Acórdão nº 00212/12.4BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Julho de 2021
Magistrado Responsável | Maria Fernanda Antunes Apar |
Data da Resolução | 15 de Julho de 2021 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO A. instaurou acção administrativa comum contra a Junta de Freguesia (...), ambos melhor identificados nos autos.
Invocou, em síntese, i) que é proprietário de um conjunto de prédios rústicos em (...); ii) a Junta de Freguesia (...) levou a cabo actos dentro da sua propriedade, como seja a remoção de rede e de pedras aí colocadas; iii) colocou placa toponímica a nomear um caminho que passava dentro da sua propriedade; iv) tal actuação de criação de um caminho teve como único intuito lesá-lo; v) abuso de poder; vi) omissão do dever de audiência dos interessados; vii) carência de forma legal; viii) ofensa ao conteúdo essencial do direito de propriedade; ix) danos causados pela conduta ilícita.
Terminou pedindo: - A condenação da Ré “ao restabelecimento de direitos e interesses violados, retirando as placas toponímicas, devolvendo os materiais que retirou e reconhecendo o A. como único e legítimo proprietário da faixa indevidamente apossada;” - A condenação da Ré “em litigância de má-fé face ao abuso de poder, ao incumprimento das disposições administrativas em vigor e ao prejuízo causado ao A. sem que o interesse público o justificasse e a lei o fundamentasse.” Subsidiariamente, pediu: - A condenação da Ré no pagamento da quantia de 11.701,88 € a título de danos patrimoniais e 1.000 € a título de danos morais, sendo esta última importância a entregar numa instituição de solidariedade social que a própria Junta defina.
Por decisão proferida pelo TAF de Penafiel foi julgada procedente a acção e: - Reconhecido o Autor como legítimo proprietário da parcela de terreno designada por Caminho da (...); - Condenada a Ré, no prazo de 30 dias e sob pena de eventual condenação dos seus representantes em sanção pecuniária compulsória, a: - Restituir ao Autor a pedra, os três metros de rede e os seis metros de cabo de aço retirados da sua propriedade em 21-01-2012; - Retirar as placas toponímicas contendo a designação “Caminho da (...)” colocadas à entrada e à saída da propriedade do Autor; - Condenada a Ré a abster-se de obstar a que o Autor exerça o seu direito de propriedade sobre aquela parcela de terreno; Desta vem interposto recurso.
Alegando, a Ré formulou as seguintes conclusões: 1ª - Vem o presente recurso interposto da sentença proferida nos referenciados autos que julgou a ação procedente e, em consequência, reconheceu o ora Apelado como legítimo proprietário da parcela de terreno designada por Caminho da (...), e condenou a ora Apelante a, no prazo de 30 dias e sob pena de eventual condenação dos seus representantes em sanção pecuniária compulsória, i) restituir ao Apelado a pedra, os três metros de rede e os seis metros de cabo de aço retirados da sua propriedade em 21-01-2012, ii) retirar as placas toponímicas contendo a designação “Caminho da (...)” colocadas à entrada e à saída da propriedade do Autor, e iii) abster-se de obstar a que o Autor exerça o seu direito de propriedade sobre aquela parcela de terreno, e, finalmente, iv) nas custas do processo.
2ª – A Apelante estriba o seu dissídio quanto ao sentenciado por padecer de erro na valoração e apreciação da prova testemunhal produzida e consequente decisão sobre a matéria de facto; 3ª- Insurge-se ainda contra a mesma por, consequentemente, a sentença padecer de errada aplicação do direito, quer quanto à qualificação do caminho em discussão nos presentes autos, quer mesmo quanto à condenação em custas.
4ª - A Apelante considera incorretamente julgados os pontos A., B., C., D., E., M., S., RR., XX. dos factos provados, e 1. dos factos não provados, 5ª - Os depoimentos das testemunhas J., cujo depoimento se encontra gravado do minuto 00:00 ao minuto 50:19 no registo da gravação áudio da audiência realizada no dia 29-10-2020, da testemunha A., cujo depoimento se encontra gravado do minuto 50:30 ao minuto 1:35:22 no registo da gravação áudio da audiência realizada no dia 29-10-2020 e da testemunha E., cujo depoimento se encontra gravado do minuto 2:37:21 ao minuto 3:19:25 no registo da gravação áudio, impunham decisão diversa; 6ª – Com efeito, tribunal a quo considerou que “A. Antes de 1985 existia um caminho de pé-posto desde aquilo que é hoje a Rua (...) e o Lugar da (...), que servia as pessoas do Lugar da (...) e a Quinta da (...)”; 7ª – Todavia, a prova testemunhal produzida não permite concluir que o caminho em apreço se tratava de um “caminho de pé posto”, nem que servia apenas as pessoas do Lugar da (...) e a Quinta da (...); 8ª - Face aos depoimentos das testemunhas J., (aos minutos 01:42, 30:27 e 41:04), A. (aos minutos 52:20 e 1:19:45) e E., (ao minuto 2:41:15) resulta, sem margem para equívocos, que o Caminho da (...), anteriormente a 1985, permitia a passagem de animais de carga, carros de bois e pessoas, e o seu traçado iniciava-se junto a um tanque existente à margem da Rua (...), servia a casa da (...) e quatro outras propriedades situadas à sua margem e terminava no moinho existente junto ao rio.
9ª - Assim, face à prova produzida, impõe-se a alteração do ponto A: dos factos assentes, nos seguintes termos: “A. Antes de 1985 existia um caminho por onde passavam pessoas, animais de carga e carros de bois, desde aquilo que é hoje a Rua (...) e o Lugar da (...), que servia as pessoas do Lugar da (...), a Quinta da (...) e outras quatro quintas, e as pessoas que se dirigiam a um moinho junto ao rio.” 10ª - Os mesmos elementos de prova não permitem também que o Mmo Juiz a quo, na sua decisão sobre a matéria de facto, tivesse dado como provado que “B.
Esse caminho ia desde o tanque que ficava junto do caminho que deu origem à Rua (...), na Bouça do (...), até ao Lugar da (...).”; 11ª – Com efeito, face aos depoimentos indicados na conclusão em 8ª e ainda de J., (aos minutos 12:54 e 38:29, de A. de e E., (ao minutos 2:41:45), resulta claramente que o caminho em apreço tem efetivamente, o seu início próximo de um tanque situado junto do caminho que deu origem à Rua (...), mas não na Bouça do (...), propriedade do Apelado, pois que, só após uma distância de cerca de 30 metros medida a partir do referido tanque, atravessa, aí sim, a dita bouça; 12ª - Assim, face à prova testemunhal produzida, impõe-se a alteração do ponto A: dos factos assentes, nos seguintes termos: “B. Esse caminho ia desde o tanque que ficava junto do caminho que deu origem à Rua (...), passava pelo Lugar da (...) e ia até ao moinho junto ao rio.” 13ª - A mesmíssima prova testemunhal produzida sobre os pontos A. e B. dos factos provados não autoriza, também, que o Mmo. Juiz a quo tivesse dado como provado em C. que “C. Nesse percurso, o caminho atravessava a Bouça do (...), dividindo-a a meio, e ainda outros terrenos agrícolas, a jusante deste, que hoje pertencem á família A. e ao pai da actual presidente da Junta de Freguesia”.
14ª - Com efeito, como atrás referido, logo no seu início, o caminho passa por uma parcela de terreno de um tal E., numa distância de cerca de 30 metros, situando-se a propriedade do Apelado do lado de baixo, delimitada por um muro de pedra (cfr. depoimento da testemunha E., gravado ao minuto 2:41:15), e só depois é que atravessa a Bouça do (...); 15ª - Assim sendo, face à prova testemunhal produzida, impõe-se a alteração do ponto C: dos factos assentes, nos seguintes termos: “C. Nesse percurso, o caminho atravessava, logo no seu início, um prédio de E., a Bouça do (...), dividindo-a a meio, e ainda outros terrenos agrícolas, a jusante deste, que hoje pertencem á família A. e ao pai da actual presidente da Junta de Freguesia”; 16ª - Embora assumindo menor relevância para o thema decidendum, a decisão sobre a matéria de facto vertida nos pontos D. e E. dos factos provados enferma de uma imprecisão que não é, de todo, despicienda; 17ª - Com efeito, em ambos os pontos se faz referência a “Esse caminho…”, ou seja, o caminho de pé-posto existente antes de 1985; 18ª - Sucede que, em causa nos presentes autos está o “Caminho da (...)”, cuja extensão, assinalada pelo Apelado em 51º da P.I., será de 87,5 metros de comprimento, por cerca de 2 metros de largura; 19ª - Dúvidas não restarão, assim, quanto a poder afirmar-se que a parte do primitivo caminho que” tinha uma inclinação muito acentuada não oferecendo condições para a sua pavimentação e não permitia a passagem de veículos automóveis”, era a parte que hoje corresponde ao traçado do Caminho da (...), tanto assim que após o alargamento do trilho identificado em G. dos factos provados, o – esse sim – novo Caminho da G. foi empedrado e infraestruturado; 20ª - Haverá, assim, que ser alterada a decisão sobre a matéria de facto que consta dos factos dados como assentes em D. e E., dos factos provados, deles passando a constar a referência a “O Caminho da (...)”, em vez de “Esse caminho”; 21ª – Por outro lado, a decisão sobre a matéria de facto padece de várias incongruências e contradições; 22ª Desde logo, em M: dos factos provados, dá-se como assente que “M.
Pelo menos desde o alargamento do trilho a que se referem os pontos G e H do probatório, o Caminho da (...) nunca mais foi limpo pela Junta de Freguesia”; 23ª - Porém, ao contrário, em AA. do probatório, dá-se como assente que “AA. De 2011 em diante, o designado Caminho da (...) foi limpo pela Junta de Freguesia apenas uma vez”; 24ª - Ora, se o alargamento do trilho ocorreu em 1983-1985, ou seja, em data anterior a 2011, carece de sentido o facto dado como assente em M., pelo que se impõe a respetiva eliminação; 25ª - Ocorre manifesta contradição o decidido na sentença sobre os factos dados como assentes em S. e RR. do probatório; 26ª – Aí se dá como provado que “S. E. possui uma faixa de terreno de cerca de 30-40m do lado nascente do actual Caminho da (...), ladeado por um muro de pedra” e, por outro que “RR. O designado Caminho da (...), na configuração que lhe foi dada em 2012, atravessa única e exclusivamente a propriedade do A.”...
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