Acórdão nº 931/10.0BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 17 de Junho de 2021
Magistrado Responsável | LINA COSTA |
Data da Resolução | 17 de Junho de 2021 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: L....., SA, devidamente identificada como Autora nos autos de acção administrativa, que instaurou contra o Instituto da Segurança Social, IP (ISS, IP), inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da sentença, proferida em 10.11.2016, pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, que julgou a improcedente a acção e absolveu o Réu dos pedidos.
Nas respectivas alegações, a Recorrente formulou as conclusões que seguidamente se reproduzem: «A. O Tribunal a quo julgou improcedente a ação administrativa especial apresentada pela Autora para anulação do ato administrativo emitido pela Segurança Social, que obriga a Autora ao pagamento do montante correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego devida a cinco trabalhadores com os quais a Autora celebrou acordo de revogação do contrato de trabalho, no valor global de € 137.256,00 (cento e trinta e sete mil duzentos e cinquenta e seis euros), B. A Autora não se conforma com a decisão do Tribunal a quo pelo que vem dela recorrer.
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Entende a Autora que o ato administrativo enferma de um vício de falta de fundamentação e viola o disposto nos n.ºs 4 e 5 do artigo 10.º do DL n.º 220/2006, de 03 de Novembro, devendo como tal ser revogado.
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Subsidiariamente, e por mero dever de patrocínio, entende a Autora que não sendo procedentes o alegado vício de falta de fundamentação e demais ilegalidades do ato administrativo, sempre deverá ser apenas responsabilizada pelos montantes efetivamente pagos pela Segurança Social aos beneficiários do subsídio de desemprego, revogando-se a decisão do Tribunal a quo e ordenando-se a anulação do ato impugnado e condenando a Segurança Social a praticar ato que exija à Autora apenas o valor das prestações que, de facto, suportou.
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Resulta claro dos factos provados que a decisão da Segurança Social omite quais os factos que deram origem à decisão da Segurança Social, pelo que não faculta à Autora um conhecimento devido e efetivo do conteúdo ou sentido da decisão.
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Desde logo, a notificação para audição prévia remete para motivos anteriormente comunicados que nunca foram efetivamente comunicados ou dados a conhecer à Autora, pois conforme resulta dos factos provados no âmbito do procedimento administrativo apenas foram efetuadas duas únicas comunicações: para audição prévia e a decisão final.
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O ato administrativo omite, igualmente, a forma de cálculo dos montantes a pagar a título de subsídio de desemprego, desconhecendo a Autora qual o itinerário cognitivo adoptado pela Segurança Social para calcular os montantes atribuídos aos beneficiários de subsídio de desemprego, bastando-se com uma mera descrição de cinco dívidas, que somadas perfazem o total de € 137.258,00, não tendo a Autora outra possibilidade se não pagar e calar (!) H. Em suma, a propósito do ato administrativo poderia saber a Autora apenas o seguinte: - Que está em causa uma restituição de valor global igual a € 137.256,00 - Que aquela restituição ocorre no âmbito do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro, mais concretamente ao abrigo do artigo 63.º daquele diploma; - E que a Segurança Social entende que, para efeitos da aplicação do disposto nos n.ºs 4 e 5 do artigo 10.º daquele diploma, o numero de trabalhadores da empresa é aferido no mês anterior ao do limite do período retrospetivo de três anos, o qual corresponde ao mês temporalmente mais distante.
I. Fica a Autora sem saber: - Que acordos de cessação de contratos individuais de trabalho são, em concreto, questionados no ato impugnado; - Em que medida foram as quotas estabelecidas nos n.ºs 4 e 5 do artigo 10.º do DL 220/2006, de 3 de novembro.
- Quantos acordos podia celebrar a Autora e quantos efetivamente celebrou ao ponto de despoletar a aplicação do artigo 63.º do Decreto-Lei 220/2006, de 3 de novembro; - A que acordo contestado pela Segurança Social corresponde cada valor indicado no quadro 1 da notificação para audição prévia; e - Qual a forma de cálculo do montante atribuído aos beneficiários do subsídio de desemprego.
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Não obstante, o Tribunal a quo proferiu uma decisão em que admite uma atuação abusiva pela Segurança Social, por violação do princípio da fundamentação dos atos administrativos, afirmando o seguinte: “Não há falta de fundamentação mesmo que a Ré tenha enviado a notificação do projeto de decisão aludindo a anteriores informações (…) o ato impugnado encontra-se devidamente fundamentado, posto que através dele, aliado à informação ainda que não oficial, a Autora soube a que beneficiários respeitaria o ato e que não se encontravam preenchidas as condições previstas no artigo 10.º e 63.º do DL 220/2006 e, por que via disso teria de restituir o valor de €137.256,00” K. Consideramos estarmos perante um erro de julgamento ao considerar-se que o ato administrativo se encontra devidamente fundamentado e afirmar que as condições do artigo 10.º não estão totalmente preenchidas.
L. Para que se considere o ato fundamentado é imperioso que este se faça através da convocação de elementos de facto e de iure que justifiquem, de modo claro, congruente e completo, as razões que levaram a que determinados acordos de revogação do contrato de trabalho tivessem sido excluídos das quotas previstas no n.º 4 do artigo 10.º do DL n.º 220/2006.
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Termos em que, andou mal o Tribunal a quo ao considerar que não se verifica um vício de falta de fundamentação do ato administrativo, devendo ser a decisão revogada na parte em que julga improcedente o vício de falta de fundamentação do ato administrativo.
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Adicionalmente, o ato administrativo sofre de ilegalidade por violação do artigo 10.º, n.º 4 e 5 do DL 220/2006.
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A Autora poderia celebrar até 79 (setenta e nove) acordos de revogação para efeitos do referido diploma legal, no triénio decorrido entre 2006 e 2009.
P.
Tendo a Autora celebrado apenas 67 (sessenta e sete) acordos de revogação.
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Pelo que, se considera ilegal o entendimento da Segurança Social no sentido de considerar que a Autora ultrapassou o número de acordos de revogação permitidos por aplicação das referidas normas.
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Sucede que, a interpretação da Segurança Social, acolhida na douta sentença ora recorrida, altera a forma de contabilização dos limites estabelecidos, tendo o Tribunal a quo considerado que, “(…) enquanto não tiver decorrido um período de três anos, contados da data da entrada em vigor das normas já citadas (4.11.2006), a data de início do triénio é de 4.11.2006 e o número de trabalhadores para apuramento das quotas é o verificado em Outubro/2006. E, só a partir de 4.11.2009, o início do triénio torna-se móvel e, por isso mesmo deixa de ser o mês de outubro de 2006, para ser, efectivamente, e em termos de contagem regressiva, aquele mês que, em termos cronológicos, antecede o mês do início do triénio.
” S. Esta interpretação configura uma legitimação pelo Tribunal a quo da criação de um regime transitório de aplicação das referidas normas legais, que consideramos que só por fonte legal poderia ter sido criado.
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De acordo com o entendimento proferido pelo Tribunal a quo a Autora só poderia ter celebrado 62 acordos de cessação do contrato de trabalho.
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Pelo que, os acordos de cessação dos contratos de trabalho que deram origem à notificação da segurança social (63 a 67) não estariam abrangidos pelo regime previsto no DL 220/2006.
V. O entendimento sufragado pelo Tribunal a quo além de violar o disposto nos n.ºs 4 e 5 do artigo 10.º do DL n.º 220/2006, de 3 de novembro, viola o princípio da legalidade administrativa previsto no artigo 3.º, n.º 1 do CPA e o princípio da separação de poderes, como subprincípio do Estado de Direito, consagrado, designadamente, no artigo 2.º da Lei Fundamental.
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A Segurança Social estabelece aquilo que entendemos ser um regime transitório de aplicação das referidas normas, substituindo-se ao legislador, criando uma forma de cálculo divergente do disposto no artigo 10.º, n.º 4 e 5 do DL 220/2006, de 3 de novembro.
X. Tal regime não tem substância legal e tem como consequência a imputação à Autora da responsabilidade pelo pagamento do montante correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego, conforme disposto no artigo 63.º do DL 220/2006, de 3 de novembro.
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O ato administrativo além de violar o disposto no artigo 10.º, n.º 4 e 5 do DL 220/2006, de 3 de novembro, viola, igualmente, o princípio da legalidade administrativa, previsto no artigo 3.º do CPA, ex vi do artigo 3.º, al. c) do Código Contributivo, que dispõe o seguinte: “1 - Os órgãos da Administração Pública devem atuar em obediência à lei e ao direito, dentro dos limites dos poderes que lhes forem conferidos e em conformidade com os respetivos fins.” Z. Face ao exposto, deve a decisão do Tribunal a quo ser substituída por outra que julgue o ato administrativo ilegal por violação do disposto no artigo 10.º, n.º 4 e 5 do DL 220/2006, de 3 de novembro, e consequentemente do princípio da legalidade administrativa a que a Segurança Social se encontra obrigada.
AA.
Finalmente e apenas por mero dever de patrocínio, julgando-se improcedente o pedido de revogação da decisão do Tribunal a quo por verificada a falta de fundamentação do ato administrativo e a violação do disposto no artigo 10.º do DL n.º 220/2006, de 3 de novembro, entende a Autora que sempre deveria ser revogada a decisão do Tribunal a quo que considera que o ato não viola o disposto no artigo 63.º do referido Decreto-Lei.
BB. Entende a Autora que o artigo 63.º do referido Decreto-Lei não habilita a Segurança Social a exigir, de forma antecipada e pela sua totalidade, o montante total das prestações iniciais de desemprego atribuídas aos beneficiários.
CC. Conforme jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo de 19 de junho de 2014, proc. n.º 01308/13, a responsabilidade ora em causa é indemnizatória e, por essa razão, assenta no prejuízo...
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