Acórdão nº 2517/15.3BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 30 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelTÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Data da Resolução30 de Setembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acórdão I. RELATÓRIO A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou Embargada ou FP) veio apresentar recurso da sentença proferida a 28.06.2016, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra, na qual foram julgados procedentes os embargos de terceiro deduzidos por M....

(doravante Recorrida ou Embargante), no âmbito do processo de execução fiscal (PEF) n.º 150…., instaurado no Serviço de Finanças (SF) de Cascais 1, contra D.... e C.....

O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito suspensivo.

Nesse seguimento, a Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: “

  1. Visa o presente recurso reagir contra a decisão proferida nos presentes autos que julga procedentes os embargos de terceiro deduzidos por M...., na sequência de penhora de direito correspondente a ½ do prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia de São Domingos de Rana, concelho de Cascais, sob o artigo 1…, descrito na Conservatória do Registo Predial de Cascais sob a descrição n.° 494….. efectuada no âmbito do processo de execução fiscal n.° 150….. instaurado contra D..... (e outros).

  2. Nos termos do disposto no artigo 819.° do Código Civil, “Sem prejuízo das regras do registo, são ineficazes em relação ao exequente os actos de disposição ou oneração dos bens penhorados”, dispondo o n.° 1 do artigo 1789.° do Código Civil que “Os efeitos do divórcio produzem-se a partir do trânsito em julgado da respectiva sentença, mas retrotraem-se à data da proposição da acção quanto às relações patrimoniais entre os cônjuges”, e o n.° 3 que “Os efeitos patrimoniais do divórcio só podem ser opostos a terceiros a partir da data do registo da sentença.

  3. Desde logo se realce não resultar do probatório a data do registo da sentença de divórcio a que a douta sentença apela, mostrando-se fixados os seguintes factos: o divórcio ocorreu em 12/10/2000 por sentença transitada em julgado, no decurso de acção que terá sido intentada em 27/01/1999; em 27/12/2013 foi registada a penhora em causa nos presentes autos; em 24/11/2014 foi adjudicado à embargante o imóvel penhorado por sentença proferida, e transitada, no âmbito de partilha judicial; e em 22/05/2015 procedeu a embargante ao registo de tal aquisição.

  4. O n.° 1 do artigo 1789.° do Código Civil limita a produção dos efeitos do divórcio em relação à data da propositura da acção às relações patrimoniais entre os cônjuges, pelo que não pode ter aplicação ao caso sub judice - uma vez que em causa relações com terceiros - mais derivando do n.° 3 poderem ser os efeitos patrimoniais do divórcio opostos a terceiros após o registo da sentença, facto que não foi levado ao probatório.

  5. Assim, decidiu o Tribunal a quo com fundamento em norma cuja aplicação se limita às relações entre os cônjuges, mostrando-se ademais o entendimento defendido pelo Tribunal a quo viciado por interpretação do direito não suportável.

  6. Ora, se atentarmos à sistemática do Código Civil poderemos afirmar que o n.° 1 do artigo 1789.° do Código Civil se relaciona de forma directa com os efeitos do casamento quanto às pessoas e bens dos cônjuges, determinando o momento a partir do qual se consideram cessados os efeitos patrimoniais próprios que decorrem do casamento e que vinculam cônjuges, dos quais se destacam o regime de bens e a responsabilidade dos cônjuges pelas dívidas.

  7. Os efeitos patrimoniais derivados da cessação do vínculo, nomeadamente quanto ao regime de bens e à responsabilidade dos cônjuges pelas dívidas, ganham, pois, pertinência desde a data da propositura da acção de divórcio, mas apenas e só quanto aos cônjuges, adquirindo realce quanto a terceiros a partir do registo da sentença.

  8. Contudo, não se depreende das normas (n.°s 1 e 3 do artigo 1789.° do Código Civil) que a aquisição de bem imóvel ocorrida no âmbito da partilha judicial do património comum se mostre apta a configurar-se como direito de propriedade cuja constituição retroage à data do registo da sentença, e muito menos à data da propositura da acção de divórcio, e com efeitos perante terceiros.

  9. Pois que aquilo que a norma pretende é, contrariamente ao pretendido pela douta sentença proferida, estabilizar os efeitos patrimoniais no que diz respeito às relações entre os cônjuges, e também com terceiros, e não atribuir retroactivamente a ex-cônjuges direitos que não tinham à data do divórcio.

  10. A penhora em causa nos presentes autos efectivou-se por meio de registo (27/12/2015) em momento muito anterior à aquisição (por adjudicação em processo de partilha judicial) e subsequente registo da aquisição do imóvel pela embargante (24/11/2014 e 22/05/2015, respectivamente), sendo que até esse momento não era titular da propriedade plena do referido bem.

  11. E, neste quadro fáctico, e atendendo à interpretação do artigo 1789.° do Código Civil que se impõe, a norma do artigo 819.° do Código Civil tem plena aplicação, pois que a aquisição derivada do bem pela embargante, e o registo de tal aquisição, são posteriores à penhora, mostrando-se por isso tal acto de disposição como ineficaz em relação à AT.

  12. Efectivamente, “Consagra-se aqui como referiram os autores Pires de Lima/Antunes Varela, «...o princípio da ineficácia em relação ao credor dos actos de disposição ou oneração dos bens penhorados, ressalvadas as regras do registo»” e no “No que respeita à inoponibilidade dos factos sujeitos a registo o n.° 1 do artigo 5. ° do Código do registo predial (aprovado pelo Decreto-Lei n.° 224/84, de 06 de Julho), determina que «Os factos sujeitos a registo só produzem efeitos contra terceiros depois da data do respetivo registo» (cfr. Acórdão Tribunal da Relação do Porto de 18/11/2013, Processo 254/11.7TBPVZ-B.PI).

  13. E continua o douto aresto “A partilha de bens constitui um acto oneroso e é, sem dúvida, como tal, um acto de «disposição de bens», pois implica a emissão de uma declaração de vontade por parte dos intervenientes nesse acto, que a lei tutela, e que determina a alteração do estatuto jurídico dos bens no que respeita à sua natureza patrimonial e titularidade. No caso, o...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT