Acórdão nº 348/14.7BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 16 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelJORGE CORTÊS
Data da Resolução16 de Setembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acórdão I- Relatório M..., melhor identificada nos autos, intentou no Tribunal Tributário de Lisboa oposição contra o processo de execução fiscal com o n.º 32552010010..., na qualidade de revertida da devedora originária “M... Cabeleireiros, Lda.”, por dívidas de IVA de 2008 e 2009, no valor total de € 2.618,70. O Tribunal Tributário, por sentença proferida a fls. 182 (numeração do SITAF), datada de 2017.11.23, julgou a oposição improcedente. A oponente interpôs recurso contra a sentença. Alega nos termos seguintes: «1. Na decisão de reversão a AT limita-se a referir em “fundamentos da reversão” um entendimento geral e abstrato, fundado na Lei Geral Tributária, sem o cuidado de subsumir os factos no caso sub judice às normas que invoca.

  1. Revelador disto mesmo é o facto de constar no despacho que são responsáveis os administradores, diretores ou gerentes e outras pessoas que exerçam funções de administração? Ora, a Opoente está a ser responsabilizada a que título? 3. Não tendo a AT especificado o fundamento da reversão, afigura-se-nos que a decisão padece de falta de fundamentação (art. 23º, n.º 2, 77º, n.º l da LGT e art. 268º, n.º 3 da CRP).

  2. Importa referir que o despacho de reversão é completamente omisso quanto à extensão temporal da responsabilidade da Oponente.

  3. Deste modo, mesmo com a argumentação da sentença recorrida, por esta via deveria o despacho de reversão ser anulado por falta de fundamentação (art. 23º, n.º 2, 77º, n.º l da LGT e art. 268º, nº3 da CRP).

  4. Contrariando a sentença em sindicância, pelo facto de a Oponente ser gerente de direito não se presume a sua gerência de facto, sendo esta interpretação pacífica junto dos tribunais superiores, mesmo na jurisprudência mais recente.

  5. Da decisão de reversão não consta qualquer facto revelador da gerência de facto da Oponente. Pelo que, dependendo a reversão da gerência efetiva, não existindo qualquer indício disso, nem tendo a AT invocado qualquer facto revelador disso, a decisão de reversão padece de falta de fundamentação (art. 268º, n.º 3 da CRP).

  6. Acresce que, face à prova realizada nos autos, não era lícito operar-se a presunção judicial, baseada nas regras da experiência (cfr.art. 351.º, do C. Civil), de exercício de facto da gerência pela oponente/recorrida.

  7. Quanto às supostas declarações do TOC, elas não foram feitas em audiência de discussão e julgamento, não foram comunicadas à Oponente, nem nunca se permitiu o respetivo contrainterrogatório.

  8. Os depoimentos das testemunhas devem ser prestados em audiência contraditória (art. 118º, n.º 2 do CPPT). Não se trata de uma informação oficial.

  9. Assim, a sua consideração, nesta fase processual constitui uma violação do disposto no art. 118º, n.º 2 do CPPT e do princípio do contraditório, o que desde já se invoca (art. 3o, n.º3 do CPC ex vi art. 2o, al. e) do CPPT e arts. 13º, n.º l e 20º, n.º 4 da CRP).

  10. Mais, as supostas declarações referem-se apenas ao exercício de 2005 não se podendo extrair qualquer conclusão ou presunção sobre 2008 e 2009.

  11. A presunção feita pelo juiz de 1a instância (pelo facto de supostamente ser gerente de facto em 2005 pressupõe que era gerente de facto em 2008 e 2009 — pág. 11 e 12)) não decorre das regras de experiência comum, nem de qualquer outra razão que o justifique, sendo por isso infundada.

  12. Quanto aos rendimentos da Oponente em 2008 e 2009, ela auferiu rendimentos da categoria A (trabalho por conta de outrem) pagos pela devedora originária.

  13. Este facto não permite presumir a gerência de facto da Oponente.

  14. Mais, em sede judicial a AT tentou fundamentar a sua decisão (art. 41º a 44ºda contestação).

  15. Contudo, a decisão de reversão nada refere quanto a estes supostos factos ou documentos.

  16. Assim, esta tentativa configura uma fundamentação posterior que a douta sentença admitiu.

  17. O despacho de reversão, embora proferido num processo de natureza judicial, tem a natureza de ato administrativo (cfr. art.º 148º, do C.P.A.), pelo que são de considerar em relação a ele as exigências legais próprias deste tipo de atos, designadamente, no que concerne à fundamentação (cfr. artºs.268, nº.3, da C. R. Portuguesa, e 23, n.º 4, e 77, da L.G.T.).

  18. A deficiente fundamentação não pode ser efetuada à posterior, antes se impondo a sua concretização no próprio ato de reversão, de forma a que o seu destinatário possa perceber e defender-se de cada um dos respetivos segmentos que lhe são desfavoráveis, sendo para isso imprescindível que lhe seja dada a conhecer a factualidade subjacente ao ato praticado.

  19. A isto acresce que não é admissível a fundamentação “ a posteriori”, que em regra se mostra suscetível de colidir com a estabilidade dos interesses particulares (Cfr. Vieira de Andrade, ob. cit., p.299; Ac. TCA de 07.10.1999, in “Antologia de Acórdãos do STA e do TCA”, Ano III, nºl, p.247 e ss.), pelo que em princípio não deve ser aceite que só agora, em sede de contestação, a oponente venha a ter conhecimento dos fundamentos omitidos.

  20. A AT pretendeu em sede de contestação sanar um vício de fundo, que a sentença em recurso permitiu.

  21. Ora, a p.i. foi elaborada em função dos vícios do ato. A prova foi indicada na p.i. em função do ato impugnado.

  22. A Oponente não tem um meio judicial que lhe permita defender-se, em toda a plenitude, desta fundamentação subsequente, que nunca antes foi invocada.

  23. Admitir a fundamentação subsequente do ato em sede de contestação, configura-se uma violação do princípio da igualdade.

  24. O princípio da igualdade seria violado porque a Oponente limitou o âmbito da ação aos fundamentos do ato reversão invocados pela AT e imputou-lhe os vícios decorrentes dessa fundamentação.

  25. Admitir que AT possa posteriormente apresentar uma fundamentação subsequente, coloca as partes em juízo em desigualdade no que diz respeito à possibilidade de alegar, fundamentar e provar os fatos e vícios que julgue pertinentes.

  26. Depois de apresentada a oposição a Oponente não tem mais articulados.

  27. Admitir esta fundamentação subsequente, como pretende a AT configura uma violação dos direitos de defesa da Oponente (art. 2o e art. 268º, n.º 4, da CRP), do princípio do contraditório (art. 2o, da CRP, art. 3o do CPC ex vi art. 2o, al e) do CPPT) do princípio da igualdade (art. 13º da CRP, art. 6o da CEDH, art. 3ºA do CPC e art. 98º da LGT) e do próprio dever de fundamentação (art. 268º, n.º 3, da CRP).

  28. Face aos elementos probatórios junto aos autos e indicados na sentença, a recorrente não se conforma que se considere que a AT tenha remetido e a devedora originária seja considerada como notificada para audição prévia para as LOs de IVA de 2008 e de 2009, bem como, das notas de...

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