Acórdão nº 238/06.7BEBJA de Tribunal Central Administrativo Sul, 24 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelCRISTINA FLORA
Data da Resolução24 de Junho de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 2.ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO M... e M..., com os demais sinais nos autos, vêm recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Tributário Administrativo e Fiscal (TAF) de Beja, que julgou improcedente a impugnação judicial que deduziram contra o acto de liquidação do Imposto Municipal sobre Imoveis, referente ao ano de 2005 e respeitante ao prédio inscrito na matriz predial rústica sob o artigo nº002...., da Freguesia de Montoito, Concelho de Redondo.

As Recorrentes apresentaram as suas alegações e, após convite ao aperfeiçoamento, formulam as seguintes conclusões: «1.

Em 1994, com base no novo cadastro geométrico do concelho de Redondo, o prédio rústico em causa nos autos foi objecto de reavaliação do valor patrimonial, tal como os demais prédios rústicos do mesmo concelho, e em 1995 entraram em vigor os novos valores patrimoniais resultantes da revisão da avaliação cadastral.

  1. De 1995 a 2004, o prédio estava inscrito na matriz sob o artigo 002.0....da freguesia de Montoito do concelho de Redondo, tinha uma área total de 956,0000 hectares e o seu Valor Patrimonial tributário (VP) era de € 2.168.984,65.

  2. Em 2005, em virtude da mera desanexação de uma parcela com 9,6000 hectares, anexada a prédio rústico contíguo, o referido prédio passou a ter uma área de 946,4000 hectares, com idêntica composição de culturas, e o seu VP foi reduzido em conformidade, passando de € 2.168.984,65 para € 2.132.725,20.

  3. Na sequência do processo de desanexação/anexação ocorrido em 2005, foram alterados os números das matrizes correspondentes aos prédios envolvidos e o prédio em apreço passou a estar inscrito na mesma matriz sob o artigo 002.....

  4. De 1995 a 2004 o dito VP de €2.168.984,65 não foi considerado para efeitos de incidência de Contribuição Autárquica (CA) e, depois, de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), sendo em seu lugar devidamente considerado o VP de €66.193,08 (cf. art.5º da Lei nº36/91, de 27-07, e art.25º do Dec.-Lei nº287/2003, de 12-11).

  5. Quanto a 2005, porém, surpreendentemente, o valor considerado para incidência de IMI passou a ser o VP do prédio após a mencionada desanexação (€2.132.725,20), não tendo sido aplicado, desde 2005, o regime de salvaguarda previsto no art.25º, nº1, do citado Dec.-Lei n.º287/2003, o que motivou a impugnação oportunamente deduzida pelas ora recorrentes quanto ao acto tributário de liquidação referente a 2005.

  6. A sentença recorrida julgou improcedente o pedido de impugnação porque, no entender do tribunal a quo, em resumo, a cláusula de salvaguarda prevista no artº25º do Dec.-Lei nº287/2003 é apenas aplicável aos prédios urbanos e porque não teria existido violação do princípio da igualdade. Contudo, 8.

O acto tributário de liquidação de IMI impugnado é nulo, por violar o princípio da igualdade (cf. art.161º, nº2, d), do CPA, aplicável por força do artigo 2º, cf), do CPPT e arts.13º e 104º, nº3, da CRP) e, em consequência, deve ser declarado nulo. Na verdade,

  1. Documentos juntos aos autos pela própria Autoridade Tributária (cf. fls. 143 ss., maxime a listagem de fls.146 ss.) evidenciam que o VP de cada um dos 2859 prédios rústicos existentes no concelho de Redondo em 2002 (valor para efeitos de incidência de imposto, determinado com observância de limitação imposta por cláusula de salvaguarda) não sofreu qualquer alteração em 2003, ou seja, não sofreu alteração após a entrada em vigor do CIMI, pelo que esta entrada em vigor não afastou a aplicação de cláusula de salvaguarda a tais prédios rústicos.

  2. Os mesmos documentos evidenciam até que 292 prédios rústicos existentes em 2002 foram reavaliados em 2003 e que, após esta reavaliação, todos esses 292 prédios, sem qualquer excepção, mantiveram o valor tributável igual ao de 2002. Assim, mesmo relativamente aos prédios rústicos do concelho de Redondo reavaliados após a entrada em vigor do CIMI, não foi alterado o valor tributável para efeitos de base de incidência de imposto, o qual havia sido fixado tendo em consideração as mencionadas cláusulas de salvaguarda.

  3. Em suma, relativamente aos prédios rústicos do concelho de Redondo em situação substancialmente idêntica, quer aos avaliados anteriormente à entrada em vigor do CIMI, quer aos avaliados após esta entrada em vigor, aplicaram-se sempre as cláusulas de salvaguarda sucessivamente previstas na lei (art.5º da Lei nº36/91 e art.25º do Dec.-Lei nº287/2003), constituindo o prédio rústico em causa nestes autos a única excepção (com referência a 2005). Ora, D) Não se vislumbra qualquer fundamento objectivo e razoável, constitucionalmente válido, para justificar que somente a um prédio rústico avaliado em 1994/1995, e nem sequer reavaliado na vigência do CIMI, seja aplicável, para efeitos de base de incidência de lMl, quanto a 2005, o valor patrimonial resultante da dita avaliação, sem atender à cláusula de salvaguarda legalmente prevista, e que para todos os restantes prédios rústicos situados no mesmo concelho (tenham ou não tenham sido reavaliados na vigência do CIMI) seja aplicada a cláusula de salvaguarda.

    Sem nada conceder 9.

    O acto tributário de liquidação de IMI impugnado é anulável, por violar a norma do art.25º, nº1 do Decreto-Lei nº287/2003, que aprovou o CIMI (e o disposto no art.103º, nºs 2 e 3, da CRP), e em consequência deve ser anulado. Com efeito,

  4. O CIMI deixou de remeter para a aprovação do Código das Avaliações, mas não criou qualquer conjunto de regras para definir o VP dos prédios rústicos, limitando-se, no tocante a estes, a remeter para a velha metodologia (do tempo do CCPIIA) do rendimento colectável do prédio. Assim, nada fez para colmatar «as extremas desigualdades de tratamento» na tributação dos prédios rústicos, razão pela qual, considerando o elemento histórico de interpretação da lei, é inquestionável que o regime de salvaguarda previsto no citado art.25º terá de aplicar-se aos prédios rústicos, pois os motivos que historicamente estiveram na génese da criação da cláusula de salvaguarda mantêm-se plenamente válidos na vigência do CIMI.

  5. As extremas desigualdades de tratamento, resultantes da metodologia de determinação do VP dos prédios rústicos, estão na génese da mens legislatoris que determinou a existência de cláusulas de salvaguarda, quer no âmbito da vigência do CCA quer no âmbito da vigência do CIMI (conforme se evidencia expressamente in Ciência e Técnica Fiscal nº397, pág. 192, e no preâmbulo do próprio CIMI), pelo que é inquestionável a racionalidade subjacente à génese da norma ora interpretada; ademais, o preâmbulo do CIMI refere-se à «equidade» como um «dos principais objectivos a alcançar», designadamente através da redução dos limites das taxas, «0,8%» quanto aos prédios rústicos [art.112º, nº1, a)], «e do estabelecimento de limites ao aumento da colecta, por forma a que não ocorra (...) um agravamento exagerado e abrupto do imposto a pagar».

  6. Sob o ponto de vista do enquadramento sistemático, o CIMI aplica-se a todos os prédios (rústicos e urbanos - cf. art.1º do CIMI), pelo que o regime transitório consagrado no regime (ou cláusula) de salvaguarda previsto no art.25º, nº1, do diploma que aprovou o CIMI (Dec.-Lei nº287/2003), terá forçosamente que ser aplicável a rústicos e urbanos, não só porque o legislador, no texto da norma, não restringiu o seu âmbito de aplicação, com também porque não faz qualquer sentido, pelos motivos históricos e teleológicos acima descritos, restringir a aplicação da norma aos prédios urbanos.

  7. Quanto à letra da lei, o art.25º, nº1, do Dec.-Lei nº287/2003 estabelece: «o aumento da colecta do IMI resultante da actualização dos valores patrimoniais tributários não pode exceder, por prédio, os seguintes valores anuais adicionados à colecta da contribuição autárquica ou do IMI devido no ano anterior ou que o devesse ser, no caso de prédios isentos...».

    A letra da norma é clara, não sendo necessário recorrer a qualquer interpretação extensiva ou restritiva para concluir que a previsão legal acima transcrita é (também) aplicável ao caso em apreço nos autos.

  8. O facto de o prédio ter sido objecto de fraccionamento em 2005, originando novo número de artigo matricial - "novo prédio", na verdade velho, com mera diminuição de área -, em nada afecta a conclusão anterior porque, nos termos do artigo 36º do ClMl: «os prédios resultantes de fraccionamentos ou anexação não são submetidos a avaliação, desde que não tenha havido alterações nas culturas, resultando o seu valor da respectiva discriminação ou da adição do valor das parcelas dos prédios que lhes deram origem», (itálico e sublinhado nossos) F) Em face do acima exposto, não é possível conceber uma correcta interpretação da lei que afaste a aplicabilidade do citado regime de salvaguarda ao caso em apreço.» ****Não foram apresentadas contra-alegações.

    ****Foram os autos a vista do Magistrado do Ministério Público que emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

    **** Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.

    ****As questões invocadas pelas Recorrentes nas suas conclusões das alegações de recurso, que delimitam o objecto do mesmo, e que cumpre apreciar e decidir são as seguintes: _ erro de julgamento porquanto o ato de liquidação é nulo, por violar o princípio da igualdade, nomeadamente o art. 161.º, n.º 2, alínea d) do CPC (conclusões 1 a 8 e respetivas alíneas das alegações de recurso); _ erro de julgamento porque o ato de liquidação é anulável por violação do disposto no art...

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