Acórdão nº 88/21.0BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 17 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelJORGE PELICANO
Data da Resolução17 de Junho de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul.

L...

, nacional da República da Gâmbia, vem interpor recurso da sentença proferida no TAC de Lisboa que julgou improcedente o pedido de anulação do despacho datado de 02/02/2021, do Director Nacional do SEF, que, ratificando o despacho de 30/12/2020 do Director Nacional Adjunto do SEF, decidiu que o pedido de protecção internacional por ele apresentado é inadmissível e determinou a sua transferência para Itália. Formulou as seguintes conclusões: 1a - A decisão do SEF padece de erro nos pressupostos de facto e de direito na medida em que não foi precedida do necessário pedido de informação, junto das autoridades italianas, sobre se, foi feito um pedido de asilo ou de protecção internacional por parte do aqui A., de forma a saber, com segurança, se a sua situação é enquadrável nas normas do art.° 37°, n.° 2 e do art.° 38° da Lei do Asilo, bem como nos art.°s 3°, 23°, n.° 1 e 25°, n.°s 1 e 2 do Regulamento.

  1. - É que se, como diz o A., pelo mesmo não foi feito qualquer pedido de protecção internacional em Itália, apenas lhe tendo sido recolhidas as suas impressões digitais, à sua situação não são aplicáveis as normas atrás referidas.

  2. - Invoca a decisão recorrida que «não é rigoroso afirmar que, caso não tenha apresentado um pedido de protecção internacional em Itália, não lhe é aplicável o disposto nos art.°s 37° e 38° da Lei de Asilo nem, bem assim, os artigos , 23°, n.° 1 e 25°, n.° 1 do Regulamento (EU) n.° 604/2013, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26.06», pois isso também pode acontecer, por exemplo, nos casos dos n.°s 1 e 2 do art.° 13° do Regulamento, porém, não lhe assiste, porquanto, nos termos do n.° 1 do art.° 13 do Regulamento, tendo o A. entrado em território italiano por barco, vindo da Líbia, em meados de 2017 e lá tendo permanecido mais de 12 meses após essa data, a responsabilidade da Itália pela análise do pedido de protecção internacional cessou. Sendo certo que o n.° 2 não se aplica com os fundamentos invocados na sentença ou com outros por a Itália já não poder ser tido como país responsável nos termos do disposto no n.° 1.

  3. - Acresce que, ao contrário do defendido na sentença de que se ocorre, a nova redacção do art.° 3°, n.° 2 do Regulamento 604/2013, de 26/02, afasta a discrionariedade dos Estados Membros e determina uma obrigação legal dos mesmos, antes de decidirem e de procederem à transferência do requerente de protecção internacional para o Estado com obrigação de retomar, quando haja motivos válidos, apreciarem sobre a eventual ocorrência de falhas sistémicas no procedimento de asilo e nas condições de acolhimento daquele Estado.

    5a- Em relação à Itália, é do conhecimento geral, por tal ser amplamente noticiado nos órgãos de comunicação social e por organizações de cariz não governamental, através de relatórios, artigos e estudos que essas falhas sistémicas e de acolhimento existem naquele país.

  4. - Correndo o aqui recorrente o risco sério e real de, a ser transferido para Itália, vir a sofrer um tratamento cruel, desumano ou degradante.

  5. - Face à notoriedade da realidade que se vive em Itália no que respeita ao conhecimento dos pedidos de asilo e sobre as condições de acolhimento e permanência naquele país aos requerentes de protecção internacional, incumbia ao SEF, nos termos do art.° 58° CPA, previamente a proferir uma decisão, instruir o processo com informação atualizada sobre a realidade em Itália.

  6. - E não tendo o SEF, como se lhe impunha, recolhido a informação necessária, cabia ao tribunal a quo tê-lo feito.

    TERMOS NOS QUAIS E NOS MELHORES DE DIREITO DOUTAMENTE SUPRIDOS POR V. EX.A, DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE E, CONSEQUENTEMENTE, DEVE A DECISÃO RECORRIDA SER ANULADA E SUBSTITUÍDA POR OUTRA QUE DECLARE NULA A DECISÃO PROFERIDA PELO SEF E CONDENADO O MESMO A INSTRUIR O PROCEDIMENTO COM INFORMAÇÃO FIDEDIGNA SOBRE SE O RECORRENTE PEDIU PROTEÇÃO INTERNACIONAL EM ITÁLIA, OU, CASO ASSIM NÃO SE ENTENDA, A INSTRUIR O PROCEDIMENTO COM INFORMAÇÃO FIDEDIGNA E ATUALIZADA SOBRE O FUNCIONAMENTO DO PROCEDIMENTO DE ASILO EM ITÁLIA E AS CONDIÇÕES DE ACOLHIMENTO E PERMANÊNCIA, NAQUELE PAÍS, DOS REQUERENTES DE PROTEÇÃO INTERNACIONAL.”.

    *O Recorrido não apresentou contra-alegações.

    Foi dado cumprimento ao disposto no art.º 146.º do CPTA.

    O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, pelo que há que decidir se a sentença recorrida sofre do erro de julgamento de facto e de direito que lhe é apontado, por: - o SEF não ter pedido informação às autoridades italianas sobre se o Recorrente formulou ali um pedido de protecção internacional, de forma a determinar se a situação do Recorrente é enquadrável nas normas do art.° 37°, n.° 2 e do art.° 38° da Lei do Asilo, bem como nos art.°s 3°, 23°, n.° 1 e 25°, n.°s 1 e 2 do Regulamento de Dublin III; -não ter sido averiguada a existência de falhas sistémicas no procedimento de asilo em Itália, correndo o Recorrente o risco de vir aí a sofrer um tratamento cruel, desumano ou degradante.

    *Fundamentação De facto.

    Na sentença recorrida foi fixada a seguinte matéria de facto: 1. Em 22.09.2017, o A. foi identificado pelas autoridades competentes em Itália, aí tendo sido recolhidas as suas impressões digitais (cf. cópia do “EURODAC – Fingerprint Form” com a referência IT1NA048PJ junta a fls. 77-78 dos autos no SITAF, documento que se dá por integralmente reproduzido).

    1. Em 04.11.2020, o A. apresentou um pedido de protecção internacional junto do R. (cf. declaração comprovativa de apresentação do pedido de protecção internacional junta a fls. 104 dos autos no SITAF, documento que se dá por integralmente reproduzido).

    2. Em 24.11.2020, o A. prestou declarações junto do SEF, cujo auto se reproduz parcialmente infra: (…) «Imagem no original» «Imagem no original» (cf. auto de declarações junto a fls. 108-117 dos autos no SITAF, documento que se dá por integralmente reproduzido).

    3. A final do auto de declarações a que se alude no ponto anterior, consta um quadro com a designação de “Relatório”, segundo o qual: (…)«Imagem no original» (cf. auto de declarações junto a fls. 108-117 dos autos no SITAF).

    4. Em 02.12.2020, o A. apresentou um requerimento junto do R., cujo teor se transcreve parcialmente infra: a) O requerente emenda no campo "Data de Nascimento" (Página 1 da Entrevista / Transcrição) para 09/01/1998 - Nove de Janeiro de mil novecentos e noventa e oito; b) Em "Registos Eurodac" (Página 5 da Entrevista / Transcrição), o requerente reitera que apenas saiu de...

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