Acórdão nº 00718/17.9BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 02 de Julho de 2021

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução02 de Julho de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte: I. RELATÓRIO 1.1.

I.

, residente na Rua (…), em Coimbra e com os demais sinais nos autos, instaurou contra a CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, I.P.

(CGA) com sede na Av. 5 de outubro, 175, Lisboa a presente ação administrativa, pedindo a declaração de nulidade ou a anulação da decisão datada de 12.09.2017, que determinou a reposição do valor de 36.756,90€, correspondente ao valor das pensões abonadas à A. no período compreendido entre maio de 2015 e agosto de 2017.

Indicou como contrainteressada a UNIVERSIDADE DE COIMBRA (UC).

Para fundamentar a sua pretensão, alega, em síntese, que por sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de 21 de julho de 2017, proferida no processo n.º 82/16.3BECBR, já transitada em julgado, foi julgada procedente a ação administrativa instaurada pela Autora contra a aqui Ré anulando-se o ato nela impugnado, o despacho da direção da Ré de 26 de janeiro de 2015 que determinou a aposentação voluntária antecipada da Autora, com fundamento na violação do art.º 121.º n.º 1 do CPA.

Na sequência dessa decisão, por comunicação datada de 25.08.2017, foi a A. notificada do valor da pensão mensal ilíquida de 1.541,60€ e para, querendo, se pronunciar, após o que desistiu do pedido de aposentação voluntária antecipada, e reiniciou as suas funções como Professora Associada com Agregação no Departamento de Engenharia Química da Universidade de Coimbra, a partir de 1 de outubro de 2017.

Foi também notificada para regularizar a dívida no montante de 38.756,90€, valor que a Ré considerou indevidamente pago à Autora, nos meses de maio de 2015 a agosto de 2017, a título de pensão de aposentação.

No período temporal que mediou entre a prática do ato ilegal por parte da Ré (26.01.2015) e a sua reconstituição (25.08.2017) a Autora esteve impedida do exercício das suas funções docentes na UC, por se encontrar na situação de aposentação e não auferiu da Universidade de Coimbra qualquer remuneração, o que foi determinado por causa imputável à Ré.

Sustenta que não lhe sendo possível voltar às suas funções na Universidade de Coimbra no período de tempo que já decorreu (janeiro de 2015 a agosto de 2017) não lhe foi possível auferir vencimentos das funções que não se poderão neste momento ficcionar.

Refere que o entendimento legal da Ré sufragado no ato impugnado apenas tomou em consideração um dos itens do dispositivo legal que citou (artigo 173.º do CPTA), o seu número um, e não atendeu às estatuições dos restantes números da citada norma.

A seu ver, a situação sub judice configura um exemplo típico em que se justificará que, em virtude do exercício de um dever jurídico de ponderação, devam ser atribuídos efeitos jurídicos à situação decorrente do ato de aposentação da Autora por se tratar de uma situação merecedora desses efeitos à luz dos princípios constitucionais da proteção da confiança legítima, do princípio da boa-fé, do princípio da proporcionalidade e, inclusive, do princípio da prossecução do interesse público.

1.2. Regularmente citada, a CGA apresentou contestação defendendo a legalidade do ato impugnado, alegando, em síntese, que só atribuindo eficácia retroativa à anulação do despacho de 26 de janeiro de 2015 – o que implica a restituição do montante correspondente às pensões indevidamente abonadas pela Caixa Geral de Aposentações, o pagamento dos vencimentos por parte da Universidade de Coimbra e a regularização das quotas devidas no período em causa – se eliminam todos os seus efeitos e se cumpre a obrigação de “reconstituir a situação que existiria se o ato não tivesse sido praticado”.

Pediu, a final, a absolvição do pedido, por improcedência da ação.

1.3.A UC, por seu turno, veio subscrever a posição defendida pela A., pugnando pela anulação do ato impugnado.

1.4. Em 23.06.2020 foi apensada aos presentes autos a ação Administrativa nº 176/18.0BECBR, instaurada pela UNIVERSIDADE DE COIMBRA, NIPC (…), com sede no Paço das Escolas, 3004-531 Coimbra contra a CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, I.P., e onde foi indicada como contrainteressada I., na qual é formulado, a final, o seguinte pedido: “Termos em que, e nos melhores de direito que v. Exa. Doutamente suprirá, deve a presente ação ser julgada procedente por provada, e, Em consequência: - ser declarada a nulidade da decisão da caixa geral de aposentações que constata a existência de uma dívida, cuja obrigação de pagamento atribui à autora, Universidade de Coimbra, no valor de €52.502,48, respeitante às quotas e contribuições em falta, relativas ao período de 0103-2015 a 02-10-2017, em que a subscritora I., esteve a receber pensão de aposentação (ao abrigo de decisão da CGA que veio a ser anulada, por douta sentença proferida pelo TAF de Coimbra, datada de 21-07-2017, e transitada em julgado), ao abrigo do disposto nos arts. 161.º, n.º 2, alíneas g), k) e l), e art. 162.º, n.ºs 1 e 2, todos do CPA.

- sem prescindir, e se assim não se entender, deve a referida decisão da CGA ser anulada, por infundada e ilegal, na medida em que viola o disposto nos arts. 3.º, 4.º, 8.º, 10.º, 12.º e 16.º, do CPA, nos termos do art. 163.º, n.os 1, 2 e 3, do mesmo diploma”.

Como causa de pedir indicou, em síntese, que entre 01-03-2015 e 02-10-2017, a subscritora I. não prestou serviço na Universidade de Coimbra, não existindo, naquele período, qualquer vínculo laboral remunerado entre a subscritora supra referenciada e a Universidade de Coimbra.

Na origem das quotas e contribuições em falta – e que a CGA ora reclama da Universidade –, está um comportamento omissivo, culposo e danoso da CGA, não tendo a UC a obrigação de entregar à CGA quotas ou contribuições relativas a uma trabalhadora que não prestou serviço na Universidade, nem por esta foi remunerada, no período a que respeitam as quotas ou contribuições em falta, pelo que o ato aqui em causa é nulo, por criar uma obrigação pecuniária não prevista na lei.

A obrigação imposta pelo artigo 173.º do CPTA tem limites, que são os que decorrem dos n.ºs 2 e 3 daquele normativo (art. 173.º do CPTA).

Apenas à Ré é imputável o facto de a Requerente – como aposentada – ter estado impedida de exercer funções na Universidade enquanto docente e de receber a correspondente remuneração, desde 01/03/2015, sendo que nos termos do art. 16.º do CPA, “a Administração Pública responde, nos termos da lei, pelos danos causados no exercício da sua atividade”.

Sendo da responsabilidade - única e exclusiva - da CGA, a (anulada) decisão de aposentação da referenciada I., terá de ser esta a suportar os custos da anulação de tal decisão, nomeadamente, a dívida que emerge dos descontos e quotas que deveriam ter sido entregues à CGA.

O ato praticado pela CGA, violou, também, o disposto no n.º 1, do art. 121.º, do CPA, que determina a audição e informação dos interessados sobre o sentido provável da decisão, antes de ser tomada a decisão final.

O ato notificado à autora é completamento omisso quanto à sua fundamentação e quanto aos prazos de impugnação, sendo também nulo por carecer de forma legal, e por ser completamente omisso quanto à fundamentação da decisão.

O ato aqui em causa viola ainda, além das disposições supra citadas, os princípios consagrados nos arts. 4.º, 8.º e 10.º do CPA.

A CGA pugnou também pela improcedência da ação, com os fundamentos que já havia aduzido na contestação da ação n.º 718/17.9BECBR.

1.5. Por despacho de 01.03.2020, e na sequência de requerimento de fls. 66 e 67, foi ordenada a apensação aos presentes autos da Ação Administrativa nº 176/18.0BECBR.

1.6. Em 01.07.2020 foi proferido despacho em que foi dispensada a realização de audiência prévia por o processo reunir já todos os elementos necessários ao conhecimento do mérito da causa no despacho saneador e julgada desnecessária a produção de prova testemunhal.

1.7. Fixou-se o valor da causa em 91.259,38€.

1.8. Proferiu-se saneador-sentença, que julgou a presente ação procedente, sendo o seu segmento dispositivo do seguinte teor: “Com os fundamentos supra expostos e de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa: a) Julgo a presente ação procedente, por provada, e, consequentemente: a. Anulo o ato que impôs a restituição das quantias auferidas a título de pensão por I., no período compreendido entre maio de 2015 e agosto de 2017; b. Anulo o ato que impôs o pagamento, por parte da Universidade de Coimbra, do valor de €52.502,48, respeitante a quotas e contribuições em falta, relativas ao período de 01.03.2015 a 02.10.2017, em que a subscritora I., esteve a receber pensão de aposentação.

b) Condeno a CGA no pagamento da totalidade das custas a que houver lugar.

* Registe e Notifique.” 1.9. Inconformada com o saneador-sentença que julgou a ação procedente, a CGA interpôs a presente apelação, formulando as seguintes conclusões: “1ª Determina o artigo 173º do CPTA que, sem prejuízo do eventual poder de praticar novo acto administrativo, no respeito pelos limites ditados pela autoridade do caso julgado, a anulação de um acto administrativo constitui a Administração no dever de reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado, bem como de dar cumprimento aos deveres que não tenha cumprido com fundamento no acto entretanto anulado, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter actuado.

  1. A sentença anulatória de um acto administrativo tem um efeito constitutivo, que, em regra, consiste na invalidação do acto impugnado, fazendo-o desaparecer do mundo jurídico desde o seu nascimento.

  2. Tem, também, um outro efeito, próprio de toda e qualquer sentença de um tribunal, seja qual for a natureza deste, que é o da reconstituição da situação hipotética actual (também chamado efeito repristinatório, efeito reconstitutivo ou reconstrutivo da sentença). Segundo este princípio, a Administração tem o dever de reconstituir a situação que...

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