Geral validou um voto a favor da candidatura do PPD/PSD à Assembleia de Freguesia de Pernes.

25º

Voto este que, a Assembleia de Apuramento Local o declarou nulo.

26º

Este voto em causa, apesar de estar inserido no quadrado correspondente à candidatura do PPD/PSD, não tem qualquer semelhança com uma cruz.

27º

O “desenho” não é constituído por nenhum segmento de reta.

28º

Muito menos existe qualquer interceção entre segmentos de reta.

29º

Foi bem declarado nulo pela Assembleia de Apuramento Local.

30º

A deliberação da Assembleia de Apuramento Geral de validar este voto é irregular.

31º

Devendo o mesmo ser declarado nulo.

32º

Pois o mesmo é um simples desenho, até mesmo uma rasura.

Do direito

33º

O presente recurso é apresentado pelo mandatário da candidatura do recorrente, verificando-se a sua legitimidade processual ativa – art.º 157º da Lei dos Titulares do Órgãos das Autarquias Locais.

34º

É apresentado no tribunal competente - art.º 158º da Lei dos Titulares do Órgãos das Autarquias Locais.

35º

No dia imediatamente seguinte ao da publicação do edital contendo os resultados do apuramento, pelo que, está a tempo - art.º 158º da Lei dos Titulares do Órgãos das Autarquias Locais.

36º

Previamente a candidatura recorrente deduziu a respetiva reclamação e protesto no ato em que se verificaram, no decurso da Assembleia de Apuramento Geral - art.º 156º da Lei dos Titulares do Órgãos das Autarquias Locais.

37º

Do que supra se afirmou, resulta a violação do art. 133º da Lei dos Titulares do Órgãos das Autarquias Locais.

38º

De acordo com o Acórdão do TC nº 319/85, DR 2ª série, de 15/04/1086, é nulo o voto em que a marca desenho ou rasura extravase o quadrado para efeitos de voto em determinada candidatura.

39º

Ora, nenhum dos votos aqui em causa e que devem ser validados na candidatura do PS, extravasa o respetivo quadrado.

40º

Pelo que, são válidos e desta forma devem ser validados.

41º

No entanto, o voto validado pela Assembleia de Apuramento Geral a favor da candidatura do PPD/PSD, não passa de uma rasura e até desenho, sem qualquer semelhança com uma cruz, devendo ser declarado nulo nos termos da al. d), nº1 do art.º 133º da Lei dos Titulares do Órgãos das Autarquias Locais.

42º

De acordo com os acórdãos do Tribunal Constitucional nº 864/93, nº 565/2005, nº 530/2009 e nº 541/2009, são nulos os votos que suscitem fundadas e objetivas dúvidas quanto à declaração de vontade do eleitor.

43º

Mas já não são nulos os votos em que no respetivo boletim a respetiva cruz não tenha sido perfeitamente desenhada e até exceda os limites do quadrado.

Nestes termos e nos melhores de...

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