Acórdão nº 2100/20.1BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 09 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelPEDRO NUNO FIGUEIREDO
Data da Resolução09 de Setembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul I. RELATÓRIO V... Portugal – C..., S.A.

, instaurou ação de contencioso pré-contratual contra o Ministério da Justiça, pedindo i) a anulação do ato de adjudicação da proposta da contrainteressada N…; ii) a anulação, por invalidade consequente, do contrato celebrado em sua execução; iii) a anulação de todo o procedimento por ilegalidade congénita; iv) a condenação da entidade adjudicante a abrir novo procedimento sem incorrer na mesma ilegalidade, de forma a que nele seja escolhida a proposta economicamente mais vantajosa.

Indicou como contrainteressadas N..., S.A.

, e M..., S.A.

Por decisão de 28/02/2021, o TAC de Lisboa - Juízo de Contratos Públicos julgou a ação improcedente.

Inconformada, a autora interpôs recurso daquela decisão, terminando as alegações com a formulação das conclusões que seguidamente se transcrevem: “I – DO OBJECTO DO PRESENTE RECURSO A. A sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa que julgou improcedente a acção proposta pela Autora V..., e, consequentemente, absolveu a Entidade Demandada e a Contra-interessada do pedido de anulação do acto de adjudicação adoptado, em 20.10.2020, por Despacho de Sua Excelência o Senhor Secretário de Estado Adjunto e da Justiça, ao abrigo do Acordo-Quadro SMT-2019 da Entidade de Serviços Partilhados da Administração Pública, I.P. (ESPAP), para aquisição de Serviços Móveis de Voz e Dados (referência PAQ/01/2020/UCMJ), bem como, por invalidade consequente, do Contrato respectivo se este tivesse sido entretanto celebrado ou o fosse, na pendência da acção.

  1. Pedia-se, ainda, a anulação de todo o procedimento por ilegalidade congénita, a condenação da Entidade Adjudicante a abrir novo procedimento sem incorrer na mesma ilegalidade, de forma a que nele seja escolhida a proposta economicamente mais vantajosa.

    II – IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO C. O Tribunal a quo errou na decisão da matéria de facto, ao dar como não provados os factos referidos em 1), 2) e 3) da matéria de facto.

  2. Na motivação, o Tribunal limitou-se a referir que esses factos resultaram da “tomada de posição definida pela ED, em concreto, no artigo 3.º da sua contestação, sobre os factos articulados pela Autora na petição inicial, na qual afirmou, de forma explicita, que “apenas se consideram admitidos os factos descritos na petição inicial (p.i.) e elencados nos seus artigos 2.º a 4.º, 6.º a 8.º, 12.º, 13.º, 16.º, 17.º, 19.º, 28.º, 29.º e 39.º a 41.º, impugnando-se todos os demais”.

  3. Tal decisão corresponde a manifesto erro de julgamento sobre a matéria de facto, por errada apreciação da prova produzida, uma vez que, independentemente da posição tomada pela Entidade Demandada – que mais não foi do que uma impugnação não especificada, sem remissão para qualquer elemento probatório, sem justificação, meramente conclusiva e, pior, que em nada contradiz a restante posição assumida pela Entidade Demandada e Contra-interessada relativamente aos factos –, os documentos juntos aos autos imporiam que aqueles factos fossem dados como provados.

  4. No que respeita ao facto não provado referido no n.º 1), relativo ao ciclo de vida útil dos equipamentos cujo fornecimento constitui o objeto do contrato em apreço, a Entidade Demandada impugnou – embora não especificadamente – o facto de que os equipamentos a adquirir no âmbito do contrato tivessem tipicamente um ciclo útil de vida de 3 anos.

  5. Todavia, é facto público e notório, decorre da experiência comum que este tipo de equipamentos não dura muito mais do que 3 anos, excepto alguns equipamentos topo de gama (que não é o caso dos que se forneceriam pela adjudicatária) seja porque se tornam rapidamente obsoletos em virtude do aparecimento permanente de novas aplicações e software, seja porque os próprios materiais não resistem muito mais do que esse período de tempo, devido ao uso intensivo e permanente destes equipamentos.

  6. Por outro lado, a prova documental produzida também revela claramente que é esse o período de vida útil estimado para o uso destes equipamentos, designadamente o próprio Caderno de Encargos, que estabelece como período de vigência do contrato 36 meses, e reconhece que um prazo de garantia superior a 24 meses é já uma vantagem considerável para este tipo de equipamentos, sendo que se atribuía pontuação máxima (100 pontos), caso os candidatos tivessem oferecido prazos de garantia de 3 anos.

    I. Por último, a duração do contrato (de 36 meses, com exceção do contrato a celebrar pelo Supremo Tribunal Administrativo, cuja duração é de 24 meses) é também fixado, no sentido de corresponder a esse prazo de vida útil.

  7. Nestes termos, deverá ser modificada a decisão sobre a matéria de facto e ser dado como provado o facto referido em 1) dos factos não provados.

  8. Em segundo lugar, o Tribunal a quo deu também como não provado que “2) A maior parte, se não a totalidade, das quantidades previstas para fornecimento de equipamentos será executada logo no princípio do Contrato, o que determinará que se venham a aplicar os referidos consumos mínimos - facto invocado no artigo 10.º da petição inicial; impugnado pela ED no artigo 3.º da sua contestação”.

    L. Tal decisão é contraditória com a motivação expendida na sentença recorrida, relativamente a este ponto: “Saliente-se aqui, a propósito do facto descrito em 2), que o que resulta provado nos autos, na decorrência dos esclarecimentos prestados pelo júri no procedimento é que “2 – Os equipamentos a solicitar, serão essencialmente no início do contrato, sendo que apenas pontualmente e em algum caso excecional, poderão ser solicitados equipamentos posteriormente”, mas do qual não é possível inferir sobre a efetivação da “maior parte” ou “totalidade” das quantidades previstas para o fornecimento”.

  9. De facto, não se compreende como o Tribunal tenha lido e citado o esclarecimento do júri de que os equipamentos a solicitar só o seriam “posteriormente” ao início do contrato “apenas pontualmente e em algum caso excecional”, para depois concluir que não é “não é possível inferir sobre a efetivação da “maior parte” ou “totalidade” das quantidades previstas para o fornecimento”, sobretudo porque deu como provado, na alínea E) da matéria de facto dada como provada que “consta do Anexo A do Convite…” as estimativas de fornecimento de cerca de dois mil [!!!] equipamentos.

  10. Pelo que, face à prova produzida e ao que estava estabelecido no art.º 16.º, n.º 6, do Caderno de Encargos do Acordo Quadro e na Cláusula 9.ª, n.º 4, do Caderno de Encargos, o Tribunal a quo teria de ter dado como provado que os equipamentos a fornecer ao abrigo do contrato, estimados 2.341 seriam fornecidos logo no início do contrato, salvo casos pontuais e excepcionais: O. Assim, da conjugação dos factos provados nas alíneas C) e E) da matéria de facto, com os esclarecimentos prestados pelo júri e na Cláusula 9.ª, n.º 4, do Caderno de Encargos, deverá ser modificada a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal a quo, no sentido de dar como provado que: [NOVO PONTO DA MATÉRIA DE FACTO]: O Convite à apresentação de propostas previa que o adjudicatário fornecesse 2.241 (dois mil trezentos e quarenta e um) equipamentos, que deveriam ser entregues logo no início do contrato, salvo em casos pontuais e excecionais, sendo que, por tais fornecimentos, a entidade adjudicante ficaria obrigada a pagar os consumos mínimos previstos na proposta.

  11. Na sentença recorrida, mais uma vez motivada pela impugnação genérica, constante do artigo 3.º da contestação, deu-se também como não provado que “3) – Tendo em conta as quantidades de consumos estimadas e que serviram de critério a este procedimento, e as quantidades de equipamentos a fornecer com o consumo mínimo associado, o valor global a pagar no final do Contrato corresponderá ao valor de ambas as rubricas: tarifário e equipamentos/consumo mínimo - facto invocado no artigo 11.º da petição inicial; impugnado pela ED no artigo 3.º da sua contestação”.

  12. Todavia, este facto resulta também inevitavelmente da restante matéria de facto dada como provada, pelo que não podia esta matéria ser dada como não provada.

  13. Com efeito, se ficou patente nas peças do procedimento acima referidas que a adjudicatária teria de fornecer equipamentos, que ficariam sujeitos ao pagamento de um consumo mínimo, e que, excedido esse consumo mínimo haverá sempre de pagar o preço fixado no tarifário, é de meridiana conclusão que os montantes que serão gastos, a final, pela entidade adjudicante serão calculados pela conjugação do preço do tarifário com os valores de consumos mínimos.

  14. Mais: a cláusula 10.ª, n.º 2, do Convite (e 4.ª, n.º 2, do Caderno de Encargos) – referida no facto provado E) – estabelece que “o preço total proposto resulta do somatório obtido entre o montante total proposto para o ‘Tarifário Proposto’ (TP) e o valor total proposto para o ‘Consumo mínimo associado à disponibilização de terminais (CM)”.

  15. Pelo que a decisão sobre a matéria de facto deverá também ser alterada, aditando-se à matéria de facto provada o facto não provado 3), com base nos meios probatórios acima referidos e em conjugação com o facto provado E).

    III – OS ERROS DE JULGAMENTO DA SENTENÇA RECORRIDA U. O cerne da questão decidenda consiste em saber se a Entidade Adjudicante usou legitimamente, ou não, dos seus poderes discricionários na determinação de critérios de adjudicação, no caso no que respeita ao peso de ponderação dos coeficientes relativos à avaliação do “tarifário” (que valeria 70%) e aos consumos mínimos decorrentes da substituição de terminais (que valeria 25%).

    V. A...

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