Acórdão nº 10186/15.4T8PRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelCATARINA SERRA
Data da Resolução17 de Junho de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. RELATÓRIO 1.

AA e BB propuseram acção contra Patris Investimentos, SGPS, S.A.

, peticionando “ser a ré condenada a pagar aos autores o valor de € 281.901,98, ao qual acrescem os juros, contados à taxa comercial, contados desde a citação e até integral pagamento, ou, caso assim não se entenda, sempre deve a ré ser condenada a pagar aos autores o valor de € 172.062,40, ao qual acrescem os juros, contados à taxa comercial, contados desde a citação e até integral pagamento, tudo com as legais consequências”, com fundamento na violação de um contrato de gestão de carteira celebrado entre as partes.

  1. Em 1.10.2018 foi proferida sentença em cuja parte decisória pode ler-se: “Julga-se a ação parcialmente provada e procedente, condenando-se a ré, PATRIS INVESTIMENTOS, SGPS, S.A., a pagar aos autores, AA e BB, a quantia de € 22.574,00 (vinte e dois mil quinhentos e setenta e quatro euros), acrescida de juros contados desde a data de citação e até efetivo pagamento, sendo os juros devidos à taxa legal que em cada momento vigore por força da portaria prevista no art. 559.º do Cód. Civ.

    ”.

  2. Desta sentença apelaram autores e ré para o Tribunal da Relação do …...

  3. Apreciados os recursos, foi proferido um Acórdão de cujo segmento dispositivo consta o seguinte: “Na improcedência total das alegações da Ré e parcial das dos autores altera-se o acórdão recorrido e consequentemente condena-se a ré, PATRIS INVESTIMENTOS, SGPS, S.A., a pagar aos autores, AA e BB, a quantia de €45.149,21, acrescida de juros contados desde a data de citação e até efetivo pagamento, sendo os juros devidos à taxa legal que em cada momento vigore por força da portaria prevista no art. 559.º do Cód. Civ.

    ”.

  4. Ainda inconformados, interpõem recurso de revista deste Acórdão os autores AA e BB.

    Pugnam, no essencial, pela procedência total dos pedidos e, a fechar as alegações de revista, enunciam as seguintes conclusões: “i) Os Recorrentes, pese embora, essa alteração de entendimento não podem ainda conformar-se com a liquidação dos danos que foi feita e têm ainda entendimento diverso e relevante também para a fixação do montante dos danos a indemnizar a respeito dos ilícitos contratuais que originaram esses danos pelas razões que explanarão ao longo da presente alegação, sendo, pois, o presente recurso circunscrito as essas questões.

    ií) De acordo com a matéria de facto dada como provada ficou demonstrado que os Recorrentes celebraram em 20 de Outubro de 2006 com a Recorrida o contrato de gestão de carteiras junto a fls. 396 e cujas obrigações principais se encontram descritas nos pontos 2o a 5o do relatório de facto; iii) Nada foi preenchido nesse contrato a título de determinação da carteira em função do perfil de risco (vd. fls. 3 desse documento), razão pela qual, sem outras definições que tivessem sido feitas, tal contrato seria absolutamente arbitrário e como tal nulo por desrespeito da Art.° 332° do Código dos Valores Mobiliários vigente à data da sua celebração; iv) Mas a margem de discricionariedade da actuação da Recorrida acabou por ser definida, através do documento de fls. 34. denominado decisão de investimento (ponto 7o do relatório de facto), tendo ficado definido, que a actuação da Recorrida deveria circunscrever-se às estratégias por ela designadas de "Altavisa Global" e "Alatvisa Biomed", o peso que tais estratégias deveriam ter na carteira dos Recorrentes (50% cada uma) e o risco de cada uma (moderado elevado); v) A discricionariedade na actividade de intermediação financeira da Recorrida: ficou limitada pela decisão de investimento acordada, devendo essa actividade ater-se aos limites aí traçados, a menos que existisse ordem específica dos Recorrentes que permitisse exceder esses limites; vi) Revela-se irrelevante que tais estratégias não fossem fundos de investimento, nem fundos imutáveis, mas sim estratégias de investimento predispostas pela Recorrida (pontos 8o e 9o do relatório de facto), porque tais estratégias de investimento estavam definidas nos termos dos prospectos enviados (ponto 10° do relatório de facto) e não se confundiam entre si; vii) E se é certo que o nome que lhes fosse dado seria irrelevante, já não o era a sua obediência, ou não, a uma decisão de investimento padronizada, para a qual não relevava unicamente o perfil do cliente, mas, também as outras condições que deveria ter esse investimento; viii) Os instrumentos que deveriam ser integrados nessas estratégias, pese embora a elevada margem de que dispunha a Recorrida, deveriam conter-se dentro dos limites definidos para essas estratégias (sendo essa situação é simples de verificar na estratégia dita "Altavisa Biomed" que deveria incluir produtos financeiros com diversa natureza mas, todos ligados ao sector da saúde humana); ix) A não ser como se vem referindo, nem sequer se compreenderia qual o significado e o valor da decisão de investimentos e, sobretudo, da repartição proporcional da carteira dos Recorrentes, de 50% em cada uma das estratégias escolhidas; x) A Recorrida, com excepção de situações em que existissem ordens concretas dos Recorrentes noutro sentido, deveria ter circunscrito a sua actividade de intermediação às estratégias por ela própria definidas e acordados com esses Recorrentes, mas a Recorrida nunca cumpriu esses limites do seu mandato, como resulta evidente dos pontos 15° a 30° do relatório de facto, tendo investido em quaisquer estratégias ou instrumentos financeiros sem qualquer respeito por esses limites; xi) Tal actuação que se iniciou logo aquando do começo de vigência do contrato celebrado é grave, na medida em que demonstra o desrespeito por uma das obrigações essenciais que qualquer contrato de "gestão de carteiras" ou de mandato e é reiterada, nunca, podendo, pois, ser havida como decorrendo de culpa, leve, razão pela qual, a responsabilidade daí adveniente não se encontra prescrita; xii) Tendo os Recorrentes logrado demonstrar as obrigações decorrentes do contrato e da decisão de investimento a ele inerente - o que fizeram - caberia à Recorrida demonstrar o cumprimento dessas obrigações, o que não fez; xiii) Por outro lado, os Recorrentes invocaram que, por força do incumprimento das obrigações em questão sofreram um dano correspondente à diferença entre o valor total investido (€ 326.082,32 - ponto 15° do relatório de facto) e o valor que lhes foi entregue aquando da cessação do contrato (€ 44.180,34 - ponto 44° do relatório de facto e documento n.° 11 junto com a petição inicial); xiv ) E, "no que respeita ao nexo de causalidade", "a presunção de culpa do Art.° 304°, n.° 2" do Código dos Valores Mobiliários "também se refere, a título excepcional para a imputação mobiliária, a esse pressuposto da responsabilidade civil" (Gonçalo Castilho dos Santos, obra citada, pag. 215); xv) Teria, pois, que ter sido a Recorrida a ilidir a presunção de que o incumprimento praticado provocou os danos que se demonstraram, o que não fez, devendo ser condenada no valor em questão; xvi) A Recorrida não respeitou integralmente os deveres de informação que para ela impendiam face aos Recorrentes e "a referência à conduta profissional, diligente, leal e transparente do intermediário financeiro não traduz apenas um esforço concretizador do padrão de adequação da prestação realizada" - "referimo-nos (...) ao conteúdo da prestação e, portanto, no caso de esta ser realizada diligente, leal e transparentemente, ao não cumprimento da mesma e não à mera violação de deveres de conduta" (Gonçalo Castilho dos Santos, obra citada, pag.201); xvii) Ou seja, estando em causa a violação de deveres de informação sucessivos a cargo da Recorrida, esta violou a sua obrigação, decorrente da Lei, de actuar de forma transparente perante os Recorrentes e, por isso, não caberá falar em cumprimento defeituoso dessa obrigação, mas, em incumprimento; xviii) Esses deveres de informação sucessivos que deveriam ser cumpridos aquando da periódica entrega dos extractos tinham e têm importância de relevo na economia do contrato celebrado; xix) No contrato que está em questão, atenta a fluidez evidente das estratégias financeiras que corporizavam os investimentos feitos pela Recorrida (pontos 8o e 9° do relatório de facto) e a natureza pouco transparente destas, com maior acuidade se impunha o respeito pelas normas que regulavam à data o dever de informação sucessiva a cargo desta; xx) E na verdade, a informação constante dos extractos enviados (ponto 40° do relatório de facto) era absolutamente exígua, não permitindo aferir qual teria sido a actividade financeira desenvolvida no âmbito do contrato; xxi) A informação em causa deveria dirigir-se "à satisfação do interesse do credor" e "assegurar a inexistência de danos" (Gonçalo Castilho dos Santos, obra citada, pag. 140); xxii) A Recorrida violou, pois, o seu dever de informação, como decorre dos pontos 31° e 40° do relatório de facto, salientando-se, de resto, que o ónus da prova do cumprimento deste dever incumbia até àquela que o não cumpriu; xxiii) O incumprimento, de um dos deveres basilares do contrato, reiterado, é grave de modo a que não possa dizer-se que procede apenas de culpa leve, e como tal, não está prescrita a responsabilidade daí decorrente; xxiv) E tendo os Recorrentes invocado que, por força do incumprimento das obrigações em questão sofreram um dano correspondente à diferença entre o valor total investido (€ 326.082,32 - ponto 15° do relatório de facto) e o valor que lhes foi entregue aquando da cessação do contrato (€ 44.180,34 - ponto 44° do relatório de facto e documento n.° 11 junto com a petição inicial), e devendo a Recorrida ilidir a presunção de que o incumprimento praticado provocou os danos que se demonstraram, o que não fez, deve ser condenada no valor em questão; xxv) Ainda que não se entendesse como se vem expondo e que o único facto ilícito contratual susceptível de fundar a responsabilidade da Apelante fosse o não envio dos extractos relativos...

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