Acórdão nº 1667/17.6BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 24 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelPATRÍCIA MANUEL PIRES
Data da Resolução24 de Junho de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I-RELATÓRIO I….., LDª (doravante I….., Lda ou Recorrente) e o DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA (doravante DRFP ou Recorrente) vieram interpor recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Leiria, a qual julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida por I….., LDª, contra as liquidações adicionais de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), e respetivos juros compensatórios (JC), referentes aos anos de 2013 e 2014, no valor global de €412.508,22, tendo anulado as liquidações adicionais de IVA, na parte impugnada, nos montantes de €56.770,58 para o ano de 2013, e de €31.373,35 para o ano de 2014, acrescido dos correspondentes JC, e mantido no demais.

*** A I….., LDª, interpôs recurso na parte em que decaiu tendo concluído como segue: “1- A Impugnante, ora recorrente, inconformada com a D. sentença proferida nos autos pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que julgou apenas parcialmente procedente a impugnação apresentada, dela vem interpor o presente.

2 - Ora, com o devido respeito que é muito, a Recorrente não pode conformar-se com a D. decisão recorrida, no que concerne à parte decisória que julgou improcedente a impugnação da recorrente, decidindo manter na ordem jurídica os restantes montantes de IVA liquidados adicionalmente pela Fazenda Pública (ou seja, todo o valor para além dos 56.770,58€ para o ano de 2013, e de 31.373,35€ e respectivos juros compensatórios que pela D. sentença proferida foi decidido anular), absolvendo a AT nessa parte.

3 - Ao decidir da forma como o fez, decidiu mal e em desconformidade com a lei – erro de julgamento de facto e de direito. Entende a recorrente não ter sido feita uma correcta apreciação e valoração da prova testemunhal e documental, verificando-se, assim, um erro notório de apreciação da prova produzida.

4 - A Impugnante, ora Recorrente, deduziu impugnação judicial contra as liquidações adicionais de Imposto Sobre o Valor Acrescentado (IVA), e respectivos juros compensatórios, referentes aos oito trimestres dos anos de 2013 e 2014, no valor global de 412.508,22€, efectuadas pela Fazenda Pública, pedindo, a final, a anulação das liquidações de IVA, no montante de 311.053,82€ e correspondentes juros compensatórios.

5 - A liquidações controvertidas padecem do vício de violação da lei, por errónea qualificação e quantificação da matéria colectável sujeita a IVA.

6 - O ponto 7) dos factos dados como provados constantes da D. sentença recorrida não deveria ter sido dado como provado, pelo menos com a redacção que aí consta, devendo tal redacção ser alterada, dele retirando as referências a “que a recebeu” e “assinado por” J…...

7 - Porquanto, a recorrente não teve conhecimento da notificação para exibição dos documentos contabilísticos referentes aos anos de 2013 e 2014, pois que o seu gerente há data, J….., estava ausente no estrangeiro, não tendo sido ele que assinou o respectivo aviso de recepção, nem escreveu nesse documento (AR), quer a data, quer o nome “ J…..” ou o aludido número do Cartão de Cidadão.

8 - A assinatura aposta no aviso de recepção não é do gerente da arguida (J…..), não foi ele que a fez, só podendo tratar-se de uma falsificação.

9 - Sendo que tal falsificação já havia sido alegada pela Impugnante/Recorrente em sede de processo de recurso de contra-ordenação, com o nº 1590/17.4BELRA, que correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, Unidade Orgânica 2, conforme bem resulta do recurso que agora se junta como documento 1 e que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais. Doc. 1 10 – Embora a existência do documento seja anterior à entrada da presente impugnação judicial, só com a audiência de julgamento e a prolação da decisão agora recorrida, mais concretamente o facto provado constante do ponto 7) da D. sentença recorrida, é que se tornou necessária a junção de tal documento, por forma a alterar a convicção do Tribunal, o que se pretende.

11 - O presente documento releva pois, para a boa decisão da causa por poder, em conjugação com outros elementos de prova, contribuir para a convicção desse Tribunal na decisão a proferir quanto à matéria de facto impugnada com fundamento no disposto no nº 1 do artigo 662º do C.P.C., conjugado com os artigos 425º e 423º do mesmo código, aplicáveis ex vi o artigo 281º do C.P.P.T.

12 - Ora, não tendo a assinatura constante do aviso de recepção sido feita pelo punho do gerente da impugnante, a aludida notificação efectuada pelos Serviços de Inspecção Tributária, não teve lugar, não podendo produzir quaisquer efeitos relativamente à Impugnante/Recorrente.

13 - Devendo o ponto 7 dos factos provados passar a ter a seguinte redacção: Em 25/08/2016, os SIT remeteram para a morada da sede da Impugnante, na pessoa do seu representante legal e por carta registada com aviso de recepção, o ofício nº ….., cujo teor consta do seguinte: (…).

14 - Por outro lado, importa ainda ter presente que em momento nenhum, houve qualquer recusa por parte da impugnante/recorrente na entrega da apresentação dos documentos contabilísticos relativos aos anos de 2013 e 2014.

15 - Vindo aliás, a impugnante/recorrente a depositar os documentos referentes à contabilidade dos anos de 2013 e 2014, mais precisamente ao período de 01/01/2013 a 31/12/2014, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria – Unidade Orgânica 4, no âmbito do processo nº 151/17.2 BELRA (recurso da decisão de derrogação do sigilo bancário), em 20/01/2017, conforme bem resulta do ponto 10) dos factos provados constante da D. sentença recorrida.

16 - O que a recorrente fez face à recusa por parte da Autoridade Tributária em receber os documentos contabilísticos por, alegadamente, já ter decorrido o prazo que lhe havia sido concedido para o efeito e com o objectivo de fazer prova de que detinha a documentação necessária para a acção inspectiva, não havendo necessidade de recorrer à derrogação do sigilo bancário e ao recurso a mecanismos de excepção, como é o caso do método indirecto, para correcção dos valores do IVA.

17 - Pastas essas que estiveram nesse Tribunal – TAF de Leiria -, à ordem desse processo, até 25/07/2017, data em que foram entregues/devolvidas ao gerente da Recorrente, ou seja, as pastas estiveram depositadas no Tribunal durante a acção inspectiva e para além da conclusão da acção inspectiva, em 24/04/2017, e notificação do relatório final de inspecção, datado de 05/07/2017, conforme pontos 13), 15) e 19) dos factos provados, logo à disposição do Senhor Inspector para análise e consulta.

18 – Tanto mais que o Senhor Inspector da Autoridade Tributária, N….., embora possa não ter tido qualquer intervenção na fase judicial desse processo de recurso, não ignorava a sua existência, pois que, nas suas declarações prestadas em audiência de julgamento, admitiu ter tido conhecimento da existência do recurso da decisão de derrogação do sigilo bancário que a impugnante/recorrente havia apresentado, conforme bem resulta do seu depoimento em audiência de julgamento de 10/11/2020, registado em sistema digital áudio (de 00:35:40 a 01:13:30 do temporizador de gravação) e concretamente na parte supra transcrita aos minutos 1:11:21 a 1:12:31.

19 - Destarte, deveria o Tribunal “ a quo” ter considerado como provado o facto B) dos factos não provados constantes da D. sentença – “O senhor inspector tributário tinha conhecimento de que a contabilidade da Impugnante dos anos de 2013 e 2014, estavam depositadas neste Tribunal, à ordem do processo nº 151/17.2BELRA”.

20 - E, como tal, atento o supra exposto, a Autoridade Tributária não deveria ter recorrido a métodos indirectos e procedido às liquidações adicionais de IVA, devendo ter analisado os documentos que se encontravam no Tribunal.

21 - E se assim tivesse procedido teria necessariamente chegado a uma conclusão diferente, mais justa e mais próxima, senão exacta da realidade, não tendo apurado IVA de montantes absolutamente exagerados, naqueles anos de 2013 e 2014.

22 - Cumpre dizer que o lançar mão da avaliação indirecta não depende de um critério discricionário da AT, porquanto o princípio é o do grau da certeza na tributação.

23 - A avaliação indirecta detém um carácter excepcional, dado só poder ser utilizada nas condições expressamente previstas na lei, conforme bem resulta do artigo 87º da LGT (nº 1 do artigo 81º da LGT), e assume-se como subsidiária da avaliação directa (nº 1 do artigo 85º da LGT), aplicando-se –lhe, sempre que possível e a lei não estabelecer o contrário, as regras da avaliação directa (nº 2 do artigo 85º da LGT).

24 - Ou seja, apenas se recorrerá à avaliação indirecta quando a avaliação directa não for absolutamente possível ou conveniente, ou doutro modo e na formulação da doutrina, só quando a matéria tributável não puder ser apurada mediante a declaração do contribuinte, depois de corrigida, se for caso disso, é possível a Administração afastar-se dessa declaração e tributar o contribuinte mediante o uso de métodos indirectos.

25 - Ora, reportando-nos ao caso concreto dos autos, atenta a factualidade exposta, à luz do quadro legal aplicável, para os exercícios referentes aos anos de 2013 e 2014, não deveria a Autoridade Tributária ter recorrido à utilização de métodos indirectos para corrigir os valores do IVA dos períodos em causa, tendo assim, violado o disposto nos artigos atrás referidos.

26 – Ainda, da prova produzida em audiência de julgamento, designadamente das declarações da testemunha N….., depoimento registado em sistema digital áudio (de 00:35:40 a 01:13:30 do temporizador de gravação), concretamente aos minutos 1:01:23 a 1:01:52, resulta que não obstante terem os documentos sido recolhidos pelo Senhor Inspector Tributário, como o próprio confirmou, facto é que não os considerou em sede de dedução de IVA, procedendo a correcções, no ano de 2013, no montante de 34.283,73€ e no ano de 2014, no montante de 55.764,79€, conforme quadros I, III e IV constantes do relatório de inspecção...

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