Acórdão nº 4/21.0T8RMZ.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 09 de Setembro de 2021

Data09 Setembro 2021

Processo n.º 4/21.0T8RMZ.E1 Acordam no Tribunal da Relação de Évora: O Ministério Público, com a legitimidade que lhe é conferida pelos arts. 1.º, 3.º, n.º 1, alínea p), 5.º, n.º 1, alínea g) do Estatuto do Ministério Público e 138.º, 141.º, n.º 1, e 142.º do Cód. Civil, veio instaurar a presente acção especial de acompanhamento de maior relativamente a (…).

Alegou, em síntese, que a requerida nasceu em 07/03/1932, sofre de Alzheimer e perturbação depressiva desde, pelo menos, 2009, e síndrome demencial desde 2013, encontrando-se totalmente incapaz de governar a sua pessoa e bens. Em virtude da doença, a requerida não consegue realizar actividades básicas, como alimentar-se, vestir-se ou cuidar da higiene sozinha, e necessita de supervisão permanente. Não sabe ler nem escrever. Apenas consegue efetuar cálculos aritméticos elementares. Não tem noção do valor do dinheiro nem consegue fazer nenhuma operação com ele. Não tem noção do espaço e do tempo. Não tem capacidade de crítica. Não há indicação que a requerida tenha filhos. Vive num lar para pessoas idosas. Requereu, por isso, que seja decretado o acompanhamento da requerida, propondo como medidas de acompanhamento a aplicação do regime da representação geral e administração total dos bens da requerida, com limitação dos direitos pessoais de casar, constituir união de facto, procriar, perfilhar ou adoptar, e de testar, e propondo que seja designado para desempenhar as funções de acompanhante, (…), Presidente da Direcção da Associação de Solidariedade Social de (…), instituição essa onde a requerida se encontra a viver.

Foi cumprido o disposto no art. 892.º do C.P.C. e ordenada a citação da Requerida, nos termos dos arts. 893.º e 894.º do C.P.C.

Não foi possível a citação pessoal da Requerida em virtude de a mesma se apresentar incapaz de perceber o acto que teria de levar a efeito, conforme consta da certidão negativa.

Foi então nomeado defensor oficioso à requerida e efectuada a posterior citação do mesmo para, querendo, contestar a presente acção, o que este fez, apresentando a respectiva contestação, na qual admitiu os factos descritos na petição inicial e indicando uma sobrinha da requerida, (…), como familiar próxima e que a visita regularmente, sendo pessoa idónea para exercer o cargo de acompanhante daquela. Para prova de tal factualidade arrolou testemunhas.

Procedeu-se à realização de exame pericial, tendo sido levado a cabo pela Dra. (…), perita médica designada nos autos, a qual veio a examinar a requerida, tendo elaborado o respectivo relatório.

Considerando a informação clínica constante dos autos (documentos juntos com a petição inicial) e estando mencionado no relatório do exame pericial que a requerida padece de demência com componente neurodegenerativa associada a componente vascular, e que comunica quase só por monossílabos, foi dispensada, pelo M.mo Juiz “a quo”, a audição da requerida, por se afigurar absolutamente inútil para a boa decisão da causa, mas não se tendo tomado posição expressa relativamente à inquirição das testemunhas arroladas na contestação.

De seguida, pelo M.mo Juiz “a quo” foi proferida sentença que veio a decidir o seguinte: 1 – Decretar a medida de acompanhamento a (…), nascida a 07/03/1932, residente na Estrutura Residencial para Pessoas Idosas da Associação de Solidariedade Social de (…), sita na Rua (…), n.º 57, em (…), cometendo-se ao Acompanhante os seguintes regimes: a) representação legal geral, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 145.º do Código Civil; e b) administração total de bens, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 145.º do Código Civil.

2 – A Beneficiária manterá o livre exercício dos direitos pessoais enumerados no artigo 147.º, n.º 2, do Código Civil, com excepção dos direitos de adoptar, de exercer responsabilidades parentais e de testar; 3 – A Beneficiária não poderá livremente celebrar negócios da vida corrente.

4 – Fixa-se a data de início da conveniência das medidas de acompanhamento decretadas no dia 01/11/2019.

5 – Nomeia-se para desempenhar o cargo de Acompanhante da Beneficiária (…), Presidente da Direcção da Associação de Solidariedade Social de (…), onde a Beneficiária está integrada.

6 – Fica dispensada a constituição de conselho de família.

Inconformada com tal decisão dela apelou a requerida, tendo apresentado para o efeito as suas alegações de recurso e terminando as mesmas com as seguintes conclusões: 1. O presente recurso vem interposto da douta sentença que decretou o acompanhamento de maior da recorrente, designando como acompanhante o Presidente da Direção da Instituição onde se encontra internada, Dr. (…).

  1. Na douta sentença recorrida além de uma deficiente decisão sobre a matéria de facto, fez-se uma errada aplicação do direito aos factos.

  2. O Ministério Público peticionou, na ação especial de acompanhamento de maior, que fosse decretado o acompanhamento da recorrente e designado como acompanhante o presidente da direção da Instituição onde aquela se encontra internada, Dr. (…), com base numa declaração onde alegadamente a beneficiária disse pretender que fosse nomeado acompanhante o presidente da instituição ou a sua esposa, e que se impugnou em sede de contestação.

  3. A Recorrente admitiu os factos descritos na Petição Inicial, contudo discordou da proposta do MP no que diz respeito à nomeação do acompanhante, indicou como acompanhante a sua sobrinha, (…) e requereu a inquirição dos sobrinhos para apurar quem reunia melhores condições para desempenhar o cargo de acompanhante.

  4. A Recorrente foi sujeita a perícia médico legal tendo o MMº Juiz notificado as partes para se pronunciarem quanto às medidas de acompanhamento e mais uma vez, discordou da nomeação do acompanhante por não o considerar pessoa idónea para o exercício do cargo.

  5. Apesar das diligências de prova requeridas que, salvo melhor entendimento, seriam absolutamente imprescindíveis para que o cargo de acompanhante fosse cometido a pessoa idónea, o MMº Juiz não as realizou, decidindo, sem mais designar como acompanhante o presidente da direção.

  6. Ainda que não tenha considerado a declaração junta com a petição inicial, e na qual o MP fundamentou a sua escolha quanto ao acompanhante, por entender que a beneficiária “não tem capacidade para compreender o alcance da escolha que sobre si impenderia em primeira linha, razão pela qual competirá ao Tribunal designar a pessoa que deverá ocupara tal cargo”.

  7. Da matéria de facto provada nada consta acerca dos pressupostos de designação do acompanhante, nomeadamente os que dizem respeito à ponderação da pessoa que melhor salvaguarda o interesse da beneficiária, mormente as condições e aptidões dos familiares da beneficiária para o exercício da função.

  8. Vide Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, Processo nº 1243/19.9T8FAF.G1, que relativamente à não inclusão na matéria de facto dos pressupostos relativos à pessoa que melhor salvaguarda o interesse imperioso do beneficiário, nos diz que: 10. “I- Não tendo sido manifestada pelo requerido qualquer vontade pessoal, expressa ou presumível, quanto à opção ou escolha do seu acompanhante, a única questão com...

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