Acórdão nº 617/19.0T8CNT.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 07 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelALBERTO RU
Data da Resolução07 de Setembro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório a) Corre termos no Cartório Notarial de ..., a cargo da Sra. notária ..., um processo de inventário, com o n.º ..., no qual a Recorrente é interessada na qualidade de herdeira das heranças que aí se partilham por óbitos dos seus pais.

    Neste inventário a Recorrente apresentou um requerimento com estas pretensões: 1 - «colação para consequente redução por inoficiosidade de todas as doações feitas em vida às suas duas irmãs, A... e P...»; 2 - Redução da doação do prédio misto descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº ..., da freguesia de ...

    Este prédio misto descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ..., da freguesia de ..., tem registado, sob a Ap. 32, de 1994/06/29, um «ónus de eventual redução de doação».

    Na sequência da dedução destas pretensões, a Recorrente pediu, através das «Ap. 6049 e AP 6050», à Conservatória do Registo Predial de ..., «o registo dos seus legítimos direitos propugnados por um Ónus de Colação para Redução de Doação lavrado sob registo oficioso sobre o prédio n.º ... da freguesia e Concelho de ..., através da AP. 32, já invocados no âmbito do processo de inventário n.º ... a correr termos no Cartório Notarial de ...».

    [Este texto entre aspas é da autoria da Recorrente e identifica o pedido feito na Conservatória. Foi extraído do ponto n.º 8 do requerimento que a Recorrente dirigiu ao Tribunal da Comarca de Cantanhede, onde deu entrada em 9 de setembro de 2019, o qual deu origem à presente impugnação da decisão proferida pela mencionada Conservatória – cfr. fls. 5 dos presentes autos de recurso.

    Como não se vislumbra nestes autos de recurso o pedido concretamente feito pela Recorrente na Conservatória do Registo Predial de ..., exarou-se aqui esta afirmação da própria Recorrente sobre o conteúdo desse pedido] O pedido de registo foi recusado pela Sra. Conservadora por duas razões, que se sintetizam assim: Por um lado, porque o pedido formulado não continha factos sujeitos a registo predial; Por outro, porque as pretensões formuladas no inventário não podiam ser consideradas como «ações» para efeitos do disposto no artigo 3.º do Código de Registo Predial, norma esta que versa sobre «ações, decisões, procedimentos e providências sujeitos a registo».

    A Recorrente interpôs recurso hierárquico o qual manteve a recusa de registo e impugnou tal recusa no Tribunal da Comarca de Cantanhede.

    O Tribunal da Comarca de Cantanhede proferiu a decisão que deu origem ao presente recurso, ou seja: «Em conclusão, não sendo comprovada a instauração ou pendência de ação sujeita a registo, nem titulando os documentos apresentados com o pedido de registo quaisquer factos registáveis, designadamente ao abrigo das alíneas a) e v) do nº 1 do art. 2º do CRPredial, outro não poderia ser o sentido da decisão da Srs. Conservadora senão o da recusa decretada.

    Pelo exposto, julgo improcedente a presente impugnação judicial e, por consequência, mantenho as decisões tomadas pela Senhora Conservadora da Conservatória do Registo Predial de ...» b) Como se acabou de dizer, o presente recurso vem interposto desta decisão.

    As respetivas conclusões são as seguintes: «A- Vem o presente Recurso interposto da Sentença proferida pelo Juiz do Juízo Local de Cantanhede – Juiz 1, Proc. Nº ... que veio em apreciação da Impugnação Judicial interposta pela Recorrente, julgar a mesma “Pelo exposto, julgo improcedente a presente impugnação judicial e, por consequência, mantenho as decisões tomadas pela Senhora Conservadora da Conservatória do Registo Predial de ..

    .” B- A decisão ora recorrida, veio mostrar-se ferida do vício da nulidade prevista nos termos do art.º 615, n º 1, alínea d) do CPC, em vários segmentos, como a seguir se identificam: SOBRE A DETERMINAÇÃO DO OBJETO DOS PEDIDOS DE REGISTO PRECONIZADA PELO TRIBUNAL A QUO C- Verifica a Recorrente primeiramente, que o objeto determinado pelo Tribunal a quo confunde conceitos de Redução em toda a sua amplitude, pois nem a Redução operada no âmbito sucessório por excesso de quota disponível, atinge o bem erga omnes, como foi expressamente considerado na decisão, nem o exercício potestativo do direito juridicamente tutelado aos herdeiros legitimários de requerer a Redução e o seu registo tendo por fundamento o Ónus Real oficiosamente decretado em 29-06-1994 conforme comprovou pela Certidão do imóvel que juntou, pode ser desqualificado na sede onde pode e deve ser requerido – a do Processo de Inventário -.

    D- Resultando que efetivamente só por este meio a Legítima do herdeiro Requerente fica totalmente protegida em cado de alienação a terceiros, os quais só nesta circunstância respondem com o bem ou mesmo com o valor do mesmo.

    E- E, na verdade, a Recorrente veio requerer o registo de um direito potestativo que exerceu em sede de Inventário e se fundamentou no Ónus de Eventual Redução de doação celebrada por conta da legítima, oficiosamente decretado desde 29-06-1994.

    F- O Tribunal a quo ao atribuir a este Ónus qualidades erga omnes, que operariam automaticamente no âmbito do Inventário, mesmo que o Herdeiro legitimário não exercesse os seus direitos potestativos pelos quais poderia requerer a tutela jurídica do Ónus oficiosamente decretado em 29-06-1994, nos termos do art.º 2169º. do CC, quando o bem é alienado, permitindo as mesmas segundo decidiu que os herdeiros legitimários exigissem de terceiro o pagamento da sua legítima, caso a pretendessem receber em espécie, ou o seu valor, no caso nem a Herança ou o património das donatárias apresentar bens suficientes para o pagamento das tornas encontradas em sede de Inventário, desviou-se da apreciação da amplitude jurídica permitida pelo Ónus registado, pois este muito embora seja um Ónus Real, só atinge terceiros se for invocado através de Requerimento( pelos herdeiros legitimários) ou Ação judicial (por quaisquer outros terceiros), constituindo quer os Requerimentos com valor de Ação Judicial ou as Ações judiciais propriamente ditas fundamento válido e eficaz para que os pedidos de registos apresentados sejam deferidos.

    G- Por outro lado, constata-se que o Tribunal a quo ao considerar que não se tinham cumprido os pressupostos dos registos pois a Recorrente tinha apresentado um Requerimento e não tinha intentado uma Ação Judicial, proferiu uma decisão nula nos termos do art.º 615, nº. 1 alínea d) do CPC, pois que efetivamente não apreciou questões que deveria ter apreciado quanto à equiparação dos Requerimentos submetidos em sede de Inventário com as Ações civis.

    H- Nesta medida, o Tribunal a quo desvirtuando o alcance dos valores axiológico-normativos impostos pelo Lei nº 23/2013, de 5 de março, desconsiderou a tutela jurídica exercida pela Recorrente no âmbito dos seus preditos direitos potestativos e, ao fazê-lo, impediu consentaneamente o registo da suspensão da prescrição dos direitos invocados pela Recorrente, no âmbito dos Requerimentos submetidos.

    I- O Tribunal a quo formulou ainda de forma incorreta o objeto do registo peticionado pela Recorrente – Registo dos requerimentos submetidos em sede de Inventário para Redução Eventual de doação – o qual não se espelha na seguinte redação: “2) Nesse processo a ora impugnante apresentou requerimento autónomo de “colação para consequente redução por inoficiosidade de todas as doações feitas em vida às suas duas irmãs, A... e P...” e onde requereu a redução da doação do prédio misto descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº ..., da freguesia de... ” J- Na verdade, a Recorrente veio apresentar a Registo os seguintes três Requerimentos deduzidos:

    1. REQUERIMENTO DE REDUÇÃO DE LIBERALIDADES b) REQUERIMENTO PARA RELACIONAÇÃO OFICIOSA DE DOAÇÕES c) REQUERIMENTO COLAÇÃO K- Tendo a Recorrente apresentado com os mesmos a seguinte inventariação de documentos: A) Certidão de óbito de J...

    B) Certidão de óbito de M...

    C) Habilitação de herdeiros de J...

    D) Habilitação de herdeiros de M...

    E) Escritura de Doação celebrada em 17-3-1994 F) Certidão permanente do Imóvel sobre o qual recaiu o registo do Ónus de Eventual Redução G) Requerimento de Abertura de Inventário nº ...

    H) Requerimento de Identificação de Herdeiros I) Requerimento de Cumulação de Inventários J) Requerimento aditamento retificação Relação de Bens K) Imposto Sucessório pago sobre o imóvel em crise L) Requerimento adicional imposto selo ...

    M) Requerimento adicional imposto sucessório J...

    N) Requerimento Autoridade Tributária Abertura de Inquérito O) Requerimento Autoridade Tributária sobre Adicional à Relação de Bens P) Requerimento Autoridade Tributária sobre a Cessão do Quinhão hereditário promovida por uma das donatárias Q) Requerimento Autoridade tributária sobre o imóvel em crise R) Auto de declarações Cabeça de Casal S) Cartão de Cidadão – frente T) Cartão de Cidadão – verso L- Resultando, assim, inequívoco, que o Tribunal a quo ao reconduzir os Requerimentos apresentados pela Recorrente, a um único Requerimento transmutou a natureza e o fim de cada um dos mesmos.

    M- Do exposto mais se assacando que o Tribunal a quo registou uma apreciação sobre matéria controvertida inexistente nos autos, construindo sobre a mesma uma incorreta construção do silogismo judiciário que assentou na falta de leitura e concretização da carga probatória relacionada ao exercício dos seus direitos potestativos no âmbito do Ónus de Eventual Redução já registado.

    N- Por todas estas razão encontra-se a decisão ferida da nulidade prevista na al. d) do art. 615º, nº 1 do CPC, pois não apreciou devidamente as questões que deveria ter apreciado, afrontando clamorosamente o disposto nos art. 2º, nº 1, a) e v) e 3º, nº1, a) do Código do registo Predial, e art.º. 8º-A, nº 1, a) 1ª parte do CRP, urgindo em consequência seja a mesma revogada e substituída por outra que...

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