Acórdão nº 41/20.1BESNT-S2 de Tribunal Central Administrativo Sul, 17 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelANA PAULA MARTINS
Data da Resolução17 de Junho de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em Conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO A..., LDA.

, Autora nos autos principais e aí melhor identificada, vem recorrer do despacho proferido, a 04.03.2021, pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa (Juízo dos Contratos Públicos), pelo qual indeferiu a prova pericial por si requerida.

O despacho recorrido foi proferido no âmbito de uma acção de contencioso pré-contratual interposta pela ora Recorrente, contra o CENTRO HOSPITALAR UNIVERSITÁRIO DE LISBOA CENTRAL, E.P.E, na qualidade de entidade demandada e contra R... – S..., LDA., na qualidade de contra-interessada.

* Nas suas alegações, a Recorrente formulou as seguintes conclusões: “1. O objeto do presente recurso é o despacho de indeferimento da prova pericial requerida pela Autora, do qual cabe recurso de apelação autónoma, nos termos conjugados dos artigos 142.º, n.º 5 do CPTA e 644.º, n.º 2, alínea d) do CPC, que deve ser admitido com efeito suspensivo (cfr. artigo 143.º, n.º 1 do CPTA) e subida imediata em separado (cfr. artigo 645.º, n.º 2 do CPC).

  1. De harmonia com as disposições conjugadas dos artigos 388.º do Código Civil, 476.º, n.º 1 do CPC e 91.º, n.º 3 do CPTA, a prova pericial só pode ser indeferida quando se mostre impertinente ou dilatória e claramente desnecessária.

  2. Considerando os factos em relação aos quais foi requerida prova pericial, e as alegações em que assenta a causa de pedir da Autora, mostra-se imprescindível proceder a uma interpretação correta e rigorosa dos requisitos técnicos indicados no Caderno de Encargos, bem como da proposta da Contrainteressada R..., por forma a aferir a compatibilidade desta com aqueles.

  3. Para poder proferir uma decisão, impõe-se ao tribunal, portanto, que dê resposta a um conjunto de questões de natureza eminentemente técnica, para as quais se mostram necessários conhecimentos especializados em matéria de análises clínicas, e dos respetivos equipamentos e reagentes químicos utilizados, que o Tribunal não possui.

  4. O objeto da perícia requerida incide sobre matéria de facto relevante, que constitui a base das alegações apresentadas pela Autora na sua petição inicial, pelo que a diligência não se mostra impertinente.

  5. A perceção e a apreciação da factualidade em causa, com o rigor necessário à justa composição do litígio, exige conhecimentos técnicos especializados que um juiz não possui, nem tem de possuir, pelo que a perícia tão pouco se mostra dilatória, ou claramente desnecessária.

  6. O direito à prova constitui uma dimensão essencial da tutela jurisdicional efetiva e do direito a um processo justo e equitativo consagrados no artigo 20.º da Constituição, daí resultando igualmente que só excecionalmente, nos casos em que se mostre impertinente, por recair sobre factos irrelevantes, ou dilatória, por incidir sobre matéria que não carece de especiais conhecimentos pode ser indeferida a prova pericial.

  7. O critério para aferir da necessidade da produção de prova pericial deverá reconduzir-se à razoável necessidade de conhecimentos específicos e especializados por forma a alcançar uma perceção e apreciação suficientemente segura dos factos que vise a justa composição do litígio.

  8. Conclui-se que a perícia requerida não se mostra impertinente ou dilatória, nem, muito menos, claramente desnecessária.

  9. Ao indeferir a perícia, o despacho recorrido viola os artigos 388.º do Código Civil, 476.º, n.º 1 do CPC e 91.º, n.º 3 do CPTA e ainda o direito à prova ínsito no princípio da tutela jurisdicional efetiva (artigo 20.º da CRP).

    Termos em que deverá ser concedido provimento ao recurso e revogado o despacho recorrido, ordenando-se a baixa dos autos para que seja realizada a perícia requerida.

    * Regularmente notificada, a Recorrida/Entidade Demandada não contra-alegou.

    * Por sua vez, a Recorrida/Contra-interessada contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso, não tendo formulado conclusões.

    * O Ministério Público junto deste Tribunal, regularmente notificado nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147°, do CPTA, não emitiu parecer.

    * Sem vistos, atento o disposto nos arts. 36º nºs 1 e 2 e 147º do CPTA, mas com prévia divulgação do projecto de acórdão pelos Senhores Juízes Desembargadores Adjuntos, o processo vem submetido à Conferência. * II - OBJECTO DO RECURSO Atentas as conclusões das alegações do recurso, que delimitam o seu objecto, nos termos dos arts. 635º, nº 4 e 639º, nºs 1 e 2 do CPC, ex vi art 140º, nº 3 do CPTA, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso, cumpre aferir se o despacho recorrido incorreu em erro de julgamento ao indeferir a prova pericial.

    * III – FUNDAMENTAÇÃO De facto São relevantes as seguintes ocorrências processuais (cfr. documentos juntos na certidão que compõe os autos e consulta do processo no SITAF): 1- Na petição inicial, apresentada a 13.01.2020, a ora Recorrente pede que se declare a “ilegalidade do segmento do Anexo I – Lista de reagentes – Lote 1- Cadeia do Caderno de Encargos” e a “ilegalidade do disposto no artigo 9.º, n.º 2, do Programa do Procedimento.” 2- A 29.04.2020, a Autora, ora Recorrente, nos termos e ao abrigo do disposto nos artigos 63.º, n.ºs 1, 2 e 4, 102.º, n.º 4, e 103.º-A, n.º 1, do CPTA, formula um pedido de ampliação do objecto do processo “à impugnação do ato de adjudicação praticado pelo Conselho de Administração da Entidade Demandada, bem como do contrato celebrado ou a celebrar na sua sequência”.

    3- A Autora requer a produção de prova documental, testemunhal e pericial.

    4- Relativamente à prova pericial, esta vem requerida com a indicação das seguintes questões: - A R... é, ou não, a única entidade no mercado relevante que comercializa os reagentes Tiroglobulina para um equipamento híbrido, além de ser a única entidade que comercializa os reagentes Everolimus e Cortisol Salivar? - A exigência concursal de que o adjudicatário forneça equipamentos híbridos com uma única entidade de controlo afasta, ou não, a possibilidade de os concorrentes recorrerem a equipamentos de terceiros, de modo a suprirem a falta de reagentes que possam não ter disponíveis para comercialização? - Os softwares dos equipamentos propostos pela R..., a instalar nos Polos e no Hospital de S. José são, ou não são, verdadeiramente iguais na ótica do utilizador? 5- A 11.10.2020, foi admitida a ampliação do objecto do processo.

    6- Tendo a Contra-interessada R... interposto recurso da decisão de admissão da ampliação, foi o mesmo indeferido por despacho de 16.12.2020, for configurar despacho interlocutório que apenas pode ser impugnado com o recurso que venha a ser interposto da decisão final.

    7- A 18.01.2021, foi proferido despacho a identificar o objecto do litígio e a enunciar os temas da prova nos seguintes termos: “I.1. OBJETO DE LITÍGIO Saber se assiste à Autora o direito a obter: i. A declaração de ilegalidade do segmento do Anexo I - Lista de reagentes - Lote 1 Cadeia do Caderno de Encargos; ii. A declaração da ilegalidade do disposto no artigo 9.º, n.º 2 do Programa de Procedimento; iii. A declaração de ilegalidade da deliberação praticada pelo Conselho de Administração da Entidade Demandada, de 02/04/2020, que excluiu a proposta da Autora e procedeu à adjudicação combinada dos lotes 1, 2, 3 e 18, no âmbito do concurso público favor da Contrainteressada R... – S..., Lda. (R...).

    I.2. TEMAS DA PROVA A fim de proferir decisão, importa apurar: a) circunstâncias, objetivos e motivos (designadamente relativos à gestão do contrato e/ou de ordem financeira/económica, técnica ou funcional) que determinaram a alegada decisão de não desdobramento em lotes do objeto do lote 1; b) se a composição do Lote 1 - Cadeia e os requisitos técnicos que lhe estão associados determinam que mais nenhum operador no mercado, a não ser a CI R..., tem possibilidade de apresentar proposta, designadamente em virtude da (im)possibilidade de os concorrentes recorrerem a equipamentos de terceiros, de modo a suprirem a falta de reagentes que possam não ter disponíveis para comercialização; c) se a Autora comercializa (ou não) o reagente Tiroglobulina (cf...

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