Acórdão nº 02237/20.7BEBRG de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 06 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelPEDRO VERGUEIRO
Data da Resolução06 de Outubro de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Processo n.º 2237/20.7BEBRG (Recurso Jurisdicional - Reclamação para a Conferênci

  1. Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública, devidamente identificada nos autos, notificada da Decisão Sumária de 22-08-2021, que negou provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo a decisão judicial recorrida, com distinta fundamentação, veio apresentar Reclamação para a Conferência nos termos do nº 3 do art. 652º do C. Proc. Civil tal como consta de fls. 312-317, concluindo no sentido da procedência da presente reclamação, com a anulação da decisão, sendo proferida uma outra que entenda que o pedido de isenção foi intempestivamente apresentado.

    Nesta medida, cumpre analisar a presente reclamação para a conferência, ao abrigo do art. 652º nº 3 do C. Proc. Civil “ex vi” art. 2º, al. e), do CPPT, considerando que a Reclamante alude aos seguintes elementos: A.

    A RFP entende que houve um excesso de pronúncia por parte deste Douto Tribunal, pois que o tema do recurso cingia-se à existência, ou não, por parte do órgão de execução fiscal [OEF] de uma violação do princípio do inquisitório, em clara violação do disposto no n.º 2 do art.º 608.º CPC, aplicável pelo art.º 663.º também do CPC, o que determinará necessariamente a nulidade da decisão, nos termos do n.º 1 do art.º 125.º do CPPT e al. e) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC.

    Sem prescindir, B.

    Mesmo que se entenda que não houve excesso de pronúncia, a FP não foi ouvida antes da decisão sumária do Senhor[a] Desembargador[a] Relator, i.e., não foi assegurado pelo Relator o cumprimento do contraditório, em clara violação do disposto no n.º 3 do art.º 3 e n.º 3 do art.º 665, ambos do CPC, o que também determinará necessariamente a nulidade da decisão.

    Sem prescindir, C.

    Fazenda Pública não se pode conformar com a decisão, por entender que se fez uma errada interpretação das disposições combinadas do n.º 8 do art.º 169 e n.º 2 do art.º 170.º do CPPT.

    D.

    Pois, seguir tal linha de raciocínio de que o pedido de dispensa de garantia pode ser apresentado a todo o tempo, fará com que o n.º 2 do art.º 170.º do CPPT seja completa letra morta! E.

    Pois se o pedido pode ser apresentado a qualquer momento, qual a necessidade do legislador prever a possibilidade deste ser apresentado no prazo de 30 dias após a ocorrência de factos supervenientes?.

    F.

    Perceciona a Fazenda Pública que a tal linha de raciocínio seja motivado pela teor do n.º 8 do art.º 169.º do CPPT, onde se pode ler que “caso no prazo de 15 dias, a contar da apresentação de qualquer dos meios de reação previstos neste artigo, não tenha sido apresentada garantia idónea ou requerida a sua dispensa, procede-se de imediato à penhora.” G.

    Tal entendimento é claramente plausível para a questão da apresentação da garantia idónea pois não só a legislação atual não impõe um prazo para a sua apresentação como, considerando que tal penhora se destina a garantir o processo, compreende-se que o contribuinte o possa fazer de forma voluntária em qualquer momento [pois o efeito útil é o mesmo do conseguido por via da penhora realizada pelo OEF].

    H.

    Já quanto ao pedido de dispensa, não só a lei prevê um prazo específico para a sua apresentação, como não existe qualquer equiparação legal entre o pedido de dispensa de prestação de garantia e a efetiva prestação ou constituição de garantia.

    I.

    Até porque o legislador não o entendeu dessa forma, pois ao alterar o n.º 7 do art.º 169.º do CPPT [atual n.º 8] através da Lei n.º 64-B/2011 de 30 de dezembro [OE 2012], não retirou do n.º 1 e 2 do art.º 170.º do CPPT os prazos legais para apresentar pedido de dispensa de garantia e isso, apesar de ter procedido a uma alteração daquele artigo por via daquela lei [alterando o seu n.º 1].

    J.

    Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, nos termos do n.º 2 do art.º 9.º do CC.

    K.

    Sem prescindir, 1.º Os acórdãos citados para fundamentar a decisão sumária, têm na sua génese uma realidade completamente distinta da dos presentes autos, não podendo aqueles acórdãos, no entender da FP, servir de base à decisão sumária nos termos do art.º 656 do CPC.

    L.

    A RFP não pode deixar de trazer á colação outro acórdão onde se entendeu de forma diferente ao concluída na decisão sumária, nomeadamente o acórdão processo n.º 1630/19.2BELRS [já supra referido] onde ficou dito que “assim, do disposto na letra da lei resulta que o executado apenas pode pedir a dispensa de prestação de garantia após a apresentação do meio gracioso ou contencioso de defesa, incluindo a oposição à execução (artigo 169.º, n.º 7 ex vi do n.º 10 do mesmo artigo 169.º do CPPT) e tem de o fazer até 15 dias após a apresentação do mesmo, sob pena de caducidade do direito a requerer aquela dispensa” [realce nosso]. …”.

    Não houve resposta.

    Sem vistos, por se tratar de processo classificado de urgente, vem o processo à Conferência para julgamento.

    ******* Como é sabido, o instituto da reclamação para a conferência, previsto no art. 652º nº 3 do C. Proc. Civil (aplicável ao processo judicial tributário “ex vi” do artº.2, al.e), do C.P.P.T.), fundamenta a sua existência no carácter de Tribunal colectivo que revestem os Tribunais Superiores, nos quais a regra é a decisão judicial demandar a intervenção de três juízes, os quais constituem a conferência, e o mínimo de dois votos conformes.

    Sempre que a parte se sinta prejudicada por um despacho do relator (desde que não seja de rejeição do requerimento de interposição do recurso ou de retenção do mesmo, caso em que cabe a reclamação prevista no art. 643º do C. Proc. Civil), pode dele reclamar para a conferência. Os direitos da parte - reforçados pela decisão colegial em conferência - são assegurados pela possibilidade de reclamação para a conferência de quaisquer decisões do relator, excepcionadas as de mero expediente.

    A deliberação em conferência pode assumir uma de duas modalidades. Em primeiro lugar pode ser inserida no acórdão que virá a incidir sobre o recurso, seguindo, neste caso, a tramitação que for ajustada ao seu julgamento. Em segundo lugar, pode a mesma deliberação ser autonomizada num acórdão próprio, no caso de se impor uma decisão imediata devido à natureza da reclamação em causa ou se o acórdão sobre o recurso já tiver sido proferido. Em qualquer dos casos, é sobre o projecto elaborado pelo relator que o colectivo irá incidir a sua deliberação, com a consequente manutenção, revogação ou alteração do despacho reclamado (cfr. José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.106 e seg.; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.106 e seg.; António Santos Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 2ª. Edição Revista e Actualizada, 2008, Almedina, pág.244 e seg.; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil Anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.421).

    Na situação em apreço, a decisão sumária, que negou provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo a decisão judicial recorrida, com distinta fundamentação, encontra-se exarada a fls. 285 a 305 dos presentes autos e tem o seguinte conteúdo que integralmente se reproduz: “(…) 1. “RELATÓRIO A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, datada de 10-06-2021, que julgou procedente a presente deduzida por “A…….., UNIPESSOAL, Lda.” no presente processo de RECLAMAÇÃO relacionado com a decisão proferida pela Direcção de Finanças de Braga (OEF) no âmbito do Processo de execução de fiscal (PEF) nº 0361202001065815 e apensos, de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia, notificado à Reclamante através do Oficio n.º 70501642 de 15-10-2020.

    Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem: “ (…)

  2. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a reclamação de atos do órgão do OEF e, em consequência, decidiu anular a “decisão reclamada”.

  3. A Douta sentença padece de erro de julgamento de direito, por violação do disposto nos n.ºs 58.º, 74.º, n.º 1 do art.º 99.º, todos da LGT, n.º 342 do CC e no n.º 2 do art.º 170.º do CPPT.

  4. Ao contrário do decidido, a decisão reclamada não padece de qualquer violação do princípio do inquisitório, sendo discutível a adequação das concretas normas que o Tribunal a quo lançou mão, atenta a falta de lacuna no ordenamento jurídico fiscal e a natureza judicial do processo de execução fiscal.

  5. Da leitura do pedido de isenção, não consta qualquer alegação de facto ou de direito quanto à superveniência do pedido, nomeadamente, quanto ao facto das diligências junto das instituições bancárias terem findado após 15 de setembro de 2020.

  6. Não se alcança o suporte probatório que leva o Douto Tribunal a quo a concluir que tais diligências ou factos são “posteriores à apresentação das impugnações junto do CAAD” ou “necessariamente após a instauração das impugnações”.

  7. Perceciona a RFP que tal conclusão poderá ter levado o Tribunal a intuir que, partindo de tal premissa, existiria uma alta probabilidade da Reclamante só ter tido conhecimento do resultado de tais...

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