Acórdão nº 102/16.1GBSTC-B.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 08 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelLAURA GOULART MAUR
Data da Resolução08 de Setembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora Relatório No âmbito dos autos com o NUIPC 102/16.1GBSTC, em que é arguido (...), foi, em 23 de julho de 2020, proferido o seguinte despacho (transcrição): “Nos presentes autos foi o arguido (...) condenado por sentença, transitada em julgado no dia 26-10-2018, na pena de 2 anos e 2 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, sob condição de se submeter a consulta médica de alcoologia, e fazer tratamento à dependência do álcool

Solicitada informação sobre o cumprimento das condições impostas ao arguido, veio a DGRSP informar que o arguido não está a cumprir a condição imposta, tendo faltado a diversas consultas, sem justificar a sua ausência

Foi designada data para a audição do condenado e da técnica da DGRSP que tem estado a acompanhar o cumprimento da condição

O Ministério Público teve vista dos autos, tendo requerido a revogação da suspensão da execução da pena

A defensora oficiosa do arguido pronunciou-se no sentido de ser mantida a suspensão da execução da pena

Cumpre apreciar e decidir: Do relatório de acompanhamento junto aos autos pela DGRSP resulta que o arguido foi encaminhado para a Cri do Litoral Alentejano, onde esteve presente em consulta a 08/04/2019, 17/06/2019, 16/09/2019. Só compareceu no Cri, nas referidas datas, após grande insistência do técnico da reinserção social. Não compareceu a qualquer outra consulta nem iniciou tratamento, tendo faltado às consultas que lhe foram agendadas em 03/06/2019, 22/07/2019, 16/10/2019, 25/10/2019, 28/10/2019, não tendo justificado a sua ausência às mesmas, demonstrando assim, a falta de verdadeiro empenho no tratamento ao alcoolismo. Só após insistência do técnico da reinserção social, e por temer consequências judiciais, marcou consulta recentemente (06/03/2020), à qual compareceu.o mesmo

Ouvido o arguido, o mesmo declarou que a última consulta a que foi, já foi há muito tempo, nem se lembra, diz que é capaz de ter sido há 5 meses; mais disse que este ano não foi a nenhuma consulta, a última consulta há-de ter sido em Setembro do ano passado; afirmou que não tem bebido; disse que bebe uma cervejinha ou outra à sexta-feira, afirmou que não bebe todos os dias, e não tem bebidas em casa, mais disse que com a sua mãe está tudo bem

Ouvida a Técnica que procede ao acompanhamento do arguido, a mesma referiu que sempre acompanhou o arguido, tendo referido que o fez com muitas dificuldades, uma vez que este não demonstra qualquer consciência do problema do alcoolismo de que padece, o que dificulta a sua adesão a qualquer acompanhamento no CRI do Litoral Alentejano. Referiu que o arguido compareceu a algumas consultas, mas faltou mais vezes do que aquelas que compareceu, o que torna muito difícil para que o mesmo faça um verdadeiro tratamento

Quando comparece, volta-lhe a ser marcada uma nova consulta com um espaçamento temporal muito grande, e essa questão foi colocada pela senhora técnica, tendo-lhe sido dito, que aquela era a data que o arguido tinha pedido, com fundamento no facto de não poder ir mais vezes por questões de trabalho. Não obstante esta justificação por parte do arguido, a DGRSP tem conhecimento que o mesmo umas vezes trabalha, outras vezes não trabalha ou trabalha só quando o dinheiro acaba. Tem, por isso, disponibilidade para ir às consultas, se forem quinzenais ou semanais e não o faz. Paralelamente, continua a beber com muita frequência, em excesso, e mesmo agora durante o estado de emergência, com os cafés fechados, comprava bebidas alcoólicas para consumir em casa, mantendo sempre o mesmo padrão de consumo que anteriormente. O arguido refere que com a mãe (a vítima), que não há conflito nenhum, mas ele também não admite os factos pelos quais foi condenado, portanto, a autocrítica dele é nula. Por outro lado, a vítima diz que ele não voltou a ser violento fisicamente com ela, mas quando chega a casa ao fim do dia depois de estar no café, é muito difícil lidar com ele, porque ele tem um comportamento muito irritável e com pouca tolerância a qualquer palavra que a mãe diga, sendo que a mesma tem feito um esforço muito grande para que nada tenha acontecido até agora

Os motivos que podem determinar a revogação da suspensão da pena de prisão constam do artigo 56.º, n.º 1, do mesmo Código, o qual determina, por sua vez, que: “A suspensão da execução da pena de prisão é revogada sempre que, no seu decurso, o condenado: a) Infringir grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos ou o plano de reinserção social; ou, b) Cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas”

Conforme resulta deste preceito, a revogação não é automática e só deve ter lugar quando o incumprimento dos deveres ou o cometimento do facto ilícito que determinou a condenação posterior revelarem que as finalidades que estavam na base da suspensão já não podem ser atingidas através dessa suspensão

A suspensão de execução da pena, enquanto medida com espaço autónomo no sistema de penas da lei penal, traduz-se numa forte imposição dirigida ao agente do facto para pautar sua a vida de modo a responder positivamente às exigências de respeito pelos valores comunitários, procurando uma desejável realização pessoal de inclusão, e por isso também socialmente valiosa

Para além das circunstâncias do facto e das condições pessoais do agente, a satisfação das finalidades da punição constitui um dos pressupostos relevantes da suspensão da pena, no sentido de que esta medida não poderá ser decretada quando não satisfaça, em concreto, aquelas finalidades

A suspensão da execução da pena de prisão, aqui prevista, assenta num prognóstico favorável relativamente ao comportamento futuro do agente, que se fundamentará na ponderação da personalidade do agente e das circunstâncias do facto (mesmo posteriores ao facto e mesmo que tenham já sido valoradas em sede de medida da pena)

No caso dos presentes autos, decorridos quase 2 anos desde a sua condenação, o mesmo não demonstrou, demonstra a mínima vontade ou empenho em cumprir a condição que lhe foi imposta no plano de readaptação social e que constitui condição da suspensão da execução da pena de prisão

Ao invés, o arguido, alheou-se totalmente da obrigação de cumprimento da condição que lhe foi imposta, não reconhecendo a necessidade de tratamento ou de comparecer às consultas, mesmo que instado a fazer pela Técnica que o acompanhava, denotando uma ausência de autocrítica para o seu comportamento e uma manifesta insensibilidade ao direito e às consequências inerentes à sua condenação nos presentes autos

Acresce ainda que é patente no comportamento do arguido que o mesmo não pretende adoptar uma postura diferente, porquanto, não obstante o juízo de prognose favorável que lhe foi feito mediante a suspensão da execução da pena, o mesmo não cumpre a condição imposta mantendo o mesmo padrão de consumo de bebidas alcoólicas com total ausência de autocrítica para o seu comportamento e negando o mesmo

Por outro lado, esta postura do arguido e a persistência do mesmo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT