Acórdão nº 1363/19.0BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 30 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelCATARINA ALMEIDA E SOUSA
Data da Resolução30 de Setembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul I – RELATÓRIO M …………………., deduziu impugnação judicial contra o ato de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) n.º ……………………., referente aos rendimentos de 2018.

O Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra julgou procedente a impugnação e, consequentemente, anulou o ato impugnado.

Inconformada, a Fazenda Pública veio recorrer contra a sentença. As suas alegações terminam com a formulação das seguintes conclusões: I) O thema decidendum do presente recurso assenta em aferir se liquidação de IRS ora impugnada, relativa ao ano de 2018, é ilegal por violação do Direito da União Europeia, maxime o art.º 63.° do TFUE, em virtude da interpretação efetuada pela AT do n.°2 do artigo 43.° do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares no sentido de limitar a incidência de imposto a 50% das mais-valias realizadas por residentes em Portugal, excluindo, todavia, dessa limitação, as mais valias que tenham sido realizadas por um residente noutro Estado-Membro da União Europeia.

II) Nos termos do artigo 9.º do CIRS constituem incrementos patrimoniais as mais valias definidas no artigo 10.º do CIRS.

III) Preceitua a alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do CIRS que constituem mais valias os ganhos obtidos que resultem, nomeadamente, da alienação onerosa de direitos reais sobre imóveis.

IV) O valor dos rendimentos qualificados como mais-valias é o correspondente ao saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, sendo que quando respeitante às transmissões efetuadas por residentes previstas na al. a) do n.º 1 do art.º 10.º, positivo ou negativo, esse saldo é apenas considerado em 50% do seu valor (cf. n.º 1 do art.º 43.º do CIRS).

  1. As mais-valias previstas na al. a) do n.º 1 do art.º 10.º do CIRS auferidas por não residentes em território português que não sejam imputáveis a estabelecimento estável nele situado são tributados à taxa autónoma de 28% (cf. al. a) do n.º 1 do art.º 72.º do CIRS).

    VI) Os residentes noutro Estado Membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu, desde que, neste último caso, exista intercâmbio de informações em matéria fiscal, podem optar, relativamente aos rendimentos de mais-valias resultantes de alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis, pela tributação desses rendimentos à taxa que, de acordo com a tabela prevista no n.º 1 do art.º 68.º do CIRS, seria aplicável no caso de serem auferidos por residentes em território português, sendo para efeitos de determinação dessa taxa tidos em consideração todos os rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território, nas mesmas condições que são aplicáveis aos residentes (cf. n.ºs 9 e 10 do art.º 72.º do CIRS, na redação dada por aditamento pela Lei n.º 67-A/2007, de 31/12).

    VII) A técnica de opção pelo englobamento como forma de afastar o tratamento fiscal desigual para os não residentes da União Europeia/Espaço Económico Europeu está igualmente presente na redação do art.º 17-A do CIRS, não sendo do conhecimento público que exista um eventual pedido de reenvio prejudicial perante o TJUE sobre a inconformidade ou compatibilidade da referenciada opção pelo englobamento com o direito comunitário.

    VIII) Este aditamento dado pela Lei n.º 67-A/2007 visou adequar o sistema tributário nacional à decisão constante do acórdão do TJUE de 2007-10-11, Processo n.º C-443/06, mais conhecido por acórdão Hollmann, e nesta matéria foi pelo Centro de Estudos Fiscais (CEF) proferido o Parecer nº 71/07, de 27de novembro.

    IX) O TJUE considerou que a questão que importava elucidar era saber se a disposição constante do art.º 56 do Tratado CE se opunha “a uma legislação nacional, como a que está em causa no litígio no processo principal, que sujeita as mais-valias resultantes de alienação de um bem imóvel situado num Estado-Membro, quando essa alienação é efetuada por um residente noutro Estado - Membro, a uma carga fiscal superior àquela que incidiria, em relação a este mesmo tipo de operação, sobre as mais-valias realizadas por um residente do Estado onde está situado esse bem imóvel” (n.º 22 do acórdão).

  2. A resposta do TJUE a esta questão consistiu em considerar que “o art.º 56.º CE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no litígio no processo principal, que sujeita as mais-valias resultantes da alienação de um bem imóvel situado num Estado-Membro, no caso vertente em Portugal, quando essa alienação é efectuada por um residente noutro Estado–Membro, a uma carga fiscal superior àquela que incidiria, em relação a este mesmo tipo de operação, sobre as mais-valias realizadas por um residente do Estado onde está situado esse bem imóvel”.

    XI) Conforme resulta desta afirmação, o que releva, do ponto de vista da compatibilidade com o Direito Comunitário, não é, simplesmente, o facto do n.º 1 do art.º 43 do CIRS excluir da limitação da incidência de imposto a 50% as mais valias realizadas por um residente noutro Estado-membro da UE, mas é sim, decisivamente, o facto de daí poder resultar uma carga fiscal superior à que seria aplicável a um residente para o mesmo tipo de operações, que como refere o acórdão, o que não é admissível do ponto de vista do Direito Comunitário é “um tratamento fiscal desigual para os não residentes, na medida em que permite, o caso de realização de mais—valias, uma tributação mais gravosa e, por isso, uma carga fiscal superior à que é suportada pelos residentes numa situação objetivamente comparável” (nº. 54).

    XII) A resolução da questão da incompatibilidade com o Direito Comunitário verificada na situação em apreço assenta no facto de, tal como se afirma no n.º 58 do acórdão do TJUE, “a vantagem fiscal concedida aos residentes, que consiste numa redução de metade da matéria coletável correspondente às mais valias, excede, em todo o caso, a contrapartida que consiste na aplicação de uma taxa progressiva à tributação dos seus rendimentos”.

    XIII) Desta forma, para que se possa detetar o “tratamento fiscal desigual para os não residentes” há que atender à redução a metade da matéria coletável das mais valias imobiliárias, mas é também necessário considerar a taxa que se aplicaria com o mesmo nível de rendimentos, por força da progressividade, por escalões relativamente aos residentes, não se tratando de proceder à extensão ilimitada e incondicional da vantagem resultante do n.º 2 do art.º 43 do CIRS para os não residentes pois, caso contrário, tal teria como consequência inadmissível, e não pretendida, em face do princípio da não discriminação, que seria suportado, independentemente do valor da matéria coletável, imposto apenas a uma taxa de 12,5% por aplicação da taxa proporcional de 25% (atualmente de 28%) correspondente a 50% do saldo positivo entre as mais valias e as menos valias.

    XIV) Portanto, o quadro jurídico em que se afere, em relação à tributação das mais valias imobiliárias, a existência de uma “carga fiscal superior à que é suportada pelos residentes numa situação objetivamente comparável (n.º 54 do acórdão) compreende, para além do n.º 2 do art.º 43 do CIRS, as disposições constantes dos artigos 22 nº 1 e 68.º do CIRS, no que respeita aos não residentes e à sua tributação à taxa de 25% (atualmente de 28%).

    XV) Tendo em conta o teor do Acórdão Hollmann, e no sentido de adaptar a legislação nacional à decisão nele sufragada, foi assim aditado ao artigo 72.º do Código do IRS, pela Lei n.º 67-A/2007, de 31/12, o n.º 7 (atual n.º 9), no qual se estabelece que os residentes noutro Estado membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu, desde que, neste último caso, exista intercâmbio de informações em matéria fiscal, possam optar, relativamente aos rendimentos referidos nas alíneas a) e b) do n.º 1 e no n.º 2, pela tributação à taxa que, de acordo com a tabela prevista no n.º 1 do artigo 68.º, seria aplicável no caso de serem auferidos por residentes em território português.

    XVI) Por sua vez, o n.º 8 (atual n.º 10) do mesmo artigo e diploma legal, também aditado pela Lei n.º 67-A/2007, de 31/12, prescrevia, na redação à data dos factos, que para efeitos de determinação da referida taxa progressiva, fossem tidos em consideração todos os rendimentos, incluindo os obtidos fora deste território, nas mesmas condições aplicáveis aos residentes.

    XVII) Ora, o n.º 10 do artigo 72.º, do Código do IRS, à semelhança do n.º 1 do artigo 15º do Código do IRS, exige que, para efeitos de tributação pelas taxas do artigo 68.º, devam ser englobados todos os rendimentos obtidos nesse ano (quer em Portugal, quer no estrangeiro) e assinalados os...

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