Acórdão nº 01646/14.5BEBRG de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 06 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelNUNO BASTOS
Data da Resolução06 de Outubro de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1. O Representante da fazenda pública junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, recorre da douta sentença daquele Tribunal que julgou caducado o arresto decretado em bens do Recorrido B………..

, contribuinte fiscal n.º ……………..

Com a interposição do recurso apresentou alegações e formulou as seguintes conclusões: «(...) I - O presente recurso tem por tem por objeto a douta sentença proferida no processo supra referenciado, no segmento em que declarou a caducidade da providência cautelar de arresto decretada nos presentes autos, exclusivamente na parte relativa ao requerido B………. (potencial devedor subsidiário) e, em consequência, determinou que as custas fossem a repartir entre a Fazenda Pública e os oponentes, por aí se ter entendido, em suma que, não tendo sido proferido, até ao fim do ano posterior àquele em que se efetuou o arresto, o ato tributário (entendido este em sentido amplo por forma a incluir o despacho de reversão) para cuja garantia o arresto se destinava, imperou concluir pela caducidade do arresto decretado na parte relativa ao Oponente B………….

II - Douta sentença essa que, a nosso ver, e salvaguardado o devido e merecido respeito que a mesma nos merece, que é muito, incorreu, à luz do artigo 9º do Código Civil, numa errada interpretação e aplicação do direito aos factos dados como provados, nomeadamente da norma da segunda parte, do nº 1, do artigo 137º do CPPT.

III - A questão de direito que se coloca no presente recurso consiste em saber se a expressão “acto tributário” inserta na segunda parte, do nº 1, do artigo 137º do CPPT, deve ser entendida em sentido estrito, ou seja, deve ser entendida no sentido de “acto de liquidação” - não abrangendo, por esta via, o despacho de reversão contra o potencial devedor subsidiário - ou, diversamente, deve ser entendida em sentido amplo, abrangendo, por esta via, também o despacho de reversão contra o potencial devedor subsidiário.

IV - No que respeita à Doutrina, Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, II volume, 6ª Edição, 2011, Anotado e Comentado, Áreas Editora, pág. 461, em anotação ao referido artigo 137º do CPPT, refere o seguinte: “4 – Falta de acto tributário no prazo de um ano Na segunda das situações de caducidade referidas, introduz-se uma alteração em relação ao que se previa no anterior CPT.

No art. 158.º do CPT previa-se que a caducidade ocorria quando se apurasse não haver lugar a qualquer liquidação, o que, entendido em sintonia com a finalidade do arresto de garantir a cobrança de créditos tributários em fase de liquidação, significava que caducava o arresto quando se constatasse que não se concretizava a liquidação que justificava a realização do arresto.

O presente art. 137.º do CPPT, na parte correspondente, utiliza uma formulação não muito explícita, ao referir que o arresto fica sem efeito quando «se apure até ao fim do ano posterior àquele em que se efectuou não haver lugar a qualquer acto tributário» pretende colocar um limite temporal à manutenção do arresto nos casos em que ele é justificado por um crédito em fase de liquidação.

Nestes casos, em que foi a «provável existência» (na terminologia do nº 4 do art. 136.º) de um crédito tributário que justificou o arresto, não se aguardará mais do que um ano pela sua concretização e, uma vez transcorrido sem que haja uma liquidação, o arresto caduca.

Não se trata, assim, ao contrário do que poderia induzir a fórmula utilizada, de manutenção do arresto até que ocorra uma qualquer liquidação de qualquer tributo até ao termo do ano posterior ao da concretização do arresto, só relevando para obstar à caducidade a efectivação da liquidação de um dos tributos a cuja garantia se destinou o arresto, como se depreende da referência ao «processo de liquidação do ou dos tributos para cuja garantia é destinado».

A referência a «qualquer acto tributário» e não à liquidação cuja provável existência justificou o arresto, justifica-se por o arresto poder ter-se destinado a assegurar mais do que uma liquidação de tributos e bastar que alguma delas se concretize até ao termo do ano posterior àquele em que se efectuou o arresto, para não ocorrer caducidade.”.

V - Como decorre do excerto da obra de Jorge Lopes de Sousa antes transcrita em parte, o autor perfilha a tese segundo a qual a expressão “acto tributário” inserta na segunda parte, do nº 1, do artigo 137º do CPPT, deve ser entendida em sentido estrito, ou seja, deve ser entendida no sentido de “acto de liquidação”, referindo, a este propósito, nomeadamente, que “A referência a «qualquer acto tributário» e não à liquidação cuja provável existência justificou o arresto, justifica-se por o arresto poder ter-se destinado a assegurar mais do que uma liquidação de tributos e bastar que alguma delas se concretize até ao termo do ano posterior àquele em que se efectuou o arresto, para não ocorrer caducidade.”.

VI - Assim, afigura-se-nos ser inequívoco que o referido Autor não perfilha a tese que imperou na douta sentença aqui posta em crise, segundo a qual a expressão “acto tributário” inserta na segunda parte, do nº 1, do artigo 137º do CPPT deva ser entendida em sentido amplo, abrangendo, por esta via, o despacho de reversão contra o potencial devedor subsidiário.

VII - A nosso ver, atendendo aos cânones interpretativos a interpretação a dar à expressão “acto tributário” inserta na segunda parte, do nº 1, do artigo 137º do CPPT - atendendo à letra da lei (elemento literal ou gramatical, a qual é “simultaneamente ponto de partida e limite da interpretação”), atendendo aos elementos lógicos (em particular, atendendo ao elemento histórico e ao elemento sistemático), e atendendo, em especial, ao disposto no artigo 9º, nº 3 do Código Civil – só pode ser a de que a expressão “acto tributário” deve entendida em sentido estrito, ou seja, deve ser entendida no sentido de “acto de liquidação”, não abrangendo, por esta via, o despacho de reversão contra o potencial devedor subsidiário.

VIII - Aliás, no que se refere ao elemento sistemático da interpretação é a própria sentença aqui posta em crise que parece dar razão à nossa tese, antes referida, quando refere, nomeadamente: “Que o legislador considera a expressão “acto tributário” como sinónimo de “acto de liquidação do tributo” é evidenciado por várias disposições legais. Assim, o nº 6 do art.º 59º do CPPT refere que “da apresentação das declarações de substituição não pode resultar a ampliação dos prazos de reclamação graciosa, impugnação judicial ou revisão do acto tributário, que seriam aplicáveis caso não tivessem sido apresentadas”; o nº 2 do art.º 61º do CPPT refere-se à “anulação judicial do acto tributário”, estabelecendo que “cabe à entidade que execute a decisão judicial da qual resulte esse direito determinar o pagamento dos juros indemnizatórios a que houver lugar”; o art.º 89º, nº 1, do CPPT, dispõe que “os créditos do executado resultantes de reembolso, revisão oficiosa, reclamação ou impugnação judicial de qualquer acto tributário são aplicados na compensação das suas dívidas (…)”; o art.º 68º, nº 1, do CPPT informa-nos que “o procedimento de reclamação graciosa visa a anulação total ou parcial dos actos tributários por iniciativa do contribuinte, incluindo, nos termos da lei, os substitutos e responsáveis” e o art.º 117, nº 1, do mesmo Código, estatui que “salvo em caso de regime simplificado de tributação ou quando da decisão seja interposto, nos termos da lei, recurso hierárquico com efeitos suspensivos da liquidação, a impugnação dos actos tributários com base em erro na quantificação da matéria tributável ou nos pressupostos de aplicação de métodos indirectos depende de prévia apresentação do pedido de revisão da matéria tributável”. Como se vê, em qualquer uma destas disposições a expressão “acto tributário” apenas pode ser compreendida como sinónimo de “acto de liquidação”: o procedimento de reclamação graciosa visa a anulação de actos de liquidação, a anulação judicial da liquidação confere o direito a juros indemnizatórios, a impugnação da liquidação com base em erro na quantificação da matéria tributável ou nos pressupostos de aplicação de métodos indirectos depende de prévia apresentação do pedido de revisão da matéria tributável, etc.”.

IX - A nosso ver, e salvo melhor entendimento, a circunstância de, ocorrendo a citação do devedor subsidiário até ao fim do 8º ano a contar do início do prazo de prescrição, os efeitos da interrupção que derivam da sua própria citação produzem-se em relação a ele (nº 2 e nº 3 do artigo 48º da LGT), parece militar no sentido da tese por nós defendida, isto é, parece incutir a ideia de que a expressão “acto tributário” inserta na segunda parte, do nº 1, do artigo 137º do CPPT, deve ser entendida em sentido estrito, ou seja, deve ser entendida (apenas) no sentido de “acto de liquidação”, não abrangendo, por esta via, o despacho de reversão contra o potencial devedor subsidiário.

X - E isto porque, ao que decorre do disposto no nº 2 e nº 3 do artigo 48º da LGT, a Administração Tributária dispõe do prazo de oito anos aí referido para proceder à citação do potencial devedor subsidiário e, desta forma, obviar à prescrição relativamente ao mesmo devedor subsidiário.

XI - Não existindo, a nosso ver, qualquer razão válida para se entender que, existindo um arresto decretado sobre bens do potencial devedor subsidiário, como é o caso, exista o dever legal de o órgão de execução fiscal emitir o despacho de reversão contra o potencial devedor subsidiário até ao fim do ano posterior àquele em que se efetuou o arresto - sob pena de, assim não sucedendo, ocorrer a caducidade do arresto em relação ao potencial devedor subsidiário, como foi entendido na douta sentença aqui posta em crise - quando parece decorrer da lei (artigo 48º da LGT) que a Administração Tributária dispõe de um prazo mais longo (8 anos) para o...

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