Acórdão nº 0131/20.0BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 30 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução30 de Junho de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1. – Relatório A Diretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) vem, nos termos do n.º 1 do artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (“CPTA”), aplicável ex vi n.ºs 2 a 4 do artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem Tributaria — “RJAT”), com a alteração introduzida pela Lei n.º 119/2019, de 18 de Setembro, interpor recurso de uniformização de jurisprudência para o Pleno do Contencioso Tributário do STA, da decisão arbitral proferida no Processo n.º 683/2019-T do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), em que são recorridos A………………..

e B…………………….

, melhor sinalizados nos autos, relativo à aplicação do artigo 43.º, n.º 2 do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, em sede de tributação de IRS de mais-valias, quando obtidas por cidadãos europeus não residentes em território nacional, e invocando contradição com a decisão arbitral proferida no Processo n.º 539/2018-T.

Inconformada, formulou a recorrente Diretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, as seguintes conclusões: A – O Acórdão arbitral recorrido (683/2019-T) incorreu em erro de julgamento, porquanto decidiu o Tribunal Arbitral “Assim, tudo visto e ponderado, parece resultar claro que os actos de liquidação mediatamente postos em crise, por se terem fundado na interpretação de que o nº 2 do artigo 43º do Código do IRS só é aplicável aos residentes em território português, são ilegais e como tal devem ser anulados, ainda que se dê aos residentes noutros Estados-membros a possibilidade de serem tributados como se residentes em Portugal fossem, por sua opção.” B – E sustenta o referido acórdão arbitral que “Acresce que o TJUE apreciou já, pelo menos um caso cujas características permitem que dele aqui se fale: é o caso Gielen, de 18.03.2010, proc. C-440/08. Ainda que referente à proibição de restrições à livre prestação de serviços, nele se rejeita a possibilidade de se oferecer ao contribuinte a opção entre um quadro de tributação ilegal e outro pretensamente legal. O TJUE precisou que, perante uma vantagem fiscal cujo benefício é recusado aos não residentes, uma diferença de tratamento entre estas duas categorias de contribuintes pode ser qualificada de discriminatória, na acepção do TFUE, quando não haja nenhuma diferença suscetível de justificar as diferenças de tratamento, quanto a este aspeto, entre as referidas categorias de contribuintes.

Transpondo este postulado para o caso sub judice, a vantagem fiscal consistiria na possibilidade de os residentes verem a tributação incidir apenas sobre metade da mais-valia imobiliária apurada nos termos do Código do IRS, ao passo que os não residentes vê-la-iam incidir sobre a totalidade do respetivo montante, ainda que a taxa diferente. Ora, em rigor, não parece haver nenhuma diferença objetiva entre as duas situações para além da residência. Uns são tributados de uma forma, porque residentes em território português e outros são tributados de forma diversa porque nela não residem. É pois, evidente que os contribuintes residentes e os contribuintes não residentes se encontram numa situação comparável.

(…) Ora, entendem os Requerentes que este diverso tratamento tributário, distinguindo residentes em território português de residentes noutros Estados-Membros da União Europeia é objetivamente discriminatório, não se justificando à luz da liberdade de circulação de capitais consagrada no artigo 63º do TFUE.

Defende-se a Requerida dizendo que sempre terão os residentes noutros Estados-Membros da União Europeia a possibilidade de optarem por um regime de tributação em tudo idêntico ao aplicável aos residentes em território português, nos termos do disposto nos números 14 e 15 do artigo 72º do Código do IRS (números 9 e 10 à data da alienação do imóvel pelos Requerentes).

Sucede que a existência desta opção não afasta a invalidade do regime objetivamente discriminatório que autorizou a prática dos atos de liquidação de IRS mediatamente impugnados nos presentes autos arbitrais.” C – Ao contrário do que decidiu a Decisão Arbitral fundamento (processo n.º 539/2018-T), na qual o Tribunal arbitral considerou que: “14 - Apresenta-se, pois, neste processo, uma dupla situação que encerra incongruências, entre si, quanto ao que o Requerente pretende, porquanto:

  1. Por um lado, pretende a aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 43.º do Código do IRS, que é aplicável às mais-valias obtidas em território português, que, de facto manda considerar a tributação de 50% saldo das mais-valias de imóveis, respeitantes às transmissões efetuadas por residentes, previstas na alínea a)2 do n.º 1 do artigo 10.º.

  2. Por outro lado, exige que seja feita uma tributação do referido saldo, reduzido em 50%, com aplicação da taxa aplicável a não residentes de 25%, conforme opção de tributação pelo regime geral, conforme campo 07 do quadro 8B da sua Declaração mod. 3 de IRS, e não pela aplicação das taxas gerais do artigo 68.º e das demais regras aplicáveis aos residentes.

    15 - Ora, esta forma de tributação mista, de escolha do melhor dos regimes de tributação, ou seja, ser considerado como residente para efeitos de aplicação do artigo 43.º, n.º 2 e não residente para efeitos de aplicação da taxa do artigo 72.º, n.º 1, ambos do CIRS, o que é incongruente e inaplicável, e nem sequer se pode argumentar que há violação dos Tratados da União Europeia, por não se estar perante uma qualquer discriminação.

    16 - Isto porque o Requerente tinha ao seu dispor a possibilidade de ver tributadas as suas mais-valias de harmonia com todas as regras aplicáveis aos residentes, se, para tanto, tivesse feito essa opção, ao abrigo do n.º 9 do artigo 72.º do Código do IRS, como a lei lhe permite - o que não aconteceu.

    17 - Assim, ao não ter optado pela tributação das suas mais-valias imobiliárias, pela aplicação das taxas do artigo 68.º do CIRS e das demais regras aplicáveis aos residentes, mas sim pelas taxas gerais, não assiste razão ao Requerente.

    18 - Aliás, nem aos residentes as normas do CIRS permitem esta dualidade de tratamento, ou seja, redução a 50% das mais-valias imobiliárias e aplicação das taxas do artigo 72.º do CIRS, obrigando sempre, neste caso, ao englobamento deste saldo com os demais rendimentos para aplicação à totalidade dos rendimentos auferidos as taxas gerais do artigo 68.º do Código do IRS.

    19. O regime escolhido pelo Requerente, embora invoque que é um residente na União Europeia, foi o da tributação pelas taxas do artigo 72.º aplicáveis a não residentes e não as aplicáveis a residentes, pelo que o regime escolhido deve ser aplicado "in toto", como procedeu, e bem, a Requerida, no entender do Tribunal.

    19- Assim sendo, não se poderá invocar a discriminação negativa como pretende o Requerente e isto porque as suas opções foram respeitadas.

    20- Recorda-se que o Acórdão do TJCE de 2007OUT11 (Hollman) foi proferido antes das alterações introduzidas ao artigo 72.º do CIRS, já anteriormente citadas, precisamente para permitir uma tributação igualitária entre residentes em território português e não residentes, desde que os sujeitos passivos o requeiram - o que não foi o caso.” D – Concluindo o Acórdão fundamento que: “20 - Nesta conformidade, entende este Tribunal que a liquidação impugnada não sendo incompatível com o disposto no artigo 63.º do TFUE, dada a opção do Requerente, julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral, mantendo-se na ordem jurídica a liquidação n.º 2018.5005490173, relativa ao ano de 2017 e no valor de €47.034,56.

    (…) Termos em que se decide:

  3. Julgar improcedente o pedido arbitral formulado e, em consequência, manter na ordem jurídica a liquidação de IRS impugnada.

  4. Julgar igualmente improcedente o pedido de pagamento de juros indemnizatórios a favor do Requerente. (…)” E – Verifica-se uma patente e inarredável contradição quanto à mesma questão fundamental de direito, que consiste em saber se o regime de exclusão de tributação de mais-valias previsto no artigo 43.º, n.º 2 do CIRS é aplicável aos não residentes.

    F – Quanto ao estabelecido pelas regras que determinam os requisitos de admissibilidade deste tipo de recursos, resulta que, para que se tenha por verificada a oposição de acórdãos, é necessário (vd., entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 2015-06-03, processo 0793/14) que: · as situações de facto sejam substancialmente idênticas; · haja identidade na questão fundamental de direito; · se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta; e, · a oposição deverá decorrer de decisões expressas e não apenas implícitas.

    G - As presentes alegações demonstram que, no caso vertente, se encontram reunidos os referidos requisitos para que se tenha por verificada a alegada oposição de acórdãos.

    H - Para que se considere que há oposição de acórdãos, entende a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo que os acórdãos em confronto versem sobre situações fácticas substancialmente idênticas e que se pronunciem sobre a mesma questão fundamental de direito. Ou seja, importa que as soluções opostas tenham sido perfilhadas relativamente ao mesmo fundamento de direito, o se verificou.

    I - Entre o Acórdão recorrido e o Acórdão fundamento há uma identidade de situações de facto, na medida que em ambos os casos, a factualidade consignada se reporta a tributação no âmbito de IRS, tendo em conta a aplicação do art. 43.º, n.º 2 do CIRS aos não residentes.

    J - As decisões em confronto perfilharam, sobre a mesma questão fundamental de direito, soluções opostas de forma expressa, isto é, adotaram sobre a mesma questão de direito soluções juridicamente divergentes em idênticas situações de facto.

    K - Resta concluir que o Acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento, bem como que se encontra em manifesta oposição quanto à mesma questão fundamental de direito com a jurisprudência firmada na Decisão...

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