Acórdão nº 01023/13.5BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 06 de Outubro de 2021
Magistrado Responsável | PEDRO VERGUEIRO |
Data da Resolução | 06 de Outubro de 2021 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1.
RELATÓRIO A…………….. e B………….., devidamente identificados nos autos, inconformados, vieram interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, datada de 17-12-2020, que julgou improcedente a pretensão pelos mesmos deduzida no presente processo de IMPUGNAÇÃO relacionado com a decisão de indeferimento de reclamação graciosa, visando despacho ordenante do cancelamento de isenção de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI).
Formularam nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem: “ (…) A. O tema nuclear destes autos tem a ver com a legalidade ou ilegalidade da determinação da cessação do benefício da isenção anteriormente prevista no artigo 40.º, n.º 1, a. n) do EBF para os anos pretéritos à notificação prevista no artigo 88.º, al. c) da Lei n.º 53-A/96, de 29 de Dezembro, que aprovou o Orçamento de Estado para o ano de 2007.
-
E a questão fundamental é a da natureza da notificação prevista no referido artigo 88.º, al. c) da Lei n.º 53-A/96, de 29 de Dezembro.
-
Sobre esta questão fundamental, o Tribunal a quo limitou-se a entender que a notificação em apreço não tem uma natureza constitutiva, antes conferido ao interessado o direito ao contraditório no âmbito do procedimento administrativo.
-
E, com base nesse entendimento, a sentença recorrida concluiu que o despacho em apreço não padeceria de qualquer ilegalidade.
-
É certo que tal notificação não tem uma natureza constitutiva, mas isso não obsta a que a efectividade da cessação do benefício fiscal dependa da condição da eficácia que é a notificação para o efeito em apreço, a qual opera para o futuro, até por homenagem ao princípio da irretroactividade da lei fiscal.
-
É esse claramente o espírito do artigo 88.º, al. c) da Lei n.º 53-A/06, de 29 de Dezembro, que assim foi erroneamente interpretado pelo Tribunal a quo.
-
Não ignoram os ora Recorrentes que o disposto no artigo 40.º, n.º 8 do EBF (actual artigo 44.º), por via das alterações introduzidas pela referida Lei 53-A, e no que ora releva, passou a determinar que: «8. Os benefícios constantes das alíneas b) a m) do n.º 1 cessam logo que deixem de verificar-se os pressupostos que os determinaram, devendo os proprietários, usufrutuários ou superficiários dar cumprimento ao disposto na alínea g) do n.º 1 do artigo 13.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, e os da alínea n) cessam no ano, inclusive, em que os prédios venham a ser desclassificados.».
-
Porém, e como também defende o parecer do Ministério Público de 12 de Março de 2015, notificado aos ora Recorrentes por expediente datado de 29.01.2018 – que defendeu a procedência da impugnação judicial –, os efeitos para os contribuintes desta alteração legislativa estava dependente da notificação prevista no artigo 88.º, al. c) da Lei 53-A/06.
I. Pelo exposto, o que importa é reconstituir qual foi a mens legislatoris relativamente ao efeito da notificação.
-
Na óptica da sentença recorrida, essa notificação funcionaria apenas como garantia dos contribuintes para o exercício do seu direito ao contraditório, no que tange à reposição do regime regra.
-
Porém, não nos parece que o sentido da notificação seja apenas esse, até porque, se assim fosse, não haveria razão para que isso não ficasse plasmado na letra da lei. Outrossim, o efeito da notificação, nos termos latos em que foi formulada, tem em mente dar a conhecer ao contribuinte a avaliação da AT sobre a situação do seu prédio, para que este dela fique ciente, podendo reagir ou, pura e simplesmente, passando a contar com ela.
L. Deste modo, tal notificação tem a natureza de condição de eficácia da cessação do benefício – verdadeiro ónus para a Administração Fiscal -, razão pela qual tal cessação não se torna efectiva sem essa notificação, operando apenas para as situações jurídicas ocorridas após a sua realização.
-
Não só a lei não estabelece que, verificada a condição da eficácia, a cessação opera retroactivamente desde a sua entrada em vigor, como seria manifestamente iníquo e ilógico – em face da unidade do sistema jurídico – que assim fosse.
-
Basta, por exemplo, pensar no que acontece com inúmeros benefícios fiscais, designadamente no âmbito do IMI, em que, se o contribuinte não pedir o respectivo reconhecimento no prazo legal, vê deferida a isenção apenas para o ano imediato àquele em que apresente tal requerimento, não se retroagindo a concessão do benefício à data em que estavam preenchidos os respectivos pressupostos (cfr. artigos 44.º n.º 9, 46.º, n.º 7 e 47.º n.º 5 do EBF4). Se é assim a “favor” do Estado, porque não há-de ser assim igualmente “contra” o Estado? O. Por outro lado, também essa é a regra no campo do Direito Civil; como, por exemplo, ocorre com o aumento de renda de um contrato de locação, em que o senhorio tem direito a uma actualização anual, mas sempre na dependência da notificação ao inquilino desse aumento, a qual assim também funciona como uma condição de eficácia relativamente ao exercício do direito em pauta.
-
Dispõe ao artigo 9.º, n.º 3 do CC que, na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO