Acórdão nº 687/16.2.T8TMR-H.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 14 de Julho de 2021

Magistrado ResponsávelTOM
Data da Resolução14 de Julho de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 687/16.2.T8TMR-H.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Santarém – Juízo de Família e Menores de Santarém – J3 * =CLS= * Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: * I – Relatório: Nos presentes autos de entrega judicial de menores, a requerente (…) não se conformou com a decisão que indeferiu o pedido de não entrega de (…), por, entretanto, o menor ter completado 16 anos de idade.

A requerente interpôs ainda recurso da decisão que determinou à Autoridade Central da DGRSP que indicasse data, modo e operacionalização da entrega dos menores.

* A – Da extinção da obrigação de entrega relativamente ao menor (…): O Ministério Público requereu a instauração, com carácter de urgência, de processo para entrega judicial daquelas crianças (em executoriedade de decisão judicial proferida por Autoridade Judiciária Francesa) contra a mãe dos menores, (…).

* Em 29/07/2014, o Tribunal de Família de Grande Instância de Bobigny decidiu que as responsabilidades parentais eram exercidas em conjunto pelo pai e mãe e que a guarda ficava deferida ao pai, que mantém residência em França, com início em Setembro de 2014.

* Em 15/04/2016, os menores (…) e (…) saíram com a mãe de França e não regressaram na data acordada.

* No dia 11/07/2019, o Tribunal “Grande Instance de Paris” determinou que a residência habitual da (…) e do (…) estava fixada junto do progenitor e que, como tal, estas crianças deviam regressar, de imediato, para junto daquele.

* No dia 19/07/2019, a Autoridade Central Francesa solicitou à Autoridade Central Portuguesa (DGRSP) a execução do pedido de regresso daqueles menores ao território Francês, ao abrigo do disposto no n.º 8 do artigo 11.º do Regulamento CE 2201/2003.

* Recebidos os autos, foi designada data para a audição das crianças.

* Mostra-se junta aos autos certidão prevista no artigo 42.º e 11.º, n.º 8, do Regulamento (CE)a2201/2003, do Conselho, de 27NOV.

* Por sentença datada de 12/09/2019, o Juízo de Família e Menores de Santarém (J3) decidiu estar verificada a executoriedade em Portugal da sentença proferida em 11/07/2019, pelo Tribunal de Grande Instance de Paris, em França, no processo n.º RG 19/35392, em que são partes o Requerente (…) e Requerida (…) e é determinada a entrega dos menores (…) e (…) ao pai, ao abrigo do estatuído nos artigos 11.º, n.º 8 e 42.º do Regulamento (CE) n.º 2201/2003, do Conselho, de 27 de Novembro de 2003.

* Foi interposto recurso desta decisão. E, em 30/01/2020, o Tribunal da Relação de Évora julgou improcedente o recurso interposto, confirmando a decisão recorrida.

* Interposto recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, este Colendo Tribunal decidiu não admitir o recurso interposto.

Em sede de conferência, após reclamação, por acórdão lavrado em 20/01/2021, o Supremo Tribunal de Justiça não conheceu da reclamação, por ser extemporânea.

* A título incidental, por requerimento datado de 03/12/2020, o Ministério Público veio, ao abrigo do disposto no artigo 4.º da Convenção Sobre os Aspectos Civis do Rapto Internacional de Crianças, solicitar que se declarasse que, em virtude de (…), nascido em 22/07/2004, ser já maior de 16 anos de idade, o mesmo deixou de estar abrangido por essa Convenção.

Mais requereu que essa declaração fosse levada em conta, designadamente para efeitos de não concretização da entrega do jovem em apreço.

* O Supremo Tribunal de Justiça indeferiu essa pretensão com base na seguinte fundamentação: «a requerente pede a extinção da instância por inutilidade com fundamento no facto de o menor (…) ter completado 16 anos, e por esse motivo já não lhe ser aplicável a Convenção de Haia nos termos do seu artigo 4.º. E justifica a extinção da instância quanto à menor (…) “por extensão, por via da não separação dos irmãos”.

A convenção invocada pelo recorrente é a Convenção Sobre Aspectos Civis do Rapto Internacional, aprovada em Haia, e aprovada pelo Decreto do Governo n.º 33/83, DR, 1ª série de 11.05.1983.

A situação dos autos não se subsume àquela Convenção, que não foi invocada na decisão recorrida; o que está em causa nos autos é o reconhecimento e execução de uma decisão proferida por um tribunal francês em que o tribunal português é um mero Tribunal de Execução nos termos do Regulamento n.º 2201/2003 do Conselho, de 27.11.2003.

Não existe, assim, fundamento para declarar a extinção da instância, motivo por que se indefere o requerido a fls. 358».

* Em 24/02/2021, o Ministério Público renovou a pretensão em causa junto da Primeira Instância[1] e o Juízo de Família e Menores de Santarém afirmou que o requerido já tinha sido objecto de decisão do Supremo Tribunal de Justiça, reproduzindo parte dessa decisão, julgando assim improcedente o referido pedido.

* B – Decisão que determinou que a Autoridade Central da DGRSP indicasse datas e modo e operacionalização da entrega dos menores.

Em 18/02/2021 foi prolatada a seguinte decisão: «Comunique à Autoridade Central Direção-Geral de Reinserção Social, sendo ainda para indicar data e modo de operacionalizar a entrega dos menores».

* Inconformada com tais decisões, a recorrente apresentou recursos de apelação[2] e as respectivas alegações continham as seguintes conclusões: «1) Conforme consta dos autos, o menor (…) atingiu a idade de 16 anos no passado dia 22.07.2020.

2) Corre no apenso E nestes autos, no mesmo tribunal a quo autos de alteração do exercício das responsabilidades parentais, doutamente promovido pelo Ministério Público em representação dos menores.

3) Atualmente, as circunstâncias relativas aos menores já não são as mesmas que se verificavam quando França requereu a Portugal (em Julho de 2019) a entrega destas crianças.

4) Todavia, ao invés de analisar e subsumir a realidade atual e as circunstâncias atuais em que se encontram os menores atualmente nas normas legais aplicáveis, emite-se a decisão recorrida que se demite da sua função de decidir em conformidade com os factos, para se “demitir dessa função” e socorrer-se de uma decisão do STJ que nada mais foi que uma decisão sobre um requerimento de extinção de instância naquele processo que corria termos naquele STJ.

  1. A decisão recorrida foi proferida apesar de ter elementos no processo que indicam o seguinte: b) Existe e encontra-se pendente um pedido de transferência de competência, ao abrigo do artigo 15.º do Regulamento 2201/2003, DE 27.11 DE 2003, a dirigir ao Tribunal de Grande Instância de Bobigny, para que os autos de regulação de poder paternal passem a ser tramitados em Portugal; c) (…) e (…) mantêm, na atualidade, uma ligação especialmente estreita com Portugal, seja pelo facto de este ser o país da sua nacionalidade seja porque, desde há quase cinco anos, o seu quotidiano familiar, escolar, social e afetivo se desenvolve, sem interrupções, neste país.

  2. É em Portugal que, entre outras, se situam as estruturas escolares e de saúde que, de forma próxima, têm tido intervenção na vida de (…) e de (…).

  3. Corre uma ação de alteração de regulação do exercício das responsabilidades parentais promovida pelo MP junto do Tribunal.

  4. (…) tem hoje a idade de 13 anos e (…) tem a idade de 16 anos e manifestam a sua vontade em ficar a viver com a sua mãe e seu agregado familiar, em Portugal.

  5. Atenta a idade dos menores a sua vontade não pode deixar de ser valorizada.

  6. Os menores estão a viver com a respetiva mãe e declaram-se e sentem-se bem com essa situação.

  7. A Convenção de Haia de 1980 deixou de ser aplicável ao jovem (…) uma vez que o mesmo atingiu já os 16 anos de idade (artigo 40.º da Convenção).

  8. A permanência dos menores (…) no mencionado agregado familiar juntamente com os seus irmãos preservará os laços e vivências afetivas a que todos estão habituados.

  9. Só essa permanência dos menores no respetivo agregado materno contribuirá para a manutenção das suas rotinas e ligações afetivas diárias construídas.

  10. Ou seja, se os menores se mantiverem no agregado materno salvaguardam-se as relações familiares já estabelecidas, preserva-se o seu círculo de relações, a estabilidade emocional daqueles e, bem assim, toda a estruturação de vida que, entretanto, os mesmos granjearam e que se lhes tem revelado favorável.

  11. A vontade manifestada pelos jovens é, atenta a sua idade, consciente, legítima, atendível e merece ser relevada.

  12. A pretensão dos jovens tem acolhimento na Convenção dos Direitos da Criança, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 20 de novembro de 1989 e ratificada por Portugal em 21 de setembro de 1990 e também por França em 7.09.1990: Art. 3.º: n.º 1 todas as ações relativas à criança, sejam elas levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de assistência social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar primordialmente o melhor interesse da criança.

5) Com o devido respeito, o que se pedia era que a decisão recorrida olhasse para os autos e procurasse entender que os autos e estes menores pedem que se tenham em conta as suas circunstâncias concretas.

6) Como explicar ao menor (…), que já tem 16 anos de idade, que tem que ir para França com base numa Convenção que já se não lhe aplica. Como explicar à menor (…) que tem que ir para França sozinha e deixar os seus irmãos aqui em Portugal, cortando de forma abrupta todos os laços que enraizou aqui em Portugal na comunidade escolar, nos amigos e vizinhos e com a sua família que tem estado ligada em Portugal sem interrupções desde 2016. Para voltar para um progenitor que nunca a procurou sequer… O tribunal a quo consegue explicar isto? E enquadrar a vida dos menores neste contexto? 7) A decisão recorrida é uma decisão tecnocrata, fria, desumana e, por isso, impensável do ponto de vista, legal, consuetudinário e constitucional.

8) Cuja interpretação ofende os princípios mais elementares da base de qualquer ser humano.

9) “A criança gozará de proteção especial e deverão ser-lhe dadas oportunidades e facilidades através da lei e outros meios para o seu desenvolvimento...

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