Acórdão nº 681/21 de Tribunal Constitucional (Port, 27 de Agosto de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Teles Pereira
Data da Resolução27 de Agosto de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 681/2021

Processo n.º 866/2021

Plenário

Relator: Conselheiro José António Teles Pereira

Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional

I – A Causa

1. O Grupo de Cidadãos Eleitores “União SOLC” dirigiu, em 19/07/2021, uma queixa à Comissão Nacional de Eleições (CNE), com o seguinte teor: “[ao] abrigo do calendário eleitoral para as autárquicas de 2021, vimos pelo presente e tendo por base o artigo 38 e 41 da LEOAL e Lei 26/99, apresentar denúncia contra a entidade supra referida de publicidade institucional que viola as normas atrás referidas, nomeadamente publicações da página do Facebook «União das Freguesias de Sandim, Olival, Lever e Crestuma»”.

Na sequência de pedido da CNE, foram enviadas imagens das publicações em causa (cfr. fls. 10-v.º/12).

1.1. Foi ouvido o Presidente da Junta da União de Freguesias de Sandim, Olival, Lever e Crestuma (doravante, “Presidente da Junta de Freguesia de SOLC”), que se pronunciou no sentido do arquivamento do processo.

1.2. Apreciando a queixa, a CNE, em reunião plenária que teve lugar em 19/08/2021, deliberou: (i) determinar a abertura de procedimento contraordenacional contra o Presidente da Junta de Freguesia de SOLC, por violação do n.º 4 do artigo 10.º da Lei n.º 72-A/2015, de 23 de julho; (ii) notificar o Presidente da Junta de Freguesia de SOLC para proceder à remoção das publicações na rede social Facebook identificadas na queixa apresentada, sob pena de cometer crime de desobediência; e (iii) recomendar ao Presidente da Junta de Freguesia de SOLC que, no decurso do período eleitoral, até à realização do ato eleitoral marcado para 26 de setembro próximo, se abstenha de efetuar, por qualquer meio, todo e qualquer tipo de publicidade institucional proibida. Assentou tal deliberação nos seguintes fundamentos:

“[…]

«1. No âmbito da eleição para os órgãos das autarquias locais, de 26 de setembro de 2021, o Grupo de Cidadãos Eleitores União SOLC apresentou uma participação denunciando, em síntese, que a Junta de Freguesia de Sandim, Olival, Lever e Crestuma, através de publicações na sua página oficial na rede social Facebook viola os deveres especiais de neutralidade e imparcialidade, por estas integrarem realização de publicidade institucional proibida, prevista no n.º 4 do artigo 10.º da Lei n.º 72-A/2015, de 23 de julho.

2. Das referidas publicações consta o seguinte:

Publicação de 19 de julho às 13:00, composta por imagens (3) acompanhadas do seguinte texto:

“Lever vai ter mais 17 jazigos

A construção de jazigos nos diferentes cemitérios da freguesia têm sido obras feitas ao longo do tempo, para dar resposta às carências e apelos dos cidadãos.

Ao todo foram construídos dezenas de jazigos, estando agora a começar novas obras no cemitério de Lever, que vão dar origem à construção de mais 17 jazigos…” (sublinhado nosso)

– Publicação de 17 de julho às 18:45, composta por imagens da praia fluvial e do seguinte texto “Já pode ir à praia em Lever

A Freguesia de Sandim, Olival, Lever e Crestuma, tem, a partir de hoje, mais um espaço de lazer para os habitantes e para todos os que a visitam.

A nova praia fluvial, localizada em Lever, está disponível para todos os que querem aproveitar estes dias de calor (e não só), usufruindo de um espaço de qualidade, e da segurança que a presença de nadadores salvadores garante.

À beleza do rio, acrescenta-se ainda um conjunto de estruturas de lazer, das quais se destacam várias mesas para piquenique.

A obra resultou de uma parceria entre a Câmara de Gaia, a Junta da União de Freguesias da SOLC, e a empresa águas de Gaia.” (sublinhado nosso)

– Publicação de 15 de julho às 18:01, composta por imagens (4) e de um texto intitulado “Obras na EB1/JI da Igreja 1 e 2 de Sandim”, cujo teor, em síntese, refere que “(…) as obras de reabilitação da EB1/JI da Igreja 1 de Sandim começaram (…). Durante o primeiro período haverá algum transtorno, mas são obras que visam melhorar as condições físicas do edificado, através da reabilitação dos três edifícios existentes, de forma a impedir a sua degradação irreversível.” E ainda que “(…) as obras da EB1 da Igreja 2 de Sandim vão proporcionar melhores condições aos utentes deste estabelecimento de ensino, com a construção de cobertura para o recreio e construção de acessos para pessoas de mobilidade reduzida.” (sublinhado nosso)

3. Notificado o Presidente da Junta de Freguesia de Sandim, Olival, Lever e Crestuma respondeu, em síntese, que “[as] publicações apresentadas (…) mais não são de que avisos à população. (…) Não são publicações de promoção, não utilizam linguagem propagandística nem foram concretizadas pela aquisição onerosa de espaços publicitários. (…) Trata-se de publicações que visam dar a conhecer um local disponível para atividades sazonais, de veraneio (…). Outras trata-se de avisos sobre o início de obras que causarão incómodos aos fregueses que usam tais espaços (…) em nenhum dos casos, estas publicações visam, direta ou indiretamente promover a imagem, iniciativas ou atividades da Junta de Freguesia ou do seu Presidente.”

4. A CNE, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 1.º da Lei n.º 71/78, de 27 de dezembro, «exerce a sua competência relativamente a todos os atos de recenseamento e de eleições para os órgãos de soberania, das regiões autônomas e do poder local».

5. Nas palavras do Tribunal Constitucional (cf. Acórdão n.º 509/2019) «[a] CNE desempenha um papel central de “guardião” da regularidade e legalidade democráticas dos procedimentos eleitorais da República Portuguesa».

6. De acordo com a alínea d) do n.º 1 do artigo 5.º da Lei n.º 71/78, de 27 de dezembro, compete à CNE assegurar a igualdade de oportunidades de ação e propaganda das candidaturas durante as campanhas eleitorais.

7. As entidades públicas, designadamente os órgãos das autarquias locais e os respetivos titulares, estão sujeitos, em todas as fases do processo eleitoral, a especiais deveres de neutralidade e de imparcialidade. Nestes termos, a Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais – LEOAL (aprovada pela Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de agosto) estabelece no artigo 41.º que “Os órgãos (…) das autarquias locais, bem como, nessa qualidade, os respetivos titulares, não podem intervir, direta ou indiretamente, na campanha eleitoral, nem praticar atos que, de algum modo, favoreçam ou prejudiquem uma candidatura ou uma entidade proponente em detrimento ou vantagem de outra, devendo assegurar a igualdade de tratamento e a imparcialidade em qualquer intervenção nos procedimentos eleitorais.”

8. Com este imperativo legal procura-se garantir, por um lado, a igualdade de oportunidades e de tratamento entre as diversas candidaturas e, por outro lado, que não existam interferências exteriores no processo de formação da vontade dos cidadãos para o livre exercício do direito de voto. A consagração de tais princípios e dos correspondentes deveres pretendem acautelar a prática de atos que, de algum modo, favoreçam ou prejudiquem uma candidatura em detrimento e/ou vantagem de outras.

9. De acordo com o disposto no art.º 38.º da LEOAL os princípios da neutralidade e imparcialidade a que todas as entidades públicas estão vinculadas são especialmente reforçados a partir da publicação, no Diário da República, do decreto que marca a data das eleições.

10. A partir desta publicação é também proibida a publicidade institucional por parte dos órgãos do Estado e da Administração Pública de atos, programas, obras ou serviços, salvo em caso de grave e urgente...

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