Acórdão nº 2310/11.2BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 16 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelLURDES TOSCANO
Data da Resolução16 de Setembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 1ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO A Fazenda Pública, com os sinais nos autos, veio, em conformidade com o artigo 283.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, interpor recurso da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, de 16 de abril de 2020, a qual julgou procedente a oposição deduzida por A...

, com os sinais nos autos, ao processo de execução fiscal (PEF) n.º 3328200601... e apensos, instaurado para cobrança da quantia exequenda de €7.133,46, proveniente de dívidas de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), dos anos de 2004 e 2005, das quais foi devedora originária P... - PUBLICIDADE, LDA. Mais, aquela sentença, determinou a extinção da suprarreferida execução fiscal, fixou à causa o valor de em €7.133,46 e condenou a Fazenda Pública nas custas.

A Recorrente termina as alegações de recurso formulando as conclusões seguintes: “I. Visa o presente recurso reagir contra a douta decisão que julgou procedente a oposição judicial, intentada por A...

, já devidamente identificada nos autos e que, em consequência, ordenou a extinção da execução por dívidas da sociedade “«P... - PUBLICIDADE, LDA.», que reverteram contra si na qualidade de responsável subsidiário, relativamente ao processo de execução fiscal n.º 3328200601... e apensos, na parte em que dizia respeito a retenções na fonte de IRS dos exercícios de 2004 e 2005. Entende a Fazenda Pública que mal esteve o Tribunal a quo na douta sentença proferida porquanto, existindo elementos nos autos que impunham decisão diversa na apreciação dos factos relevantes, promoveu uma errónea aplicação do direito a estes mesmos factos, ao ignorar circunstancias factuais que, constantes da matéria de facto dada como provada, denunciam o exercício da gerência de facto por parte do Oponente; circunstancias estas que, tendo sido ignoradas, impõem, salvo melhor opinião, a anulação da sentença recorrida.

  1. Estatuindo que art.º 250º do Código Civil que “O negócio jurídico realizado pelo representante em nome do representado, nos limites dos poderes que lhe competem, produz os seus efeitos na esfera jurídica deste último”, cumpre ter presente que, atuando na qualidade de gerente da devedora originária, a outorga de uma procuração exprimiu a vontade da Oponente recorrida em continuar à frente dos destinos da devedora originária, na medida em que através desta consentiu que os atos praticados pelos seus procuradores se refletissem na sua esfera jurídica como se tivessem sido praticados pessoalmente pela própria. Deste modo, mesmo que a Oponente não tenha assumido ela própria de forma direta a gerência de facto da sociedade, mas delegado em outrem essa função através de procuração, é responsável pelo destino da sociedade e por todos os atos de gestão da mesma.

  2. No caso sub judice, respeitando a dívida exequenda a créditos resultantes de tributo cujo prazo legal de pagamento ou entrega terminou no período do exercício da administração/gerência por parte do Oponente, a disciplina a ter em consideração será a estabelecida no artigo 24.º, n.º 1, al. b), da LGT. Sendo que o ónus da prova da gerência de facto, conforme já reiterado pela inúmera doutrina e jurisprudência que se debruça sobre a matéria, cabe à Administração Fiscal. Assim, do que vem acima explanado, “a existência de uma procuração enquadra-se no apuramento do exercício de facto da gerência, pois pode ser considerada como uma forma indirecta desse exercício”, ilação esta que é mesmo uma exigência das regras da experiência comum, pois quem confere um mandato instrui os seus representantes sobre o rumo que pretende imprimir sobre o negócio, não constando da matéria de facto provada elementos que indiciem um uso contrário da procuração em sentido divergente da presumível vontade da Oponente. E, com base nesta comprovada gerência de direito e facto, cabe, pois, ao julgador utilizar as diversas presunções judiciais ao seu alcance, nomeadamente as posições assumidas no processo, as provas produzidas e as regras da experiência para concluir a gerência de facto.

  3. Do que vem exposto resulta que a Oponente recorrida era gerente de direito e de facto, sendo responsável pelo não cumprimento do dever fundamental de pagar os impostos por parte da devedora originária, não obstante ter conferido procuração a terceiros para a prática de atos de gerência. Em suma, com o devido e muito respeito, o Tribunal a quo, ao decidir como efetivamente o fez, menosprezou o entendimento consolidado e reiterado da jurisprudência emanada pelos Tribunais Superiores, estribando o seu entendimento numa inadequada valoração da matéria de facto e de direito relevante para a boa decisão da causa, tendo violado o disposto na al. b) do n.º1 do art.º 24º da Lei Geral Tributária.

Termos em que, e com o douto suprimento de vossas excelências, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogada a sentença ora recorrida, com as demais e devidas consequências legais, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!.” ****A Oponente, aqui Recorrida, notificada, apresentou contra-alegações nas quais alcança as seguintes conclusões: “A – Ficou provada a total ausência da prática pela oponente de actos de gestão de facto da sociedade devedora originária enquanto a mesma foi gerente “in nomine” da referida sociedade.

B – Tal facto nem sequer é questionado pela AT recorrente, a qual se limita a repisar com insistência que a outorga pela oponente de uma procuração implicaria a pretendida gerência de facto.

C – Contudo, de forma alguma se pode retirar tal ilação, quando se conclui dos autos – prova documental e testemunhal – que na verdade foi a filha da oponente que foi sempre a sócia “real” da P..., Ldª e dela gerente de facto juntamente com o outro sócio gerente, J..., tendo-se a oponente limitado a fazer o favor a sua filha de ser, em lugar dela, sócia gerente “in nomine” por motivos pessoais respeitantes a sua filha.

D – De qualquer modo, a verdade é que a oponente nem sequer já era sócia gerente “in nomine” da sociedade devedora originária quando terminaram os prazos legais de pagamento das dívidas fiscais revertidas.

E – Com efeito, constata-se pelo mapa anexo ao despacho que determinou a reversão, que os prazos legais de pagamento das dívidas revertidas terminaram entre Novembro de 2008 e Janeiro de 2009.

F – Isto é, quando há muito a oponente deixara de estar inscrita como gerente da P..., Ldª (cfr, certidão do registo comercial junta aos autos, pela qual se verifica que a oponente cessou a gerência de direito em 30 de Novembro de 2005, tendo a apresentação a registo tido lugar em 23 de Dezembro de 2005).

G – Mais: a oponente deixou de ser sócia da dita P..., Ldª em Dezembro de 2005, por ter cedido a quota que se encontrava na sua titularidade nominal (cfr. certidão do registo comercial).

H – A reversão foi instaurada, segundo o despacho que a determinou, ao abrigo do artigo 24º, nº 1, alínea b) da Lei Geral Tributária.

I – Nos termos de tal norma, os gerentes são subsidiariamente responsáveis pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.

J – Ora, como se viu, in casu os prazos legais de pagamento das dívidas revertidas, terminaram três anos depois de a oponente ter deixado de ser gerente e sócia da sociedade devedora originária.

K – De que o foi apenas, repete-se, “in nomine”.

L – Isto é, gerente de facto daquela sociedade nunca...

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