Acórdão nº 01386/17.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 02 de Julho de 2021

Magistrado ResponsávelHelena Canelas
Data da Resolução02 de Julho de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I. RELATÓRIO N.

(devidamente identificado nos autos) autor na ação administrativa que instaurou em 07/06/2017 no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto identificando como réus o MINISTÉRIO DA JUSTIÇA e o CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA – na qual peticionou a condenação destes a pagar-lhe a quantia global de 26.778,94 €, referentes a ajudas de custos e subsídio de deslocação referente ao exercício de funções na Secção de Comércio da Instância Central de Aveiro deslocalizada em Anadia, acrescida de juros de mora vincendos calculados sobre o montante de 25.381,72€, bem como as ajudas de custos vincendas, relativas aos meses de junho e julho de 2017, no montante total de 3.840,04 € - inconformado com a decisão proferida no despacho-saneador datado de 23/02/2018 (fls. 519 SITAF) pela Mmª Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro (Tribunal ao qual o processo foi remetido na sequência da decisão quanto à incompetência em razão do território proferida em 08/06/2017 pela Mmª Juíza do TAF do Porto – cfr. fls. 92 SITAF) que absolveu da instância quer o Conselho Superior da Magistratura quer o MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, o primeiro com fundamento em incompetência do Tribunal em razão da matéria e o segundo com fundamento na verificação da caducidade do direito de ação, dela interpôs o presente recurso de apelação (fls. 575 SITAF), formulando as seguintes conclusões, nos seguintes termos: I) Ao não atender o pedido, em relação a ambos os RR., e salvo o devido respeito por outra opinião, a Sentença recorrida incorreu em (i) erro de julgamento da matéria de facto, (ii) errada subsunção e aplicação do direito, padecendo ainda, a decisão recorrida (o que apenas subsidiariamente se aduz), de (iii) omissão de pronúncia, de facto e de direito e (iv) excesso de pronúncia, por violação do princípio do contraditório.

II) A Sentença em mérito padece de erro de julgamento da matéria de facto, ao não levar em conta factos essenciais, visto que, na matéria de facto dada como assente, omite resposta a parte significativa dos factos alegados na petição inicial (e nas contestações) admitidos por acordo ou provados por documento, quando tal matéria de facto é essencial, de acordo com as soluções plausíveis da questão de direito, para a apreciação do mérito da causa.

III) Embora o Tribunal se possa socorrer de factos que resultem da instrução e discussão da causa, e tenha por relevantes no seu critério de livre aplicação do direito (arts. 5.º, n.º 3, do CPC, e 1.º do CPTA), o que não pode é desconsiderar totalmente (não os incluindo nos factos provados ou nos não provados) factos essenciais que foram alegados pelo A. para fundamentar o pedido, quando tais factos estão provados por documento e admitidos por acordo, como ocorre no caso dos autos, pois, apesar da declaração formal de impugnação, na contestação do R. Ministério da Justiça, dela não resulta que aquele R. tenha impugnado eficazmente os factos alegados na petição inicial.

IV) Por isso, impõe-se, sempre salvo o devido respeito por mais bem estribada opinião, por preencherem os referidos requisitos, considerar provados ou assentes os factos alegados nos artigos 1, 2, 3, 5, 6, 7, 9, 10, 11, 12, 13, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 23 (quanto ao teor e data do parecer), 28, 29, 30 e 46 da petição inicial V) Ao não o fazer, a Sentença recorrida errou no julgamento dos factos relevantes, violando o disposto no art. 5.º, 607.º do CPC e 1.º do CPTA.

VI) A decisão recorrida padece ainda de erro do julgamento da matéria de facto, por ter considerado, erradamente, demonstrados certos factos que incluiu na matéria assente, porque nem eles resultam dos documentos juntos aos autos e não impugnados, nem emergem de qualquer posição concordante assumida pelas partes nos articulados.

VII) Assim sucede, primeiramente, com o ponto 8 da matéria de facto, cujo teor, referindo-se à decisão proferida no procedimento cautelar, apenas se compreende por manifesto lapso, e cuja relevância para a decisão da causa não se alcança.

VIII) E, bem assim, nos pontos 1 e 3 dos factos assentes, no segmento em que na Sentença se considerou provado que os recibos de vencimento do Requerente, datados de 21/11/2014 e 21/01/2016, foram emitidos pelo Conselho Superior da Magistratura, que apenas resulta de ter atribuído aquele sentido, equivocadamente, à referência ao Conselho Superior da Magistratura que consta nos referidos recibos, que existe apenas porque todos esses recibos, em suporte electrónico, migraram da página informática da DGAJ para o IUDEX, plataforma electrónica gerida exclusivamente pelo CSM, de onde o A. os obteve para juntar aos autos.

IX) Impondo-se, na perspectiva do recorrente eliminar o facto nº8 da matéria assente e alterar os factos provados nº1 e 3, no sentido de que, nas datas neles referidas, foi efectuado o pagamento pela DGAJ/Ministério da Justiça, que emitiu os correspondentes recibos, dos vencimentos, ajudas de custo e despesas de deslocação nos termos constantes dos documentos de fls. 46ss, cujo teor restante se dá por reproduzido.

X) Pelo que, decidindo de forma diversa, a Sentença recorrida violou as regras previstas nos arts. e 607.º, nº4, do CPC e 1.º do CPTA.

XI) O argumento essencial aduzido na Sentença recorrida, para justificar a decisão de improcedência do pedido – no sentido de que a omissão ou falta de pagamento das ajudas de custo e despesas de deslocação, aos juízes temporariamente deslocalizados, reclamadas pelo A. nestes autos, constitui acto materialmente administrativo – carece de fundamento legal.

XII) Como acertadamente se decidiu no Douto Acórdão do Venerando Tribunal Central Administrativo do Norte, datado de 06.04.2018, prolatado no âmbito do Processo Cautelar - N.º 1384/17.7BEPRT – AVEIRO, apenso a estes autos, relatado pelo Ex.mo Senhor Desembargador João Beato O Sousa, “a falta de uma decisão não é uma decisão, mas sim o seu contrário e que, por isso, a falta de decisão não tem cabimento no conceito de “ato administrativo” (nem, convenhamos, no conceito corrente e elementar de acto)”.

XIII) O que foi doutamente entendido na esteira da jurisprudência dos Tribunais Superiores: “Não se pode, assim, considerar acto administrativo o processamento mecanizado mensal dos vencimentos, elaborados normalmente pelos serviços administrativos e financeiros, mas onde não existe qualquer definição sobre um problema concreto” (cfr. Acórdão do Tribunal Administrativo Central Norte de 18.11.2016, relatado por Exmo. Senhor Desembargador Joaquim Cruzeiro, disponível no sítio da DGAJ, na internet).

XIV) E em inteira convergência com a melhor doutrina, a respeito do “caso paradigmático do processamento de abonos e vencimentos (…) é, em si mesmo, uma mera actuação jurídica, que se limita a materializar um direito previamente definido (…)”, pois nesse caso, “o que conta é que o trabalhador é titular de um direito de crédito que não foi devidamente satisfeito e é esse direito de crédito que ele irá fazer valer, através de uma acção administrativa comum, dentro do respectivo prazo de prescrição” (cfr. Mário Aroso Almeida, Teoria Geral do Direito Administrativo, O Novo Regime do CPA, 2017, pp. 227ss).

XV) Aliás, o entendimento da inexistência, in casu, de qualquer acto administrativo, foi tácita mas claramente admitido inicialmente pelo Tribunal recorrido, no apenso e nestes autos.

XVI) Não existe a diferença relevante, que na Sentença recorrida se procura fazer, entre o processamento das Ajudas de custo e dos vencimentos, pois ambos dependem da definição prévia do direito através de acto de natureza legal e/ou administrativa, tal como, ambos carecem da verificação e apreciação desses requisitos (em operação mecanizada e, agora, quase sempre informaticamente tratada) e ambos atribuem somente eficácia externa a acto prévio, acrescendo que os requisitos para o pagamento das ajudas de custo também resultam directamente da lei (DL nº106/98, de 24.04, nos arts. 26.º e 27.º do EMJ) e em actos administrativos prévios (algumas deliberações emitidas pelo CSM já referidas nos autos).

XVII) Mesmo que a mera devolução dos boletins configurasse um acto administrativo, a verdade é que ela apenas ocorreu em relação a dois boletins (os restantes foram simplesmente ignorados), e seria absolutamente nula, porque praticada com preterição total do procedimento e audição prévios exigíveis (art. 161.º, nº2, al. l, do CPA).

XVIII) Ao contrário do propugnado pela Sentença impugnada, o acto de processamento e pagamento das despesas de deslocação e ajudas de custo, pelo R. Ministério da Justiça ou por banda do Conselho Superior da Magistratura, é apenas mero trâmite ou execução de um direito que o Recorrente já possuía, quer por força da Lei (arts. 26.º e 27.º do EMJ), quer por força de uma Deliberação do CSM (Deliberação de 16.05.2015), o qual, independentemente de qualquer Deliberação posterior, se manteve pelo menos até Agosto pretérito.

XIX) Acresce que, como o A. não recorreu a uma qualquer acção de impugnação de deliberação, mas a uma acção comum de condenação (em prestações que não envolvem a emissão de um acto administrativo impugnável), carece de qualquer cabimento chamar aqui à colação uma norma (do art. 168.º do EMJ) que tem um campo de aplicação específico e devidamente gizado pelo legislador, ressalte-se, exclusivamente a respeito da impugnação dos actos materialmente administrativos.

XX) Mais: a supressão do direito a, pelo menos, um grau de recurso, quando o A. pretende ver apreciado um direito de crédito de valor superior à alçada do Tribunal de 1.ª Instância, que resulta da atribuição da competência para apreciar o caso ao Contencioso do Supremo Tribunal de Justiça, quanto ao R. CSM, é estranha e inaceitável na nossa ordem jurídica XXI) Decidindo que a ausência ou recusa de pagamento das ajudas de custo e despesas de deslocação constitui acto administrativo, e decidindo que a...

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