Acórdão nº 2737/16.3T8VFX.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelCHAMBEL MOURISCO
Data da Resolução08 de Junho de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo n.º 2737/16.3T8VFX.L1. S1 (Revista) - 4ª Secção Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

AA, instaurou ação declarativa de condenação com processo comum contra TJA — Transportes J. Amaral, SA, pedindo a condenação desta no pagamento de: - € 26.996,88, a título de retribuição por trabalho suplementar prestado desde 2005 a 2016; - € 2.662,52, a título de retribuição de trabalho noturno prestado de 2005 a 2016; - € 12.459,90, a título de diferenças retributivas reportadas a férias, subsídio de férias e subsídio de Natal de 2005 a 2016; - € 50.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, juros de mora vencidos e vincendos no valor de € 10.374,54. E a pagar à Segurança Social as prestações reportadas aos valores nos autos peticionados.

  1. Realizada a audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: Pelo exposto, julgo a presente ação, parcialmente, procedente, por nessa medida provada e, em consequência: 1 - Condeno a R. a pagar ao A., o valor que se vier a liquidar, a título de créditos laborais, por reporte a trabalho suplementar e noturno efetuado entre outubro de 2011 e março de 2016, com o mínimo de € 4.980,00; 2 — Condeno a R. a pagar ao A., o valor que se vier a liquidar, a título de valores diferenciais entre os efetivamente pagos e os devidos, a título de férias e subsídio de férias, no período compreendido entre outubro de 2005 e março de 2016, tendo como referência, em cada ano, o valor mensal da retribuição base (e diuturnidades) e o acréscimo remuneratório de € 364,67; 3 — Absolvo a R. do mais peticionado contra ela, nos autos.” 3.

    Inconformado com esta decisão, o Autor interpôs recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação decidido conceder parcial provimento ao recurso, condenando a Ré a pagar-lhe juros de mora à taxa legal, sobre a confessada quantia de € 6.419,80, desde 15-01-2019 até integral pagamento, mantendo-se no mais a sentença recorrida.

    O Tribunal da Relação perante pedido de retificação formulado pela Ré veio a alterar o acórdão que passou a ter o seguinte dispositivo: … concede-se parcial provimento ao recurso do autor, condenando-se a ré a pagar-lhe juros de mora à taxa legal, sobre a confessada quantia de € 5.809,80, desde 15- 01-2019 até integral pagamento, mantendo-se no mais a sentença recorrida.

    4.

    Inconformado com esta decisão, o Autor interpôs recurso de revista, tendo formulado as seguintes conclusões: A – A decisão de que se recorre é tendenciosa e injusta, como a decisão de primeira instância já tinha sido, na parte em que se impugna, e está em contradição, quer com a prova produzida, quer até mesmo com as afirmações contidas na própria decisão.

    B – Consubstancia um erro de julgamento na apreciação e valoração da prova, e interpreta e aplica erradamente as normas legais, violando as normas sobre a prova constantes do Código Civil, nomeadamente, os arts. 341º a 396º.

    C – Os valores designados como “ajudas de custo”, quer as “isentas” quer as “tributáveis”, não são verdadeiras ajudas de custo, são, sim, uma manobra para contornar as normas fiscais de tributação quer em sede de IRC quer do pagamento de contribuições à Segurança Social por parte da R.

    D – Esses valores integram a retribuição ao abrigo dos arts. 258.º e 260.º do Código Civil, tendo que considerar-se que a retribuição base do Recorrente era pelo menos € 1.023,00 e não € 610,00.

    E – Ainda que o Tribunal entendesse não serem de acolher os dados fornecidos pelo Recorrente relativamente à quantificação do trabalho suplementar e noturno, face à peritagem e à confissão da R., deveria ter sido seguido o critério do n.º 5 do art.º 231º do C.T., pois a R. juntou prova documental em consonância com o Autor e à peritagem foram apontadas limitações, incompletudes e discrepâncias que a mesma reconheceu.

    F- Incumbia à Recorrida o registo do trabalho suplementar, nos termos do disposto no art.º 231º do C.T., pelo que competia a esta liquidar essas prestações, nas datas respetivas.

    G – É inegável a relevância social e jurídica da decisão desta contenda, porquanto, considera poder enquadrar nas “ajudas de custo” o pagamento de trabalho suplementar, quando, fiscalmente, umas e outro têm tributações e enquadramentos diferentes! H - O que implica, e implicou no caso sub judice, que o Estado Português tenha sido, lamentavelmente, lesado, como foi reconhecido em audiência de discussão e julgamento pela Mm. ª Juíza a quo, sem que as devidas consequências daí tenham sido retiradas.

    I - Outro aspeto com inegável relevância social e jurídica é a desvalorização profissional a que foi sujeito o ora recorrente desempenhando funções que não cabem na sua categoria profissional e que conduziram a um agravamento do seu estado de saúde, e que a ora recorrida reconhece, pois passou a atribuir aos seus motoristas uma compensação monetária para o desempenho dessas funções.

    J - Nunca foi autorizada a junção aos autos do Relatório único da empresa, que o ora recorrente sempre solicitou, e que poderia fazer, entre outras, a prova da falta de pagamento do trabalho suplementar, dando inteira razão ao autor, ora recorrente.

    K - O Direito não pode permitir uma solução destas, pois é manifestamente injusta e atentatória dos mais elementares princípios legais.

  2. A Ré não contra-alegou.

  3. Foi proferido despacho pelo relator referindo que o Tribunal da Relação, tendo concedido provimento parcial ao recurso do Autor no que diz respeito ao pagamento de juros, confirmou a sentença do Tribunal de 1.ª instância relativamente às questões suscitadas, pelo que o objeto do presente recurso de revista tem de se cingir a saber se Tribunal da Relação violou o disposto nos artigos 640.º e 662º do CPC, ao rejeitar o recurso quanto à impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, uma vez que, nas suas conclusões, o Autor invocou erro de julgamento na apreciação e valoração da prova.

  4. Neste Supremo Tribunal de Justiça, a Excelentíssima Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido da inadmissibilidade da revista na parte em que existe dupla conforme e na sua improcedência da parte restante.

  5. O objeto do presente recurso, cinge-se a saber se Tribunal da Relação violou o disposto nos artigos 640.º e 662º do CPC, ao rejeitar o recurso quanto à impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, uma vez que, nas suas conclusões, o Autor invocou erro de julgamento na apreciação e valoração da prova.

    II

    1. Fundamentação de facto: Na primeira instância foi considerada provada a seguinte factualidade: 1. O A. foi admitido ao serviço da R., em 1 de outubro de 2005, para, sob as ordens, direção e fiscalização da mesma, exercer as funções de motorista, com horário de 40 horas semanais, distribuídas de acordo com o horário em vigor na empresa, mediante a retribuição base de € 575,00, conforme documento escrito denominado de «contrato a termo certo», subscrito pelo A., que ora faz fls. 23/v a 25, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; 2. Nesse documento, exarou-se, ainda, na cláusula 12.ª que «o Instrumento de regulamentação e trabalho aplicável para o sector foi publicado no BTE n.º 20 de 08/03/1980 e a última alteração no BTE n.º 30 de 15/08/1997»; 3. No âmbito da prestação do seu trabalho como motorista, o A. conduz um veículo pesado de mercadorias, procedendo ao preenchimento de guias de transporte e colocava mangueiras e braços de ferro para descarregar e acondicionar a respetiva carga.

  6. No dia 14 de outubro de 2008, o A. sofreu um acidente de trabalho e, por causa das lesões sofridas, esteve em situação de baixa médica até 2011.

  7. O acidente referido em 4., deu origem ao processo judicial emergente de acidente de trabalho, que correu termos neste Juízo, sob o n.º 405/09……, no âmbito do qual foi proferida sentença, homologatória de acordo alcançado em Tentativa de Conciliação, datada de 01.07.2010, a fixar a IPP do A. em 10%, desde 01 de Outubro de 2009 e, no âmbito de revisão da IPP, foi proferida sentença, datada de 09.10.2017, a fixar a IPP do A. em 13,6%, desde 02.11.2016, conforme certidão de sentença, junta a estes autos.

  8. Em 2012, o A. enviou à R. uma carta a solicitar a atribuição de um serviço que tivesse mais em atenção a incapacidade que lhe tinha sido atribuída no âmbito do acidente de trabalho (confissão A.).

  9. Por isso, a R. disponibilizou ao A. uma nova viatura e um novo serviço que o A. ainda executava à data do julgamento (confissão do A.).

  10. Nessa sequência, o A. deixou de conduzir viaturas de transporte ….., com exceção, de cerca de 40 vezes, desde 2003 em diante (confissão do A.).

  11. Trabalho que obrigava a proceder a operações de carga e descarga …… com manuseamento de mangueiras de enchimento (confissão do A.).

  12. A. passou a transportes de …. sendo as operações de carga e descarga feita por operadores no expedidor e no destinatário (confissão do A.).

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